Discursos João Paulo II 1980 - 1 de Dezembro de 1980

Venerável Irmão Nosso
e caros filhos

A vós todos, não só cultores mas também defensores do latim, vos saudamos neste Palácio Vaticano, do qual até as paredes, ornamentadas com inscrições latinas, como que se dirigem aos visitantes na língua de Roma. Junto pois desta Sé Apostólica, em que floresce tal língua desde tempos antiquíssimos até ao presente, vós «não sois estrangeiros nem hóspedes» (Ep 2,19), mas por assim dizer tendes direito de cidadãos.

Agradecemos ao Venerável Irmão Nosso Pericle Felici, grande perito nesta augusta língua, ter-se-Nos dirigido com palavras delicadíssimas. Damos, em seguida, os parabéns aos vencedores deste Concurso Vaticano que, sendo clérigos ou leigos, mostram ainda haver quem procure «a antiga mãe», quer dizer, a língua latina. Não sem alegria soubemos que o primeiro prémio, entre os concorrentes com escritos em prosa, foi atribuído ao autor de um trabalho com o título « Oswiecim ou da coroa dupla», em que é descrito com grande brilho como se entrelaçaram santidade e martírio no Beato Maximiliano Kolbe, filho da Polónia. Aliás porque se menciona a Nossa pátria, seja lícito recordar que também ela concorreu e não pouco para o esplendor da língua e da literatura latina: basta recordar os ilustres poetas João Kochanowki e Casimiro Matias Sarbieski.

Dir-se-á que a vossa reunião tratou, bem a propósito, dos neologismos latinos, a fim de que se encontrem de maneira cuidadosa e apropriada vocábulos para servirem verdadeiramente, na vida de cada dia, àqueles que escrevem e falam latim, e se tomarem meios para que esta língua de Roma — devido à falta de palavras modernas, que exprimem claramente noções e inventos da nossa época — se não ponha de parte como instrumento inadequado.

Embora os tempos em que vivemos não favoreçam os vossos estudos, nem por isso deixeis de insistir no louvável trabalho empreendido. Para que a iniciativa reverta deveras em utilidade comum e tenhais prova certa da Nossa benevolência, concedemos da melhor vontade a Benção Apostólica a todos e cada um de vós.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


A UM GRUPO DE FIÉIS DA UCRÂNIA


Sala do Consistório

Segunda-feira, 1 de Dezembro de 1980



Caros Irmãos e Irmãs da Ucrânia

A vós todos aqui reunidos apresento as boas-vindas com a saudação que a nós e a vós é querida: Slawa Isusu Chrystu! Alegro-me de todo o coração de me ser dado ver-vos, dirigir-vos a minha palavra e abençoar-vos de perto. Para mim não sois simples peregrinos, mas sois da família, porque tendes a fortuna de viver em Roma, sede do Sucessor de São Pedro Apóstolo.

Viestes hoje ter comigo nesta ocasião especial, que é o Sínodo dos vossos Bispos, convocado por minha vontade e desejo. E o Sínodo dos Bispos ucranianos, alimentado com as vossas santas orações, cumpre aqui um grande encargo para bem da Igreja e das almas imortais, e de modo particular para a glória de Deus e para a difusão e reforço do reino de Jesus Cristo no vosso Povo, tão querido ao meu coração.

É para mim grande consolação ser a vossa Comunidade em Roma tão numerosa por número e aprecia da por qualidade. Compõe-se fundamentalmente dos numerosos candidatos à vida espiritual, isto é, dos seminaristas, e também de sacerdotes, monges e irmãs, estudantes leigos e outros bons ucranianos que vivem "sub umbra Petri". Particular estima merece a digníssima Pessoa de Sua Eminência o Cardeal José Slipyj, tão benemérito da Igreja, e a do seu Arcebispo Coadjutor Miroslav Lubachivskyj, como também as destes representantes da vossa Igreja, que na nossa Cúria Romana desempenham importantes serviços tanto a Nós, Vigário de Cristo na terra, como também a esta Sé Apostólica.

