Discursos João Paulo II 1981 - Segunda-feira, 5 de Outubro de 1981

3. Entre os vastos campos de acção do laicado cristão, a vossa Assembleia reteve três fundamentais: a família, o trabalho e a cultura.

Uma vez mais, vos agradeço a vossa escolha; exprime o vosso desejo de tornar vossas algumas das preocupações maiores do meu pontificado, de as tomar em conta e de as concretizar.

A família, o trabalho e a cultura são três eixos essenciais à volta dos quais se tece a vida do homem, se realiza a sua humanidade, se constrói a sua personalidade cristã de filho de Deus, irmão dos seus semelhantes e senhor da criação. São lugares universais, determinantes para o desenvolvimento integral do homem e do contributo original do Evangelho para a vida social; são lugares que incitam.

Compreendereis que não me é possível, aqui, falar em pormenor das imensas possibilidades deles, nem dos problemas e desafios que eles apresentam.

Mas desejaria recordar-vos a importância — de que vós sois sem qualquer dúvida conscientes — da opção preferencial dada pelo magistério pontifício e pelo magistério episcopal em favor da família, lugar original do homem, célula de base da sociedade, berço da civilização, comunidade chamada a ser Igreja doméstica. E desejaria além disso recomendar-vos que fosseis também recolher abundantemente da herança tão rica que nos deixou o recente Sínodo dos Bispos. Sabei que foi, por considerar o carácter prioritário da pastoral familiar, que senti a necessidade de criar o Pontifício Conselho para a Família que, sem qualquer dúvida, poderá contar com a colaboração activa do vosso Dicastério.'

A respeito de todas as questões que se referem ao trabalho, permito-sue enviar-vos para a minha recente encíclica Laborem exercens.Por outro lado, como o indica o vosso programa, o seu conteúdo subentende os vossos trabalhos. Os assuntos que ela trata revestem para mim hoje grande importância. Por isso animo-vos não só a estudá-la atentamente, mas a pó-la em execução, porque a sua fecundidade é sustentada e será prolongada pelo compromisso eclesial e cristão dos leigos no mundo do trabalho. Abri os olhos e vede: os tempos estão maduros para o Evangelho produzir cada vez mais frutos nos diversos sectores do mundo do trabalho e nos movimentos de trabalhadores, ao passo que estão em crise as sociedades de todos os géneros que se ocupam da organização do trabalho e se baseiam no materialismo e no "economismo", e aparecem ilusórias as utopias de salvação que não respeitam as virtualidades e todas as dimensões da humanidade.

Convido-vos também a contribuir com todas as vossas forças para a renovação da cultura que, sendo expressão do homem integral, deve estar ao seu serviço, enraizada nas melhores tradições dos povos e das nações, aberta à transcendência e baseada tanto nos costumes populares como nas mais nobres realizações científicas e técnicas. Só esta renovação será capaz de dar novo sentido à vida humana, de levar a que nasçam novos projectos e novas esperanças nos planos pessoal e colectivo, e de levar a novos amanhãs mais dignos do homem.

E agora, a vós todos aqui presentes, às vossas famílias e, por meio de vós, a todos os leigos que asseguram múltiplas formas de presença na Igreja e no mundo, concedo, com toda a minha afeição paternal e fraternal, a minha Bênção Apostólica.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DO GÂMBIA, LIBÉRIA E SERRA LEOA


EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM»


Palácio Apostólico de Castel Gandolfo

Segunda-feira, 5 de Outubro de 1981



Caros Irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo

1. Constituístes-vos em Conferência Episcopal Interterritorial conjunta —do Gâmbia, da Libéria e da Serra Leoa, e como tal vos reunistes hoje aqui. Mediante esta união entre vós encontrais amparo fraterno, enfrentais problemas comuns e procurais meios efectivos para anunciar o Evangelho de Cristo. Além de tudo isto, em ocasiões como a presente, estais em condições de viver o mistério da unidade da Igreja, tão plenamente quanto possível, entre vós próprios: Ecce quam bonum et guam jucundum habitare fratres in unum (Sl 132/133, 1).

