Discursos João Paulo II 1980 - Fortaleza, 10 de Julho de 1980


VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE AO BRASIL

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

NA CATEDRAL DE MANAUS


Manaus, 10 de Julho de 1980



Senhor Arcebispo Administrador Apostólico de Manaus,
Senhores Arcebispos e Bispos,
Caríssimos irmãos e irmãs em Jesus Cristo

1. A Providência divina foi mais uma vez bem generosa para com o Papa, reservando-lhe, depois de um mundo de alegrias, a alegria suplementar de vir concluir aqui, em Manaus, no coração do fabuloso Amazonas, o intenso programa desta visita pastoral. Eu Lhe sou profundamente agradecido de encontrar-me convosco, neste cenário que fala do Criador e proclama que é “Ele o único que faz grandes maravilhas” (Ps 135,4) e elevo ao Deus uno e trino, em nome do qual aqui me encontro, louvor e homenagem.

Sinto-me feliz por poder encontrar-me com a Igreja – tão marcadamente missionária – desta Região, com a sociedade civil, seus governantes e representantes, de modo particular. Muito obrigado pela calorosa acolhida de todos, bem expressa nas palavras bondosas do Senhor Arcebispo Administrador Apostólico.

2. Presente por toda parte, o Senhor quis estar presente aqui no meio de nós por outras maneiras particulares: realmente presente em Corpo, Sangue, Alma e Divindade na Santíssima Eucaristia que celebramos; presente na Sua Palavra, confiada à Igreja como depósito e patrimônio, Palavra da vida e da verdade que o Papa também aqui deseja anunciar; presente no Vigário de Cristo, ao qual foi dado o poder de “apascentar as Suas ovelhas e os seus cordeiros”(cf. Jo Jn 21, 15ss); presente em cada um dos Seus “santos”, isto é, daqueles que vivem a vida divina; presente na Comunidade dos que aqui nos congregamos em Seu nome; e presente, enfim, nos “pequeninos”, naqueles “pobres em espírito” que o Senhor proclama bem-aventurados (cf. Mt Mt 5,3), porque vazios de si mesmos para acolher o Reino e porque com eles o Senhor de algum modo se identifica: “Cada vez que fizestes a cada um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes” (Mt 25,40).

Presentes a Ele e n’Ele unidos pelo vínculo da caridade, que seja o Senhor a falar-vos por “Pedro”: a Ele empresto minha voz e meu visível afeto para que a todos chegue um sinal do Seu amor.

3. Uma saudação, antes de mais ninguém, aos meus amados Irmãos no Episcopado, que colegialmente unidos comigo partilham a solicitude de todas as Igrejas. Com eles saúdo a coroa de Sacerdotes, diocesanos e religiosos. Vós sois um dom que Deus faz à sua Igreja. Pelo Sacramento da Ordem o Senhor que vos escolheu e chamou vos consagra por um novo título para serdes servidores do Seu Evangelho de Salvação (cf. Gal Ga 1,7). Ilumina-nos a todos a visão da Igreja, como Cristo a quis, universal, revestindo embora em cada parte do mundo aspectos e expressões exteriores diversas, sempre una e única. Por isso, enquanto procurais estar bem próximos do povo e dos seus problemas, fazeis bem em cultivar a unidade eclesial, “arraigados e fundados na caridade”(cf. Ef Ep 3,17).

4. Saúdo-vos também – sabeis com quanta afetuosa estima – a vós queridos Religiosos e Religiosas. Por vossa consagração entregastes vossa vida nas mãos do Senhor. Deixai-vos moldar por Ele, na intimidade que se alimenta com a oração e a adoração “em espírito e verdade”, como o Pai quer os seus adoradores. Seja o Espírito de amor a conduzir-vos sempre, pelas vias da ascensão espiritual, com pobreza simples, obediência generosa e castidade transparente.

5. A vós todos, igualmente, amados filhos, quer ocupeis cargos de responsabilidade quer vos entregueis aos trabalhos mais simples como cristãos, a todos se estende a mesma afetuosa saudação. Em união direta com os vossos pastores e na comunhão de toda a Igreja, sois aqueles que na realidade do dia-a-dia dais no vosso ser e agir e traduzis em vida, o testemunho da Boa Nova.

