Discursos João Paulo II 1981 - Quinta-feira, 5 de Novembro de 1981

Agradeço cordialmente ao Senhor Cardeal Bernardin Gantin, que preside os trabalhos do vosso encontro, os sentimentos expressos em vosso nome. Quer sejais homens de Igreja ou membros de organismos civis, sede todos bem-vindos! Na vossa diversidade e na vossa complementariedade, sois de facto um sinal tangível de que o meu solene apelo em favor do Sahel lançado a 10 de Maio de 1980 da catedral de Ougadougou — foi ouvido e dá frutos. Aqui, seja-me permitido saudar o Cardeal Paul Zoungrana que, recebendo-me o ano passado, me deu a ocasião para sensibilizar a opinião pública sobre o drama da seca, que atinge 13 países da África e milhões de Africanos.

Desde que o meu caro predecessor Paulo VI pediu ao Conselho pontifício "Cor Unum" para se interessar activamente por este doloroso e persistente problema, cujos pontos a vossa reunião se esforça por determinar, pode-se legitimamente falar de um progresso da solidariedade eclesial. Quantas Igrejas locais na África, primeiramente e recordo-o comovido —, abriram o seu coração e os seus muito escassos recursos aos seus irmãos e irmãs dizimados pela seca! Como deixar de salientar igualmente o trabalho realizado pelo Centro de Estudos e de União do Alto Volta! E estes exemplos africanos contribuíram para estimular as organizações católicas de caridade e desenvolvimento — nos países ricos e até nos que o não são tanto — a empreender acções variadas e convergentes para refrear este flagelo da África. É uma alegria e um reconforto para mim ver aqui os representantes destes organismos caritativos. Merecem as minhas felicitações e os meus encorajamentos, e os de toda a Igreja.

Mas devo também mencionar a generosidade dos fiéis que alimentaram as colectas organizadas através do mundo católico, e certamente no espírito do bom Samaritano do Evangelho. Desejo renovar de modo especial a minha profunda gratidão aos católicos da Alemanha Federal que, por ocasião da minha visita pastoral em Novembro passado, fizeram precisamente uma colecta sem dúvida notável em favor do Sahel. Todas estas respostas vindas do povo cristão me impelem a reiterar o meu solene apelo de Ougadougou, porque há ainda tanto a fazer! E exorto-vos a dar-lhe de novo toda a ressonância possível.

Quereria ainda reavivar em vós o espírito que deve impregnar a vossa acção evangélica de solidariedade. Primeiro, é evidente que as ofertas já recolhidas ou a recolher devem ser rigorosamente utilizadas para afastar as terríveis catástrofes das regiões africanas sem água, e que tais investimentos não podem ser feitos senão segundo o verdadeiro espírito dos discípulos de Cristo, isto é o sentido profundo do homem, que é sempre e em toda a parte o nosso irmão em humanidade que traz a marca de Deus. Neste serviço às populações em perigo, não se poderia tratar de competir ou substituir os poderes públicos. Muito pelo contrário, é mesmo indispensável agir em estreita colaboração com eles e com outras instâncias regionais ou mundiais. A este propósito, é-me grato saber que os representantes da Comissão Inter Estados para a luta contra a seca no Sahel (C.I.L.S.S.), da FAO e do Programa Alimentar Mundial (P.A.M.) participarão no vosso encontro e não deixarão de lhe levar os seus conhecimentos e as suas experiências. Numa palavra, a Igreja deseja colaborar, na medida dos seus meios e segundo o espírito do Evangelho, com todos os organismos da sociedade civil quando se trata de ir em ajuda do homem. Por outro lado, a modicidade dos seus próprios recursos materiais faz que ela se deva inserir num quadro de acção concertado e programado, para alcançar bons resultados.

Dito isto, permanece que esta obra eclesial de caridade e de promoção — tendo este aspecto de integração salientado a todo o momento — é reivindicada pela Igreja como um direito e um dever próprios. O decreto sobre o apostolado dos leigos (n. 8) recorda-o inequivocamente. A Igreja esforça-se e esforçar-se-á sempre por fazer face a este direito e a este dever deixando-se habitar pelo Espírito mesmo de Cristo, mas também procedendo de maneira tão racional e metodológica quanto possível. De facto todos nós pensamos que os organismos caritativos devem ultrapassar o simples papel de paliativos, tendo em conta os apelos mais urgentes, para se atacarem as causas mesmas dos flagelos e, no caso, da seca persistente. Há também realismo da sua parte em procurarem interessar as populações locais na realização dos projectos previstos. Uma integração paralela exige verdadeiro conhecimento dos lugares e das pessoas, respeito dos factores culturais, paciência, que virá a ser retribuída. É importante, pois, que as Igrejas locais atingidas pelo drama da seca possam contribuir para formar animadores, capazes de serem responsáveis dos projectos e da sua execução.

