Discursos João Paulo II 1980 - 12 de Dezembro de 1980

SAUDAÇÃO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS REPRESENTANTES DA IMPRENSA


INTERNACIONAL NA AUDIÊNCIA


ÀS DELEGAÇÕES DA ARGENTINA E DO CHILE


12 de Dezembro de 1980



Uma cordial saudação a vós aqui presentes, que trabalhais nos meios de comunicação social, periodistas, fotógrafos e repórteres da televisão...

Reunistes-vos hoje aqui para dar testemunho de um grande acontecimento. Não se trata, todavia, da feliz conclusão, que todos desejamos, da minha obra de mediação sobre a zona austral. Não se trata do final, mas queira Deus que seja um passo decisivo para o mesmo.

Acabo de entregar, de forma reservada, aos Senhores Ministros dos Negócios Estrangeiros da Argentina e do Chile — dessas queridas Nações da América do Sul — o texto da minha proposta para a solução da controvérsia que, de há tempo, dificulta as boas relações entre os dois Países. Nesse texto recolhi sugestões e conselhos para o que poderia ser — a meu juízo uma solução definitiva, que elimine toda a incerteza para o futuro. Se, como desejo, a minha proposta fosse aceite, não haveria já motivos de divergência, daqui por adiante, na zona austral.

A vós, queridos informadores que deveis colaborar na obra da paz, corresponde agora a nobre e elevada tarefa de ajudar os Responsáveis dos Países para que possam tomar as decisões adequadas, num ambiente sereno, com valentia e com bom senso. Já no ano passado, ao falar às

Delegações de ambas as Nações, exaltei a vossa tarefa: vós tendes nas vossas mãos os meios de comunicação social e podeis fazer grande bem. Peço-vos que o façais! O Senhor vos abençoe na vossa tarefa!

Também eu vos abençoo e invoco, sobre as vossas famílias, sobre a vossa bela profissão e sobre o vosso serviço, a protecção bondosa da Virgem Santíssima, Nossa Senhora de Guadalupe, Imperatriz das Américas, cuja festa celebramos hoje.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À FEDERAÇÃO INTERNACIONAL


DAS ASSOCIAÇÕES CONTRA A LEPRA


13 de Dezembro de 1980

Caros amigos

1. Folgo muito em ter este encontro convosco, delegados da Federação Internacional ILEP. Através de vós, saúdo aqueles povos que, com sensibilidade generosa, assumiram a nobre causa à qual quotidianamente devotais as energias da mente e do coração. A vossa Federação de Associações Antilepra, que abrange 24 países industrializados e trabalha em estreita colaboração com 80 nações onde a lepra é endémica, realiza a louvável obra de enfrentar o problema dessa enfermidade de maneira unificada; graças a essa adequada coordenação de iniciativas e esforços, procura ciosamente evitar esbanjamento e atrasos.

Nesta oportunidade sinto-me feliz de poder dizer-vos quanto aprecio os sublimes objectivos que inspiram a vossa obra. Tenho outrossim a satisfação de vos oferecer uma palavra de encorajamento a continuardes o que haveis começado. Eu mesmo tive uma experiência pessoal da obra que se está fazendo para combater essa doença: foi-me dado visitar leprosários quando das minhas visitas pastorais tanto à Africa quanto ao Brasil. Afigura-se ingente a soma de progresso que ainda está por fazer, se levarmos em conta os dados estatísticos que aí estão a revelar-nos que, de momento, não mais do que 20 por cento das pessoas afectadas pelo mal de Hansen recebem tratamento médico. Ainda existem no mundo milhões de hansenianos que são deixados arranjarem-se por si mesmos e ficam expostos às consequências de uma doença que geralmente oferece pouca resistência a uma terapia apropriada. E um facto que não pode deixar de estar presente à consciência de quem quer que tenha sentimentos cristãos, ou meramente humanos.

2. Exerceis as vossas actividades de acordo com uma estratégia mundial que procura levar em conta todas as necessidades das pessoas atingidas pelo mal, tanto no plano da saúde como nos planos económico e social. Com esse intuito, em sintonia com os programas montados na Conferência de Alma Ata da Organização Mundial de Saúde, propusestes-vos a tarefa de dar a vossa contribuição ao plano da «medicina básica», a qual conta com a participação responsável da comunidade que recebe a vossa assistência preventiva e curativa.