2. Estas mesmas vantagens aplicam-se de modo diferente à vossa visita ad Limina. Aqui, vós e as vossas comunidades eclesiais locais encontrais o conforto da Igreja universal. Aqui ficais certos do pessoal interesse e solicitude do Bispo de Roma, que vos testemunha o amor que a Igreja inteira nutre por vós. Aqui a Santa Sé esforça-se por partilhar convosco o peso do vosso cargo e os vossos problemas comuns; aqui procurais e recebeis no meio de irmãos a solidariedade e o apoio necessários para cumprirdes a vossa missão de proclamar Cristo. A este respeito, a Sagrada Congregação para a Evangelização dos Povos, e todos os que ao longo do mundo se lhe associam na colaboração pelas missões, asseguram-vos as suas orações, a sua estima e o seu desejo de vos assistis.

3. Como Bispos, viestes a Roma para invocar os santos Apóstolos Pedro e Paulo, e para encontrar fortaleza junto dos seus túmulos. Com eles, é oportuno dirigir-se imediatamente para Jesus. Com Pedro confessais a Jesus e perante o mundo; "Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo" (Mt 16,16). E com Paulo reiterais a vossa profunda convicção de que Jesus é para todos nós "a nossa sabedoria, a nossa justiça, a nossa santificação e redenção" (1Co 1,30).

Esta convicção sobre Cristo justifica todo o vosso ministério e todos os vossos esforços para levar o seu nome ao vosso povo. Justifica o vosso desejo de pregar o seu Evangelho de salvação. A vossa fé no Filho de Deus ampara-vos no trabalho requerido para reunir o vosso povo, mediante as palavras e os sacramentos, numa família eclesial, numa comunidade. Dado que vós próprios aceitastes o mistério escondido durante séculos e revelado em Cristo, sois incitados a comunicar Cristo aos outros, proclamando o conteúdo da sua revelação como o grande contributo original da Cristandade.

4. Como Jesus é a nossa redenção e o nosso tudo, o vosso ministério está colocado sob o sinal da esperança. Esperais na palavra de Deus; confiais nas suas promessas. Confiais na sua ajuda cada dia, como fizeram os missionários que vos precederam. Os vossos sentimentos são certamente idênticos aos do Apóstolo Paulo: "Se nos afadigamos e recebemos ultrajes, é porque pusemos a nossa esperança em Deus vivo" (1Tm 4,10). Com esta esperança apostólica, caros Irmãos, prossegui fervorosamente nas vossas tarefas pastorais. Proclamai incessantemente o mistério de Cristo e da sua Igreja, segundo os elevados ensinamentos do Concílio Vaticano II, e em fidelidade a todas as suas directrizes.

Continuai o vosso ministério de formar Cristo nas jovens gerações e de lhes apresentar o desafio completo do seu Sermão da Montanha. Deus recompensar-vos-á certamente, como também a todos os que trabalharam convosco na promoção das escolas Católicas e os muitos serviços que estas escolas prestam à comunidade Católica e à sociedade em geral.

Não deixeis de apresentar o ensinamento de Cristo sobre a justiça e o amor fraterno a todos os homens e mulheres de boa vontade, de todos os níveis da sociedade. Se assim fizerdes, promovereis a harmonia e o bem-estar das próprias nações de que fazeis parte.

5. De modo muito especial continuai a exercer o vosso zelo pastoral na promoção de vocações religiosas e sacerdotais para Cristo. "Confiai-Lhe todas as vossas preocupações" (1P 5,7), e rogai "ao Senhor da messe que envie trabalhadores para a Sua messe" (Mt 9,38). Apelai para o vosso povo, a fim de compreender quanto elas são vitalmente necessárias para a comunidade, e quanto importante é o contributo da família cristã na promoção das vocações eclesiásticas. Pedi ao vosso povo a oração e o sacrifício que Deus deseja da comunidade para que os jovens possam receber a graça de perseverar com amor puro e generoso no seguimento de Cristo. Pedi especialmente aos doentes e aos enfermos que ofereçam os seus sofrimentos, em união com os do Salvador, por esta santa intenção.

6. Mediante um esforço pastoral combinado, tendes agora um seminário interterritorial no Vicariato Apostólico da Monróvia. Esta comum iniciativa apostólica merece o vosso contínuo interesse e toda a vossa atenção pessoal — a vossa atenção individual e colectiva. O Seminário é de capital importância para a vida da comunidade cristã e para o futuro do povo de Deus. No seminário, a palavra de Deus deve ser autenticamente vivida e fielmente transmitida na sua integridade, em obediência ao mandato de Cristo e para o bem-estar de todas as gerações futuras do vosso povo. Fidelidade em transmitir a fé e deligência em formar os seminaristas são actividades pastorais de suprema importância para os Bispos; são expressões de profundo amor pastoral. Sim, foi com grande discernimento que o Concílio Vaticano II se referiu aos seminários como "o coração da diocese" (Optatam Totius OT 5).