Olhai para Cristo, o nosso modelo e mestre: Ele passou “fazendo e ensinando” (cf. At Ac 1,1).

Ele nos recorda a todos o dever da fidelidade à vocação recebida de Deus e aos compromissos pessoalmente assumidos no Batismo. Para cumpri-los somos continuamente enriquecidos com graça sobre graça.

Recordo-vos, nesta circunstância, que uma só coisa é necessária: a coerência com o ser cristão, a fidelidade ao amor com que Deus nos amou primeiro e espera o nosso amor. A verdade é que somos chamados todos – não tenhamos medo da palavra – à santidade (e o mundo hoje precisa tanto de santos!), uma santidade cultivada por todos, nos vários gêneros de vida e nas diferentes profissões, e vivida segundo os dons e as funções que cada um recebeu, enveredando sem hesitação pelo caminho da fé viva, que suscita a esperança e opera pela caridade (cf. Lumen Gentium LG 41).

6. A última – mas cordialíssima – saudação vai para os amados índios que vou encontrar dentro de um momento.

7. Envio desta Catedral, saudações cordiais também a toda a população desta hospitaleira cidade e de todo o Amazonas e territórios e estados vizinhos, pensando em particular nas Comunidades católicas das Dioceses e Prelazias desta parte norte do Brasil. E num pensamento afetuoso envolvo ainda os que sofrem, no corpo ou na alma. Cristo seja a sua esperança e a sua paz!

E que a paz de Deus desça sobre todos vós e sobre cada habitante desta cidade e sobre todos os que vivem e labutam nestas maravilhosas terras brasileiras.

Com a minha Bênção Apostólica.



VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE AO BRASIL

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

DURANTE O ENCONTRO COM OS ÍNDIOS DA AMAZÔNIA


Manaus, 10 de Julho de 1980



Meus amados filhos

A minha saudação primeiro de tudo para todos vocês, para aqueles que aqui representam. Vocês são uma presença muito grata para o Papa, nesta viagem que ele está realizando pelo Brasil, e agora pela querida Amazônia. Está realizando esta viagem especialmente para encontrar a vocês.

O que lhes vou dizer? Que lhes posso dizer? Começo por repetir o que talvez já tenham ouvido dizer aqui pelos seus amigos missionários: que a Igreja e o Papa vos estimam, estimam muito por aquilo que vocês são e por aquilo que vocês representam. Vocês representam pessoas humanas e “chamados a ser de Jesus Cristo” (Cf. Rm Rm 1,6), vocês representam também os filhos de Deus. A Igreja procura dedicar-se hoje a vocês como se dedicou desde a descoberta do Brasil a vossos antepassados. O bem-aventurado José de Anchieta, é neste sentido o pioneiro, de certo modo o modelo de gerações e gerações de missionários jesuítas, salesianos, franciscanos, dominicanos, missionários do Espírito Santo ou do Preciosíssimo Sangue, capuchinhos, beneditinos e tantos outros – totalmente devotados a vocês. Com meritória constância eles procuraram comunicar-lhes com o Evangelho toda ajuda possível em vista de sua promoção humana.

Confio aos Poderes Públicos e outros responsáveis os votos que, neste encontro com vocês, eu faço de todo coração em nome do Senhor: que a vocês, cujos antepassados foram os primeiros habitantes desta terra, tendo sobre ela um particular jus ao longo de gerações, seja reconhecido o direito de habitá-la na paz e na serenidade, sem o temor – verdadeiro pesadelo – de serem desalojados em benefício de outrem, mas seguros de um espaço vital que será base não somente para a sua sobrevivência, mas para a preservação de sua identidade como grupo humano, como verdadeiro povo e nação. A esta questão complexa e espinhosa almejo que se dê uma resposta ponderada, oportuna, inteligente, para o benefício de todos. Assim se respeitará e favorecerá a dignidade e a liberdade de cada um de vocês como pessoa humana e de todos vocês como um povo e uma nação.

Que Deus vos abençoe em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.



VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE AO BRASIL

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

NA CERIMÔNIA DE DESPEDIDA DO BRASIL


Manaus, 11 de Julho de 1980



Queridos Amigos Brasileiros,
Meus irmãos e irmãs no Senhor Jesus Cristo

1. Chegou, com muita pena para mim, o momento de dizer adeus.

Antes de deixar o solo brasileiro, quero exprimir a minha gratidão profunda a todos: a Sua Excelência o Senhor Presidente da República, ao Episcopado do Brasil, aos membros do Governo, ao Senhor Ministro aqui presente e às demais Autoridades e Responsáveis pelos destinos desta grande Nação.

Impossível citar, mesmo genericamente, todas as pessoas e grupos com quem tive contacto nestes dias abençoados e, por outro lado, não quisera esquecer ninguém. Chegue o meu agradecimento sentido a todo o Povo deste País e a cada um dos brasileiros: aos fiéis católicos e aos não católicos; a todos os homens e mulheres, nascidos ou radicados nesta terra, seja qual for a sua origem étnica, dos primitivos habitantes da “Terra de Santa Cruz”, os índios do Brasil, aos últimos estabelecidos nesta pátria hospitaleira; enfim, a todos aqueles a quem tive o prazer de ver e cumprimentar pessoalmente, bem como àqueles que nestes dias me acompanharam, graças à maravilha dos meios audiovisivos. A todos, muito obrigado! Desejaria que este muito obrigado chegasse particularmente a todos aqueles que participaram de maneira ativa na preparação e no desenrolar desta minha visita pastoral. E houve bem conta de quanto essa tarefa foi grande e de quanto este trabalho foi exigente. Não tenho outro modo para exprimir toda a minha gratidão senão mediante a lembrança nas minhas orações, pedindo que o próprio Deus recompense a todos e a cada um. A todos sem exceção. Quer aos representantes da Autoridade e da Administração quer às instituições da Igreja quer ainda a toda a comunidade da Nação brasileira.

2. Minha estadia no Brasil permitiu-me enriquecer meu conhecimento da língua portuguesa com algumas palavras e expressões. Aprendi, por exemplo, que “quem parte leva saudades”. Devo confessar que já estou sentindo o que significa este ditado. Mas, com a saudade do Brasil, levo também no coração uma imensa alegria e a mais grata satisfação, por tudo aquilo que me foi dado ver, comungar e viver convosco, nestes dias da minha permanência entre vós.

Permanência longa e breve; breve mas suficiente para uma intensa e marcante experiência humana e religiosa, que ficará como cimento de uma profunda amizade.

Deus seja louvado por tudo e por todos! E já que “toda a dádiva e todo o dom perfeito vem do alto”(Jc 1,17), quero adorar e “dar graças a Deus, a quem sirvo” (Cf. 2Tm 2Tm 1,3) pelas muitas alegrias e consolações que sua infinita bondade me quis proporcionar, ao longo desta viagem pastoral.

3. Levo nos olhos e no coração tantas imagens de vida e beleza, que me impressionaram neste dinâmico e promissor País, e as últimas e mais impressionantes serão as imagens portentosas destes rios e florestas do Amazonas. Contudo, mais ainda do que as imagens das inúmeras maravilhas, quer naturais quer criadas pelo homem, é a imagem deste homem brasileiro que levo comigo. Do homem concreto e histórico que é neste momento protagonista de uma hora importante para o País.

Quando no dia 22 de outubro de 1978 dei início solene ao meu ministério na Sé de São Pedro, dirigia-me a todos com uma calorosa exortação: abri as portas a Cristo; abri amplamente os corações a Cristo.

Escancarei as portas a Cristo, quando hoje, depois dos doze dias de meu peregrinar por terras brasileiras, chegou a hora de despedir-me de vós. O meu coração está cheio de gratidão exatamente porque vós abristes as portas Àquele que, como sucessor de São Pedro, veio de Roma para realizar no meio de vós o seu ministério ao serviço do Evangelho. Que Deus vos recompense a vós que haveis acolhido este meu ministério. O Evangelho é a palavra da verdade. É certo que esta palavra nos coloca diante de exigências. Recordai-vos que tais exigências são sempre ditadas pelo amor para com o homem e ditadas por motivo do bem do mesmo homem.