Esforçais-vos também por superar toda a forma de terapia que comportaria o isolamento dos doentes. Mediante o fornecimento de serviços móveis adequados, é efectivamente possível proporcionar aos pacientes o necessário tratamento, capacitando-os a ficarem com as suas famílias e continuarem a trabalhar.

É fácil divisar as vantagens desse modo de proceder: além de poupar aos que sofrem a traumática experiência do isolamento, ajuda a superar atávicos preconceitos e temores infundados, que ainda prevalecem em certos sectores da sociedade. Devem ser debeladas as superstições que cercam a lepra, de molde a tornar ainda mais eficientes as várias formas de a combater que já são providencialmente usadas pelo mundo fora.

3 As associações que pertencem à vossa Federação, bem como as demais Organizações que operam nesse campo, estão igualmente carreando os seus esforços para a esfera da pesquisa científica. São numerosas as direcções tomadas por estes estudos, e algumas estão-se mostrando particularmente promissoras: penso na pesquisa que se está conduzindo sobre o bacilo do mal de Hansen, pesquisa esta que procura determinar a sua exacta composição bioquímica, identificar mais cuidadosamente as suas características, medir a eficácia de novas drogas e produzir o mais depressa possível uma vacina antilepra eficaz.

O financiamento desta pesquisa, bem como a produção de drogas já conhecidas, que são bastante eficazes e prontas nos efeitos, mas também custam muito, requerem recursos económicos consideráveis. Os fundos com que podeis contar, não são suficientes para satisfazer esses requisitos. Por isso, estais envidando, com razão, esforços ainda mais amplos para alertar a sociedade, no intuito de familiarizar toda e qualquer pessoa com o tormento de tantos irmãos e irmãs que, pela simples razão de serem doentes, se vêem condenados a uma existência segregada e brutalizada.

Sinto a felicidade de encorajar-vos nessa campanha humanitária. E não me posso furtar à exigência de exprimir a esperança de que a generosidade de pessoas particulares se sentirá desafiada pelos esforços ias Organizações Internacionais e dos Governos, de sorte que obtenha cabal e duradoura vitória nessa batalha, que está longe de ser desesperadora.

4. Esta esperança de receber o apoio de toda e qualquer pessoa de boa vontade, desperta certamente um eco especial nos corações de quem reconheça em Cristo o Filho de Deus, o qual por amor se fez o irmão de todo o ser humano. Como pode um cristão deixar de sentir o desafio daquela dura palavra: «O que não fizestes para com um dos menores dentre estes, a mim não o fizestes» (Mt 24,45)?

Está a Igreja a preparar-se para reviver, no mistério do Natal, o acontecimento maravilhoso da entrada na história humana do Verbo feito carne. Foi este facto marcado pela pobreza e a rejeição, pela hostilidade de uns e a indiferença da maioria. Ali do presépio, onde jaz rodeado de singelos pastores — uma categoria olhada como «impura» pela sociedade daquele tempo —, o Filho do homem interroga quem quer que nele creia, sobre quanto ele ou ela esteja fazendo para combater não só o bacilo do mal de Hansen, senão também de tantas outras formas de lepra, que se originam e desenvolvem com o contagioso bacilo do egoísmo.

Quem dera pudesse servir a contemplação deste prodígio do amor divino para incentivar no coração dos fiéis renovada resolução de fraterna solidariedade, e trazer-vos a todos vós a consolação de experimentar uma vez mais a verdade daquele «logion»que para nós conservou o Apóstolo Paulo: «Mais felicidade é dar do que receber» (Ac 20,35). Com estes bons votos, de boa mente imploro sobre vós, companheiros de trabalho, e sobre todos quantos apoiam a vossa obra com as suas generosas contribuições, copiosas bençãos do Deus Omnipotente.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS TÉCNICOS E ATLETAS DO "PISA SPORTING CLUB"


Sábado, 13 de Dezembro de 1980



Caríssimos Dirigentes e Jogadores do "Sporting Club" de Pisa!

