Discursos João Paulo II 1981 - Sábado,10 de Outubro de 1981

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NOS «JOGOS DA JUVENTUDE»


Sala dos Suíços do Palácio de Castel Gandolfo

Domingo, 11 de Outubro de 1981



Queridos rapazes e jovens desportistas!

1. Tenho o prazer de vos receber e saudar cordialmente, juntamente com os Dirigentes da Comissão Olímpica Nacional Italiana, os quais, no término da manifestação nacional dos "Jogos da Juventude", vos acompanharam para vos dar a possibilidade de exprimir aqui, em nome também dos vossos colegas pertencentes a todas as regiões da Itália, os sentimentos da vossa fé cristã e da vossa alegria juvenil. Dirijo o meu vivo agradecimento ao Doutor Franco Carraro, vosso dedicado Presidente, pelas amáveis palavras com as quais se dignou introduzir este encontro familiar.

2. A vossa presença alegra-me intimamente não só pelo espectáculo de estupenda mocidade que ofereceis à minha vista, mas também pelos, valores físicos e morais que representais. O desporto, de facto, mesmo sob o aspecto de educação física, encontra na Igreja apoio para tudo aquilo que ele comporta de bom e de são. Com efeito, a Igreja não pode não encorajar tudo o que serve para o desenvolvimento do corpo humano, justamente considerado a obra-prima de toda a criação, não apenas pela sua proporção, vigor e beleza, mas também e sobretudo porque Deus fez dele a habitação e o instrumento de uma alma imortal, infundindo-lhe aquele "sopro de vida" (cf. Gén Gn 2,7) pelo qual o homem é feito à sua imagem e semelhança. Se, depois, se considera o aspecto sobrenatural, são uma admoestação esclarecedora as palavras de São Paulo: "Não sabeis que os vossos corpos são membros de Cristo?... Não sabeis que o vosso corpo é templo do Espírito Santo, que habita em vós, que recebestes de Deus?... Glorificai, pois, a Deus no vosso corpo" (1Co 6,15 1Co 19-20).

3. Eis, caríssimos jovens, algumas passagens daquilo que a revelação nos ensina sobre a grandeza e a dignidade do corpo humano, criado por Deus e remido por Cristo. Por isso a Igreja não cessa de recomendar a valorização deste instrumento maravilhoso mediante uma educação física apropriada, a qual, ao mesmo tempo que por um lado faz evitar os exageros do culto do corpo, por outro treina quer o corpo quer o espírito para o esforço, a coragem, o equilíbrio, o sacrifício, a nobreza, a fraternidade, a cortesia e, numa palavra, a honestidade. Se for praticado deste modo, o desporto ajudar-vos-á, sobretudo, a tornar-vos cidadãos amantes da ordem social e da paz; ensinar-vos-á a ver nas competições desportivas, não já lutas entre rivais, nem factores de divisão, mas manifestações agonísticas pacíficas, nas quais não deve nunca diminuir, mesmo no devido esforço para conseguir a vitória, o sentido do respeito ' para com o concorrente.

Com estes pensamentos e com estes votos, concedo-vos de bom grado, assim como às vossas famílias e aos vossos amigos, a minha especial Bênção Apostólica em penhor de abundantes graças celestes e como sinal da minha benevolência.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À ASSEMBLEIA CONJUNTA


DOS SUPERIORES E DAS SUPERIORAS DA ITÁLIA


Palácio Pontifício de Castel Candolfo

Quinta-feira, 15 de Outubro de 1981



Caríssimos Irmãos e Irmãs em Cristo!

1. Desejo manifestar-vos, em primeiro lugar, a minha sincera alegria por este encontro convosco, expoentes qualificados das Ordens e Congregações masculinas e femininas da Itália, acompanhados aqui pelo Secretário da Sagrada Congregação para os Religiosos, que representais 120 Institutos masculinos, com 37.000 Religiosos, e 650 Institutos femininos, com 145.000 Religiosas.

