Discursos João Paulo II 1981 - Terça-feira, 17 de Fevereiro de 1981


VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE

AO EXTREMO ORIENTE (PAQUISTÃO, FILIPINAS,

GUAM, JAPÃO E ALASKA)

ORAÇÃO DO PAPA JOÃO PAULO II

À VIRGEM NO SANTUÁRIO


DE NOSSA SENHORA DO PERPÉTUO SOCORRO


Manila, Bairro de Baclaran

Terça-feira, 17 de Fevereiro de 1981



Hoje é-me dado vir aqui pela segunda vez na minha vida. A primeira vez que aqui estive foi quando estava a caminho para o Congresso Eucarística na Austrália; ao celebrar a Missa à tardinha fui testemunha de uma verdadeira devoção filial e da imensa confiança que vós, ó Mãe do Perpétuo Socorro, gozais entre os fiéis, o povo que vive nesta grande cidade, capital das Filipinas.

Hoje, venho como Sucessor de São Pedro na Sé de Roma, dado que, através do inescrutável desígnio da Divina Providência, foi do agrado de Cristo chamar-me para o ministério universal da Igreja. Venho, seguindo os passos do meu predecessor Paulo VI, como peregrino, às Igrejas e aos povos do Extremo Oriente. Venho de Roma e ao mesmo tempo em estreita união com ela, para elevar à honra dos altares os Mártires que deram as suas vidas por Cristo em Nagasaqui, nos anos de 1633, 1634 e 1637. Entre eles estava o Filipino Lorenço Ruiz, o primeiro filho da Igreja nesta terra a alcançar a glória da beatificação.

A vós, ó Rainha dos Mártires e Mãe da Igreja, quero confiar de modo especial este meu ministério papal e os seus mais diversos aspectos. Foi do sangue de mártires que, logo desde o início, a Igreja do vosso Filho nasceu e cresceu forte, a Igreja de Jesus Cristo, em cujo sacrifício na Cruz vós, ó Mãe, cooperastes com o maternal sacrifício do vosso coração (cf. Lumen Gentium LG 58).

De facto, verificamos muitos exemplos de igual testemunho dado por santos e bem-aventurados Mártires em várias partes do grande Continente da Ásia. A implantação da fé confirma com sangue a semente já profundamente enraizada no solo da história. Mas não somos nós, seres humanos, que podemos medir e saber se esta implantação é suficiente para a edificação do serviço do Evangelho e da Igreja nestas várias terras e nas inúmeras ilhas que estão em redor. Este juízo deixamo-lo à misericórdia do próprio Deus, ao coração do nosso Redentor e Senhor e ao Espírito Santo que orienta a humanidade e a Igreja mediante o testemunho de sangue para com o Reino de amor e de verdade.

E ainda, todo este imenso trabalho que está sempre diante de nós, eu, João Paulo II, com a plena consciência da minha humana fraqueza e indignidade, desejo — como sempre faço — confiar-vos, ó Mãe de Cristo e da Igreja, para que veleis com o vosso incessante amor maternal por ela em toda a parte, pronta a servir com todas as formas de socorro em cada coração humano e entre todos os povos. E especialmente entre aqueles que são mais tristemente provados pelo sofrimento, pela pobreza e por toda a espécie de aflição quaisquer que sejam.

Assim, ao iniciar-se a minha visita pastoral ao Extremo Oriente, entrego-vos e recomendo-vos com absoluta confiança, como Mãe do nosso Redentor, todas as nações e povos da Ásia e as ilhas que estão em redor. Entrego-vos e recomendo-vos a Igreja, especialmente naqueles lugares onde ela se sente em maior dificuldade, onde não é convenientemente compreendida a sua missão, nem tão pouco o seu irresistível desejo de servir as pessoas e os povos. Entrego-vos hoje, no início desta peregrinação, a hospitaleira Filipinas e a Igreja que, tendo sido aqui particularmente enraizada coro vigor, também sente especialmente com vigor a sua responsabilidade missionária. Oxalá não lhe falte a energia necessária para a obra de evangelização! Oxalá persevere, como o servo fiel que espera constantemente a vinda do Senhor, no serviço do seu próprio povo e na abertura para todos os outros.

Mãe do Perpétuo Socorro, aceitai esta humilde súplica e colocai-a no Coração do vosso Filho vós, que tendo estado junto da sua Cruz no Calvário, ali fostes dada a cada um de nós como nossa Mãe. Amém.



VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE

AO EXTREMO ORIENTE (PAQUISTÃO, FILIPINAS,

GUAM, JAPÃO E ALASKA)

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

NA CERIMÓNIA DE BOAS-VINDAS ÀS FILIPINAS


Aeroporto Internacional de Manila

Terça-feira, 17 de Fevereiro de 1981



Senhor Presidente,
Eminências e Veneráveis Irmãos no Episcopado,
Caros irmãos e irmãs em Cristo,
Querido povo das Filipinas

1. Salamat sa Puong Maykapal! Demos graças a Deus! Com profunda gratidão a Deus por me ter sido dado vir às Filipinas, dirijo a minha mais sentida saudação de amor e paz a todos vós. É uma grande alegria pisar o solo deste amado país, e aguardo com antecipado prazer os próximos dias que passarei entre vós.

2. Venho até vós no nome de Jesus Cristo, de quem sou Servo. E venho para uma visita de natureza religiosa e pastoral a fim de proclamar o seu Evangelho, proclamar a salvação no seu nome. Como sucessor do Apóstolo Pedro é meu desejo confirmar os meus irmãos e irmãs da Igreja católica na sua fé em Nosso Senhor Jesus Cristo, que é a nossa justiça e a nossa paz, o nosso maior tesouro e a única fonte da nossa esperança.

3. Exactamente na primeira semana do meu pontificado, o Cardeal Sin falou comigo sobre a possibilidade da minha vinda às Filipinas, por ocasião do quarto centenário da Igreja em Manila. Naquela altura pediu-me para beatificar Lorenzo Ruiz aqui nesta cidade capital. Embora não tivesse sido possível satisfazer este pedido no Ano Jubilar de 1979, desejo agora, com a primeira Beatificação de um filho nativo desta terra, levar a termo, por assim dizer, esta celebração centenária. Esta é a primeira e principal razão da minha vinda, A Beatificação que também honrará solenemente outros quinze mártires cristãos, é sem dúvida um acontecimento histórico para este país e uma grande bênção para a Igreja em toda a parte do mundo. A vida heróica deste leigo filipino e o testemunho de fé dos seus companheiros recordam-nos que todos nós somos chamados à santidade de vida, e que, como escreveu São Paulo, o poder de Deus que "opera em nós, pode fazer infinitamente mais do que tudo quanto podemos ou entende-mos" (Ep 3,20).

4. E assim vim participar com o povo filipino nesta ocasião de grande alegria e de orgulho cristão. Pela história da Igreja na minha pátria, sei quanto foi importante naquele tempo, para todo o povo da Polónia, a primeira canonização de um seu filho nativo, Santo Estanislau. Realizou-se em Assis, em 1253. Sabeis que na época actual todas as cerimónias deste género se realizam habitualmente em Roma, na Sé de Pedro, centro da Igreja universal. Excepcionalmente, um rito de Beatificação terá lugar agora, pela primeira vez, fora de Roma. A celebração será realizada de modo diferente, mas verdadeiramente no coração da Igreja, na Igreja local onde o Bem-aventurado Lorenzo Ruiz cresceu na fé.

Este extraordinário acontecimento mostrará de modo claro como as duas dimensões da única Igreja — a dimensão universal e a dimensão local — são complementares e se incluem reciprocamente. É conveniente que a moldura de tal acontecimento sejam as Filipinas, nação conhecida pelo dinamismo da sua fé cristã e ao mesmo tempo pela sua sólida tradição de incontestável fidelidade ao Bispo de Roma.

5. Em relação com esta cerimónia também me é grato fazer uma visita pastoral através das Filipinas. O longo programa dar-me-á a possibilidade de me encontrar com pessoas de diversas regiões. Gostaria muito de ir a toda a parte, de me encontrar com todas as florescentes paróquias católicas, de estar com a gente dos bairros de todo o território, mas o tempo é limitado. Todo o povo das Filipinas estará no meu coração e na minha oração quando eu visitar as diferentes comunidades incluídas no programa.

A este propósito, estou-lhe muito grato, Senhor Presidente, como também às autoridades nacionais e locais, por terem tornado possível tudo isto, e por me terem oferecido a hospitalidade das Filipinas.

6. Desejo igualmente, mediante esta viagem apostólica, manifestar o meu respeito e a minha estima pela Ásia inteira, por todos os países que vos são vizinhos nesta parte do mundo. Aos membros das outras Igrejas cristãs, aos quais também tenho a felicidade de chamar irmãos e irmãs em Cristo, apresento cordiais e fraternais saudações. E a todos aqueles que pertencem a religiões não cristãs dirijo a minha sincera saudação como amigo e irmão na única família humana.

7. Ao ser-me dado por Deus este privilégio de visitar o vosso país que é constituído por milhares de ilhas, sinto-me impelido a repetir, em louvor do nosso Criador, as palavras do Salmista: "O Senhor reina: Exulte de alegria a terra, rejubilem as numerosas ilhas" (Ps 96,1). Verdadeiramente, exultem de alegria e rejubilem as numerosas ilhas das Filipinas no amor misericordioso do nosso Deus!