De toda o coração vos abençoo a vós todos aqui presentes e àqueles que são caros ao vosso coração, os vossos pais e amigos, e convosco abençoo todo o Povo ucraniano, tanto na Pátria como aqui na Diáspora. Em penhor das copiosas graças divinas, concedo a vós todos a minha Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DO SÍNODO UCRANIANO


1 de Dezembro de 1980



Eminentíssimo Senhor Cardeal
Excelentíssimo Arcebispo Coadjutor
Caríssimos Irmãos

Como humilde sucessor de São Pedro e Pai de todos os Católicos, apresento a minha saudação a vós que estais reunidos com o meu beneplácito, aqui em Roma, centro do mundo católico, por ocasião deste vosso importante Sínodo. A graça do Espírito Santo reuniu-vos aqui, junto do túmulo dos Santos Apostólicos e do túmulo tão querido a nós e a vós, de São Josafat, Arcebispo de Polosk, apóstolo da unidade das Igrejas. Viestes aqui na festa deste mártir pela fé, no décimo sexto aniversário da trasladação das suas santas Relíquias e da deposição delas na Basílica de São Pedro debaixo do altar de São Basílio Magno, perto das relíquias de São Gregório Nazianzeno e ao lado das do segundo grande luminar do Oriente São João Crisóstomo. Verdadeiramente grande é Deus nos Seus Santos!

Precisamente agora completam-se 400 anos a partir do nascimento de São Josafat, que veio ao mundo no ano de 1580 na terra de Volínia, na cidade de São Vladimiro, Baptista da Rus-Ucrânia. Disto prestam testemunho o biógrafo do santo, o Bispo Jakiv Susza, e antes e depois dele outros homens de fé. Que enorme graça para a vossa Igreja e para o vosso povo que a cidade de Vladimiro, luz do vosso povo, tenha dado tão grande Santo, precisamente no tempo mais importante da vossa Igreja! Estou a pensar em se ter renovado a união de toda a extensa Diocese metropolitana de Kiev com esta Santa Sé Apostólica, por meio da conhecida União de Berest no ano de 1596. Foi esta grande obra como que selada com o sangue de São Josafat e é por isso que ela resiste tão tenazmente.

Para conservar obra tão gloriosa reunistes-vos aqui, caríssimos Irmãos, a fim de vos consultardes mutuamente sobre as importantes questões pastorais da vossa Igreja tanto na Pátria como aqui no seu conjunto. Vós todos juntos considerastes e nos indicastes os nomes daqueles que são tidos como merecedores da dignidade episcopal, isto de modo particular para as sés vacantes de Filadélfia e de Chicago, na América, como também para os Bispos Auxiliares de alguns dos vossos Bispos. Além disso, aplicastes a vossa atenção de modo particular ao já vizinho vosso Jubileu Milenário do Baptismo da Rus-Ucrânia nos tempos do glorioso Príncipe Vladimiro o Grande, que a Igreja honra como santo. Estabelecestes também as novas directrizes para a renovação das vossas eparquias, paróquias e famílias, da vossa comunidade inteira, tudo segundo a vossa tradição cristã e o inabalável ensinamento da Igreja, e à luz dos decretos do recente Concílio Vaticano II.

Desejo assegurar-vos, Bispos da Igreja Ucraniana, que dirijo quotidianamente as minhas fervorosas súplicas diante do altar de Deus e invoco as bênçãos para vós e pelas almas confiadas aos vossos cuidados. Deus, que iniciou em vós esta boa obra, obra da difusão e do reforço do Seu reino na terra, vos conceda as Suas mais abundantes graças.

A fidelidade da vossa Igreja a esta Santa Sé foi testemunhada em tempos pelos vossos antepassados, assim durante o Concílio de Lião como depois em Florença por boca do vosso Metropolita, o futuro cardeal Isidoro. Esta fidelidade foi prometida, em nome de toda a vossa Jerarquia daquele tempo, pelos Bispos Ipácio Pozio e Cirilo Terlecklyj diante do Papa Clemente VIII e — o que mais conta — por esta fidelidade não poucos dos vossos irmãos e irmãs deram a vida.