Muito dilectos Irmãos, nesta visita ad Limina, com todo o vosso coração, renovai a vossa confiança em Jesus Cristo e no seu Espírito Santo. No poder do Espírito Santo, a palavra de Deus foi semeada, cresceu e já produziu uma rica messe para o Reino de Deus. Entre provas e dificuldades, o Espírito Santo amparou os vossos predecessores, amparou-vos a vós próprios e o vosso clero. Ele continuará a estar convosco e em vós, e a trabalhar mediante vós. Quero agora pedir-vos que leveis a minha Bênção Apostólica a todo o vosso povo. Em particular peço-vos transmitais aos vossos sacerdotes, religiosos e outros colaboradores no Evangelho a mensagem de esperança, cristã que celebrámos juntos em Roma: "Se nos afadigamos e recebemos ultrajes, é porque pusemos a nossa esperança em Deus vivo" (1Tm 4,10).

E enquanto o Senhor não chega em glória, Maria, esposa fiel do Espírito Santo, seja para o povo peregrino de Deus nas vossas amadas terras "sinal de esperança segura e de consolação" (Lumen Gentium LG 68). Oxalá a Mãe de Jesus acompanhe todos vós com o seu amor maternal.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NA SESSÃO PLENÁRIA


DA COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL


Palácio Apostólico de Castel Gandolfo

Terça-feira, 6 de Outubro de 1981



1. Apraz-me o mais possível saudar-vos, membros da Comissão Teológica Internacional, em primeiro lugar o Presidente da mesma, Cardeal Franjo Seper, e os outros vogais da Sagrada Congregação para a doutrina da fé. Reunis-vos aqui de todos os continentes, de vários centros de cultura, das regiões de tantas línguas e de muitas matérias da ciência teológica. Em vós saúdo, por conseguinte, cada teólogo católico, onde quer que trabalhe pelo bem espiritual da Igreja.

2. O meu venerando Predecessor, o Sumo Pontífice Paulo VI, instituiu no ano de 1969 a Comissão Teológica Internacional, depois de os Padres do Sínodo extraordinário dos Bispos, celebrado dois anos antes, exprimirem este desejo. O encargo da Comissão consiste em "prestar auxílio à Santa Sé, especialmente... à Sagrada Congregação (para a Doutrina la Fé) e em ponderar as questões doutrinais de maior importância" (cf. Estatutos da Comissão, em: Acta Apostolicae Sedis 61, 1969, 540, n. 1). Nestes dois quinquénios passados, a Comissão Teológica de muitos e vários modos cumpriu, feliz e utilmente, esse propósito, conforme consta de muitos documentos de grande importância até agora publicados. Como sei, foi prestado grande auxílio não só ao Romano Pontífice, à Sagrada Congregação para a doutrina da fé e a outros dicastérios da Cúria Romana, mas também às conferências dos Bispos e aos progressos da teologia. Tal ministério nestes tempos difíceis era absolutamente necessário para novas questões e para sentenças diversas e ajudou a que uma só fé numa só Igreja se alimentasse e fortificasse. Por isso, o encargo da Comissão Teológica aumenta sempre e repito as palavras da minha alocução no dia 16 do mês de Outubro do ano de 1979 aos membros desta Comissão: que a ela "muito a aprovamos e estimamos, e dela muito esperamos" (cf. Acta Apostolicae Sedis 71, 1979, 1429).