Todo o serviço, o ministério da Igreja tem sempre em vista contribuir para que a vida humana também aqui sobre a terra, se torne sempre mais digna do homem e é por isso que a palavra do Evangelho tem sempre como finalidade o bem de todas as sociedades e de todas as nações. Oh quanto eu desejaria que o meu serviço apostólico em terras brasileiras contribuísse para o bem de toda a vossa grande sociedade nacional, que a reforçasse e a tornasse sempre mais pátria comum de todos aqueles homens que habitam aqui por gerações sucessivas desde os inícios, e de todos aqueles outros que no correr dos tempos aqui encontraram as condições de vida, de existência.

Praza a Deus que nesta Pátria se constitua a grande comunidade na qual reine a fraternidade, o amor, a justiça e a paz. Esta foi também a finalidade do meu ministério exercido no meio de vós.

4. E agora posso confiar-vos um desejo? Que as vossas portas que se abriram para mim com amor e confiança, permaneçam largamente abertas para Cristo. Será minha alegria plena. Na força redentora da Cruz, na energia vivificadora da Eucaristia, e na indefectível proteção de Maria, Mãe da Igreja, a iniciativa da viagem que ora está prestes a terminar. Na Cruz, na Eucaristia e em Nossa Senhora se baseia a minha esperança de que a semente da Salvação que aqui procurei ançar, germine, cresça e dê frutos de amor, de fraternidade e de vida cristã.

Tenho plena confiança de que, pela evangelização autêntica e total, a Boa Nova do amor do Pai, manifestado no seu Filho Jesus, chamando os homens à vida eterna, pela contínua ação do Espírito Santo há de penetrar no coração das massas, pois a Salvação também é “fermento”, destinada a “levedar toda a massa” do querido Povo brasileiro.

Deixando o Brasil, após estas intensas jornadas de fé e de calor humano, e também de calor climático, vós brasileiros continuareis bem presentes na minha oração. Pedirei sempre a Deus que os grandes princípios cristãos, desde sempre arraigados em vós, e sobretudo o senso de Deus e a solidariedade humana, continuem a marcar a fidelidade do Brasil a si mesmo e à sua identidade histórica.

Muito obrigado a todos! Meus melhores votos de prosperidade! Deus lhes pague e abençoe o Brasil, sob a contínua proteção de Nossa Senhora Aparecida!

Eu disse que era a hora de dizer adeus. Mas não: digo-vos apenas Até logo! Até logo! Até logo!

Se Deus quiser.



VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE AO BRASIL

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

NA CHEGADA A ITÁLIA DEPOIS DA PEREGRINAÇÃO


APOSTÓLICA AO BRASIL


Aeroporto de Fiumicino, 12 de Julho de 1980



1. Obrigado, mil vezes obrigado, Senhor Presidente do Conselho de Ministros, pelas gentis expressões que me quis dirigir, em nome também do Senhor Presidente da República Italiana e do Governo; no momento em que de novo ponho pé no solo italiano, ao termo de uma viagem cheia de encontros, de colóquios e de inapagáveis comoções. Não é sem sentir profundo reconhecimento para com o Senhor que o meu pensamento regressa aos intensos dias passados entre as populações daquela terra imensa e estupendamente variada, que é o Brasil. Tenho ainda na vista os panoramas ilimitados, que se ofereciam ao olhar admirado durante as deslocações de uma localidade para a outra; mas bem mais tenho no coração o espectáculo comovedor das multidões imponentes de pessoas, da realidade humana, que se vinha encontrar com o humilde Sucessor de Pedro, para lhe trazer a própria saudação e o testemunho da sua fé.

Estive no meio dessa gente como missionário do amor de Cristo pelo homem. Com a minha visita quis manifestar a minha vontade de comunhão com os Irmãos no Episcopado e com os fiéis daquela nobre Igreja, com os seus esforços, as suas penas e as suas esperanças. Ao mesmo tempo quis exprimir às almas religiosas das outras Confissões e a todos os homens de boa vontade. o grande desejo que tema Igreja Católica de oferecer a sua colaboração, nó respeito e na recíproca estima, a todas as iniciativas dirigidas â promoção dos valores humanos fundamentais.