Dirijo-me especialmente a Si, Senhor Cardeal, tão solícito pela sorte da Igreja Ucraniana na Pátria e na Diáspora. O Senhor o recompense e abençoe, e a todos os Prelados zelosos. Sede abençoados neste tempo do vosso Sínodo e para sempre! De todo o coração vos abençoo a vós todos aqui reunidos e convosco abençoo os sacerdotes, monges, monjas e todos os crentes, de modo particular a vossa juventude e aqueles ainda que sofrem pelo nome de Jesus. Formulo ardentes votos pelo início das celebrações do Milénio do vosso Cristianismo e, em penhor das mais copiosas bençãos de Deus, dou-vos de todo o coração a minha Benção Apostólica.

Louvado seja Jesus Cristo!



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


A UM GRUPO DE MINEIROS ITALIANOS


Quinta-feira, 4 de Dezembro de 1980



Caros Irmãos!

Desejo antes de tudo agradecer-vos por terdes vindo a este encontro que, realizando-se no dia de Santa Bárbara, padroeira de quantos trabalham nas minas, é sinal evidente da vossa fé cristã, além da vossa devoção ao Sucessor de Pedro.

Por conseguinte, saúdo-vos cordialmente e dou-vos as boas-vindas a esta casa, que é do comum Pastor da Igreja, e portanto está aberta a todos. Tanto mais devia abrir-se a vós, caros mineiros. Vós, de facto, representais uma categoria de pessoas que realizam um dos trabalhos mais pesados, e além disso fazeis-me recordar o trabalho que eu próprio fiz durante alguns anos, na minha juventude.

Sei por experiência que se trata de uma ocupação dura, embora no curso dos anos tenham certamente sido introduzidos melhoramentos nas técnicas de trabalho; posso pois compreender os vossos problemas e prometo-vos a minha afectuosa vizinhança.

Sobretudo quero dizer-vos que, se é justo o ditado comum segundo o qual o trabalho nobilita o homem, é também verdade que a fé cristã pode enobrecer o trabalho mesmo e até torná-lo mais humano. Portanto, a exortação que vos dirijo é a de renovardes e consolidardes a vossa plena adesão a Cristo, redentor do homem e nosso Senhor. Só Ele nos permite dirigir todas as nossas energias para a construção de uma sociedade que só será nova se for fundada finalmente no respeito e sobretudo no amor recíproco.

Isto vos desejo de todo o coração, ao mesmo tempo que ainda vos renovo os sentimentos da minha benevolência pastoral. Em particular, levai a minha saudação aos vossos Entes queridos e aos vossos Colegas de trabalho, aos quais desejo abundantes favores celestes para uma vida humana e cristã próspera e feliz.

Em penhor destes votos, é-me grato conceder-vos a minha Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DA COMISSÃO MISTA


DO CONSELHO MUNDIAL METODISTA


E DA IGREJA CATÓLICA


5 de Dezembro de 1980



Caros Irmãos em Cristo

É sempre alegria e consolação receber grupos como o vosso, intensos pontos focais de uma actividade que é a grande bênção na nossa época — a procura de reconciliação entre os seguidores de Cristo. O tempo do Concílio Vaticano II, quando os Bispos da Igreja Católica se entregaram com toda a seriedade a esta actividade no Decreto sobre o Ecumenismo, foi tempo em que o Espírito Santo também impeliu os cristãos de muitas tradições a semelhante empresa, e foram estabelecidos muitos diálogos a nível mundial, incluindo aquele em que vós estais agora empenhados. Assim, por 14 anos, intelectuais e pastores tanto metodistas como católicos, acrescentaram esta actividade aos seus trabalhos ordinários.

Alguns de vós formaram parte desse generoso grupo de observadores que o Metodismo enviou às sucessivas sessões do Concílio. Notastes muitas vezes nos vossos relatos quanto ficavam impressionados estes observadores atentos com as profundas afinidades entre as tradições e os ideais católicos e os metodistas: entre a fervorosa pregação de santidade pessoal pelos Wesleys e pelos mais recentes chefes metodistas, e o trabalho dos gigantes espirituais da história católica. Ao escolherdes esta afinidade como âncora para o vosso diálogo, fizestes uma escolha com sabedoria; a vossa foi verdadeiramente «conversa santa», centrada no amor de Cristo compartilhado por uns e outros, de maneira que nele as espinhosas questões, que formaram o diálogo da triste história da divisão cristã moderna (questões a que não vos esquivastes), têm sido encaradas com serenidade, boa vontade e caridade. Ninguém mais do que o ecumenista precisa de lembrar-se das palavras de São Paulo: «Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver caridade, sou como bronze que ressoa e como címbalo que tine» (1Co 13,1).