À legítima alegria por este encontro desejo também acrescentar a viva satisfação por esta assembleia nacional conjunta, que se realiza pela primeira vez na Itália e foi preparada pelos Organismos interessados com admirável empenho tanto no que se refere à parte litúrgica — oração comunitária e celebrações eucarísticas — quanto ao número, à amplitude e à profundidade dos temas meditados e estudados juntos, que dizem respeito à presença e ao valor da vida religiosa na Igreja e no mundo, à eficácia e ao contributo da vida religiosa na construção da Igreja, e também ao tema específico da vida religiosa perante as mudanças culturais e estruturais da sociedade italiana, na qual todos vós, Irmãos e Irmãs, sois chamados a trabalhar apostolicamente e a dar exemplar e incisivo testemunho da vossa doação total a Deus.

2. Estes temas de fundo, e também os multíplices assuntos de estudo, que nestes dias são tratados pelos trabalhos de grupo — como, por exemplo, a espiritualidade da acção, a pastoral vocacional, as comunicações sociais e a vida religiosa, a coordenação para um melhor serviço eclesial, etc. —, enfrentados conjuntamente, têm em vista salientar o facto que, se é comum a organização, a vida e a actividade apostólica dos Religiosos e das Religiosas, é todavia a formação religiosa, naquela fundamental e ineliminável "dimensão contemplativa", que está na base da consagração religiosa, a qual é resposta generosa e total à chamada de Jesus: "Sequere me" (cf. Mc Mc 2 Mc 14 Lc 5,27).

Esta dimensão original da vida religiosa foi acentuada pelo Concílio Vaticano II, que recomendou aos Religiosos e às Religiosas o primado da vida espiritual, e por conseguinte o amor a Deus, que nos amou a nós primeiro, a vida escondida com Cristo em Deus, o espírito de oração e o amor do próximo para a salvação do mundo e a edificação da Igreja (cf. Perfectae Caritatis PC 6); foi ainda reafirmada pelo meu Predecessor Paulo VI na sua Exortação apostólica sobre o renovamento da vida religiosa segundo o ensinamento do Concílio, quando vos disse: "Uma atracção irresistível vos arrasta para o Senhor. Empolgados por Deus, entregais-vos à sua acção soberana, que vos eleva para Ele e n'Ele vos transforma, enquanto vos prepara para aquela contemplação eterna, que constitui a nossa comum vocação" (Evangelica Testificatio, 8); foi também amplamente tratada pelo recente documento, emanado em Março do ano passado pela Sagrada Congregação para os Religiosos e os Institutos Seculares sobre a "Dimensão contemplativa da vida religiosa"; que é um dos textos que nestes dias estais a analisar e a meditar na reflexão conjunta.

É comum o empenho para a promoção da pessoa, mediante a inserção nos multíplices aspectos da vida social, a variedade das obras e das actividades realizadas pelos Religiosos e pelas Religiosas em favor do homem, na comunhão eclesial orgânica e em fidelidade dinâmica à própria consagração, segundo o carisma do Fundador, como recorda a instrução "Religiosos e promoção humana", promulgada pela Plenária do mencionado Dicastério em Abril de 1978. "O cumprimento da missão da evangelização — lê-se neste documento — requer da Igreja que ela perscrute os sinais dos tempos, interpretados à luz do Evangelho, respondendo assim aos perenes interrogativos do homem. Desta dimensão profética, são chamados os Religiosos a prestar singular testemunho. A contínua conversão do coração e a liberdade espiritual, que os conselhos do Senhor estimulam e favorecem, tornam-nos presentes aos seus contemporâneos de modo a recordarem a todos que a edificação da cidade terrena só pode ser fundada no Senhor e dirigida para Ele" (Introd.).

Comum é, por fim, a inserção orante e efectiva na Igreja local, da qual os Religiosos e as Religiosas nasceram e à qual prestam individualmente o próprio serviço, no testemunho e no anúncio do Evangelho, na colaboração recíproca, na coordenação da pastoral diocesana sob a guia do Bispo, cujo ministério representa o de Cristo cabeça da Igreja, como é claramente descrito no documento "Critérios sobre as relações entre Bispos e Religiosos na Igreja", publicado em Maio de 1978 pela Sagrada Congregação dos Bispos e a Sagrada Congregação para os Religiosos e os Institutos Seculares, em aplicação dos documentos conciliares Christus Dominus e Perfectae Caritatis.