2. É-me agradável nesta altura dirigir um pensamento de gratidão ao Senhor Presidente da República Brasileira e às outras Autoridades políticas, civis e militares, que tantas atenções me reservaram nas várias etapas da minha peregrinação.

De delicadas atenções me cumularam também os Excelentíssimos Bispos, por cujas Igrejas passei, e também a eles desejo renovar aqui a expressão do meu reconhecimento. Nem posso deixar de dizer uma palavra sobre as provas de afectuosa dedicação recebidas de Sacerdotes, Religiosos e Religiosas, de Personalidades das Organizações católicas e, em geral, dos fiéis, com quem me foi possível tomar contacto; são recordações belíssimas, às, quais voltarei com ânimo grato no recolhimento da oração.

Os mais de 30.000 quilómetros percorridos nestes poucos dias; consentiram-me, apesar da limitação do tempo, formar para mim uma ideia bastante concreta da realidade humana e cristã daquele vastíssimo Pais, das graves dificuldades com que tem de medir-se, mas também dos extraordinários recursos de que, dispõe para construir o seu amanhã. Existe lá uma Igreja viva, rica de fermentos evangélicos autênticos, que a incitam no caminho para uma cada ver maior responsabilidade a respeito de Deus e a respeito do homem.

3. E agora que estou de regresso na minha Sede de Roma depois de um voo, que a perícia dos pilotos e a amabilidade do pessoal tornaram especialmente agradável — vá para cada um deles uma palavra especial de apreça e de reconhecimento —, tenho o prazer de ser acolhido pela vossa requintada cortesia. Ao renovar ao Senhor Presidente do Conselho de Ministros a expressão do meu reconhecimento, torno extensivo isto que sinto às Personalidades presentes, tanto civis como eclesiásticas, e a todos quantos desejaram trazer-me as suas boas-vindas. Apraz-me ver neste gesto delicado e espontâneo o testemunho de uma íntima participação nas finalidades desta minha viagem apostólica. Também eu dediquei um pensamento a vós, ilustres Senhores; nos momentos mais significativos da peregrinação: recordei-me em especial de vós aos pés. da Nossa Senhora Aparecida, entre a multidão do povo orante; e recordei-me também de vós onde a Igreja brasileira adorava, num coral cântico de louvor, o Cristo vivo no Santíssimo Sacramento da Eucaristia.

Espero que esta nova fadiga pastoral venha a produzir frutos consoladores para o bem das almas, para a mútua compreensão entre as pessoas e as classes sociais, para a cooperação internacional. Assim queira Deus, sem cujo auxilio de nada valem os esforços humanos. A Ele peço copiosos dons de cristã prosperidade também para todos vós, para as vossas famílias e para os habitantes desta dilecta Nação italiana, desta Cidade eterna e do mundo inteiro.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SECRETÁRIO DOS NEGÓCIOS


ESTRANGEIROS DA JUGOSLÁVIA


Domingo, 13 de Julho de 1980



Excelência

Dirijo cordiais boas-vindas a Vossa Excelência, à Senhora Vrhovec e às distintas personalidades que o acompanham. Tenho o gosto de me encontrar com tão eminente membro do Governo da Jugoslávia. Desde a visita do seu predecessor, Senhor Milos Minic, ao Papa Paulo VI, a República Socialista Federativa da Jugoslávia esteve representada nos ora tristes ora alegres acontecimentos do Vaticano desde Agosto e Outubro de 1978; e no princípio deste ano a Santa Sé manifestou da mesma maneira a sua simpatia para com os povos da Jugoslávia por ocasião da morte do Presidente Tito. Tudo isto tem sido confirmação do progresso das boas relações entre a Santa Sé e a Jugoslávia, e constituiu indicação para o futuro desenvolvimento das mesmas. Eu próprio terei o gosto de as promover, como fez o meu predecessor o Papa Paulo VI.