No que lhe diz respeito, a Santa Sé está plenamente de acordo em se inserir no quadro geral de acção, não só interpelando e estimulando as comunidades eclesiais e os poderes públicos, mas dando ela própria o exemplo e actualizando assim a sua tarefa particular que é de "presidir na caridade".

Para que o meu solene apelo de Ougadougou venha a ter efeito, desejo que uma realização concreta seja efectuada na região do Sahel com as ofertas que me foram ou serão enviadas, e que ela constitua o sinal eficaz do meu amor pelos meus irmãos africanos mais provados e a mim ainda mais caros desde a inesquecível viagem que fiz em 1980.

É a Deus, fonte de toda a caridade, que peço ardentemente abençoe cada urna das vossas pessoas e fecunde o vosso trabalho evangélico de solidariedade.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DA REGIÃO DO LÁCIO


EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM»


Quinta-feira, 5 de Novembro de 1981



Senhor Cardeal
Dilectos e Venerados Irmãos

Recebo-vos hoje em Visita "ad limina" com vivo afecto e ardente consideração, alegre por ela me consentir renovar o prazer dos encontros pessoais tidos com cada um de vós, oferecendo-me juntamente a oportunidade de conversar colegialmente com todos.

Vós, caros Irmãos da Conferência Episcopal do Lácio, abris a série das Visitas "ad limina" colegiais dos Bispos italianos, programadas para o ano em curso, e sois portanto o primeiro grupo de Prelados a quem me apraz dirigir a palavra. As Visitas de cada um dos Bispos tiveram início desde os primeiros meses deste ano, e sucederam-se com regularidade até e data de 13 de Maio último, dia de prova e sofrimento para a minha pessoa e para a Igreja inteira.

Ao retomar as Visitas pessoais, e neste primeiro encontro colegial, desejo confiar-vos que atribuo particular importância tanto às primeiras como aos encontros com as várias Conferências Regionais. De facto, se nos colóquios individuais, a que me proponho prestar cuidadosa atenção, me é dado acolher cada Irmão no Episcopado, que representa e traz consigo a Igreja particular de que é Pastor, no encontro colegial é-me permitido encarar, de maneira mais integral e sintética, conjuntamente com os Bispos, os problemas gerais, próprios da Nação ou das várias Regiões.

1. Os motivos da importância das Visitas "ad limina" são, primeiro que tudo, de carácter teológico e doutrinal.

Tais Visitas, na verdade, constituem primariamente acto de profunda e convicta fé no Mistério da Igreja, assim como a quis o seu divino Fundador, Jesus Cristo.

Os Bispos — que "em virtude da consagração episcopal e mediante a comunhão hierárquica com o Chefe do Colégio e com os Membros" (Nota explicativa prévia anexa à Constituição dogmática sobre a Igreja) se tornam sucessores dos Apóstolos, com capacidade de evangelizar, santificar e governar o Povo de Deus, e de perpetuar por sua vez o mesmo Episcopado — reconhecem de modo privilegiado, mediante as repetidas Visitas "ad limina", que o Sucessor de Pedro é "princípio e fundamento perpétuo e visível da unidade da fé e da comunhão" (Const. Dogm. Lumen Gentium LG 18); é aquele que assegura a ortodoxia da Verdade revelada e anunciada; é o Pastor universal da Igreja, com poder imediato sobre toda a Comunidade cristã, isto é Pastores e Fiéis.

Com Ele os Bispos desejam confirmar também deste modo uma comunhão de espírito, coração e disciplina. Estão conscientes de o mandato jurisdicional, de que estão honrados, a eles chegar dependentemente da comunhão hierárquica com Pedro, por cuja escolha ou aprovação é determinada em concreto a missão canónica.

Tal acto de fé por parte dos Bispos tem raiz no mais íntimo núcleo da doutrina católica, graças ao qual a sã e fiel tradição afirma com os Padres da Igreja: "Nihil sine Petro" (Nada sem Pedro).

A Visita "ad limina" tem ainda evidente motivação pastoral.

O Bispo de Roma, como Vigário de Cristo e Sucessor de Pedro, atende à solicitude do rebanho universal, que ele só pode atingir em concreto mediante os Bispos que estão à frente dele. Consta, de facto, da história passada e presente, como os problemas pastorais são sempre numerosos e difíceis, e têm características diversas segundo os modos e o grau de maturidade de cada uma das Igrejas.