1. Estou-vos vivamente grato pela vossa visita e com grande alegria vos apresento a minha saudação mais cordial. Trazeis aqui, à casa do Papa, a vossa juventude, a vossa vitalidade, os vossos ideais agonísticos e desportivos, e eu abro os meus braços para vos acolher com afecto e para vos assegurar que a Igreja e o Papa vos amam e vos seguem com atenção e ansiedade, assim como se interessam por todas as classes de pessoas, para indicar a todos os caminhos da verdadeira felicidade e da salvação.

A vossa presença faz-me ir com o pensamento à vossa célebre Cidade, conhecida no mundo inteiro, docemente estendida na foz do Arno, famosa pelos acontecimentos históricos, pelas referências literárias, pelas expressões da arte e da ciência; mas sobretudo, como desportistas, esta vossa cordial presença leva-me a reflectir por alguns momentos sobre a importância e a beleza do Desporto.

2. Todos os tipos de desporto encerram em si um rico património de valores, que devem estar sempre presentes, para serem realizados; o treino para a reflexão, o justo emprego das próprias energias, a educação da vontade, o domínio da sensibilidade, a preparação metódica, a perseverança, a resistência, a suportação da fadiga e das dificuldades, o domínio das próprias faculdades, o sentido da lealdade, a aceitação das regras, o espírito de renúncia e de solidariedade, a fidelidade aos compromissos, a generosidade para com os derrotados, a serenidade na derrota, a paciência com todos...: são um conjunto de realidades morais que exigem verdadeira ascética e contribuem validamente para formar o homem e o cristão.

Exorto-vos, pois, a viver segundo as exigências destes valores o vosso compromisso e o vosso ideal agonístico, para serdes sempre na vida pessoas rectas, honestas e equilibradas, que incutem confiança e esperança.

3. O período litúrgico do Advento e a solenidade do Santo Natal oferecem-me, além disso, a grata oportunidade para vos desejar de coração a íntima alegria que provém desta sempre doce e comovente comemoração. É a alegria que nasce da certeza trazida por Jesus com o seu nascimento em Belém. O Natal diz-nos que estamos inseridos num desígnio de Providência, inteligente e amorosa, que requer a nossa fé e o nosso amor e que, através das tribulações da vida, nos faz sentir a saudade do Eterno, para o qual fomos criados!

Esta é a alegria que desejo a todos vós e aos vossos Entes queridos para o próximo Natal, ao mesmo tempo que de cotação vos concedo a propiciadora Bênção Apostólica, que sempre vos acompanhe.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


A UM GRUPO DE ESPECIALISTAS EM ÓPTICA


Domingo, 14 de Dezembro de 1980



Ilustres Senhores! Caros Irmãos!

É-me grato receber-vos, a vós que pertenceis à Federação Nacional "Ópticos-Optometristas da Itália, que juntamente com os Presidentes de muitas outras Nações, associados na "International Optometric and Optical League" e no "Groupement des Opticiens du Marché Commun Européen", quisestes prestar homenagem ao Vigário de Cristo.

Agradeço-vos esta visita, que me oferece ocasião para vos manifestar estima e encorajamento pelo serviço público que prestais no importante sector, em que trabalhais. Exprimo, em particular, a minha gratidão ao Senhor Cardeal Giovanni Colombo, por vos ter acompanhado, tão gentilmente, a este encontro.

1. Tomei conhecimento com prazer do Congresso que vos reuniu aqui em Roma, não só para a entrega de atestados de fidelidade ao trabalho, mas também e sobretudo para actualizardes e aperfeiçoardes os vossos conhecimentos técnicos, a fim de oferecerdes serviços e instrumentos ópticos cada vez mais em condições de corrigir defeitos do aparelho visual e, possivelmente, de os prevenir.

Estou certo que a consciência do bem inestimável, que a vista representa para o homem, vos dá estímulo para uma assistência àqueles que pedem a vossa intervenção cada vez mais qualificada e, ao mesmo tempo, vos serve de incentivo para uma relação humana que, para além dos aspectos meramente comerciais, toma bem em conta o profundo respeito devido a cada pessoa. Pensando neste grande dom, que o Senhor lhe deu, dotando-a de órgão tão admirável, diante do qual empalidecem até os mais perfeitos e requintados aparelhos excogitados pela ciência, vós dar-vos-eis certamente conta da delicadeza da vossa profissão e sabereis avaliar as consequências humanas e sociais da mesma. O olho e a vista, de facto, são bens tão preciosos que a linguagem popular comum fez deles quase um termo de suprema comparação. A Sagrada Escritura, aliás, não hesita em o colocar como parâmetro para considerações superiores: "Lanterna do corpo é o olho; se pois o teu olho é claro, todo o teu corpo estará na luz; mas se o teu olho é doente, todo o teu corpo será tenebroso" (Mt 6,22 cf. também Lc 11,34). Há até mesmo passagens bíblicas em que aos olhos é conferida uma luz profética: "Bem-aventurados os olhos que vêem o que vós vedes. Digo-vos que muitos profetas e reis desejaram ver o que vós vedes, mas não viram" (Lc 10,23).

