Discursos João Paulo II 1981 - BÉLGICA E PORTUGAL

Quinta-feira, 22 de Janeiro de 1980



Caros amigos

Ao receber-vos esta manhã com particular alegria, não posso deixar de pensar nas multidões que chegam, ao longo do ano, aos santuários cuja guarda e animação estão a vosso cargo. É por isto que dou a este breve encontro uma importância que se une à satisfação de um contacto pessoal convosco. Permiti-me que saúde especialmente o vosso guia, o Bispo de Laval, tão dedicado ao esplendor do Santuário de Nossa Senhora de Pontmain.

Os vossos estudos pessoais e os vossos congressos de Reitores revelaram-vos que as peregrinações são uma constante da história das religiões. O cristianismo restabeleceu também este costume profundamente radicado na mentalidade popular e que responde a uma necessidade de chegar a um espaço religioso onde o divino se manifestou. Haveria sem dúvida uma história bastante interessante para escrever sobre as peregrinações cristãs, desde as primeiríssimas, que tiveram por meta Jerusalém e os lugares santos, até às da nossa época, que se fazem a Roma, a Assis, a Lourdes, a Fátima, a Guadalupe, a Czestochowa, a Knock, a Lisieux, a Compostela, a Altötting e a muitos outros lugares.

Reitores dos santuários da França, como os vossos irmãos de outras nações, sois os herdeiros e os administradores de um património religioso considerável, cujo impacto na vida do povo cristão e daqueles que se mantêm fora das fronteiras da parece actualmente em plena ascensão. Vós tendes viva consciência disto. Podeis, certamente, fazê-la partilhar por muitos outros. Nestes poucos momentos, quereria apenas confirmar as vossas convicções sobre alguns pontos essenciais do vosso ministério particular.

Sempre e em toda a parte, os santuários cristãos foram ou quiseram ser sinais visíveis de Deus, da sua entrada na história humana. Cada um deles é um memorial do Mistério da Encarnação e da Redenção.

Não é o vosso poeta Péguy que dizia, no seu estilo original, que a Encarnação é a única história interessante que jamais existiu? É a história do amor de Deus por todo o homem e pela humanidade inteira (cf. Redemptor hominis RH 13). E, se numerosos santuários romanos, góticos ou modernos, foram dedicados a Nossa Senhora, é porque a humilde Virgem de Nazaré concebeu, por obra do Espírito Santo, o próprio Filho de Deus, Salvador do universo, e o seu papel é sempre o de apresentar às gerações que se sucedem o Cristo "rico em misericórdia". No nosso tempo, que, em graus diversos, conhece a tentação da secularização, é necessário que os altos lugares espirituais, construídos no curso das épocas e não raro por iniciativa dos santos, continuem a falar ao espírito e ao coração dos homens, crentes ou não crentes, que sentem, todos eles, a asfixia de uma sociedade fechada sobre si mesma e algumas vezes desesperada. Não é para desejar ardentemente que os santuários mais frequentados se tornem ou voltem a tornar-se outras tantas casas de família onde todos que ali passam ou permanecem encontrem o sentido da própria existência, o gosto pela vida, porque terão feito uma certa experiência, da presença e do amor de Deus? A vocação tradicional e sempre actual de todos os santuários consiste em serem como uma antena permanente da Boa Nova da Salvação.