O vosso diálogo alargou-se. Além da discussão sobre as diferenças doutrinais insistiu-se enérgicamente nos desafios positivos que se apresentam a todas as testemunhas de Cristo hoje — não somente no campo social, procurando exprimir a mensagem cristã eficientemente no mundo desorientado pela mudança, mas, ainda mais, no delicado domínio interior da consciência cristã, onde nenhum homem ou mulher escapa às fortes escolhas e aos sacrifícios imprescindíveis para o seguimento de Cristo.

Oxalá a benção de Deus caia abundantemente sobre o vosso trabalho. Não vos perturbeis com os clamores dos impacientes e dos cépticos, mas fazei tudo o que esteja no vosso poder para assegurar que a vossa busca de reconciliação ecoe e se reflicta onde quer que se encontram Metodistas e Católicos. O Espírito Santo, em cuja misteriosa acção na Igreja estivestes a reflectir tão frutuosamente, derrame os seus dons sobre vós todos — a sabedoria, o conselho e a fortaleza — de que precisais para cooperar com o próximo e com Ele na realização da vontade de Deus, a quem «seja dada glória pelos séculos dos séculos por meio de Jesus Cristo. Amen» (Rm 16,27).



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO XXX CAPÍTULO GERAL


DA CONGREGAÇÃO DOS MISSIONÁRIOS


OBLATOS DE MARIA IMACULADA


Sexta-feira, 5 de Dezembro de 1980



Com muito prazer, caríssimos filhos, atendi ao vosso desejo de vos receber durante o Capítulo Geral do vosso benemérito Instituto; e a minha satisfação é ainda mais viva porque este encontro se dá em vésperas da festa da Imaculada, celeste Padroeira da vossa Congregação. Ao agradecer-vos cordialmente a prova de bondade, que a vossa presença dá de forma tão gentil, apresento os meus afectuosos votos, de um cada vez mais frutuoso trabalho, ao Padre-Geral e ao Conselho Geral: votos que de boa vontade torno extensivos a todos os Capitulares, pelos encargos que lhes serão atribuídos pela obediência.

1. Um simples olhar para a vossa grande família enche a minha alma de admiração: sois missionários do Senhor e oblatos de Nossa Senhora; em nome de Cristo Jesus e da Santíssima Virgem, dedicais-vos à obra de evangelização, entre todos os que ainda não conhecem a Cristo, como também em tornar cada vez mais fundada, entre as várias populações, a adesão aberta e generosa ao Evangelho; além disso ocupais-vos da formação dos chamados ao sacerdócio e da educação da juventude. Apostolado, por conseguinte, variado e nem sempre fácil, que presta glória a Deus por meio da oferta do vosso coração e de toda a vossa actividade à Mãe de Deus. A Assembleia Capitular é estimulada nestes dias pela ansiedade de renovação e de incremento, segundo foi desejado pelo Concílio Vaticano II e está nos votos de todos os membros do Instituto.

2. Nesta perspectiva, é necessário reportar-se cada um, em atitude de fé e de humilde disponibilidade, aos exemplos e ensinamentos do divino Mestre. Isto importa o empenho de serdes, cada vez mais e cada vez melhor, almas sacerdotais e religiosas, numa vida consagrada ao generoso exercício da justiça, do amor e da paz entre os homens, dando preferência aos humildes, aos pobres e aos que sofrem. Recorda-o também o Concílio Vaticano II: "As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, dos pobres sobretudo e de todos os que sofrem, são também as alegrias, as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo" (Gaudium et Spes GS 1).

Quanto mais se é capaz de demonstrar de forma concreta a justiça e a caridade no exercício do ministério sacerdotal e na vida comunitária, tanto maior será a credibilidade dos sacerdotes e dos missionários junto do Povo de Deus e dos irmãos que é preciso evangelizar.

Mais ainda: em proporção com o carácter evangélico da vida religiosa, da fraternidade que a distingue e da coesão do Instituto que a salvaguarda, crescerá o ajuste da acção apostólica às pessoas e aos ambientes, a que nos dirigimos ao anunciar o Evangelho.