2. Perante um valor tão excelente, como o da vista, vós certamente tereis o cuidado de unir a seriedade da vossa profissão com um profundo comportamento moral que vos fará evitar tudo o que possa prejudicar de qualquer modo a serenidade daqueles que depõem em vós a própria confiança. Não a atraiçoeis nunca, mas empenhai-vos sempre generosamente nesta delicadíssima forma de serviço, que é o vosso trabalho. E ao fazê-lo, inspirai-vos sempre no divino Operário de Nazaré, que nestes dias de Advento a Igreja se prepara para celebrar no mistério da Natividade.

3. Caríssimos Irmãos, ao confiar-vos estes pensamentos e estas exortações, dir-vos-ei, numa palavra, à maneira de conclusão: tende sempre tal sensibilidade cristã na vossa actividade; não desanimeis nas dificuldades que podereis encontrar e, sobretudo, imprimi no vosso serviço um cunho feito de nobreza de alma, que vos fará dar o primado às pessoas e não às coisas (cf. Encíclica Dives in Misericordia DM 11).

Ao mesmo tempo que invoco do Senhor, por intercessão de Santa Luzia, vossa celeste Padroeira, copiosas graças divinas, de bom grado concedo agora, a vós e aos vossos Entes queridos e colegas, a propiciadora Bênção Apostólica, em sinal da minha benevolência.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR SALOMON RAHATOKA


NOVO EMBAIXADOR DE MADAGÁSCAR


JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO


DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Segunda-feira, 15 de Dezembro de 1980



Senhor Embaixador

A presença de Vossa Excelência, nesta casa em que vos recebo com alegria, na qualidade de Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República Democrática de Madagáscar, é ocasião privilegiada para nos felicitarmos com os laços íntimos que unem a Santa Sé e a Grande Ilha, e desejo agradecer-vos as vossas palavras que sublinharam tão oportunamente toda a riqueza desses laços.

Comovidamente, ouvi-vos evocar a coragem dos cristãos malgaxes no século passado e pensava no exemplo que eles assim nos deixaram. Certamente, desde então, as condições do mundo, como as do vosso país, evolucionaram consideravelmente. Não deixa porém de ser verdade que o futuro da paz parece ameaçado, que os direitos do homem são postos em perigo aqui e acolá, que a compreensão, entre os países favorecidos e os que o são menos, é difícil. Esta situação requer de novo homens capazes de dar prova de determinação e coragem, e seguros de a dignidade do homem se encontrar primeiro na sua alma. Por isso desejo exprimir-vos a minha gratidão pelo quadro que esboçastes das actividades da Igreja no vosso país, em cujo progresso ela participa com toda a alma.

O que a Igreja tenta resolutamente levar a efeito é o serviço do homem completo. Esforça-se primeiramente em preservar e aperfeiçoar a sua intuição dos valores espirituais, componente tão notável da civilização malgaxe. Afirmará o seu sentido comunitário, fazendo conhecer ao homem, nos direitos de justiça social e internacional, a exigência, mais profunda ainda, de misericórdia, como eu lembrava na minha carta Dives in Misericordia.E ajudá-lo-á a fazer que nele cresça a paixão pela busca da verdade, mas também a da tolerância, qualidades que pertencem como coisa própria, poder-se-ia dizer, ao temperamento malgaxe. Eis o que procura Igreja católica, obra na qual colabora, de boa vontade, com as outras comunidades cristãs, como vós próprio sublinhastes. Este espírito, cada vez mais generalizado, deve permitir a todos os homens de boa vontade, no conjunto da nação, encontrarem-se a fim de promover de maneira construtiva e desinteressada a nova causa do homem.