3. Neste encargo muito deveis servir e ser úteis à boa e frutuosa relação entre o Magistério e a teologia. Por isso seja-me lícito recordar aquilo que o ano passado, na viagem pastoral pela Alemanha, no dia 18 do mês de Novembro, disse aos professores de sagrada teologia em Altötting: "A teologia é uma ciência com todas as possibilidades do saber humano. É ela livre na aplicação dos seus métodos e análises. Com a mesma razão deve a teologia considerar a sua relação para com a fé da Igreja. Não é a nós que devemos a fé; ela está, antes, 'edificada sobre o fundamento dos Apóstolos e Profetas, a pedra angular é o próprio Cristo' (Ep 2,20). Também a teologia deve pressupor a fé. Pode ela ilustrá-la e fomentá-la, mas não a pode gerar. Também a teologia tem como fundamento a fé dos Padres... O amor para com a Igreja concreta, que inclui também a fidelidade ao testemunho da fé e ao Magistério eclesiástico, não aparta o teólogo do seu trabalho e não tira a este nada da sua inalienável autonomia. Magistério e teologia têm cada qual o seu papel diferente. É por isto também que não se podem reduzir um ao outro. Todavia, servem ambos ao mesmo todo. É precisamente com esta estrutura que devem ficar sempre em diálogo" (Discurso de João Paulo II aos Professores de Teologia, em Altõtting, 18 de Novembro de 1980).

Isto vale particularmente para os encargos da Comissão Teológica Internacional, que tão inteiramente comunica as solicitudes do Pastor supremo da Igreja, da Cúria Romana e também dos Bispos dispersos pelo mundo.

4. Soube também que vós, nesta sessão plenária, de novo examinais questões selectas de Cristologia. No primeiro encontro, a Comissão Teológica Internacional, prestando auxílio na apreciação das actuais discussões e na mais profunda inteligência da fé da Igreja, constituiu e espero continue a dar frutos deste trabalho, que sejam dignos dos estudos até agora levados a termo pela Comissão. Neste assunto, activamente fomento eu três desejos, que me apraz comunicar-vos muito brevemente.

A) Jesus Cristo é a imagem de Deus; n'Ele tudo foi criado no céu e na terra (cf. 2Co 4,4 Col 1,15). Na face de Jesus Cristo brilha o esplendor de Deus Pai, invisível. Portanto Jesus Cristo é mais que profeta. Tem singular comunhão com o Pai. Só estamos remidos se Jesus Cristo pode comunicar na Sua pessoa a vida divina. Por isso cremos no Filho de Deus, "Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado e não criado, consubstancial ao Pai pelo qual tudo foi feito". Nesta profissão da fé consiste a medula da religião cristã.

B) Esta fé cristã depende do Novo Testamento e da tradição viva da Igreja, conforme se manifesta nos concílios ecuménicos dos primeiros séculos. A evocação este ano do Concílio Constantinopolitano Primeiro recordava que os verdadeiros cristãos se unem pelo vínculo da Sagrada Escritura e por esta "concordância cinco vezes secular", como se diz. A actividade teológica mais do que antes deve ajudar aquele património e o testemunho da Igreja primitiva. Não descureis esta energia espiritual nas discussões de hoje, principalmente nas ecuménicas.

Muitas declarações e numerosos actos, ao celebrar-se a sobredita, comemoração entre cristãos separados, fomentaram grande esperança de maior unidade.

C) A reflexão cristológica, por último, oferece a Deus trino louvor e agradecimentos pela Sua bondade infinita, mas encerra também significação antropológica. Refiro-me à notabilíssima e célebre frase na. Constituição pastoral Gaudium et spes (Art. 22: AAS 58, 1966, p. 1042): "Cristo, novo Adão,... revela o homem a si mesmo e descobre a sua vocação sublime". Nas Cartas Encíclicas Redemptor hominis e Dives in misericordia procurei explicar este pensamento segundo as angústias e as expectativas dos homens. Neste campo encerram-se enormes tarefas para a teologia de hoje. Por isso alegrei-me ao ouvir que desejais no futuro tratar o argumento "Da dignidade da pessoa humana". Reparai na ligação íntima dos vossos estudos!

5. Transmito-vos agradecimentos pelo trabalho até agora executado, primeiramente sob a direcção do Eminentíssimo Cardeal Presidente Seper, e do Secretário-Geral, o Protonotário Apostólico Professor Philippe Delhaye, que juntamente com muitos outros de vós, suportam há mais de dez anos o peso do trabalho. Manifesto também francamente a minha gratidão ao vosso Secretário Técnico, Pierre Jarry, devido ao cuidadoso desempenho dos seus deveres. Para o terceiro quinquénio agora começado, desejo-vos da parte de Deus todas as venturas e felicidades. Abraçando-vos com sincera caridade, peço instantemente ao Senhor, por intercessão da Bem-aventurada Virgem Maria, que vos esteja sempre presente com os dons do Espírito, vos fortifique e vos leve a mais alto conhecimento das suas riquezas. Confirme estes votos a Bênção Apostólica, que de todo o coração a vós todos concedo.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À PEREGRINAÇÃO DA CIDADE DE ÁVILA