Mediante a Visita "ad limina", o Papa tem assim a possibilidade de entrar no vivo das aspirações de cada Igreja, por meio da informação dos respectivos Pastores. Estes, de facto, informam o Papa das suas perspectivas, alegrias, inquietações e esperanças, tornando-se intermediários das perguntas das multidões cristãs que seguem acompanhando a sua história para destinos transcendentes.

A Visita "ad limina" é, em síntese, o encontro do Papa, Pastor Supremo, com um Irmão no episcopado, com um amigo e com um Pastor responsável que, agraciado de uma grande honra, leva também o peso de uma grande responsabilidade.

2. A Visita de hoje, a estes motivos de ordem geral, junta os de natureza específica derivantes da característica própria da vossa Conferência Episcopal. Como se exprimia o meu Predecessor Paulo VI na Alocução pronunciada a 24 de Fevereiro de 1977, por ocasião da vossa precedente Visita, "as Igrejas, por vós representadas, são como o primeiro dos anéis concêntricos que idealmente designam o mapa da Igreja universal, e é este um facto que postula necessariamente uma directa e mais acentuada comunhão".

Os Bispos da Região do Lácio, isto é do território que circunda Roma, centro da Cristandade e Capital da Itália, são os mais próximos do Sumo Pontífice e da Santa Sé, e operam no raio de um território que, através dos séculos, assistiu a altíssimos e irrepetíveis testemunhos de vida cristã.

É este o momento de sublinhar que património único — e ao mesmo tempo responsabilidade gravíssima — é para Roma e a sua Região a riqueza de doutrina, santidade, apostolado e caridade eclesial em todas as formas, relacionadas com a história da Sé Apostólica e com o Magistério constante e a intervenção dos Papas.

A presença dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, dos seus primeiros sucessores e de toda a falange dos mártires e dos santos que seguiram a história e a missão de Roma em todos os séculos e em cada circunstância, sobretudo dolorosa da sua vida, é única na vida da Igreja.

Também recentemente, o martírio de Santa Maria Goretti, em Nettuno, enriqueceu a tradição. É impossível enumerar todos os Santos cuja vida esteve ligada com a de Roma e da Região. Toda a qualidade de pessoas pode ter um exemplo e Patrono: os Bispos têm o exemplo dos Santos Pontífices, os jovens têm como mestre São Filipe Néri e patrono São Luís Gonzaga; as mães de família Santa Francisca Romana; os párocos São Vicente Pallotti, São Gaspar del Búfalo e São João Baptista de Rossi.

Assim a Região oferece modelos de excelsa santidade, antigos e modernos, São Boaventura de Bagnoregio, São Tomás de Aquino, São Carlos de Sezze, São Félix de Cantalício, São Paulo da Cruz e numerosos outros.

Fonte inexaurível de vida espiritual e de apostolado são ainda os grandes centros de espiritualidade e cultura cristã, e os Santuários da Região. Não podendo enumerá-los todos, limito-me a animar todo o esforço para que tais centros — como as Basílicas romanas, as gloriosas Abadias Beneditinas de Montecassino e de Subiaco, e os Santuários das diversas Ordens Religiosas — exerçam uma actividade cada vez mais intensa em vista do renovamento cristão na hora presente.

Conheço o vosso assíduo trabalho pela causa do Reino de Deus nesta Região bendita, e desejo portanto exprimir-vos a minha mais viva complacência e o meu apreço por toda a obra realizada juntamente com os Sacerdotes, os Religiosos e os Leigos das vossas dioceses.

3. Passando a analisar, de modo mais próprio, a situação religiosa da Região, posso dizer que nestes três anos de Pontificado, por meio dos encontros pessoais e dos vossos cuidadosos relatórios, me dei bastante conta seja das realidades positivas e consoladoras, seja das dificuldades por vezes ainda graves e preocupantes.

As características étnicas, sociais e culturais da Região apresentam-se díspares e múltiplas. Roma, a Capital, cresceu nestes 50 anos de modo rápido e tumultuoso, com uma população prevalentemente imigrada, de vária condição social e regional. Esta população, em parte oscilatória, habita na enorme e muitas vezes anónima periferia, criando problemas de conhecimento, aproximação e evangelização formativa e metódica. A Cidade, além disso, é continuamente atravessada por um impressionante fluxo de turistas provenientes de todas as partes do mundo, os quais trazem consigo experiências e mentalidades diversas, por vezes em contraste com os costumes cristãos.