3. Caríssimos Irmãos e Irmãs! A vossa consagração religiosa é um sinal espiritual e privilegiado para a Igreja e para o mundo! Vós seguis Cristo que, virgem e pobre, remiu e santificou os homens com a sua obediência levada até à morte na cruz. A castidade, a pobreza e a obediência consagradas, vividas em total alegria, são testemunhos prefigurativos da dimensão escatológica, da Igreja e do cristão. A fé dá-nos a certeza que a dedicação a Deus nas várias formas de vida consagrada, embora entre dificuldades, desilusões e perigos, não poderá deixar de incidir na autêntica promoção e evolução cultural e social da humanidade, como o grão do trigo, lançado à terra morre (cf. Jo Jn 12,24) e como o bocado de fermento confundido na massa (cf. Mt Mt 13,33). Disto dão plena demonstração os três novos Beatos Alain de Solminihac, Luigi Scrosoppi e Riccardo Pampuri — e as duas novas Beatas — Claudine Thévenet e Maria Repetto que tive a alegria de elevar nestes dias às honras dos altares.

Jesus Cristo vos dê continuamente a abundância da sua graça, para que possais segui-l'O com generosa alegria, e introduza também no coração de tantos e tantas jovens o germe da vocação religiosa e lhes dê a força de a fazer germinar numa generosa resposta.

Confio estes votos à maternal intercessão da Virgem Santíssima.

.A todos vós, a minha Bênção Apostólica.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À ASSEMBLEIA PLENÁRIA


DA SAGRADA CONGREGAÇÃO


PARA A EVANGELIZAÇÃO DOS POVOS


Palácio Apostólico de Castel Gandolfo

Sexta-feira, 16 de Outubro de 1981



Venerados Irmãos e Filhos caríssimos!

1. Ao dirigir-vos as mais cordiais boas-vindas, a vós que participastes, nestes dias, na X Assembleia Plenária da Sagrada Congregação para a Evangelização dos Povos, logo se presenta à minha mente todo um conjunto de circunstâncias que tornam particularmente grato a vós e a mim o encontro de hoje. Verifica-se na verdade — para usar uma palavra da linguagem litúrgica — uma "concorrência" de datas e de factos que se apresentam tanto oportunos quanto providenciais.

Estamos, antes de tudo, na vigília do Dia Missionário Mundial, em cujo clima a vossa assembleia se inscreve como um prenúncio e um estímulo, que lhe dão — disto estou seguro — qualificado e diligente contributo de actualização à luz do perene e sempre instante mandato de Cristo Senhor: Euntes in mundum universum, praedicate Evangelium (Mc 16,15). Precisamente ontem à tarde foi inaugurado solenemente o novo ano académico da Pontifícia Universidade Urbaniana, cuja actividade está também orientada para o cumprimento daquele superior mandato. Nem esqueço como nela, no belo Auditorium que eu mesmo tive a alegria de inaugurar, se desenvolvem os trabalhos da vossa assembleia.

Quanto ao tema, sobre o qual falarei mais adiante, apresenta-se ele em directa relação com o do mais recente Sínodo dos Bispos e, por esta razão, constitui rápida, positiva e consoladora resposta às indicações do Magistério.

Há, por fim, duas circunstâncias, diria, pessoais e para mim muito significativas: após a forçada interrupção, hoje é-me dado encontrar-me novamente com o vosso distinto grupo de Cardeais, Bispos, Prelados e Religiosos que junto do Dicastério missionário representais todas as regiões do mundo. E a audiência — como já recordou o Senhor Cardeal Prefeito — realiza-se no dia que assinala o terceiro aniversário da minha eleição à Cátedra de Pedro: circunstância, esta, que é para mim uma recordação e uma advertência quanto ao peso formidável que me foi então confiado e que se apoia, com as suas responsabilidades, sobre os meus fracos ombros.

2. Quero, por isso, saudar distintamente cada um de vós, aqui presentes. Digo-vos, Senhores Cardeais, que neste triénio do meu serviço apostólico me tendes tantas vezes e tão fraternalmente demonstrado o vosso afecto, a vossa disponibilidade para a colaboração, a vossa fidelidade. E depois vós, Arcebispos e Bispos, que aos cuidados do rebanho nas vossas respectivas dioceses ou às incumbências junto de outros Organismos da Cúria Romana, acrescentais o trabalho de membros ou de consultores na Congregação "de Propaganda Fide". E vós, Directores e Colaboradores das Pontifícias Obras Missionárias, cujo zelo conheço em manterdes viva a chama e a preocupação por que o Evangelho se difunda, activando um intercâmbio multiforme entre as áreas de antiga cristianização e as áreas propriamente missionárias. Saúdo, por fim, os Superiores dos Institutos Missionários, como também os Oficiais do Sagrado Dicastério e todos vós que à reunião destes dias destes a contribuição da vossa inteligência e da vossa operosidade.