Uma condição do esplendor evangélico dos santuários é que eles sejam muito acolhedores. E antes de tudo muito acolhedores em si mesmos. Qualquer que sejam a sua época ou o seu estilo, a sua riqueza artística ou a sua simplicidade, cada um deles deve afirmar a sua personalidade original evitando também a acumulação excêntrica dos objectos religiosos que lhes causa afastamento sistemático. Os santuários são feitos para Deus, mas também para o povo, que tem direito ao respeito da sua sensibilidade própria, embora o seu bom gosto necessite de ser pacientemente educado. A ordem perfeita e a autêntica beleza da basílica mais célebre ou de uma capela mais modesta são já uma catequese, que contribui para abrir o espírito e o coração dos peregrinos ou, infelizmente, para os arrefecer. Mas se as pedras e os objectos têm a sua linguagem e a sua parte de influência sobre os seres, que havemos de dizer das equipes pastorais dedicadas à animação dos santuários? O vosso serviço, meus amigos, pode ser determinante, contando com o mistério da graça de Deus. Quer se trate de receber os grupos anunciados e organizados ou visitantes anónimos e isolados — vindos para pedir instantemente uma graça, ou agradecê-la — quer se trate de ajudar à boa sequência das peregrinações preparadas pelos vossos irmãos de hábito e os seus auxiliares, ou de assegurar os exercícios do culto próprios do santuário de que tendes a responsabilidade de vigiar pelo recolhimento dos lugares ou de explicar a história dos mesmos aos visitantes, de propor um momento de oração ou de aceitar o diálogo pedido por alguns peregrinos, cada membro da equipe deve demonstrar amabilidade e paciência, competência e perspicácia, zelo e discrição, e sobretudo deixar transparecer humildemente a sua fé, ser testemunha do invisível. O vosso ministério de eleição é muito exigente. Depende disto, de qualquer modo, a abertura das almas de Deus, a conversão delas, e, para aqueles que andam apenas à procura, o seu primeiro passo para a luz e o amor do Senhor.

Todos estes esforços de acolhimento e de tomar a seu cargo crianças, estudantes, pessoas da terceira idade, doentes e deficientes, categorias sócio-profissionais muito diversas, cristãos fervorosos e cristãos em dificuldade, devem convergir para um objectivo único: evangelizar! O meu grande e caro predecessor Paulo VI teve o cuidado, na Exortação apostólica Evangelii nuntiandi, de recordar clara e simplesmente o conteúdo essencial dos elementos secundários da evangelização (cf. nn. 25 a 39). Continue cada santuário a basear nisto as suas orientações! Uma pastoral cristocêntrica! Oh, sim, ajudai os cristãos a chegarem verdadeiramente a Cristo, a unirem-se a Ele, a compreenderem "as relações concretas e permanentes que existem entre o Evangelho e a vida, pessoal e social, dos homens" (Evangelii nuntiandi EN 29). Ajudai os maus crentes a voltarem para Aquele que se apresentou como "o Caminho, a, Verdade e a Vida" (Jn 14,6). Ajudai peregrinos a inserirem-se melhor na Tradição viva da Igreja, sempre feita de fidelidade à Fé e de adaptação pastoral, desde o tempo dos Actos dos Apóstolos até ao Concílio Vaticano II. Vede também se não será possível organizar, pelo menos de tempos a tempos, conferências espirituais e doutrinais judiciosamente adequadas aos diferentes auditórios de peregrinos. Muitos dos ensinamentos importantes do Magistério são praticamente ignorados ou percebidos confusamente.

Acima de tudo, que toda a vida, dos santuários favoreça o melhor possível a oração individual e comunitária, a alegria e o recolhimento, a audição e a meditação da Palavra de Deus, a celebração verdadeiramente digna da Eucaristia e a recepção pessoal do sacramento da Reconciliação, a fraternidade entre pessoas que se encontram pela primeira vez, a preocupação de ajudar com as ofertas delas as regiões pobres e as Igrejas pobres, a participação na vida das paróquias e das dioceses.

A Virgem Maria, em honra da qual os vossos santuários são dedicados, faça frutificar o vosso importante trabalho pastoral, e ajude todos os peregrinos a aderirem cada vez mais à vontade do Senhor! E eu próprio, na recordação muito cara das numerosas peregrinações que me foi dada, fazer ou acompanhar, dou-vos a minha afectuosa Bênção.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À JUNTA MUNICIPAL DE ROMA


Segunda-feira, 19 de Janeiro de 1981



1. Para Si, Senhor Presidente da Câmara, para a Junta Municipal e para os outros Membros do Conselho da Câmara aqui presentes, a minha deferente saudação e a expressão do mais vivo agradecimento por esta visita que, além dos costumes protocolares, tem para mim um significado e um valor muito particulares. De facto, saúdo nas vossas pessoas os representantes desta alma Cidade de Roma, que a Providência quis confiar aos meus cuidados pastorais, comprometendo-me com isso a reservar-lhe, a ela e aos seus problemas humanos e espirituais, um lugar peculiar no meu coração.