Deus vos abençoe!

Deus abençoe as Filipinas!

Mabuhay ang Filipinas: Longa vida às Filipinas!

VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE

AO EXTREMO ORIENTE (PAQUISTÃO, FILIPINAS,

GUAM, JAPÃO E ALASKA)

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

NA CERIMÓNIA DE DESPEDIDA DO PAQUISTÃO


Aeroporto de Karachi

Segunda-feira, 16 de Fevereiro de 1981



Senhor Presidente,
Caros amigos

1. Hoje, ao iniciar outra viagem pastoral, é-me grato que a primeira etapa ao longo do caminho tenha sido no Paquistão. É agradável estar com todos vós, e foi uma alegria poder adorar o Deus vivo juntamente com os meus irmãos e irmãs da Igreja católica que vivem neste país. Esta viagem pastoral, como as precedentes que realizei, é essencialmente de carácter religioso.Como supremo Pastor da Igreja católica, desejo encontrar-me com os membros das comunidades cristãs locais ao longo do mundo, tanto para compreender melhor a eles e as suas necessidades, quanto para apreciar melhor os seus inigualáveis dons e energias, e acima de tudo para os encorajar na prática da fé cristã.

2. É-me grato que estas viagens também me dêem a possibilidade de me encontrar com membros de outras crenças, e de chegar a apreciar a rica herança cultural de outros povos e nações. É uma satisfação descobrir as preocupações comuns que são partilhadas por todos os homens e mulheres de boa vontade: preocupações, por exemplo, pela dimensão espiritual da pessoa humana, pela liberdade e dignidade de cada homem, mulher e criança, pela verdadeira justiça e uma paz duradoura.

3. É especialmente agradável atestar como os laços que unem todos aqueles que crêem em Deus se reforçaram nos anos recentes. Estou a pensar de modo particular nos laços de diálogo e de confiança que se estabeleceram entre a Igreja católica e o Islão. Mediante o diálogo chegámos a ver mais claramente os inúmeros valores, das práticas e dos ensinamentos que ambas as nossas tradições religiosas adoptam: por exemplo, a nossa fé no único Deus todo-poderoso e misericordioso, o Criador do céu e da terra, e a importância que atribuímos à oração, à prática da caridade e ao jejum. Peço por que esta mútua compreensão e este respeito entre Cristãos e Muçulmanos, e também entre todas as religiões, continuem e cresçam mais profundamente, e por que ainda encontremos melhores modos de cooperação e colaboração para o bem de todos.

E agora, antes de partir, permiti-me que expresse a minha gratidão a todos vós que me destes tão amáveis boas-vindas. A Vossa Excelência, Senhor Presidente, e ao Governo e aos funcionários civis que asseguraram a boa ordem durante a minha visita, o meu apreço. Também desejo agradecer a todos que trabalharam tão diligentemente para a necessária organização e preparação deste dia. Deus recompense a vossa generosidade. Vos abençoe como também às vossas famílias, com a alegria e a paz.

Querido povo do Paquistão, dirijamos o nosso pensamento para a bondade e misericórdia de Deus, com as palavras do Salmista: "Aclamai o Senhor, todas as terras! Servi o Senhor com alegria! Vinde à Sua presença e exultai" (Ps 99,1-2)!



VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE

AO EXTREMO ORIENTE (PAQUISTÃO, FILIPINAS,

GUAM, JAPÃO E ALASKA)

MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II

AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA ISLÂMICA DO PAQUISTÃO


NA CERIMÓNIA DE BOAS-VINDAS A KARACHI


Segunda-feira, 16 de Fevereiro de 1981



Senhor Presidente

1. Ao chegar ao Paquistão, saúdo Vossa Excelência em espírito de amizade, e por seu intermédio estendo as minhas saudações a todo o povo do seu país: os membros da Igreja católica e de outras Igrejas cristãs, o povo Muçulmano que nós, seguidores de Jesus Cristo, temos em alta estima, e todos os homens e mulheres de boa vontade e das outras crenças.

A minha visita ao seu país e toda a viagem que estou a iniciar hoje é principalmente de natureza religiosa. Vim como Pastor universal da Igreja católica e desejo confirmar na fé todos os meus irmãos e irmãs da religião católica. Assim, sinto especial alegria ao unir-me com o Cardeal Cordeiro e com os meus irmãos Bispos no Paquistão, com o clero, os religiosos e os leigos, no nosso mais sagrado acto de adoração, a celebração da Sagrada Eucaristia.