Os esforços do vosso país no campo das relações internacionais reflectiram-se positivamente neste processo. Tenho o prazer de reiterar os sentimentos expressos pelo Papa Paulo VI quando falou do apreço da Santa Sé pela actividade da Jugoslávia na´busca de melhor cooperação entre as nações, particularmente nas notícias relativas à paz, ao desarmamento e ao auxílio conveniente para o progresso dos povos. A Santa Sé atribui muita importância a estas questões, algumas das quais se tornaram agudíssimas no tempo presente por causa dos muitos obstáculos que parecem erguer-se no caminho do diálogo para a solução de sérios desentendimentos nas relações entre povos e no desenvolvimento de países enquanto dignos de respeito na sua independência e dignidade. Referi-me a tais problemas repetidamente, em especial diante da Assembleia Geral das Nações Unidas, nas direcções gerais da UNESCO, e ainda nas minhas viagens à minha Polónia natal e a muitos outros países do mundo, incluindo a viagem ao Brasil que agora mesmo terminei; insisti em que pudesse cada país atingir o desenvolvimento requerido pela sua dignidade, embora preservando a sua independência, as características próprias e as suas tradições, numa atmosfera de respeito pelos direitos e pelas liberdades de cada povo e cada uma das suas partes.

Outra razão para interesse no desenvolvimento construtivo das nossas relações vem dos efeitos que ele pode ter para a vida e actividade da Igreja na Jugoslávia. Como estais bem cientes, a Igreja Católica, embora não procurando privilégios, necessita de estar assegurada dos requisitos para o seu trabalho e o das suas instituições, tornando-se deste modo possível desenvolver as potencialidades encerradas nos recursos da fé cristã. Isto deve tornar possível aos católicos desempenhar, de maneira cada vez melhor, a parte própria que têm como cidadãos leais, sempre desejosos de contribuir pessoalmente para a prosperidade da sua pátria; isto será certamente para vantagem do bem-estar e do progresso de todos os seus concidadãos, de toda a Jugoslávia.

A boa vontade e o espírito de entendimento assegurarão o bom êxito destas esperanças, vencendo dificuldades de todo o género. Deus permita que a cooperação prossiga desenvolvendo-se, tanto dentro do vosso país mas também no extenso campo das relações internacionais, para o bem de todos.

A Jugoslávia e os seus povos são de profundo interesse para mim. Peço a Deus que os abençoe e acompanhe, favorecendo o progresso material e moral deles, e assegurando-lhes prosperidade e felicidade. Permita Vossa Excelência que a certifique dos meus sinceros bons votos para si e para os distintos governantes do seu país.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS JOVENS DA COMUNIDADE DE SANTO EGÍDIO


Castel Gandolfo, 20 de Julho de 1980



Tínhamo-nos já encontrado há um ano pela primeira vez. Éreis talvez então menos numerosos que hoje. Falastes-me de vós com canções, danças e testemunhos. Em seguida, encontrámo-nos noutras ocasiões diversas, sobretudo durante as minhas visitas às paróquias de Roma onde desempenhais a vossa missão, o vosso apostolado. Isto é, pude conhecer mais de perto a vossa actividade nas vizinhanças romanas e nas paróquias. Depois veio finalmente o encontro, chamemos-lhe central, em Santo Egídio. Tinha sido previsto para 9 de Março, dia muito significativo para a paróquia de Santa Maria no Trastevere, porque era a festa de Santa Francisca Romana, paroquiana do Trastevere. Mas não foi possível naquele dia por causa de uma ligeira indisposição minha. Assim, foi a visita adiada para o último domingo de Abril. E depois da visita à Basílica, pude fazer a experiência única de me encontrar convosco em Santo Egídio. Encontrei-me entre grupos de jovens trabalhadores, estudantes e entre anciãos, sacerdotes, até diversos Gerais de famílias religiosas, reitores e superiores de colégios romanos. Compreendi logo, que não é "homogénea" a comunidade de Santo Egídio mas "pluralista", isto é diversificada, e eu creio que isto é muito belo porque acolheis pessoas diversas: jovens e anciãos. E quero sublinhar sobretudo este belíssimo aspecto: a partilha da vossa vida juvenil com a dos anciãos. Vós tornai-los jovens e devo dizer que é experiência bem sucedida, porque os anciãos entre vós parecem mais jovens que os jovens. Seguindo-vos, procuro aprender a fórmula, o princípio da vossa comunidade, da vossa actividade e do vosso apostolado. Depois dos nossos repetidos encontros, posso dizer-vos hoje que o encontrei e posso começar a exprimi-lo um pouco melhor do que há um ano e há alguns meses.