Os numerosos encontros com os cidadãos e com grupos específicos, e as dezenas de visitas pastorais às várias paróquias da diocese, que pude realizar desde o início do meu ministério nesta Sé, consentiram-me adquirir um conhecimento cada vez mais profundo da realidade humana da Cidade e da sua periferia, de modo que agora posso medir em todo o seu alcance as preocupações, as ansiedades e as esperanças de que Vossa Ex.cia, Senhor Presidente da Câmara, se fez intérprete no discurso que acabou de pronunciar.

Nesta circunstância é-me grato confirmar a plena disponibilidade da Autoridade eclesiástica em dar o próprio contributo, no limite das suas competências e das suas possibilidades, para a pronta e adequada solução dos problemas, que afligem a Cidade.

Ao mesmo tempo é-me grato exprimir a confiança de que possa ser dada, da parte da Administração cívica, uma atenção sempre vigilante aos aspectos complexos e graves de uma assistência religiosa, que deve fazer frente exigências de uma população em continua expansão. O ser humano vive contemporaneamente na esfera dos valores materiais e na dos valores espirituais. Entre estes últimos, a dimensão religiosa ocupa um lugar de importância não secundária. Empenhar-se pelo crescimento integral e harmonioso do homem significa esforçar-se para que seja oferecida à instância religiosa, que emerge do íntimo do seu ânimo, uma possibilidade adequada para se exprimir, maturar e testemunhar na vida.

2. Como não reconhecer, afinal, o auxilio fundamental que a dimensão religiosa, autenticamente vivida, dá à salutar formação moral do indivíduo e à sua capacidade de manter-se imune em relação aos fermentos de corrupção, insidiosamente serpejantes no ambiente? As manifestações criminosas da violência terrorista (cujos episódios mais recentes e impressionantes são o bárbaro assassínio do General Enrico Galvaligi e o iníquo sequestro do Magistrado Giovanni D'Urso), a difusão crescente do recurso à droga, a condescendência ao permissivismo moral nas suas várias formas são, entre outros, fenómenos que esta nossa Cidade, devido à sua condição de grande metrópole e ao seu papel de Capital da Nação, teve de sofrer particularmente nestes últimos tempos. Nenhuma pessoa sensata pode deixar de se sentir intimamente abalada e perturbada perante estes preocupantes sintomas de crise profunda, que põe em dúvida os próprios fundamentos da convivência civil. A constatação dos males hodiernos torna espontâneo o confronto com os valores morais, que fizeram grande a Roma antiga, e que Salústio sintetizava com as conhecidas palavras: "Domi industria forus iustum imperium, animus in consulendo liber, neque delicto peque libidini obnoxius" (Cat 52, 21).

São estes os valores que, não obstante as óbvias adaptações devidas mudadas situações, é necessário consolidar ou recuperar, para tornar a dar serenidade aos cidadãos, dignidade e vigor às instituições públicas e prosperidade à vida económica. Pois bem, neste empenho comum para a retomada moral, que se torna cada dia mais urgente, a Religião cristã, que é a da enorme maioria dos romanos — pela nobreza dos ideais que propõe, pela força arrebatadora dos exemplos a que reenvia, pelas energias espirituais e morais que pode suscitar nos ânimos bem dispostos — revela-se portadora de fermentos positivos extraordinariamente estimulantes.

Os testemunhos que a história oferece são, a este respeito, muito eloquentes e confirmam a apreciação pronunciada pelo grande Agostinho num momento de enorme crise política e social. Dirigindo-se à "progénie dos Regoli, dos Scevola, dos Scipioni, dos Fabrizi", ele não hesitava em afirmar: "Se alguma coisa que merece ser. louvada sobressai em ti por disposição natural, com a verdadeira religiosidade vem a ser nobilitada e levada à perfeição, ao passo que com a irreligiosidade vem a perder-se e a ser depreciada" (De Civitate Dei, 11, 29, 1).