3. Tudo isto supõe oração intensa e profunda vida interior, graças às quais é possível continuar, mesmo nas ocupações do apostolado, o colóquio com o Pai do Céu, ao qual se pede e de quem se recebe a força libertadora, que permite vencer em nós tudo o que possa obstar à missão para com o próximo e permite também dar valor à pregação e ao testemunho evangélico.

Em vós, caríssimos filhos, este contínuo encontro com Deus está ainda mais facilitado pelo exemplo e pela poderosa intercessão da bem-aventurada Virgem a que estais consagrados. Nossa Senhora viveu profundamente, animada pelo Espírito Santo e pela fé sem limites, a verdade de estar Deus com os homens e de toda a humana existência e actividade terem o seu princípio e fim em Deus.

Com estes votos, invoco sobre vós, sobre os trabalhos do Capítulo Geral e sobre toda a Congregação dos Missionários Oblatos da Imaculada, uma renovada efusão de graças celestiais e, em penhor de particular afecto, concedo, sob os auspícios da .Mãe de Deus, a especial e confortadora Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À ORGANIZAÇÃO MUNDIAL


DOS ANTIGOS ALUNOS DO ENSINO CATÓLICO


6 de Dezembro de 1980



Sinto-me particularmente feliz em acolher os membros da nova Comissão directiva da Organização Mundial dos Antigos Alunos e Alunas do Ensino Católico. Ao dar-vos as boas-vindas esta manhã, desejo encorajar-vos a ter em vista os objectivos que levaram à fundação da vossa Organização.

Esta, ainda relativamente nova, nasceu da consciência muito viva dos valores recebidos na «primavera da vida», dentro das instituições católicas. Há nisto, com justa razão, um reconhecimento do valor do sistema educativo que vos formou, e dos seus princípios fundamentais. O ensino católico, de facto, procura sempre unir a aquisição do saber, a formação moral e a iniciação religiosa. Para aqueles que usufruiram dela, esta educação cristã é a fonte de um compromisso, porque ela não é património inerte, mas concepção dinâmica da existência. É precisamente a que vós quereis desenvolver em vós mesmos e nos vossos ambientes, e a que desejais assegurar à juventude actual.

Como não reafirmar então, mais uma vez, o direito de as famílias educarem os seus filhos em escolas e instituições correspondentes à sua concepção de vida?

No mundo pluralista que é o nosso, vós tendes de afirmar e cultivar a vossa própria identidade cultural religiosa própria, fundada numa concepção do homem e da sua relação com a verdade, que encontra a sua plenitude no conhecimento do Verbo de Deus, Sabedoria eterna, que revela o sentido último da realidade. Sabei situar-vos, sempre e cada vez mais, nesta verdade total que vos permitirá contemporâneamente estar abertos para diversos valores culturais do nosso mundo e trabalhar nele de modo conforme com aquilo que sois.

Precisamente, tomastes a iniciativa de estudar um determinado número de problemas importantes relativos em particular à educação e à família. Faço votos por que ajudeis deste modo a reflexão e o testemunho de muitos pais e educadores, e tenhais feliz influência junto das diferentes instâncias competentes, no plano nacional e internacional. É contributo apreciável para a obra imensa e exaltante que se depara à Igreja nestes sectores cruciais. Encorajo-vos nisto de todo o coração.

A oração ao Senhor, Mestre interior, e à Virgem, modelo das educadoras, vos ampare nos vossos esforços, como também a minha Bênção Apostólica para vós próprios, para todos aqueles que representais e para todas as vossas famílias.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS JURISTAS CATÓLICOS


6 de Dezembro de 1980

Ilustres Senhores
e caríssimos Irmãos!