Vós tendes a consciência de que o homem — jovem, maduro, adulto ou ancião, o homem como a mulher — sofre por diversos motivos. Motivos externos, como a situação social, política e as ameaças que pesam sobre o mundo. Mas sofre também interiormente, no seu íntimo, por uma espécie de resignação, pela falta de um sentido da vida. Vós encontrastes o caminho, caminho muito simples e puramente evangélico, para vencer esta resignação diante da falta de um ponto de referência central para a vida humana: compreendestes que é necessário procurar outro homem, que é necessário procurar uma comunidade que dê a esperança e a solidariedade. Esperança e solidariedade: são duas palavras que principiam pela letra "s" (em italiano) e parecem bastante significativas para a vossa espiritualidade, para a vossa vida sem mais, e também para os vossos cânticos. Eu segui-os atentamente, os vossos cânticos desta noite; as palavras que neles se repetem com maior frequência são precisamente estas duas: esperança e solidariedade. Isto corresponde ao desígnio divino: o homem é criado para se encontrar a si mesmo através da comunhão, da solidariedade. Esperança e solidariedade, se queremos, são duas palavras muito simples; o homem é chamado a encontrar-se a si mesmo por meio de uma comunhão com os outros. Encontrastes esta fórmula, que é a mais antiga; encontramo-la já no livro do Génesis, nos primeiros capítulos que tratei por tantas semanas. Sobre esta fórmula vós formastes a vossa experiência de vida, vivida por diversas pessoas, em diversos ambientes aqui em Roma e fora de Roma. E procurastes outros caminhos mesmo fora da Itália, porque a vossa experiência se revelou interessante mesmo para os outros, as outras Igrejas, para os Bispos e os sacerdotes, e também para os leigos.

Trata-se de uma fórmula muito simples, muito evangélica e muito humana. Passado um ano de encontros convosco, em diversas circunstancias, e mesmo depois de ter visto esta filmagem sobre as vossas experiências concretas, compreendi que esta é a fórmula, o principio e o fundamento da vossa comunidade.

E é fórmula muito eficaz e muito profunda, exactamente porque é evangélica, simples e humana.

Vós encontrais-vos certamente capazes de quebrar o isolamento, a autodestruição de tantos jovens e tantos anciãos. Entre os jovens esta autodestruição manifesta-se também com a droga. Vós sois capazes, fostes capazes de vencer esta autodestruição, porque descobristes a solidariedade com outro homem e com ele procurastes a solidariedade, ou antes, a união com o Senhor, com a Palavra de Deus, com Deus sem mais. Vós viveis a comunhão humana na mesma dimensão levada por Cristo, que nos deu a grandíssima possibilidade de viver a vida humana, pessoal e comunitária, na dimensão da comunhão com Deus: E esta é a proposta evangélica. E quando desta proposta se faz fórmula de vida, venceu-se cada um para si e para os outros. Assim se torna a pessoa, cristã verdadeira, consciente do porquê do próprio ser cristão, e se torna também apóstola porque uma coisa deriva da outra. Como Bispo de Roma devo dizer que, depois de um ano de encontros convosco e com a vossa experiência, estou muito contente de ter-vos em Roma, porque julgo que o vosso movimento, a vossa experiência e a vossa realidade, tudo o que se encontra sob o titulo de "Comunidade de Santo Egídio", constitui certo fermento evangélico, o fermento que deve fazer crescer a massa desta realidade que se chama Igreja de Roma, ou Roma simplesmente.

O meu augúrio é que vós sejais sempre aquele fermento, e que sejais sempre mais e mais aquele fermento evangélico para a Igreja de Roma e para Roma como tal.