No campo romano, a civilização rural está de há tempos em rápida evolução para o estilo de vida da civilização industrial, tendente ao exagerado consumismo, com o ideal da segurança social e do bem-estar.

Tais fenómenos trouxeram necessariamente mudança de mentalidade, de costumes, de sentimentos e de relações na população, criando —também por motivo de uma insuficiente informação na fé — uma atmosfera em que não é difícil verificar tendências agnósticas em matéria doutrinal e uma consequente falsa autonomia no campo moral.

É necessário todavia sublinhar também que no povo perdura o profundo substrato da fé e da moral cristã, que se manifesta com a sensibilidade ante os problemas religiosos, a íntima necessidade de Deus e da oração, a estima do Sacerdote zeloso e do seu ministério, e sobretudo com uma mais sentida responsabilização por parte de muitos Leigos comprometidos e de muitos grupos de presença cristã, que notam a urgência de mais intensa vida espiritual e mais activa participação no apostolado directo.

Diante das inegáveis dificuldades dos nossos tempos e dos sinais positivos de uma redescoberta responsabilidade na estrutura da Igreja, a minha exortação dirige-se primeiro que tudo a sustentar a vossa coragem, convidando-vos a trabalhar fervorosamente na messe do Senhor, e recordando-vos que nenhuma dificuldade pode separar-nos do amor de Cristo, como já afirmava São Paulo dirigindo-se a este povo romano: "Estou certo que nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem as potestades, nem a altura nem a profundidade, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor" (Rm 8,38-39). São Paulo queria solenemente atestar, com tais expressões, que nunca as alterações da história, embora turbulentas e difíceis, podem apartar-nos d'Aquele que remiu a humanidade com o Seu amor crucificado. Com São Carlos Borromeu, que ontem festejámos e que venero particularmente como meu Patrono, exorto-vos: "Sine metu et constanter certe agamus, atque adeo perficiamus quod Evangelium docet, quod Christus iubet, quod ratio praecipit, quod gregis salus, quod Ecclesiae auctoritas dignitasque postulat" — Procedamos certamente sem medo e constantemente, mais: levemos a termo o que o Evangelho ensina, o que manda Cristo, o que preceitua a razão, o que a saúde do rebanho, o que a autoridade e a dignidade da Igreja pedem (Oratio in Concilio Provinciali II, Anno 1569, die 29 Aprilis).

4. Dois pontos desejo finalmente assinalar à vossa atenção. Desejaria sugerir-vos, em primeiro lugar, que reforceis constantemente os encontros da vossa Conferência Episcopal; eles mostram-se cada vez mais úteis e por vezes necessários, precisamente para conseguir aquela mentalidade e aquela atmosfera de "comunhão" e "comunidade" recordadas e sublinhadas pelo recentíssimo plano pastoral da Conferência Episcopal Italiana para o próximo decénio. "Mais profundo conhecimento do dom da comunhão — está escrito no Documento publicado a este propósito —aumentará sem dúvida em toda a nossa Igreja a graça da unidade vivida na caridade e tornará crível o anúncio evangélico que ela é chamada a levar" (n. 1).

Os encontros programáticos das Conferências Episcopais Regionais têm o objectivo de partilhar as próprias experiências, de interrogar-se sobre as necessidades de cada diocese, de redigir em conjunto planos comuns de actividade pastoral, de analisar as dificuldades encontradas, de descobrir linhas de acção especialmente a respeito da formação do Clero, da pastoral das Vocações, do funcionamento dos Seminários e da relação entre os vários grupos de presença cristã.

A propósito desta intensa "comunhão" entre os Pastores, exorto-vos também a considerar com ânimo generoso e confiante, a possibilidade de auxílios mútuos e de trocas perspicazes de auxílios pastorais, vencendo a pressão "da necessidade imediata local", para favorecer um trabalho e uma programação de conjunto.

Por fim, desejo ainda exortar-vos a ouvir os Leigos e a tratar atentamente deles. Hoje, de modo particular, é necessário saber compreender e valorizar os Leigos que sentem a necessidade e quase a ansiedade de colocar-se ao serviço da Verdade para anunciar Cristo e testemunhá-l'O na sociedade em que vivem.