1. Foi para mim causa de particular alegria saber que este ano o vosso Congresso nacional de estudo teria como tema o árduo binómio violência e direito. No plano dos factos históricos, realmente, a dolorosa crónica quotidiana apresenta-nos o primeiro termo como extremamente actual. Mas, no terreno da doutrina, as controvérsias que se reacenderam, também entre os católicos, depois do Concílio, podem dizer-se apenas um pouco atenuadas, enquanto permanece ainda densa a confusão das ideias, derivadas da pluralidade das disciplinas antigas e novas, da diversidade das escolas e da oposição das ideologias políticas. E há que salientar imediatamente que hoje, à eterna dialéctica entre posições conservadoras e movimentos inovadores — que têm por objecto princípios, valores ou instituições particulares — se vai e se quer substituir, da parte de não poucos, nas actuais sociedades chamadas em transformação, a oposição entre aqueles que pensam poderem-se e deverem-se reformar pacificamente as estruturas, e os que crêem que, só depois da aniquilação total e violenta das mesmas, o homem pode chegar a construir uma sociedade mais justa e mais humana. Fruto muito amargo desta confusão das ideias é a ideologia da violência. Não se pode hesitar em reconhecer aos juristas uma competência mais directa, mais penetrante e mais adequada não só aos fins da necessária representação de cada uma das suas manifestações anti-sociais, nem sequer aos fins da sua prevenção mediante leis e instituições idóneas para eliminar as ocasiões, mas também com o fim de haurir, da vastíssima e multíplice experiência jurídica, as razões não de qualquer relação de oposição prática, mas de verdadeira antítese radical e sistemática, entre direito e violência; antítese, por conseguinte, reveladora da essência íntima da segunda.

2. É toda a enciclopédia jurídica que é chamada a contribuir para esta pesquisa. Nas várias disciplinas, a antítese violência-direito é encarada ora em determinações, ou seja em comportamentos e com consequências particulares, ora de modo mais amplo e geral. Estamos então perante uma antítese entre os mesmos termos radicais, ou perante situações não redutíveis a um fundo comum? A esta pergunta, os juristas, instruídos pela análise da linguagem, pela história e pela comparação dos ordenamentos jurídicos, podem dar, e substancialmente já deram, uma resposta no sentido da primeira alternativa.

Um primeiro passo, preliminar mas indispensável pode dizer-se geralmente dado e está na precisa distinção entre força e violência. Apesar disto, de facto, a idêntica raiz lexical (vis, hybris) e a identidade física da actividade (força individual e colectiva), foi precisando que a força — embora sendo o meio ou o instrumento essencial para o direito positivo — é também ela, quando está organizada e é exercida ordenadamente para os fins do direito, não já mera força física mas também sobretudo justiça em concreto. Isto vale, não só para a força pública, mas também para a privada, no caso de legítima defesa. A força é pois realidade nitidamente distinta em relação à violência. E queríamos acrescentar uma verdade ainda mais enobrecedora da força rectamente usada. O indivíduo, que impede com a força um infeliz de suicidar-se, não lhe faz violência, mas obra de caridade.

3. O segundo passo, decisivo, é o que leva primeiro a afirmar a antítese radical entre a violência e o direito, e depois a construir, precisa, mente sobre tal antítese, uma definição universal e válida da violência. E necessário distinguir estes dois momentos da investigação, pois, se no primeiro encontramos entre os historiadores do direito, entre os cultores da filosofia e da história geral, e entre os próprios estudiosos de cada um dos ramos do ordenamento jurídico — uma intuição geral difundida, e dir-se-ia também uma profunda convicção; quanto ao segundo, a diversidade dos critérios até agora propostos para distinguir força e violência, insistindo na ideia do direito, não só evidencia a falta de adequação de cada um deles, mas também a relação de ambos com a concepção pessoal do direito em geral que tem aquele que a propõe.

Ora é nisto que vós, juristas católicos, podeis oferecer o vosso próprio contributo para uma definição da violência mais razoavelmente válida e mais praticamente utilizável, pois mesmo no estudo aprofundado do direito positivo e no mais sincero respeito pelo ordenamento jurídico em que operais, não vos vedes obscurecidos pelo falso dogma do positivismo estadual, nem pelos permanentes equívocos contra o direito natural. Vejamos em breve qual é o caminho mais claramente aberto.

4. A violência, mesmo talvez etimologicamente, aparece como uma violação.Disse-se violação de cada um dos valores humanos, ou vistos em si mesmos, ou enquanto protegidos pelo direito positivo. Mas o primeiro critério é essencialmente moral, e não parece consentir uma definição geral universalmente válida. O segundo (chamado institucional) é o próprio do direito penal; mas, geralmente, embate-se contra a ineliminável dificuldade de, enquanto nas hodiernas sociedades em transformação, se discutem em toda a parte precisamente as instituições ou o direito positivo, a história — antiga, moderna e mesmo contemporânea — nos mostra regimes despóticos , totalitários e desumanos , cujas leis, embora pela recta filosofia sejam chamadas antes «monstros de leis» do que «leis», formalmente são sempre porém leis e instituções positivas.