3. Nesta perspectiva tenho o prazer de receber as Boas Festas que Vossa Ex.cia, Senhor Presidente da Câmara, em nome também dos seus valorosos Colaboradores, quis manifestar-me na alvorada deste novo Ano, que está à nossa frente com o tesouro das suas promessas quase intacto. Retribuo-Lhas com gratidão, acompanhando-as com votos de bom trabalho ao serviço da Comunidade civil, cujo bem-estar requer a obra de Administradores que se distingam pela agudeza de análises no individuar os problemas reais, e pela previdente prudência no propor as suas soluções concretas.

Os meus bons votos são extensivos, também, a todos os Cidadãos, sobre os quais invoco a abundância das bênçãos celestes para um Ano fecundo de alegrias serenas e de metas positivas. Apraz-me confiar estes votos à intercessão de Maria Santíssima, "Salus populi romani", que tantas vezes, no decurso dos séculos, testemunhou o seu desvelo materno para com esta Cidade. E confio-os ainda à intercessão dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, cujo sangue banhou esta nossa Roma, extraindo daí aquela germinação de fé cristã, que nunca acontecimento algum, mesmo adverso, pode em seguida extinguir.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À FEDERAÇÃO ITALIANA DAS ESCOLAS MATERNAS


Sábado, 17 de Janeiro de 1981



Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. Sinto-me verdadeiramente contente por este encontro, que me dá a feliz possibilidade de saudar cordialmente os representantes da "Federação Italiana das Escolas Maternas" reunidos nestes dias em Roma para o III Congresso Nacional.

Dou as minhas cordiais boas-vindas a vós e, por vosso intermédio, às vinte e cinco mil Religiosas, que na Itália se dedicam com empenho a uma tão importante missão, e aos pais, que manifestaram a sua confiança no valor e na seriedade do vosso assíduo trabalho e vos confiaram os seus filhos, a fim de que sejam educados e formados durante aquele período tão delicado como é o que vai dos três aos seis anos.

As breves palavras, que vos dirijo nesta audiência, querem ser de aplauso, gratidão, encorajamento e bons votos por que neste sector, tão relevante do ponto de vista religioso e social, possais realizar com plena serenidade aquele trabalho humilde, discreto, escondido sim, mas tão precioso e meritório para a Igreja, a Família e a Sociedade, e que responde ao desejo de Jesus: "Deixai vir a Mim as criancinhas" (cf. Lc Lc 18,16).

2. Desejo hoje manifestar à vossa Federação, a vós que a representais, a todas as Religiosas, às Educadoras e a todos os que desempenham a sua actividade no sector da Escola Materna, o meu aplauso e o da Sé Apostólica pela vossa eficaz presença tão difundida e capilar no âmbito do território nacional: trata-se, na verdade, de bem dez mil Escolas Maternas de inspiração cristã, com mais ou menos um milhão de crianças, que as frequentam, e portanto é também um milhão de famílias, que se sentem integradas, solicitadas e co-interessadas na complexa e quotidiana acção educadora ao serviço da criança, que deve ser o autêntico centro de todo o afecto, da atenção, dos interesses e dos projectos; a criança, que começa a dar os primeiros incertos e acautelados passos na fascinante aventura da vida; que exprime de maneira original a própria identidade e personalidade; que se apresenta necessitada de amor e protecção; que se abre à beleza da natureza; que se põe e faz tantas perguntas sobre o mundo e as pessoas que a circundam; que sente profundamente o sentido religioso e é capaz, com extraordinária espontaneidade, de dialogar intensamente com o Pai celeste.

Não diremos jamais suficientemente o nosso sincero "obrigado" a todos os que dedicaram o melhor das suas energias e do seu tempo, toda a sua vida a este apostolado autenticamente evangélico em favor dos pequeninos, que são o sinal concreto do fecundo amor das famílias, a esperança mais bela das Nações, o apelo constante para a bondade, a inocência e a limpidez, que deveriam animar as relações entre os homens.