POR OCASIÃO DAS CELEBRAÇÕES


DO IV CENTENÁRIO DA MORTE


DE SANTA TERESA DE JESUS


Sala dos Suíços

Palácio Apostólico de Castel Gandolfo

Quinta-feira, 8 de Outubro de 1981



Querido Irmão no Episcopado,
Senhor Presidente da Câmara Municipal,
Conselheiros Municipais e habitantes de Ávila,
concidadãos de Santa Teresa de Jesus

Sinto profunda satisfação ao receber hoje este vosso numeroso grupo que representa espiritualmente todos os habitantes de Ávila, cidade que teve a ventura de ser berço de uma das maiores figuras da história eclesial.

Este encontro realiza-se precisamente por ocasião do IV Centenário de Santa Teresa de Jesus, que está para ser inaugurado em Alba, de Tormes e em Ávila, nessas duas cidades tão intimamente ligadas à grande reformadora do Carmelo, por origem e por conservarem os seus restos mortais.

Agradeço-vos esta visita, que representa, de algum modo, um primeiro marco nas celebrações centenárias com a participação do Papa, a quem as conhecidas circunstâncias não permitiram estar convosco nos próximos dias, mas que renova os seus votos por que a Providência lhe proporcione, num futuro não longínquo, outro momento propício.

Entretanto, o meu Enviado Especial, Cardeal Ballestrero, tornará mais viva a minha presença nas celebrações inaugurais do Centenário, que a Jerarquia eclesiástica tem estado a preparar com iniciativas oportunas, a fim de que seja verdadeiramente, em toda a Espanha, um ano de renovação na fé, na esperança, na interioridade religiosa do povo fiel, no testemunho de vida cristã no actual momento histórico da vossa Pátria, no coerente comportamento individual, familiar e social do católico espanhol, sem presunções, nem falsos complexos, como membro da comunidade política e da Igreja.

É necessário que o rico património deixado por Teresa de Jesus seja plenamente meditado e inspire uma profunda renovação na experiência interior do povo, a fim de que deste modo revigore toda a vida eclesial, nas suas múltiplas manifestações.

A figura gigantesca, não só local ou nacional mas também universal, da Grande Teresa deve ser forte estímulo nesse sentido. A isto convida o nome que ela escolheu como configuração de si mesma, Teresa de Jesus, com o qual a conheceu a história de quatro séculos, no campo eclesial e cultural, na piedade, na teologia espiritual e na arte.

Por isso presto com muito prazer esta homenagem a esta Santa a quem, juntamente com São João da Cruz, me sinto particularmente vinculado, a qual, com razão, o meu predecessor Paulo VI declarou, em 1970, como a primeira mulher Doutora da Igreja, em reconhecimento dos seus singulares méritos e significado

Serdes concidadãos ou compatriotas de Teresa de Jesus é timbre de glória, mas é também compromisso tomado para vos inspirardes nela, nos seus ensinamentos e exemplo, a fim de serdes fiéis à sua dádiva universal, num empenho de vos tornardes cada vez melhores cidadãos e melhores filhos da Igreja.

Assegurando-vos que me recordarei assiduamente de vós na oração, para que este ano Centenário produza os frutos espirituais desejados, dou-vos com benevolência a Bênção Apostólica, extensiva a todos os habitantes de Ávila.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DA TANZÂNIA EM VISITA


«AD LIMINA APOSTOLORUM»


Palácio de Castel Gandolfo

Sexta-feira, 9 de Outubro de 1981



Caros Irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo

1. Depois de um longo período de convalescença, é uma grande alegria para mim voltar uma vez mais entre os meus Irmãos no Episcopado. Foi-me especialmente agradável recomeçar a receber as visitas ad limina principiando, a semana passada, com o primeiro grupo de Bispos da Tanzânia, e em particular com o Cardeal Rugambwa. Durante a minha visita a África tive ocasião de exprimir publicamente a profunda estima que nutro por ele, recordando o seu longo e fiel serviço como Bispo e as suas duas décadas como Cardeal. E com profundo afecto em Cristo Jesus, dou-vos hoje as boas-vindas, e dirijo-vos as minhas palavras de fraternal conforto, como também a toda a Hierarquia do vosso país. Aproveito igualmente esta ocasião para enviar as minhas respeitosas e cordiais saudações a Sua Excelência o Presidente da República.