Com mais feliz intuito da verdade substancial, juristas e moralistas, especialmente católicos, recorreram ao valor supremo da vida essencial no direito civil em geral, e do canónico em particular, o nobilíssimo «princípio da não violência»? É de observar, antes de tudo, que tal princípio, já não estranho ao Antigo Testamento, foi ensinado e praticado o mais possível pelo Redentor mesmo, que tanto as profecias como os Evangelhos nos apresentam como «cordeiro levado injustamente ao matadouro, sem qualquer rebelião ou lamentação da sua parte». Diante dos actos de violência, Ele diz precisamente: «A quem te bater numa das faces, oferece-lhe também a outra» (Lc 6,29). Mas, no sistema do pensamento cristão, o princípio da não-violência não tem só alcance negativo (não opor violência à violência), mas também alcance positivo e bem mais superior. Pode dizer-se, com efeito, que a mais cristã das máximas que nos inculcou o Redentor com o exemplo e com um explícito preceito é esta: «Não te deixes vencer pelo mal; vence antes o mal com o bem» (Rm 12,21), quer dizer, com um bem ainda maior (que no contraste resulta ser o amor).

Se, como juristas, compreendeis que não se pode construir uma sociedade fundada apenas no princípio negativo da não-violência, como juristas católicos queríamos confiar também a vós o estudo dos meios para realizar, ou ao menos para tender, cada vez mais concreta e sistematicamente, para estabelecer as condições para que se realize o grande ideal humano, propugnado pelo meu grande predecessor Paulo VI: a Universal civilização do amor. Como ele dizia, este ideal não é uma utopia, porque a lei do amor está radicada no coração de cada homem, criado à imagem de Deus que é amor, e portanto de todos os homens.

O vosso insubstituível contributo, uma vez que todos os povos reconheceram que o fundamento primeiro e o fim último da vida humana politicamente associada é a dignidade da pessoa, que diz respeito a todos os homens, e não é só combater a monstruosa concepção do direito como força, combate em que sempre vos notabilizastes, mas também rejeitar a concepção formalista, que vedes nos ordenamentos jurídicos dos simples regulamentos externos das liberdades individuais ou dos grupos, ou então simples garantia dos bens possuídos pelos particulares. Não sendo o homem só destinado a viver com os outros, mas também para os outros, encontrando nisto a mais alta perfeição da sua personalidade mesma, cada povo não pode pensar exclusivamente no próprio bem -estar, mas deve também contribuir para o dos outros povos, testemunhando assim a autêntica humanidade da sua mesma civilização particular. O dever da solidariedade, e portanto do amor, não pode estranho ao direito, já que ele, estando inscrito na própria realidade existencial do homem, é o primeiro preceito do direito natural, após o do amor para com Deus.

O conceito de direito, segundo a antiquíssima intenção, é reconduzido ao de justiça, não só ao da justiça parmeneidiana, que, distinguindo o «meu» do «teu», separava o «eu» do «tu», mas sim ao da iustitia maior pregada por Cristo, que é a caridade.

Em conclusão: como só com o princípio negativo da não-violência, não se pode construir uma sociedade, assim não se pode construir uma «sociedade sem direito e sem Estado» como prometem certas utopias contemporâneas. Mas bem se pode construir uma sociedade fundada no amor; bem se pode e se deve tender para uma universal civilização do amor. Aqui a violência será excluída, pois é contrária ao direito que é caridade: plenitudo legis dilectio (Rm 13 Rm 10).

Invocando sobre os trabalhos do vosso encontro a abundância dos favores celestiais concedo-vos do coração a propiciadora Benção Apostólica, que torno extensiva aos vossos familiares e às pessoas que vos são caras.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS DIRECTORES E AOS MEMBROS


DO MOVIMENTO CRISTÃO DOS TRABALHADORES


Sábado, 6 de Dezembro de 1980



1. Apraz-me encontrar-me convosco, Directores e Membros do Movimento Cristão dos Trabalhadores reunidos em Roma por ocasião do vosso III Congresso Nacional, para aprofundar com determinação concreta as tarefas pertencentes a um grupo católico como o vosso, quer no âmbito da comunidade eclesial, quer no vastíssimo âmbito do mundo do trabalho.