3. Quando a Igreja, especialmente mediante a obra das Congregações e dos Institutos religiosos, se dedica à difusão das Escolas Maternas, elaborando um projecto educativo global, inspirado nos valores cristãos, ela trabalha de facto para a promoção do homem todo e de todos os homens. Ela entende colaborar activamente com as famílias na educação, na formação e, em particular, na iniciação dos pequeninos na fé. A Escola de inspiração cristã é escolhida e preferida pelos pais precisamente para a formação e para o ensino religioso integrado na educação dos alunos. Também as Escolas Maternas, como todas as Escolas católicas, têm portanto o grave dever de propor uma formação religiosa que se adapte às situações dos alunos, muitas vezes bastante diversas. A formação é uma tarefa fundamental, que exige grande amor e profundo respeito para com as crianças, que têm direito a uma apresentação simples e verdadeira da fé cristã, como reafirmei na Exortação Apostólica sobra a catequese no nosso tempo (cfr. Catechesi Tradendae CTR 36 Catechesi Tradendae, nn. 36 e 69),

Será por isso necessário um contínuo contacto e diálogo com os pais, para juntos examinar, analisar e confrontar métodos e atitudes educativas, com o fim de evitar eventuais divergências, talvez aparentemente sem importância, que poderiam contudo influir negativamente nos aspectos da maturação da personalidade humana e cristã da criança.

4. Deste modo a Escola Materna pode e deve tornar-se lugar privilegiado de encontro, especialmente com os jovens casais, seja para o seu próprio crescimento na fé, seja para a correcta e completa educação dos filhos.

Nesta perspectiva a Escola Materna de inspiração cristã representa um sector de específica e empenhada acção para as Religiosas, como também para os Sacerdotes e Leigos.

Às Religiosas desejo renovar o grato reconhecimento da Igreja por tudo o que realizam com espírito de maternal dedicação neste campo, e recomendar além disso que não se deixem desanimar por dificuldades reais, que poderiam levá-las a abandonar este sector por outros tipos de actividades apostólicas; mas continuem, com renovado vigor, neste trabalho, dedicando-lhe meios adequados e pessoal especificamente preparado, mesmo que isto nossa comportar não pequenos sacrifícios.

Aos Sacerdotes, especialmente Párocos, que junto da sua igreja construíram com tantos sacrifícios uma Escola Materna, desejo dirigir a minha palavra de apreço, unida ao encorajamento por esta sua opção pastoral, que é autenticamente eclesial.

Aos Educadores e às Educadoras pertencentes ao laicato, os quais, pela sua específica preparação, desejam contribuir para a educação e a formação das crianças, quero indicar-lhes também a possibilidade de escolherem a Escola Materna como campo de evangelização e promoção humana.

A todos estes recordo as consoladoras e exigentes palavras da declaração conciliar sobre a educação cristã: "É bela, portanto, e ao mesmo tempo de grande responsabilidade a vocação de todos aqueles que recebem o encargo de educar nas escolas, ajudando os pais a cumprir o seu dever e fazendo as vezes da comunidade humana; esta vocação exige especiais dotes de alma e coração, uma preparação muito cuidadosa e uma disponibilidade permanente de adaptação e renovação" (Gravissimum Educationis GE 5).

Faço votos, portanto, por que todos os fiéis considerem as suas Escolas Maternas como Escolas da comunidade cristã, as quais devem ser então encorajadas e ajudadas; e desejo também que as Sociedades civis reconheçam o valor social das Escolas Maternas de inspiração cristã, assegurando-lhes o necessário apoio, mediante adequados contributos, a fim de garantir a efectiva liberdade de escolha dos pais no campo da escola.