Ao vosso povo toca responsabilidade especial no campo internacional, dada, entre todas as coisas, a sua própria situação no Oceano Índico. As relações que unem os povos uns aos outros mantêm-se demasiado delicadas, por causa opções diferentes e dos interesses económicos divergentes. A Santa Sé, por seu lado, aplica-se a impregnar umas e outros dos valores morais e espirituais necessários. Quer contribuir para servir os homens, não só nas suas carências materiais, mas também nas suas necessidades espirituais e na abertura delas para Deus. Não desprezará nenhum meio que possa promover este ideal, a que andaram ligadas todas as grandes civilizações e, com fidelidade particular, bem o sei, a do vosso querido país.

Tal é a parada do jogo que se aponta no coração da tarefa imensa que toca às nações e àqueles que receberam a missão de as guiar, tarefa temível em numerosos aspectos, e por isso peço-vos que transmitais a Sua Excelência o Senhor Didier Ratsiraka, Presidente da República Democrática de Madagáscar, os meus votos mais fervorosos em seu favor e no dos seus colaboradores, assim como no de todos os Malgaxes. Oxalá, com o auxilio de Deus, gozem da paz, avancem em segurança nos caminho do progresso, com solicitude da participação activa de cada um para poderem desempenhar no mundo um papel digno da civilização gloriosa de que proveio a nação malgaxe,

Quanto a vós, Senhor Embaixador, sabeis poder sempre contar com o melhor acolhimento junto da Santa Sé, a fim de serdes ajudado na vossa importante missão, para o bom êxito da qual tenho o gosto de vos dirigir os meus melhores votos.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO XXII CAPÍTULO GERAL


DOS MISSIONÁRIOS DE ÁFRICA


(PADRES BRANCOS)


Segunda-feira, 15 de Dezembro de 1980



1. Profundamente satisfeito por vos acolher no fim do vigésimo segundo Capítulo Geral da vossa Sociedade, dirijo uma saudação do fundo da alma a cada um de vós e aos 3.500 Padres e Irmãos que representais. Permiti-me que saúde especialmente o caro Padre Jean-Marie Vaseur que acaba de terminar o seu mandato como Superior-Geral, e que apresente ao seu sucessor, o Padre Robert Gay, que terminastes de eleger, os meus votos ardentes de frutoso serviço à vossa família missionária.

Se o grande cardeal Lavigerie, que vos fundou em 1878, pudesse voltar ao meio de vós, parece-me que vos repetiria com o mesmo ardor evangélico: «Sede apóstolos, e nada mais...». Esta recomendação, breve e contundente, é sempre de actualidade. Em nome da Igreja e fazendo-me eco do vosso fundador, digo-vos muito alto: «Sede apóstolos, e nada mais...». Foi aliás nesta perspectiva que o vosso Capítulo trabalhou. Os vossos espíritos e os vossos corações dão maior entrada às convicções do Cardeal, que desejava apóstolos de coração ardente e profundamente enraizados na vida espiritual. Sei, a respeito deste último ponto, do esforço realizado nos últimos seis anos pelo Conselho Geral. Empenhou-se em favorecer os exercícios inacianos e as sessões bíblicas mesmo em Jerusalém, para onde Lavigerie enviara os Padres Brancos em serviço das Igrejas do Próximo Oriente, onde os vossos irmãos trabalham com perspectiva ecuménica. Estes esforços refontalizadores dão e darão mais ainda às vossas comunidades dinamismo e transparência evangélica. A Igreja tanto necessita de apóstolos infatigáveis e habitados por Jesus Cristo!