E permito-me acrescentar que esta distinta enumeração quer ser um sinal de especial reconhecimento pela obra evangélica e eclesial, que realizais não só durante esta assembleia, mas pelo facto mesmo de que pertenceis à Sagrada Congregação, compartilhando o esforço que nunca poderá cessar, de levar Cristo aos povos. Muitíssimo obrigado, amados Irmãos e Filhos!

3. Volto agora ao tema, referente ao "Papel da família no contexto missionário". Já acenei à sua relação com o que foi tratado no Sínodo do ano passado, e, dizer que ela é muito importante, poderia parecer supérfluo. Não entrarei no mérito do argumento, porque o discutistes nas relações gerais e nos "circuli minores".

O que desejaria propor-vos é simplesmente uma consideração quanto à notável novidade que a instituição familiar, com os seus ritos e tradições, apresenta no mundo missionário. Aos ambientes geoculturais extremamente diferenciados e entre si distantes corresponde uma tipologia complexa e mais do que nunca heterogénea da sociedade familiar. Mas nós, como cristãos, como responsáveis da evangelização, somos portadores e defensores de um "nosso" tipo de família, que é e se chama "Família Cristã". Eis a regra de referência, eis o modelo que deve ser imitado!

Trata-se talvez só de um ideal, isto é de algo abstracto que, por quanto belo e sugestivo, não pode ser traduzido no costume? Não certamente, e de modo especial por isto, pela urgência de colocá-lo em prática, é que surgem delicados problemas de ordem teológica e pastoral.

Percebe-se logo o ponto das dificuldades: de uma parte é necessário estudar a família assim como Jesus Cristo a quis, é preciso considerar o seu fundamento que é o matrimónio uno e indissolúvel, como também as irrenunciáveis prerrogativas da fidelidade e da fecundidade do amor; de outra parte, há-de se ter bem presente a forma concreta da família, como existe num preciso ambiente humano e num determinado território de missão. O problema, num certo sentido, é o da aculturação, como inserção num sector particular, mas também importante e vital, do fermento evangélico.

Às vezes o confronto entre ideal e realidade poderá levar a uma fácil composição, quando elementos étnicos e éticos da cultura nativa são componíveis com os transcendentes valores cristãos; outras vezes o confronto colocará às claras uma objectiva contraposição, onde permaneçam tradições claramente pagãs, ou também sejam praticados a poligamia, o repúdio do cônjuge, a destruição da vida que começa a formar-se. Outras vezes, enfim, a relação pressentida como possível entre os graves postulados da ética matrimonial e familiar cristã e os elementos da cultura local exigirá atento discernimento e constante prudência. Neste terceiro caso, talvez mais frequente que os outros, o trabalho pastoral, confiado aos Bispos e aos Missionários, tornar-se-á ainda mais delicado e mais árduo; ele deverá ser uma arte de esclarecida sabedoria, que assim como não esquece nem sacrifica nenhuma das exigências, ainda que severas da doutrina e da fé de Cristo, também não destrói nem despreza as típicas e mais genuínas riquezas de uma população.

Dizia que se tem aqui uma aplicação do conceito de aculturação: o cristianismo — bem o sabemos, porque o repetiu com autoridade o Concílio Vaticano II (cf. Const. past. Gaudium et Spes Decr. Ad Gentes AGD 22) — não destrói quanto de verdade, de justo e de nobre uma sociedade soube construir no seu iter histórico segundo os peculiares recursos, de que a dotou o Criador; mas sobre aquele fundamento ele implanta os superiores valores que o seu Fundador lhe confiou. À família e ao matrimónio, na variedade dos positivos elementos "naturais" que caracterizam tanto uma quanto o outro junto de cada um dos povos, o cristianismo anuncia e oferece o dom da realizada elevação ao plano sobrenatural e sacramental. Jamais, por conseguinte, o missionário deixará de ensinar que o matrimónio é evento de graça e que a família, já na dimensão conjugal e depois na parental, é "em miniatura" representação da Igreja e da arcana relação que a própria Igreja tem com o Cristo.