Com estes votos, invoco sobre as vossas pessoas e sobre todos aqueles que trabalham pelas Escolas Maternas a abundância dos dons do Senhor e concedo de coração a minha Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR JOSEPH QUAO CLELAND


NOVO EMBAIXADOR DO GANA


JUNTO DA SANTA SÉ


POR OCASIÃO DA APRESENTAÇÃO


DAS CARTAS CREDENCIAIS


Sábado, 17 de Janeiro de 1981



Senhor Embaixador

É com prazer que aceito as Cartas credenciais que o acreditam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário do Gana junto da Santa Sé. Aprecio sinceramente os bons votos que me trouxe de Sua Excelência o Dr. Hilla Limann e peço-lhe queira assegurar-lhe os meus cordiais sentimentos de respeito.

Com o nosso encontro de hoje recordo vivamente as calorosas boas-vindas que me foram dadas pelo Presidente, pelos funcionários do Governo e pelo povo do Gana, durante a minha visita pastoral ao seu país, no ano passado. A alegre atmosfera de solenidade que distinguiu aquele momento ficou gravada em mim como um reflexo do profundo sentido de hospitalidade que é característica do seu povo.

A minha visita, como sabe, permitiu-me participar directamente na celebração do centenário da implantação da católica no Gana. Desde 1880 as sementes da criaram raízes fé e continuaram a crescer em direcções que beneficiaram não só a Igreja universal, mas também a inteira nação do Gana. Por esta razão aprecio a referência, que fez na sua saudação, ao contributo do espírito evangélico da Igreja no desenvolvimento do seu pais, e quero assegurar-lhe que a Igreja deseja colaborar plenamente com as autoridades civis na promoção da dignidade e do bem-estar de todos os povos.

O nosso encontro realiza-se no princípio de um Novo Ano, ao darmos outro passo que nos aproxima do início do terceiro milénio. Que oportunidade única é oferecida a cada povo, nação e continente, nesta geração actual! Como eu disse na minha Encíclica Dives in Misericordia, as possibilidades de conquistas técnicas, de intercâmbio intelectual e cultural, de grande progresso nas ciências sociais, são múltiplas e desafiadoras. Até mesmo na oportunidade de conseguir tais benefícios, também existem tensões e ameaças a sufocar aquele progresso e mesmo a pôr em risco a própria existência humana. E estes perigos não são limitados às forças externas de armas e armamentos, mas incluem igualmente a mentalidade materialista que aceita um "primado das coisas sobre a pessoa" (n. 11).

O seu povo, Senhor Embaixador, possui uma notável história pelo testemunho dado do valor da pessoa humana.

Ao aproximarmo-nos do ano dois mil, não poderemos perguntar se na Providência de Deus este respeito pela pessoa humana, tão partilhado na vida do seu povo, será o benefício mais duradouro que a comunidade mundial receberá de cada nação ou continente? Repito a convicção que exprimi o ano passado em Acra: "A Africa é chamada a fazer que surjam ideais novos e intuições novas num mundo que manifesta os sinais do cansaço e do egoísmo. Estou convencido que vós, africanos, podeis realizar isto".

Peço a Deus Todo-Poderoso que abençoe a sua missão junto da Santa Sé com felicidade e bom êxito. Faço extensivos os meus cordiais bons votos ao seu amado país e peço por que o seu povo viva em plena serenidade, progredindo na causa da justiça, da paz e da fraternidade no mundo.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À DELEGAÇÃO DO SINDICATO INDEPENDENTE


AUTÓNOMO POLACO "SOLIDARNOSC"


PRESIDIDO POR LECH WALESA


Sala do Consistório

Quinta-feira, 15 de Janeiro de 1981



Louvado seja Jesus Cristo!

1. Exprimo contentamento pela hodierna visita dos representantes de "Solidarnosc" — os sindicatos independentes e autónomos — e saúdo muito cordialmente o Senhor Lech Walesa e todos os que vieram com ele. Estou contente porque neste encontro participam também o Chefe da Delegação da República Popular da Polónia para os contactos permanentes de trabalho com a Sé Apostólica, e os seus Colaboradores.