Existe extrema necessidade de certeza autêntica e verdadeira esperança; e muitos Leigos sentem esta necessidade e querem inserir-se activa e responsavelmente no apostolado, em auxílio dos Bispos e dos Sacerdotes. É necessário portanto tornarmo-nos sensíveis a esta realidade consoladora e formarmos os Sacerdotes de maneira que se sensibilizem, por sua vez, de maneira que tal entusiasmo, que é dom autêntico do Espírito Santo para estes nossos tempos, não seja sufocado e extinto, ou pior, desviado e contorcido em experiências erradas e ilusórias.

É consolador o gradual renascimento do associacionismo católico, seja através da Acção Católica seja mediante Movimentos de recente formação, que todos conhecemos. Apresenta-se com urgência o empenho de dirigir positivamente tais forças, mesmo por meio de planos conjuntos, para um apostolado de presença e precisas tarefas de evangelização, que, no que diz respeito a Roma, deverão sobretudo corresponder às necessidades religiosas da grande periferia.

Caríssimos Irmãos!

Muitos sem dúvida seriam ainda os problemas para tratarmos e analisarmos juntos, uma vez que a pastoral se apresenta hoje verdadeiramente vasta e diferenciada. Mas vós tereis oportunidade e motivo para novos encontros; por hoje basta indicar as questões da Conferência Episcopal e da formação dos Leigos qualificados.

A Mãe do Céu, de quem o nosso povo de Roma e de todo o Lácio sempre foi tão devoto, vos acompanhe no trabalho de Pastores, vos ilumine e conforte, de maneira que, no quotidiano esforço pastoral, vos anime sempre o santo fervor, para bem dos fiéis e da sociedade inteira.

Acompanhe-vos a minha Bênção Apostólica, que vos concedo de todo o coração, tornando-a extensiva com afecto às Comunidades eclesiais a vós confiadas



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO COLÓQUIO INTERNACIONAL


SOBRE O TEMA "AS COMUNS RAÍZES CRISTÃS


DAS NAÇÕES EUROPEIAS"


Sexta-feira, 6 de Novembro de 1981



Ilustres Senhores

Por ocasião destes dias de estudo, dedicados às "Comuns raízes cristãs das Nações Europeias", desejastes esta Audiência, para vos encontrardes comigo.

Ao mesmo tempo que dirijo a todos vós pessoalmente, homens da cultura da Europa e do mundo inteiro reunidos em Roma, a saudação mais sentida, manifesto-vos o meu agradecimento, não só por esta vossa visita, para mim tão agradável, mas também porque escolhestes, como ponto de partida e argumento das vossas reflexões, ideias que sinto intimamente radicadas no meu espírito e encontrei modo de exprimir desde o princípio do meu Pontificado (Discurso de 22 de Outubro de 1978) e depois sucessivamente: na Homilia na praça da Catedral de Gniezno (3 de Junho de 1979), no discurso feito em Czestochowa aos Bispos Polacos (5 de Junho de 1979); durante as visitas a Subiaco, a Montecassino e Núrsia, ao celebrarem-se 1.500 anos a contar do nascimento de São Bento; no discurso pronunciado na Assembleia Geral da UNESCO (2 de Junho de 1980); e sobretudo manifestei claramente e sintetizei na Carta Apostólica Egregiae Virtutis (31 de Dezembro de 1980), com que proclamei São Cirilo e São Metódio patronos da Europa unindo-os a São Bento.

Obrigado por esta sensibilidade e atenção às ansiedades apostólicas características da vida do Pastor supremo da Igreja que, em nome de Cristo, se sente também Pai afectuoso e responsável da humanidade inteira.

O grito que me saiu espontâneo do coração naquele dia inesquecível, em que pela primeira vez na história da Igreja um Papa eslavo, filho da atormentada e sempre gloriosa Polónia, iniciava o seu serviço pontifício, não era senão o eco da aspiração que moveu São Cirilo e São Metódio a afrontar a sua missão evangelizadora: "Abri, escancarai as portas a Cristo! Não tenhais medo de acolher Cristo e de aceitar o Seu poder... Ao Seu poder salvador abri os confins dos Estados, os sistemas económicos como os políticos, os vastos campos da cultura, da civilização e do progresso. Não tenhais medo. Permiti a Cristo falar ao homem. Só Ele tem palavras de vida".

Conheceis a vida e as vicissitudes dos dois Santos eslavos: bem se pode dizer que a existência deles se apresenta sob dois aspectos essenciais: imenso amor a Cristo e tríplice fidelidade.