4. Sei que nos debates da vossa assembleia foi dado não pouco espaço à família como sujeito e como objecto de evangelização. São manifestamente aspectos complementares, que estão a indicar o dúplice ritmo e, quase, o respiro de uma família religiosamente viva: a ela chega o Evangelho e dela parte o Evangelho. Receber e dar; receber para dar!

Ó como ressoam significativas as palavras do evangelista João após a cura milagrosa do filho do funcionário real de Cafarnaum. Ele implorara a ajuda de Jesus e já tinha acreditado quando lhe foi dito que voltasse, porque o seu filho vivia (Jn 4,50); mas, além do milagre teve a definitiva confirmação da parte dos seus servidores, então "acreditou ele com toda a sua família" (ib. 53). Sim, a família que recebeu a fé, a família verdadeiramente cristã está como que projectada a transmitir aos outros e às outras famílias a fé que por graça de Deus possui. A família cristã é disponível à evangelização, é por si mesma missionária.

Eu penso, caros Irmãos e Filhos, no contributo que as famílias cristãs, bem formadas e exemplares por costume moral, podem dar para o anúncio do Evangelho. Então eduquemo-las bem; ofereçamos-lhes os indispensáveis subsídios para as defender das insídias e dos perigos, a que na idade moderna vão encontro um pouco por toda a parte; reforcemo-las e confirmemo-las no precioso testemunho "pro Christo et Ecclesia", que elas dão diante da sociedade que as rodeia. Também lá onde as famílias cristãs são apenas uma exígua minoria no meio de um ambiente em maioria não cristão, indispensável e validíssimo torna-se o testemunho dado por elas às outras famílias. Se forem profundamente penetradas pelo anúncio do Evangelho, terão a mesma eficácia daquele fermento que, misturado em três medidas de farinha, levedará toda a massa (cf. Mt Mt 13,33 Lc 13,20-21).

5. Consenti-me agora uma recordação. Há dois anos, durante a audiência ao vosso Cardeal, expressei-lhe o desejo de participar numa das sessões da futura assembleia plenária. Sed res aliter evenit! Se não participei pessoalmente nos vossos trabalhos, tive contudo a satisfação de vos receber esta manhã. À alegria do encontro corresponde o apreço por tudo quanto estais a estudar. Trabalhais para a família, isto é colaborais para descobrir, com sempre maior precisão, qual foi para o homem e a mulher o genuíno plano de Deus, e — o que mais vale — estais empenhados em encarná-lo nas diversas sociedades, às quais levais Cristo e o seu Evangelho.

Assista-vos neste trabalho Aquela que, como esposa e mãe incomparável no lar de Nazaré, exerce já um altíssimo papel na primeira família de Cristo; mas depois, em virtude da suprema entrega recebida no Calvário: Ecce filius tuus (Jn 19,26), estende esta sua missão à família imensamente alargada dos irmãos de Cristo. Neste mês missionário e mariano é justo que no seu nome seja concluída a vossa importante assembleia, e que a Ela, Rainha dos Apóstolos, todos nós agora nos dirijamos em conforto do renovado propósito de levar às famílias e aos povos o Evangelho da salvação.

Com a minha Bênção Apostólica.



PALAVRAS DO PAPA JOÃO PAULO II


NO FINAL DO CONCERTO DA ACADEMIA NACIONAL


DE SANTA CECÍLIA POR OCASIÃO


DO TERCEIRO ANIVERSÁRIO DO SEU PONTIFICADO


Sábado, 17 de Outubro de 1981



Transportados como por encanto às esferas mais altas do espírito humano, fomos convidados a contemplar as coisas superiores, a ultrapassar as impressões mais imediatas, para atingir aquelas imateriais e arcanas da arte, que podem aproximar a alma das alturas do Eterno. Tarefa fascinante a da música, que interpreta as aspirações, as inquietações e o anseio de absoluto da mente humana.

Passámos assim, juntos, numa paz harmoniosa, uma hora de verdadeiro aprazimento, fazendo nosso o convite da Palavra divina:

"Celebrai o Senhor ao som dos tamborins e címbalos; cantai ao Senhor um cântico novo, exaltai e aclamai o Seu nome" (Jdt 16,1).