Saúdo-vos com particular cordialidade neste lugar em que, devido ao meu ministério na Sé de São Pedro, me é dado encontrar-me com os homens de diversas nações, línguas, raças e continentes — com os homens: com os meus irmãos.Nesta fraternidade humana e universal — que a Igreja proclama em nome de Jesus Cristo e no contexto de toda a mensagem evangélica — a fraternidade que une filhos e filhas de uma mesma nação tem o seu singular lugar e particular direito, porque tem também um lugar e um direito particulares no coração do homem.

Saúdo-vos portanto como meus Compatriotas, aos quais estou ligado com o vínculo da língua, da cultura, da comum história e da experiência comum no âmbito das quais nasceu e se formou, ao longo de inteiros séculos, a solidariedade de todos os Polacos — que se verificou sobretudo nos momentos difíceis e críticos da história da nossa Pátria.

2. Alegro-me porque os acontecimentos do Outono passado, a começar das memoráveis semanas de Agosto, deram ocasião a que se manifestasse a mesma solidariedade, que chamou sobre si a atenção de vastas camadas da opinião pública do mundo inteiro. Todos salientaram a particular maturidade que a sociedade da Polónia — e de modo especial os homens do trabalho — manifestaram ao enfrentar e resolver os difíceis problemas, que se lhes apresentaram num momento crítico para o País. No quadro de fundo dos acontecimentos que não faltam no mundo de hoje — e nos quais tão frequentemente o método de acção se torna violência e prepotência, fundamentado no terror activo em diversos países, que não poupa a vida de homens inocentes — exactamente tal modo de agir, isento da violência e da prepotência, que procura as soluções baseando-se no diálogo recíproco e nas motivações fundamentais, e que tem presente o bem comum, dignifica tanto os representantes do mundo do trabalho do Litoral, da Silésia e das outras regiões do País — aqueles que actualmente se associaram em "Solidarnosc" — como também os representantes das autoridades estatais da Polónia.

Desejo assegurar-Vos — embora suponha que já o sabeis — que ao longo deste difícil período eu estive de modo particular convosco — sobretudo mediante a oração, mas também manifestando-o de vez em quando de maneira um tanto discreta e ao mesmo tempo suficientemente compreensível para Vós e para todos os homens de boa vontade.

3. Acolhi com alegria a notícia de que, mediante a aprovação do estatuto do Sindicato livre "Solidarnosc", a 10 de Novembro de 1980, o Sindicato se tornou a organização autorizada para realizar o que lhe diz respeito no território da nossa Pátria. A criação do Sindicato livre é acontecimento de grande importância. Manifesta a pronta disponibilidade de todos os homens do trabalho na Polónia — os quais exercem diversas profissões compreendidas as de "conceito", como também os agricultores — para assumirem uma responsabilidade solidária para a dignidade e a produtividade do trabalho efectuado na nossa terra natal, junto de tantos e tão diversos campos de actividade. Ela indica, além disso, que não existe — porque não deve existir — a contradição entre uma tal autónoma iniciativa social dos homens do trabalho e a estrutura do sistema que exalta o trabalho humano como valor fundamental da vida social e estatal.

O trabalho é o ónus do homem. É a actividade consciente e pessoal do homem — é o seu contributo para a grande tarefa das gerações, a da manutenção e do progresso da humanidade, das nações e das famílias. É evidente que os homens, que realizam um determinado trabalho, têm direito de se associar com liberdade precisamente em razão deste trabalho, com a finalidade de assegurar todos os bens para os quais o trabalho deve servir. Trata-se aqui de um dos fundamentais direitos da pessoa, do direito do homem como sujeito próprio do trabalho que, "dominando a terra" (para usar as palavras bíblicas) exactamente mediante o trabalho — quer contemporaneamente que, no âmbito do trabalho e em relação com o trabalho, a vida humana nesta terra "se torne verdadeiramente humana" e seja "sempre mais humana" (como lemos entre outras coisas nos textos do último Concílio).