2. Como zelantes pastores do rebanho viestes a Roma para oferecer as vossas Igrejas locais a Jesus Cristo — para lhas oferecer em união católica. Viestes para confiar o destino do vosso povo "Àquele que nos ama e que com o Seu sangue nos lavou dos nossos pecados" (Ap 1,5). Vós compartilhais as alegrias e as fadigas, as esperanças e as aspirações de milhares de pessoas e numerosas comunidades eclesiais. Estai certos, caros irmãos, que a vossa oferta é grata ao Senhor, que está para sempre com a sua esposa, a Igreja.

3. Ao mesmo tempo, viestes renovar a vossa dedicação como Bispos. Ao fazê-lo vós, quero dizer-vos que vos estou unido na oração. Como Bispo de Roma, vosso irmão e companheiro no serviço do Evangelho, desejo proclamar a grande tarefa pastoral que vos cabe, a vossa elevada dignidade como líderes do povo de Deus. Desejo elogiar todos os esforços conjuntos que fizestes e fazeis à imitação de Jesus o Bom Pastor. Desejo do mesmo modo encorajar-vos a continuar resolutamente a enfrentar os problemas pastorais de cada dia, procurando juntos soluções realistas, em concordância com a realidade da palavra de Deus e o seu poder omnipotente, sabendo perfeitamente que " o que é impossível aos homens, é possível a Deus" (Lc 18,27). Jesus mesmo estabeleceu as normas para o nosso povo; concede a graça. Ela torna-nos capazes de oferecer o seu ensinamento em plenitude, aguardando pacientemente que ele toque os corações humanos e produza boa colheita. Certamente devemos estar convencidos de que ele é "aquele que, pela virtude que opera em nós, pode fazer infinitamente mais do que tudo quanto podemos ou entendemos" (Ep 3,20). Para nós, a omissão consiste em duvidar no poder infinito da graça de Cristo.

4. É claro que devemos defender as nossas prioridades evangélicas: aqueles valores essenciais que afectam a própria vida das comunidades cristãs. Em particular, quereria pedir-vos continueis a fazer todos os esforços para promover o ensinamento da catequese, a educação religiosa e a formação adequada dos vossos seminaristas. Como Bispos, mostrai o vosso interesse pastoral pelos vossos sacerdotes e dai a todos eles a expressão do vosso amor fraterno, de modo que eles, por seu lado, sejam realmente instrumentos no ministério da salvação.

5. Em todas as coisas que fizerdes, mantende a vossa visão da Igreja como comunidade reunida em Cristo, comunhão edificada pela sua santa palavra, alimentada pelo seu corpo e pelo seu sangue, e amada pelo seu Pai que está no céu. As Igrejas locais a que vós consagrais as vossas vidas são as comunidades do vosso amado povo — povo peregrino de Deus que forma o seu Corpo Místico e procura viver a sua vicia mesma segundo os costumes das suas próprias culturas — purificadas e elevadas pelo Evangelho salvífico de Jesus — e no meio dos acontecimentos da vida quotidiana. Era este o meu pensamento o ano passado, quando me dirigi aos Bispos reunidos em Nairobi, e disse: "Respeitando e favorecendo os valores próprios e a rica herança cultural do vosso povo, vós sereis capazes de guiá-lo para uma melhor compreensão do mistério de Cristo, que deve ser vivido nas nobres, concretas e quotidianas experiências da vida africana. Não se trata de adulterar a palavra de Deus ou de esvaziar do seu poder a Cruz de Cristo (cf. 1Co 1,17), mas antes de levar Cristo precisamente ao coração da vida africana e de erguer até Cristo a vida africana inteira. Assim não só é o Cristianismo importante para a África, mas o próprio Cristo nos membros do Seu Corpo africano" (7 de Maio de 1980).

Administrar o Corpo de Cristo, conduzir o vosso povo à plena maturidade em Cristo — esta é a vossa vocação como Bispos. Sim, este é o vosso ministério: erguer toda a vida africana até Cristo, que nos seus membros se torna Ele próprio africano, e continua na sua Igreja a proclamar o Evangelho que purifica e eleva, que liberta e salva.