Desejo agora manifestar a mais cordial expressão do meu agradecimento à exímia Academia Nacional de Santa Cecília, que se orna de aprovação universal, ao seu ilustre Presidente, Maestro Mário Zàfred, como também ao Conselho Administrativo da Instituição autónoma dos Concertos da mesma Academia. A minha gratidão dirige-se ainda aos Professores da homónima Orquestra Sinfónica, aos denodados membros do Coro, e em particular aos quatro artistas que deram voz e interpretação às personagens evangélicas. Apraz-me repetir a todos o elogio do Profeta: "inventam, como David, instrumentos de música" (Am 6,5).

Uma palavra de íntimo agrado e de comovida felicitação desejo dirigir ao Maestro Monsenhor Domenico Bartolucci, Autor e Director do Oratório "Ascensão", que acabámos de ouvir.

Faço votos por que o caro Maestro prossiga, deste modo, com a linguagem moderna do seu talento e da sua inspiração, o secular caminho da música sacra, tão estimada pela Igreja e pelos cultores da arte.

Com o augúrio de uma harmonia sempre mais em sintonia com a própria vocação artística, invoco do Senhor a suave plenitude da sua graça e da sua luz e concedo a todos a minha afectuosa Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


A SUA SANTIDADE ABUNA TEKLE HAIMANOT,


PATRIARCA DA IGREJA ORTODOXA ETIÓPICA


Castel Gandolfo, 17 de Outubro de 1981



Santidade

É com o coração repleto de alegria que lhe dou calorosas boas-vindas, meu venerado Irmão, e a todos os que o acompanham hoje.

O prazer de o receber aqui em Castel Gandolfo desperta toda a minha gratidão pelas expressões de simpatia que me dirigiu por ocasião dos tristes acontecimentos que me atingiram durante este Verão.

A compacta solidariedade de tantos irmãos — ela própria expressão da fraternidade cristã — juntamente com as orações que elevaram a Deus, deram prova da comunhão de vida que provém do nosso comum baptismo e da nossa fé no nosso único Senhor Jesus Cristo. Sinto-me, pois, honrado com a sua visita e grato por ela.

Mas a minha alegria torna-se ainda maior ao pensar que este nosso encontro é parte de um movimento espiritual muito mais vasto, aquela procura comum entre todos os cristãos de progresso no caminho para a plena unidade.

Por incompreensão de línguas, por circunstâncias históricas diversas, por diferenças de mentalidades e de culturas — por estas e outras razões as nossas Igrejas chegaram, século após século, a viver separadas. Isto por sua vez levou a ulterior anuviamento da nossa compreensão recíproca. Ao recordar aos católicos o seu dever de participar activamente na busca da plena unidade, o Concílio Vaticano II salientou a necessidade de formar uma cuidadosa imagem dos outros cristãos, que é condição prévia para a plena unidade. Assim, o Decreto sobre o Ecumenismo deu particular ênfase à realidade sacramental mediante a qual as nossas Igrejas permanecem estreitamente unidas, acima de tudo em virtude da sucessão apostólica, do sacerdócio e da Eucaristia; declarou explicitamente que "pela celebração da Eucaristia do Senhor em cada uma das Igrejas, a Igreja de Cristo é edificada e cresce" (Unitatis Redintegratio UR 15).

A herança deixada pelos Apóstolos tem sido vivida pelas nossas Igrejas em diferentes formas e modos e teve desenvolvimento diverso segundo os dons naturais e as circunstâncias de vida próprias de cada uma (cf. ibid., 14). Isto também levou a expressões litúrgicas, disciplinares e teológicas diferentes; nelas, enquanto esta variedade é mais complementar do que contraditória, estas diferentes expressões são um enriquecimento para a vida e a missão da Igreja entre todos os povos (cf. ibid., 14-17). Por isso a unidade de fé pode ser revestida com o particular contributo cultural e espiritual de cada povo e de cada Igreja local.

Os contactos que nós estabelecemos proporcionam-nos agora redescobrir a profunda e verdadeira realidade da existência desta unidade. Embora as reais divergências entre nós tenham sido vistas com maior clareza à medida em que nos libertávamos progressivamente de tantos elementos secundários derivados de ambiguidades linguísticas.