O amor apaixonado e corajoso que tiveram a Cristo manifestou-se na fidelidade à vocação missionária e evangelizadora, na fidelidade à Sé Romana do Pontífice e, enfim, na fidelidade aos povos eslavos. Anunciaram a verdade, a salvação e a paz; quiseram a paz! E por isso respeitaram as riquezas espirituais e culturais de cada povo, bem convencidos de que a graça trazida por Cristo não destrói, mas eleva e transforma, a natureza. Por esta fidelidade ao Evangelho e às outras culturas locais, inventaram um alfabeto particular para tornar possível a transcrição dos livros sagrados na língua dos povos eslavos, e assim, contra as recriminações daqueles que defendiam quase como dogma as três línguas sagradas — o hebraico, o grego e o latim (os "pilatinos" como lhes chamava São Cirilo) — estes introduziram a língua eslava também na liturgia, com autorizada confirmação do Papa, e como primeira mensagem traduziram o "Prólogo" do Evangelho de João. "Gregos de origem, Eslavos de coração, confirmados por Roma, são fúlgido exemplo do universalismo cristão. Desse universalismo que abate as barreiras, extingue os ódios e une todos no amor de Cristo Redentor Universal" (Carta do Cardeal Secretário de Estado aos fiéis participantes nas celebrações de São Cirilo e São Metódio em Velehrad, na Checoslováquia. Cf. L'Osservatore Romano, 6-7 de Julho de 1981).

2. A proclamação dos dois Santos Apóstolos dos Eslavos como patronos da Europa, juntamente com São Bento, queria primeiro que tudo recordar o undécimo centenário da Carta Industrias Tuae — enviada pelo Papa João VIII ao Príncipe Svatopluk em Junho do ano de 880, na qual era louvado e recomendado o uso da língua eslava na Liturgia — e o primeiro centenário da publicação da Carta Encíclica Grande Munus (30 de Setembro de 1880), com a qual o Pontífice Leão XIII recordava a toda a Igreja as figuras e a actividade apostólica dos dois Santos. Mas com ela quis, particularmente, sublinhar que "a Europa no seu conjunto geográfico é, por assim dizer, fruto da acção de duas correntes de tradições cristãs, a que se juntam também duas formas diversas de cultura, ao mesmo tempo contudo profundamente complementares" (ibid.): Bento abraça a cultura prevalentemente ocidental e central da Europa, mais lógica e racional, e expande-a mediante os vários centros beneditinos nos outros continentes; Cirilo e Metódio põem em relevo especialmente a antiga cultura grega o a tradição oriental, mais mística e intuitiva. Esta proclamação quis ser o reconhecimento solene dos seus méritos históricos, culturais e religiosos na evangelização dos povos europeus e na criação da unidade espiritual da Europa.

Também vós, Ilustres Senhores, vindos de tantas partes do mundo, vos detivestes nesta a reflectir sobre o inegável fenómeno de unidade ideal do continente. Os Responsáveis pela Universidade Lateranense de Roma e pela Universidade Católica de Lublim quiseram chamar para aqui, para a Cidade Eterna junto da Sé de Pedro, durante quatro dias de intensa actividade, mais de 200 intelectuais de 23 Nações europeias e extra-europeias, com um esquema de estudo ordenado em 12 grupos de trabalho incluindo centenas de relatos. Duas Instituições culturais de prestígio internacional convidaram homens do pensamento e responsáveis, a que entrassem, com diálogo fraternal e construtivo, no espírito e na área da solicitude não só da Igreja Católica, mas também das mais altas Organizações Mundiais. Seguiu-se com vantagem uma linha de absoluta convergência: a busca das raízes cristãs dos povos europeus para oferecer uma norma à vida de cada cidadão e dar significado complexivo e direccional à história que estamos vivendo, por vezes com. alarmante angústia.

Temos, de facto, uma Europa da cultura com os grandes movimentos filosóficos, artísticos e religiosos que a distinguem e fazem mestra de todos os Continentes; temos a Europa do trabalho que, mediante a investigação científica e tecnológica, se desenvolveu nas várias civilizações, até chegar à actual época da indústria e da cibernética; mas há também a Europa das tragédias dos povos e das Nações, a Europa do sangue, das lágrimas, das lutas, das rupturas e das crueldades mais espantosas. Também sobre a Europa, não obstante a mensagem dos grandes espíritos, se fez sentir, pesado e terrível, o drama do pecado e do mal, que, segundo a parábola evangélica, semeia no campo da história a funesta cizânia. E hoje, o problema que nos preocupa é precisamente salvar a Europa e o mundo de novas catástrofes.