6. O critério do vosso ministério efectivo — o vosso ministério episcopal efectivo — é absoluta fidelidade a Jesus Cristo e à sua palavra. Devemos plantar e regar; Deus mesmo dará o aumento e fará crescer a semente da sua palavra no tempo oportuno. Ele pede a nossa confiança, a nossa obediência na pregação da sua mensagem, a nossa paciência em esperar a colheita abundante da salvação. Certamente viestes a Roma trazendo no coração as esperanças das vossas comunidades eclesiais e as aspirações de todo o vosso povo. Hoje, como pastores, vós e eu oferecemos tudo isto a Jesus Cristo, mediante o Coração Imaculado de Maria.

7. Oxalá estejais sempre junto dos vossos sacerdotes, amparando-os com generosidade e fervor, e assegurando-lhes que o Papa os ama e os solicita a oferecerem-se plenamente pelo rebanho. Aos irmãos e irmãs religiosos dirijo a expressão da minha gratidão pela sua consagração ao Reino e pelo serviço que amorosamente prestam no nome de Jesus. Dizei aos seminaristas que Cristo tem necessidade deles e conta com a colaboração e a perseverança deles. Assegurai às famílias cristãs que a sua vocação é abençoada por Deus e que a fidelidade delas presta imensa glória à graça de Jesus Cristo. E perante todo o povo de Deus confirmai o mandamento de Cristo em toda a sua plenitude: "Sede, pois, perfeitos, como é perfeito vosso Pai celeste" (Mt 5,48). Este é verdadeiramente o vosso ministério como Bispos, servos do Evangelho de Cristo, escolhidos para pastores da Igreja "adquirida por Ele com o seu próprio sangue" (Ac 20,28).

Caros Irmãos Bispos, louvemos juntos Jesus Cristo, que nos chamou para oferecermos as nossas vidas pelos nossos irmãos e irmãs, "para que tenham a vida e a tenham em abundância" (Jn 10,10). A ele renovamos a oblação das nossas vidas; a ele oferecemos e consagramos a santa Igreja de Deus. Louvado seja Jesus Cristo!



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DO CONSELHO


DA SECRETARIA DO SÍNODO DOS BISPOS


Palácio Apostólico de Castel Gandolfo

Sábado,10 de Outubro de 1981



Veneráveis Irmãos no Episcopado

1. Intensamente me alegro de novo por ver-vos aqui e pelo encontro que tivestes, pois formais o Conselho Geral do Sínodo dos Bispos, vós que estais nestes dias em Roma para estabelecer cada um dos assuntos e o próprio documento de consulta (lineamenta) daquele tema que será tratado no ano de 83 na Sexta Reunião do Sínodo dos Bispos. Muito me regozijo também porque, segundo a discussão do ano passado no Sínodo, e segundo as proposições e opiniões recebidas das Conferências Episcopais e dos organismos da Sé Apostólica, propusestes muito acertadamente para o próximo Sínodo este tema: "A reconciliação e a penitência na Missão da Igreja".

2. Confesso-vos que este mesmo tema não só me agrada plenamente mas despertou também, entre os Bispos e os Sacerdotes da Igreja inteira, grande interesse, e atraiu os espíritos dos fiéis para esta matéria pastoral, que sobretudo neste tempo mostra a maior das importâncias. Na verdade, a reconciliação e a penitência constituem por si uma parte absolutamente necessária, quase diríamos principal, da mensagem da salvação trazida ao mundo por Cristo, Senhor; por isso encerram também elementos primários da vida cristã em si e dos costumes católicos.

3. Assim, desde os princípios da sua pregação costumava Cristo inculcar a necessidade da penitência e tudo fazia para os homens entenderem na justa medida, como fundamento da Sua doutrina e da maneira de se proceder na terra, estar a reconciliação de todo o género humano com Deus Pai e depois dos homens entre si. Tomou Jesus e fez próprios os mandamentos do Antigo Testamento sobre o amor infinito do Pai, que vence todo o pecado. E ao mesmo tempo perdoou Ele próprio aos homens os delitos e assim esclareceu aquele desejo profundo — que nenhum homem deixa de cultivar —, o desejo da reconciliação com Deus e com os próprios irmãos. Sofrendo até ao último grau a cruz salvadora, mostrou a plena justiça de Deus e até certo ponto a Sua mais plena misericórdia. Cristo ensinou-nos portanto uma vez para sempre de que modo podemos conseguir e praticar a misericórdia, e de que modo também podemos vencer a discordância, a inveja e o amor próprio, a fim de nos aplicarmos livremente e com toda a energia a refazer um mundo mais justo e mais humano.