Este processo requer — e isto é indispensável — que aumentemos os nossos contactos directos e desenvolvamos o nosso conhecimento recíproco. As conversações e o diálogo teológico darão um contributo essencial para a clarificação definitiva de questões em aberto, em vistas da plena reconciliação. A Igreja Católica está inteiramente disposta a iniciar estes contactos directos para a busca da plena unidade e a fazer tudo o que lhe for possível, de harmonia com outras Igrejas, para promover esta busca que, sem dúvida alguma, corresponde à vontade de Deus para a sua Igreja.

No processo para a plena unidade é necessário estabelecer contactos de vida entre as várias comunidades, e fazê-lo em diferentes níveis, de modo a envolver todos aqueles que fazem parte da vida diversificada da Igreja. A colaboração mútua, verdadeiramente desinteressada e cordial, sustentada pela comum oração pode contribuir não só para fazer esquecer amargas recordações do passado, mas também para a consolidação das nossas relações presentes e para o seu crescimento, rumo à plena unidade. A este respeito, desejo assegurar-lhe o desejo da Igreja Católica na Etiópia de rezar e trabalhar, em espírito de amor fraternal, de modo a alcançar este objectivo e, ao mesmo tempo a sentir, como um dom do Espírito Santo, alguns dos 'benefícios da unidade cristã.

A união dos cristãos é hoje mais urgente do que nunca, tanto para a vida interna da Igreja como para a sua obra de evangelização do inundo moderno. Entre as presentes mudanças que a humanidade sofre, um concorde testemunho comum de todos os cristãos pode constituir o instrumento de um anúncio mais efectivo do Evangelho e também um contributo activo para a reconcilição entre os povos e para a paz do mundo.

Santidade, ao expressar os sentimentos que são inspirados pela Sua grata presença em Roma, desejo assegurar-lhe os meus sentimentos de fraternidade e solidariedade com a Igreja inteira da Etiópia, cuja presidência está ao seu cuidado, e manifestar a disponibilidade da Igreja Católica para um contacto sempre mais estreito e para um diálogo mais profundo que, alimentado e sustentado pela oração, contribuirá para a construção da unidade desejada por nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.

Saúdo igualmente, na sua pessoa, todo o povo da Etiópia para o qual formulo votos de paz e convivência construtiva e de fecunda prosperidade.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


PARTICIPANTES NA ASSEMBLEIA NACIONAL


DA MILÍCIA DA IMACULADA


Sala Clementina

Domingo, 18 de Outubro de 1981



Caríssimos!

1. O motivo que vos estimulou a pedir esta particular audiência é a comemoração do quadragésimo aniversário da morte do Beato Maximiliano Maria Kolbe e do décimo aniversário da sua Beatificação. De facto, vós pertenceis à "Milícia da Imaculada" por ele fundada, e quisestes solenizar estas duas datas tão importantes e significativas com um encontro com o Papa.

E eu, como podeis imaginar, estou verdadeiramente alegre de vos acolher com todo o afecto e a efusão do meu coração, pela excelência e pela grandeza do ideal que procurais viver seguindo o exemplo e a doutrina do Padre Maximiliano Kolbe, ilustre filho da minha Pátria, a Polónia, arrebatador modelo pela sua inteligência e santidade.

Apresento portanto a minha calorosa saudação ao Ministro-Geral dos Menores Conventuais, aos Superiores e Religiosos, e a todos vós, a cada um em particular, que representais os tantos núcleos da "Milícia" espalhados em todo o mundo: Saúdo-vos e agradeço terdes vindo a Roma, onde a 26 de Outubro de 1917 o Padre Maximiliano, como sabeis, fundou a Milícia da Imaculada.

Agradeço-vos sobretudo porque quisestes comemorar aqui comigo as duas datas da morte e da beatificação, que suscitam em mim um afluxo de lembranças e de comoção. Quantas vezes, de facto, me dirigi em peregrinação àquele lugar de tortura e de glória, ao "bunker da fome" do campo de Oswiecim, onde há quarenta anos ele morreu a 14 de Agosto, vitima do ódio mas ao mesmo tempo vencedor com o seu amor! E como recordo a minha última visita, a 7 de Junho de 1979, durante a viagem à Polónia, quando, entrando na alucinante sala, me ajoelhei naquele "Gólgota do mundo moderno". Fazeis-me também recordar com intensa saudade o solene dia da sua beatificação, 17 de Outubro de 1971, quando me encontrei junto do altar do Senhor com o Santo Padre Paulo VI e o Cardeal Stephan Wyszynski, e a visita feita a 26 de Fevereiro deste ano à Cidade da Imaculada em Nagasaqui, por ele mesmo fundada.