2. Desde a fundação, é a vossa Sociedade um Instituto missionário; contribui com outros para a grande obra da evangelização dos povos que é «a missão essencial da Igreja» (Evangelii Nuntiandi EN 14). Podemos imaginar qual seria a felicidade do Cardeal Lavigerie, se tivesse conhecido os seus estudos e as experiências missionárias da nossa época, e também os documentos eclesiásticos que daí derivam, ao mesmo tempo como frutos saborosos e normas indispensáveis. Citemos apenas a Exortação Evangelii Nuntiandi que recorda precisamente que a evangelização é a vocação própria da Igreja (n. 14) e que «evangelizar, para a Igreja, é levar a Boa Nova a todos os meios da humanidade e, pelo seu influxo, transformar a partir de dentro, tornar nova a humanidade mesma...» (ib., 18). Oxalá esta Exortação continue a ser para vós carta e luz no vosso caminho. A vossa tarefa particular foi e permanece a evangelização do mundo Africano. Por este motivo, a vossa Sociedade sempre atribuiu atenção particular aos crentes do Islão. A Igreja alegra-se com isso e anima-vos a continuardes as tarefas que desempenhais com ciência ao serviço do mundo muçulmano; tarefas de diálogo e de testemunho, que serão tão importantes nos anos vindouros. Foi exactamente com este fim de todo pastoral que a Santa Sé vos confiou o «Pontíficio Instituto de Estudos Árabes», para permitir aos clérigos e aos leigos aperfeiçoarem-se na língua e na literatura árabe, assim como no conhecimento da religião islâmica e das suas instituições. A epopeia africana dos Padres Brancos é um facto. Importa relê-la, com grande compreensão das circunstâncias, que a viram nascer e desenvolver-se, e com respeito e reconhecimento para com os vossos predecessores. Eu mesmo, durante a minha viagem pastoral pela Africa, insisti em recolher-me ao lado do túmulo de antigos missionários em Kisangani no Zaire. As gerações de Padres Brancos que se deram de corpo e alma ao anúncio do Evangelho na África, estavam bem presentes nos meus passos e na minha oração. Permiti-me acrescentar ainda que, por todo este trabalho realizado durante mais de um século, a Igreja vos exprime publicamente as suas vivas felicitações e o seu reconhecimento.

3. Mas a vossa tarefa não está terminada. Precisamente, durante este vigésimo segundo Capítulo Geral, vós todos juntos dirigistes um olhar muito atento para as necessidades actuais e urgentes mesmo do continente africano, que afirma cada vez mais a sua identidade cultural e o seu desejo de crescimento no plano sócio-económico. Não podereis fazer o vosso trabalho de evangelizadores furtando-vos ao diálogo com os outros crentes, mas sim tomando em conta as necessidades, por vezes clamorosas, do desenvolvimento africano (cf. Evangelii Nuntiandi EN 21 ss.). Mas a vossa responsabilidade mantém-se, do mesmo modo, grande a respeito das Igrejas locais, que não têm ainda sacerdotes e animadores em número suficiente. Quantos Bispos dirigem A sé Apostólica de Roma apelos urgentes e comovedores. Mantende-vos ao lado destas jovens Igrejas e encontrai cada vez mais o vosso estilo de co-responsabilidade junto delas. Continuareis também a colaborar na acção exercida pelas dioceses da Europa — verifiquei isto durante as minhas visitas pastorais à. França e à Alemanha — em favor dos trabalhadores e dos estudantes africanos que vêm por algum tempo a este continente. Este olhar prolongado dirigido ao vosso campo de apostolado fez nascer, durante as semanas de estudo e oração do vosso Capítulo, um «projecto apostólico comum». Ides agora aplicá-lo com a seriedade e o dinamismo que vos caracterizam. Mas para preparar o futuro com realismo, esforçar-vos-eis evidentemente por formar evangelizadores. Desde sempre, se fixou a vossa Sociedade o objectivo de preparar as Igrejas locais da Africa a serem missionárias por sua vez. Vós ajudaste-las muito a tornarem-se autenticamente africanas, formando — pela vossa parte — um número impressionante dos seus sacerdotes e dos seus Bispos. Mas existem também africanos que desejam levar a Boa Nova a outros países diferentes dos próprios. Alguns até, hoje como ontem, desejam ser membros da vossa Sociedade Missionária. E uma boa sorte para o apostolado. Estes sacerdotes e estes irmãos africanos herdarão a vossa tradição missionária e poderão viver em comunidades que se tornarão cada vez mais inter-raciais ao mesmo tempo que internacionais.