4. Cristo, porém, mestre da penitência e autor da reconciliação, não só com os Seus exemplos e palavras imprimiu estes princípios de vida, mas continua ainda agora a incuti-los e ensiná-los pelo Seu Espírito activo na Igreja, e finalmente por meio de nós pastores, substituídos em vez dos Apóstolos, levando o Povo de Deus por caminho seguro e patente. E a Igreja, nossa mãe, que tanto amamos, serve ao seu Senhor sem interrupção e concede a indulgência d'Ele aos homens, com a graça de Deus que deve repartir mediante o ministério da palavra e os sacramentos da salvação: em especial a Eucaristia e a Penitência. Por sua vez, nós, também pecadores, conservamos com a maior diligência estes tesouros da doutrina evangélica e da graça sobrenatural, quando em nome do Senhor os comunicamos aos nossos irmãos e irmãs.

5. Este é deveras aquele "sinal de caridade", a que se referiram o Venerável Irmão Nosso Cardeal Zoungrana, e o Secretário dá Sínodo, o Venerável Irmão Jozef Tomko — intérpretes fiéis do vosso pensar — quando enviaram da Sala do Sínodo, no dia 7 deste mês, o prezadíssimo telegrama, que recebi com a maior alegria. Agradeço a cada um de vós a manifestação de tanta fidelidade e tanta prontidão em redigir o plano para uso do próximo Sínodo. Sei que vós pensais unicamente na vontade de Jesus Cristo, na comunidade da Igreja universal, na utilidade de todos os fiéis, na prosperidade da verdadeira renovação conciliar, também quando hoje dais a última demão às vossas consultas e deliberações sobre o argumento proposto da penitência e da reconciliação na missão da Igreja.

6. Pois desse Sínodo pode certíssimamente nascer uma nova e mais profunda consciência, entre os baptizados, daquela ofensa, que fazemos ao nosso baptismo ao pecar, e daquela perpétua indulgência e misericórdia divina, de que sempre necessitamos para ser fiéis à nossa vocação cristã na terra. Mas também fora da Igreja muito pode aproveitar a todos os homens esta salvadora mensagem do perdão e da reconciliação fraterna, mensagem que será de novo explicada, desenvolvida e pronunciada pelo Sínodo dos Bispos no ano de 1983, sob a vossa direcção. Porque as angústias do nosso tempo e os erros mesmos das almas, e mais ainda as dúvidas e os desesperos muito serão aliviados e diminuídos, se as pessoas recuperarem a verdadeira liberdade de espírito, se reconhecerem a própria natureza inclinada para o mal e simultaneamente vierem de Deus misericordioso a esperança certa, a luz e a salvação.

7. Tratastes, pois, estes pontos, Veneráveis Irmãos no Episcopado; e preparastes nesta semana um plano notável de trabalho teológico e pastoral, que espera ser aperfeiçoado a seu tempo pela Sexta Reunião do Sínodo dos Bispos. O mais possível estimo, de facto, a cuidadosa diligência e constante solicitude nestes vossos encontros, para não falar da quase diária actividade da Secretaria mesma do Sínodo, cuja missão é tudo limar e levar a termo para melhor utilização por parte do Sínodo. Sobre vós e os vossos trabalhos louvavelmente conduzidos a termo, derramo a Bênção Apostólica que pedistes confiadamente, para que os frutos destes trabalhos cheguem abundantíssimos à maturidade no presente e como tais venham a ser recolhidos no tempo vindouro do mesmo Sínodo. Felicito-vos pelo que fizestes e aconselho-vos a que, recebendo o auxilio de Maria Mãe da Igreja, continueis a trabalhar, a fim de que o próximo Sínodo seja devidamente preparado, a comunidade da Igreja receba eficaz auxílio, e todo o género humano encontre abundante alegria.




Discursos João Paulo II 1981 - Segunda-feira, 5 de Outubro de 1981