3. Sem dúvida, o Congresso, em que participais, tem directamente um programa e um valor científico. Mas não basta ficar no plano académico. É necessário também procurar os fundamentos espirituais da Europa e de cada Nação, para encontrar uma plataforma de encontro entre as várias tensões e as várias correntes de pensamento, para evitar ulteriores tragédias e sobretudo para dar ao homem, a "cada um" dos que se dirigem pelos vários caminhos para a Casa do Pai, o significado e a direcção da sua existência.

Eis então a mensagem de Bento, de Cirilo e Metódio, de todos os místicos e santos cristãos, a mensagem do Evangelho, que é luz, vida, verdade, salvação do homem e dos povos. A quem nos dirigiremos, na realidade, para conhecer o "porquê" da vida e da história, senão a Deus, que se fez homem para revelar a Verdade salvadora e para remir o homem do vazio e abismo da angústia inútil e desesperada? "Cristo Redentor — escrevi na Encíclica Redemptor Hominis — revela plenamente o homem ao homem mesmo. Esta é... a dimensão humana do mistério da Redenção. Nesta dimensão o homem reencontra a grandeza, a dignidade e os valores próprios da sua humanidade... O homem, que deseja compreender-se a si mesmo até ao fundo,... deve — com a sua inquietação e incerteza, e também com a sua fraqueza e pecaminosidade, com a sua vida e a sua morte — aproximar-se de Cristo. Deve, por assim dizer, entrar n'Ele com tudo o que é em si mesmo..." (n. 10). A Europa necessita de Cristo! Necessita de entrar em contacto com Ele, de apropriar-se da Sua mensagem, do Seu amor, da Sua vida, do Seu perdão, e das Suas certezas eternas e exaltadoras! É necessário compreender que a Igreja, por Ele querida e fundada, tem como único objectivo transmitir e garantir a Verdade por Ele revelada, e manter vivos e actuais os meios de salvação por Ele mesmo instituídos, isto é, os Sacramentos e a oração. Isto compreenderam espíritos eleitos e reflectidos, como Pascal, Newman, Rosmini, Soloviev e Norwid.

Encontramo-nos numa Europa em que se torna cada vez mais forte a tentação do ateísmo e do cepticismo; em que alinha uma penosa incerteza moral com a desagregação da família e a degeneração dos costumes; em que domina um perigoso conflito de ideias e movimentos. A crise de civilização (Huizinga) e o ocaso do Ocidente (Spengler) querem apenas significar a extrema actualidade e necessidade de Cristo e do Evangelho. O sentido cristão do homem, imagem de Deus, segundo a teologia grega tão amada por Cirilo e Metódio e aprofundada por Santo Agostinho, é a raiz dos povos da Europa e, para ele urge apelar com amor e boa vontade para dar paz e serenidade à nossa época: só deste modo se descobre o sentido humano da história, que na realidade é "História da salvação".

4. Ilustres e caros Senhores!

Apraz-me concluir recordando o último gesto e as últimas palavras de um grande eslavo, ligado por amor profundo à Europa, Fiodor Michailovic Dostojevavskij, que morreu há cem anos, na tarde de 28 de Janeiro de 1881 em Petroburgo. Grande enamorado de Cristo, tinha escrito: "... a ciência sozinha não completará nunca todo o ideal humano e a paz para o homem; a fonte da vida e da salvação do desespero para todos os homens, a condição 'sine qua non' e a garantia para o universo inteiro encerram-se nas palavras 'O Verbo fez-se carne' e 'na fé nestas palavras' " (F. Dostojevskij, Os Demónios). Antes de morrer mandou ainda que lhe trouxessem e lessem o Evangelho que o tinha acompanhado nos dolorosos anos da prisão na Sibéria e entregou-o aos filhos.

A Europa precisa de Cristo e do Evangelho, pois aqui estão as raízes de todos os seus povos! Estai vós também atentos a esta mensagem!

Acompanhe-vos a minha Bênção, que vos concedo com grande afecto no nome do Senhor!





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


NO ENCONTRO FESTIVO


COM OS PEREGRINOS DA POLÓNIA


Sala Paulo VI

Sábado, 7 de Novembro de 1981



Caros Irmãos e Irmãs, amadíssimos compatriotas!

1. Durante a primeira audiência aos peregrinos da Polónia e das comunidades polacas presentes em Roma para a inauguração do meu Pontificado, convidei os meus compatriotas a visitarem-me em Roma. Renovei, depois, este convite muitas outras vezes. De facto, sabe-se quão profundos são os vínculos históricos da nossa Nação com Roma.