4. Os sindicatos têm uma história já bastante longa nos diversos países da Europa e do mundo. Têm a sua história também os sindicatos na Polónia. Recordou-o o Cardeal Wyszynski, Primaz da Polónia, excelente conhecedor dos problemas sindicais no período entre as duas guerras mundiais, no seu discurso que certamente cordiais, porque teve lugar logo após a aprovação dos Vossos Estatutos.

5. Creio, caros Senhores e Senhoras, que tendes plena consciência dos deveres em face dos quais Vos encontrais no "Solidarnosc". São, estes, deveres de suma importância. Estão ligados à necessidade de uma plena garantia da dignidade e eficácia do trabalho humano, mediante o respeito de todos os direitos pessoais, familiares e sociais de cada homem que é sujeito de trabalho. Neste sentido, estes direitos têm um significado fundamental para a vida de toda a sociedade, de toda a nação: para o seu bem comum. Com efeito, o bem comum da sociedade reduz-se, afinal, à pergunta: que é a sociedade, que é cada homem; como vive ele e como trabalha.

E por isso a Vossa autónoma actividade tem, e deve sempre ter uma clara referência à inteira moral social. Antes de tudo à moral ligada ao campo do trabalho, às relações entre o trabalhador e o patrão; mas também a tantos outros campos da moral pessoal, familiar, ambiental, profissional e política. Penso que nas bases daquela Vossa grande iniciativa, que estava para nascer durante as semanas de Agosto no Litoral e nas outras grandes cidades do trabalho na Polónia, houve um esforço colectivo para elevar a moral da sociedade. Pois, sem ela não se pode sequer falar de algum verdadeiro progresso. E a Polónia tem direito a um verdadeiro progresso — o mesmo direito que têm as outras nações; e ao mesmo tempo, num certo sentido, tem um direito particular, porque pago com as grandes provações da história, e recentemente com os sofrimentos da segunda guerra mundial.

6. Aqui trata-se verdadeiramente, e continuar-se-á a tratar, do problema estritamente interior de todos os Polacos. O esforço das semanas de Outono não foi dirigido contra ninguém, e nem sequer é contra ninguém aquele enorme esforço que continua a apresentar-se-Vos. Não é dirigido contra... é dirigido exclusivamente para o bem comum. Empreender tal esforço é direito, ou melhor, dever de todas as sociedades, de todas as nações. É direito reconfirmado pelo inteiro código da vida internacional. Sabemos que ao longo da história os Polacos foram privados, mais de uma vez, precisamente deste direito. O que não nos tira, contudo, o hábito de ter confiança na Divina Providência, e de começar sempre de novo. E no interesse da paz e da ordem jurídica internacional que a Polónia goze plenamente deste direito. A opinião pública mundial está convicta da justeza desta posição.

A actividade dos sindicatos não tem carácter político, nem deve ser instrumento da acção de ninguém, de nenhum partido político, para poder concentrar-se, de maneira exclusiva e plenamente autónoma, no grande bem social do trabalho humano e dos homens do trabalho.

7. Por ocasião do nosso encontro de hoje quero fazer-vos, meus caros Visitantes, bons votos. Eles são múltiplos, mas há dois em particular :

Desejo-Vos, antes de tudo, que possais continuar, em paz e em constância, a Vossa actividade inspirada pelos motivos de natureza social tão importantes, deixando-vos guiar pela justiça e pelo amor, deixando-vos guiar pelo bem da nossa Pátria.

Depois o segundo voto:

Acompanhe-Vos sempre a mesma coragem que existiu no inicio da Vossa iniciativa — mas também a mesma prudência e moderação.

Isto, na verdade, é exigido pelo bem e pela paz da nossa Pátria. Como disse o Cardeal Wyszynski no mencionado discurso e em outras ocasiões. Ao empreenderdes esta tarefa, que Vós mesmos escolhestes conscientemente, procurai prestar um serviço histórico para o bem desta Pátria e também de todas as nações do mundo.

Desejo-Vos isto, e por isto não cesso de pedir a Deus por intercessão da Senhora de Jasna Gora, Mãe dos Polacos.




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