Vós, dedicando-vos com responsável compromisso à reflexão e, ao estudo dos temas do Congresso, não quisestes deixar de fazer uma visita ao Papa para Lhe manifestar, a Ele Vigário de Cristo, a vossa sincera devoção, renovando ao mesmo tempo o propósito de um testemunho qualificado e específico, que seja coerente com o Evangelho e fiel às orientações do Magistério da Igreja. Para isto, desejais também uma palavra de encorajamento que ampare a vossa fadiga e a vossa actividade.

2. Assumistes tarefas de largo alcance e muitas vezes não privadas de graves dificuldades, pela vastidão dos problemas que abrangem, e sobretudo pela habitual fraqueza do homem em os enfrentar. Numa sociedade atravessada por profunda ambiguidade, inclinada, por um lado, para melhores condições de convivência civil, mas submetida, por outro lado, a um esforço produtivo que se arrisca a vir a ser inteiramente dirigido para um mero ideal de bem-estar material, excluindo as perspectivas e as exigências de uma ordem humana, espiritual e sobrenatural, o vosso movimento quer afirmar, dentro do mundo do trabalho, a presença de Cristo, a vitalidade de Cristo. Ele, de facto, "opera já no coração dos homens com a virtude do seu Espírito, não só suscitando o desejo do mundo futuro, mas por isso mesmo também inspirando, purificando e fortificando aqueles generosos propósitos, com os quais a família dos homens procura tornar mais humana a própria vida e submeter para este fim toda a terra" (Gaudium et Spes GS 38).

Tal presença redentora, revolucionária e pacífica ao mesmo tempo; desejais testemunhá-la e vivê-la antes de tudo em vós, realizando um preciso esforço de reflexão sobre a realidade que vos circunda e as suas exigências, para uma sua compreensão e interpretação evangélica, também no confronto e no diálogo — realizados com lúcida consciência da própria fé — com outros grupos organizados. A vossa tarefa, portanto, apresenta-se como animação ristã do mundo do trabalho e como acção evangelizadora no interior das forças que determinam, no momento histórico presente, a composição e o incremento do movimento operário.

3. O Papa encoraja-vos neste vosso árduo mas também exaltante serviço de crentes, orientado essencialmente para fazer compreender que o trabalho humano, como expressão das capacidades criativas do homem, para além do seu evidente aspecto produtivo, se coloca na perspectiva do primitivo pacto de Aliança entre Deus e o próprio homem, pacto definitivamente renovado em Jesus Cristo. Ou seja, o trabalho, nesta luz suprema — enquanto é meio de aperfeiçoamento do mundo e colaboração na obra criadora de Deus — ajuda o homem a ser mais homem, amadurece-lhe a personalidade, desenvolve-lhe e eleva-lhe as capacidades, abrindo-o assim ao serviço, generosidade e ao compromisso para com os outros, numa palavra para o amor.

O significado definitivo do trabalho está contido nesta disponibilidade para com os irmãos, isto é no exercício prático do grande mandamento da caridade (cf. Jo Jn 13,14), que é a lei fundamental da perfeição humana e por conseguinte também da laboriosa transformação do cosmos (cf. Gaudium et Spes, ib.). O Verbo de Deus, tornado Filho do homem, cujo Natal estamos para celebrar, oferecendo a sua vida por nós obteve-nos a graça de exercermos aquele amor que é alma e principal incentivo do trabalho humano.

Conscientes de tais verdades, continuai corajosamente a vossa missão cristã, sobre a qual invoco os dons da assistência divina e, ao mesmo tempo que agradeço ao vosso Presidente as nobres e cordiais palavras de saudação que me dirigiu, é-me grato conceder-vos a Bênção Apostólica, que de coração faço extensiva às vossas famílias e a todos os vossos Entes queridos.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


A UM GRUPO DE PEREGRINOS ITALIANOS


Sala Paulo VI


Discursos João Paulo II 1980 - 1 de Dezembro de 1980