2. Ao recordar estas datas, parece ver no meio de nós a pessoa do Padre Maximiliano sério e severo, afável e sorridente; e ainda ouvimos de novo o elogio que dele tecia Paulo VI na memorável homilia da Beatificação: "Beato quer dizer: salvo e glorioso; cidadão do céu, com todas as características de um cidadão da terra; irmão e amigo que, ainda, e mais do que nunca, é nosso...; advogado e, portanto, protector no reino da caridade; por fim, exemplo e modelo de homem, que podemos imitar na nossa vida..." (17 de Outubro de 1971). O mesmo Paulo VI mencionava ainda o Padre Maximiliano na Carta Apostólica Gaudete in Domino (22 de Maio de 1975) como "imagem luminosa para a nossa geração,... genuíno discípulo de São Francisco". Diante de um exemplo tão insigne e todavia também tão humano e perto de nós, a reflexão torna-se mais pessoal e mais responsável para vós, que pertenceis à Milícia da Imaculada.

Os Estatutos, aprovados na sua forma actual a 8 de Novembro de 1974, afirmam que a associação "quer estender o mais que for possível o dulcíssimo Reino do Sagrado Coração de Jesus mediante a Imaculada, ou melhor estar ao serviço da Imaculada nesta missão que Ela tem como Mãe da Igreja".

Este foi o ideal do Padre Maximiliano, ao qual consagrou a vida, as capacidades intelectuais, as forças físicas, a incansável actividade. O pertencer à Milícia significa urna consagração total ao Reino de Deus, à salvação das almas, por meio de Maria. Imaculada.

3. Exorto-vos portanto a viver com sempre mais fervoroso empenho este vosso ideal. Na nossa sociedade, a vossa consagração à Imaculada deve dar testemunhos serenos, confiantes e corajosos. Como o Padre Maximiliano sede enamorados e apaixonados da verdade. A Igreja hoje tem essencialmente necessidade de unidade na verdade. De facto, é a verdade que dá a coragem das grandes decisões, das opções heróicas, das doações definitivas! É a verdade que dá a força para viver as virtudes difíceis, as Bem-aventuranças evangélicas, a pureza juvenil e a castidade consagrada e conjugal! É o conhecimento e o amor da verdade que fazem surgir as vocações sacerdotais, religiosas e missionárias, e dão pulso à caridade, até à imolação de si, como fez o Padre Maximiliano! E a verdade é Cristo conhecido, seguido, testemunhado: "Eu sou a luz do mundo" (Jn 8,12) disse o Divino Mestre; e acrescentou: "Vós sois a luz do mundo" (Mt 5,14). As duas afirmações equivalem-se ao traçar claramente a linha de conduta e a responsabilidade de cada cristão: "Quem me segue, não caminha nas trevas" (Jn 8,12 Jn 12,46).

Da verdade nasce logicamente o anseio pela santidade, que foi o supremo ideal do Padre Maximiliano. Assim escrevia ele: "Não é soberba querer ser santo quanto mais for possível e santificar o maior número de almas, confiando unicamente em Deus mediante a Imaculada" (Gli scritti di Massiiniliano Kolbe, Città di Vita, Firenze 1978, vol. II, pág. 715). Oxalá da verdade surja o sentido de total confiança e de abandono ao Altíssimo, especialmente nas tribulações e nos transtornos que acompanham a história humana!

4. Caríssimos!

Sede fortes na fé e vivei com entusiasmo os compromissos da Milícia, da Imaculada, à qual pertenceis, seguindo o ensinamento e os exemplos do Padre Maximiliano Kolbe. "Sofrer, trabalhar, amar e alegrar-se": este foi o seu programa e é a síntese da sua vida. Seja assim também para vós, com o auxílio da Virgem Santíssima! E vos acompanhe sempre a minha Bênção, que a vós e a todos os inscritos na vossa Milícia concedo com grande afecto.




Discursos João Paulo II 1981 - Sábado,10 de Outubro de 1981