4. Sois homens da Igreja, missionários e apóstolos. Nisto está a vossa identidade própria e a fonte da vossa alegria. Desejava ainda sublinhar que vós quisestes sempre, desde as origens da vossa Sociedade, viver a vossa vocação em comunidades que testemunham que os preconceitos de raça, de classe, de nação e de cultura podem ser ultrapassados em favor do Reino de Deus. E a partir disto que viveis a vossa consagração à Missão. É a partir disto que vós quereis continuar pelos caminhos de uma vida espiritual profunda em que os valores de pobreza, castidade e obediência reencontram todo o seu sentido, quer sejais padres quer irmãos. Manter e construir tais comunidades de Padres Brancos é objectivo prioritário da vossa Sociedade para os anos vindouros. Isto alegra profundamente o Papa, que vos anima de todo o coração. A Igreja e o mundo de hoje têm absolutamente necessidade destas comunidades em que a partilha e a comunhão não sejam só palavras, mas realidades vividas no dia-a-dia, com humildade e entusiasmo. E acaso necessário acrescentar que tais fraternidades serão, já só elas, apelos para os jovens e mesmo para adultos de todos os países, a fim de se inserirem nas vossas fileiras e virem a render as forças? Estou persuadido que o projecto, de colocarem a própria existência completa ao serviço exclusivo do Reino, é capaz de seduzir o coração dos jovens, hoje como ontem, e de os levar até à Africa para o trabalho de cooperação com as «Igrejas Irmãs», como gosto de lhes chamar. Libertemo-nos todos dos nossos estados de alma e das nossas reacções que tenham demasiado subjectivismo. Nenhuma Igreja poderia fechar-se sobre si mesma. É mais que nunca a hora da Missão. Para isto, não bastam as nossas mais belas resoluções. Temos grande necessidade, como nos primeiros dias da Igreja, das luzes e da força do Espírito Santo. Invocando estas graças para a vossa Sociedade, tenho o gosto de vos dar, a vós próprios e a todos os Padres Brancos que vivem e sofrem pelo Reino de Deus, em paciência e em esperança, na Africa e no mundo todo, a minha afectuosa Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR ANRAWAR SABRI ABDUL RAZZAK


NOVO EMBAIXADOR DO IRAQUE


JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO


DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Quinta-feira, 18 de Dezembro de 1980



Senhor Embaixador

É grande prazer dar as boas-vindas a Vossa Excelência como representante diplomático do seu nobre país. Estou certo que a sua boa vontade e o seu talento contribuirão para reforçar a amizade existente entre a República do Iraque e a Santa Sé. Agradeço os presentes que me trouxe da parte de Sua Excelência o Presidente Saddam Hussain e gostaria de pedir lhe transmita os meus sinceros votos pelo bem-estar próprio e pelo do povo iraqueano.

O favor que no momento presente peço mais fervorosamente a Deus para o seu povo, e para todos os povos da terra, é a graça da paz. A paz é graça fundamental e bênção que tudo abrange. Onde falta a paz, falta um elemento básico da felicidade humana e muitos outros elementos são diminuídos ou destruídos. É graça de tanto valor que devemos estar preparados para sacrifícios a fim de obtê-la ou preservá-la. Beneficia a todos e confere honra àqueles que a procuram, e todos têm o dever de trabalhar por ela com dignidade, mas também com constância e coragem.

Portanto, espero sinceramente que ambas as partes no conflito entre o Iraque e o Irão mostrem real boa vontade para encontrar uma solução baseada na justiça e no mútuo respeito. Insignes estadistas internacionais estão tentando iniciar tais negociações. Creio que serão vitoriosos nos seus esforços. Rezo a fim de que Deus lhes dê força e sabedoria, e prepare os corações de todos os que estão envolvidos no conflito para aceitarem a suprema bênção, que é a paz. Os povos dos dois países, os quais ambos me são caros, procedam de acordo com as palavras "Faz a paz entre irmãos e teme a Deus, que a misericórdia pode-te ser mostrada", e gozem eles a graça e a benevolência do Senhor omnisciente da humanidade.

Os católicos do vosso país estão prontos e preparados de todos os modos a desempenhar a sua parte como cidadãos, uma vez que não há nenhuma contradição entre ser cristão o ser membro leal da sua própria nação, se alguém pertence a uma nação árabe ou a qualquer outro país. Eles desejam contribuir com o melhor da sua capacidade para o progresso material e espiritual, em tempos difíceis para o Iraque bem como em circunstâncias favoráveis. Eu gostaria também de mencionar o valioso, realmente muitas vezes insubstituível, trabalho feito por religiosos e religiosas não-iraqueanos nas várias instituições católicas. Creio que eles serão capazes de continuar esse trabalho não somente para o bem dos seus irmãos cristãos e irmãs, mas também para os outros numerosos cidadãos iraqueanos.