Recentemente no Rio de Janeiro, onde estive como hóspede há cerca de duas semanas, no Brasil, fraternalmente acolhido pelo Cardeal-Arcebispo Eugênio Araújo Sales, encontrei-me num ambiente semelhante talvez a algum existente também em Roma, mas em certos aspectos tipicamente brasileiro. Visitei as chamadas favelas, em particular a do Vidigal. Falei aos habitantes das favelas dirigindo-lhes um discurso sobre este tema das bem-aventuranças: "Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus". Eu creio que a vossa experiência, o vosso método, este caminho ou movimento que se chama Comunidade de Santo Egídio, poderia mudar também a vida destes favelados, que são os habitantes das favelas, isto é, dos ambientes mais pobres e marginalizados das grandes cidades brasileiras. Talvez em Roma não haja favelas no sentido brasileiro; há outras em sentido mais romano, mais italiano e mais europeu. Mas certamente em toda a parte, assim na Itália, em Roma, como no Rio de Janeiro e no Brasil todo, sempre se pode mudar a vida com aquela fórmula que é própria do vosso movimento. Fórmula que, provindo do Evangelho, da Palavra de Deus, tem a força de renovar a pessoa humana, o ambiente humano. A Comunidade que daí nasce torna nova a vida dos homens. Seja esta a síntese da noite vivida convosco e seja a resposta a tudo aquilo que aprendi de vós durante este ano como vosso Bispo. Por isto estou muito reconhecido a todos vós e a toda a Comunidade de Santo Egídio.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DA NOVA CÚRIA GERAL


DA CONGREGAÇÃO DA MISSÃO OU LAZARISTAS


Castel Gandolfo, 27 de Julho de 1980



Filhos dilectíssimos

Tenho o prazer de me encontrar hoje convosco, que formais a nova Cúria Geral da Congregação da Missão ou Lazaristas, como foi eleita pela XXXVI Assembleia Geral do mesmo Instituto religioso.

Por isso, apraz-me saudar em vós o novo Superior-Geral na pessoa do Padre Richard McCullen, actual sucessor de São Vicente, e, com ele, o Vigário-Geral, Padre Miguel Pérez-Flores, e os três Assistentes-Gerais.

Ao mesmo tempo que expresso a minha estima por vós e a minha satisfação por terdes sido eleitos para cargos tão importantes, não posso deixar de apresentar-vos os meus paternais bons-votos por um cuidadoso e profícuo desempenho das missões para que fostes escolhidos. A vida religiosa hoje, como sempre, antes agora mais que nunca, é chamada a dar luminoso testemunho evangélico à Igreja e ao mundo, mediante um incondicionado e total seguimento de Cristo. Este deve, além disso, configurar-se e ser vivido de tal modo que os homens possam frutuosamente verificar quão dinâmica, e dirigida para o bem de todos, é uma autêntica consagração ao Senhor. Oxalá saibais também unir harmonicamente em vós a necessária acção e a insubstituível contemplação, e sobretudo possais transfundir eficazmente a síntese de ambas em todos os membros da vossa Congregação.

Sei que os campos de apostolado a vós próprios são múltiplos: as missões, primeiramente, na mais vasta acepção do termo, conforme a entendia o vosso grande Vicente de Paulo; depois a direcção e o ensino nos Seminários; a direcção das Irmãs e das Damas da Caridade; e retiros espirituais ao Clero e ao Laicado. Trata-se de actividades muito significativas, que abrangem sectores diversos e importantes da vida da igreja e requerem todo o esforço inteligente e zeloso dos Lazaristas, no nome grande e urgente da Caridade de Cristo. E vós, dos vossos novos postos de responsabilidade, sabereis certamente imprimir a toda a vossa ilustre Família religiosa aqueles impulsos, que dela pedem os tempos e as condições tanto da Igreja corno do mundo em que hoje vivemos.

Tende a certeza que eu me recordarei de vós na oração, para que não falte a inspiradora e corroborante graça divina às vossas decisões e ao vosso delicado ministério.

Destes favores celestiais, que desejo sejam abundantes, é penhor a minha Bênção Apostólica, que de todo o coração vos concedo e torno extensiva a todos os vossos beneméritos Irmãos distribuídos pelo mundo, como prova do meu afecto e do meu incentivo.

Discursos João Paulo II 1980 - Fortaleza, 10 de Julho de 1980