Agora, quando graças à maravilhosa disposição da Providência, um polaco ocupa a Cátedra de São Pedro, parece óbvio que os laços da nossa Igreja e da nossa Nação com Roma, radicados na história, deveriam receber particular aprofundamento e adaptar-se para responder às exigências dos tempos e da Igreja universal, às das Igrejas particulares e, de modo especial, às exigências da Igreja na Polónia como também da nossa Nação e do nosso País, às exigências espirituais de cada peregrino que aqui vem.

A Igreja (que está em Roma) fundada pelos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, crescida com o testemunho deles, com o seu sangue de mártires, deseja sempre, segundo as palavras de Santo Inácio de Antioquia "presidir na caridade". Deseja, segundo a própria missão, presidir na caridade no interior da Igreja universal e em todas as suas partes, até "aos confins do mundo", e também em todos os homens de boa vontade.

2. Sendo eu, por vontade divina, o sucessor de São Pedro na Sé de Roma, desejo com igual amor e idêntica dedicação servir quer a Igreja universal quer todas as Igrejas particulares, todas as Nações e todos os povos, cada homem. Não devo porém esconder aquele particular vínculo que me liga, e sinto profundamente, com a Igreja e com a Nação de onde provenho, com todos os meus compatriotas, seja os que vivem na Pátria seja os que vivem fora dela. Alegra-me, por conseguinte, que, entre as pessoas de muitas línguas vindas a Roma para os encontros com o Papa, ressoe também a nossa língua materna, e devo dizer, por experiência própria, que graças a Deus ela se ouve aqui cada vez com mais frequência e sempre mais vibrante.

O encontro de hoje, considerando aquilo que traz, e a iniciativa de que nasce e os seus frutos, poderia intitular-se, se fosse possível, "festa do trigo". De facto estais a entregar-me a oferta do coração de tantos, muitos polacos e outros que encontram em si mesmos aquela união com "o velho País", com a Igreja, e com Roma, que é também oferta dos amigos de outras nacionalidades desejosos de participarem nesta iniciativa. Estais a entregar-me a casa na "Via Cassia" para servir à Igreja na Polónia, à Pátria, à Emigração e aos compatriotas e também, em certo sentido, a toda a Igreja e à cultura cristã de todo o mundo.

3. Dou cordiais boas-vindas e saúdo todos os meus hóspedes. Dirijo palavras de boas-vindas e saudação aos Membros do Conselho Geral do Episcopado da Polónia que, acompanhados por Sua Eminência o Cardeal Franciszek Macharski e o Arcebispo Józef Glemp, Primaz da Polónia, sucessor na Sé de Gniezno e Varsóvia do inesquecível Cardeal Stefan Wyszynski, vieram para tomar parte na inauguração do novo Centro polaco em Roma, ao qual estão ligadas as grandes esperanças de todos nós. Dirijo estas palavras a Sua Eminência o Cardeal Ladislaw Rubin, que assumiu a presidência do conselho de administração da recente Fundação que deve funcionar como base, e ao Excelentíssimo Arcebispo Andrzej Deskur, o polaco mais antigo ao serviço da Santa Sé.

As mesmas palavras dirijo aos numerosos representantes da Emigração polaca em todo o mundo, que é a fundadora desta nova obra. As mesmas palavras dirijo a Sua Eminência o Cardeal John Krol e ao Senhor Clement Zablocki, membro do Parlamento dos Estados Unidos da América, agradecendo-lhe o magnífico discurso. E a todos aqueles que nesta obra empenharam a própria autoridade, dedicando-lhe tanto coração e tanto trabalho. As mesmas palavras dirijo a muitos outros, aos Senhores Edward Piszek e Harry John, que também tiveram grande parte nesta obra. Deveriam mencionar-se ainda muitos outros, mas todos compreendem que é impossível.

Apresento as boas-vindas e uma saudação a todos vós aqui presentes e, mediante vós, a todos aqueles que de qualquer modo participaram e participam nesta obra: com a oração, com a oferta, com o conselho, com afectuoso interesse. Levai as palavras da minha gratidão e a Bênção às vossas casas, às famílias, aos vossos entes queridos. Levai esta palavra do Papa que também em nome da Igreja da Polónia, agradece a todas as comissões, às paróquias, às Congregações, aos diversos círculos, a cada pessoa a quem são familiares todas estas coisas de que esta Casa é símbolo e de algum modo actuação e ao mesmo tempo continuação.

Sei também que esta instituição deve muito a homens que, embora não sendo polacos e nem sequer tendo origens polacas, contribuíram, todavia, com espontânea generosidade.


Discursos João Paulo II 1981 - Quinta-feira, 5 de Novembro de 1981