Oxalá todo o povo do Iraque goze brevemente da paz e dos seus benefícios consequentes. Este é o desejo de toda a Igreja católica, que, como eu disse dirigindo-me à Assembleia Geral das Nações Unidas no ano passado, "em todo o lugar do mundo proclama uma mensagem de paz, reza pela paz e educa para a paz".

Evoco a graça divina também sobre Vossa Excelência e a sua própria missão, que possa efectivamente servir a causa da paz.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR CVIJETIN MIJATOVIC


PRESIDENTE DA REPÚBLICA SOCIALISTA


FEDERAL DA JUGOSLÁVIA


Quarta-feira, 19 de Dezembro de 1980



Senhor Presidente

1. Quereria começar por dizer a Vossa Excelência quanto aprecio a sua visita. Ela, dá-me ocasião de lhe apresentar as minhas saudações depois de ter sido eleito para o cargo elevado que desempenha agora, como Presidente da Presidência da República Socialista Federal da Jugoslávia. Lembro-me também do nosso primeiro encontro quando veio em representação da Jugoslávia para a cerimónia de inauguração do meu Pontificado.

Durante os últimos, anos, houve muitas ocasiões de contactos e conversações entre altos dignitários do seu país e da Santa Sé. Recordo a mais recente: o meu encontro com o Senhor Secretário Federal para os Negócios Estrangeiros, que hoje acompanha Vossa Excelência; realizou-se em Julho passado, logo a seguir ao meu regresso do Brasil. É natural, por outro lado, que a sua vinda, Senhor Presidente, reavive a lembrança de circunstância análoga à de hoje, a da recepção do Presidente Tito pelo Papa Paulo VI, há uma dezena de anos.

Essa visita marcou etapa importante na consolidação de relações mais frutuosas entre a Santa Sé e a Jugoslávia, que tinham sido normalizadas a nível diplomático alguns anos antes, e da mesma maneira na busca de relações leais entre a Igreja e o Estado. Estas, quando são fundadas no respeito da independência recíproca e dos direitos de cada um, não podem deixar de ser para proveito da sociedade civil como também da Igreja.

Tinha-se então podido confirmar publicamente que estava para o futuro ultrapassado um período inteiro, certamente não isento de dificuldades nas relações entre á Santa Sé e a Igreja católica na Jugoslávia, por um lado, e as Autoridades Civis, por outro. A vontade mútua de se empregarem em desenvolver positivamente a aproximação já conseguida devia, além do mais, servir para aprofundar um diálogo oportuno sobre problemas que dizem respeito à paz e à colaboração internacionais — às quais a Santa Sé e a Jugoslávia atribuíam e continuam a atribuir importância especial — e também às questões ligadas à presença activa da comunidade católica na Jugoslávia. Sobre este último ponto, a finalidade era assegurar cada vez melhor o espaço de legítima liberdade — sem privilégios —, de que a Igreja precisa para desempenhar o seu próprio ministério espiritual.

Penso que a maneira como as relações foram vividas, durante estes últimos anos, confirmou suficientemente as previsões e os desejos dos protagonistas do encontro. A sua visita hoje é sinal da determinação de continuar o caminho em que se entrou.

Aproveitando esta ocasião, desejaria portanto reafirmar a disponibilidade da Sé Apostólica para progredir na mesma direcção, estando ela bem consciente dos resultados positivos que podem dai derivar no futuro, graças ao esforço conjunto de homens que, animados de boa vontade, examinam juntos os diversos problemas para encontrar soluções adequadas.

2. É nesta perspectiva de uma acção particular em favor da paz e, ao mesmo tempo, do serviço inerente ao meu ministério apostólico, que é preciso considerar a iniciativa que julguei dever meu tomar no 1° de Setembro passado, enviando o documento sobre a liberdade de consciência e de religião, acompanhado de uma carta pessoal, a Vossa Excelência como aos outros Chefes de Estado dos países signatários do Acto final de Helsínquia, em vista da reunião sobre a segurança e a cooperação na Europa que se realiza actualmente em Madrid.


Discursos João Paulo II 1980 - 12 de Dezembro de 1980