2. A Igreja, cuja principal missão, sem dúvida, é unicamente espiritual, sempre se esforça por colaborar com todas as nações e povos de boa vontade na promoção da dignidade e do progresso da pessoa humana. Ela realiza os seus esforços por vários meios, tais como escolas e programas educativos, e mediante instituições caritativas e sociais. A este propósito, é-me grato verificar como a Igreja católica e o Governo do Paquistão juntos aqui trabalham em harmonia para o bem de todos. Rezo pelo contínuo êxito desses esforços.

Uma das especiais tarefas da Igreja no momento presente é a situação dos refugiados, problema a ser enfrentado pela sua nação e por muitos outros países. Aproveito esta ocasião para expressar o meu apreço pelos esforços que o Paquistão fez, e continuará a fazer, em favor dessas pessoas dispersas. E quereria assegurar a Vossa Excelência que, exactamente a Igreja que já tem ajudado nesses esforços, ela também deseja continuar a fazê-lo, dentro dos limitados meios que lhe são possíveis.

3. Uma das principais características de Abraão — em cuja fé Cristãos, Muçulmanos e Judeus de modo idêntico se unem ardorosamente a ele — era o seu grande espírito de hospitalidade, como demonstrou numa particular ocasião quando se encontrou com três visitantes no vale dos carvalhos de Mambré (cf. Gên Gn 18,1 ss.). O caloroso acolhimento, que Vossa Excelência e o querido povo do Paquistão me oferecem nesta feliz ocasião, é a expressão deste idêntico espírito de hospitalidade.

Por isso, sinto-me profundamente grato e gostaria de retribuir a sua gentileza com a garantia das minhas orações.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


A UMA REPRESENTAÇÃO DA COMUNIDADE


ARMÉNIA NA FRANÇA


Sexta-feira, 13 de Fevereiro de 1981



Caros Senhores

Esperáveis vivamente este encontro com o Bispo de Roma, ao qual as vossas comunidades arménias sempre testemunharam muita dedicação. Eu próprio dou graças a Deus por me ter sido possível receber-vos, precisamente antes de empreender a minha viagem apostólica ao Extremo Oriente, que me permito recomendar à vossa oração.

Ao receber a vossa delegação, que representa a Repartição Nacional da Cultura e das Tradições Arménias na França, o meu olhar e o meu coração voltam-se muito naturalmente e com emoção para os seis milhões de Arménios, vossos irmãos, que moram nos países de Leste ou que vivem em diáspora nas regiões ocidentais. Todos juntos, sois este povo particular cuja existência e história original contam mais de vinte e cinco séculos, este povo com destino movimentado e demasiadas vezes trágico, que sobrevive graças ao seu espírito comunitário e à sua fé. O coração dos Arménios sofre. Quereria que todos e cada um deles soubessem que sou profundamente solidário com o seu sofrimento.

Neste breve encontro — sem me substituir aos vossos responsáveis imediatos — a feliz ocasião permite-me contribuir para reanimar a vossa fé cristã e a vossa identidade cultural, que são dois tesouros de natureza diferente e no entanto historicamente interdependentes. Sem recordar em pormenor os inícios e as etapas do cristianismo arménio, podemos bendizer juntos São Gregório o Iluminador, o vosso primeiro Bispo, por ter tão ardentemente evangelizado o vosso país, e bendizer muitos outros Pastores que seguiram as suas pegadas. E como se poderia esquecer o testemunho particularmente impressionante dos mártires arménios desde as origens até aos nossos dias? No próximo domingo, na vossa igreja arménia de Roma, comemorais o mais célebre entre eles, São Vartan. Peço-lhe, em união convosco, que sustente a coragem e a fé dos vossos irmãos mais provados.

Apesar das perseguições e das tribulações de toda a espécie, a fé vivida pelos vossos antepassados — pastores e fiéis — chegou até vós. Mas é necessário que a vivais em diáspora, em países com técnica e economia avançadas, que conhecem mudanças culturais importantes. Vós sentis, não raro muito profundamente, que os valores espirituais, herdados quer da religião quer da moral natural, são postos à prova numa atmosfera de secularização, de materialismo prático e de revolução científica. É por isto que faço votos por que nos vossos lugares respectivos, frequentemente importantes e influentes, e em união com os vossos responsáveis jerárquicos, vós possais contribuir para o advento de um novo sopro espiritual no meio das comunidades arménias a que pertenceis. A fé, hoje como ontem — estais bem cientes disso — não é nem uma evasão da existência, nem uma compensação para os maus êxitos e as frustrações da vida. É, antes de tudo, luz recebida de Deus, e que se torna luz sobre o homem da história humana. É este problema-chave das relações da humanidade e de cada ser humano com Deus, plenamente revelado e dado ao mundo em Jesus Cristo, que me esforcei por exprimir na Redemptor hominis, o primeiro documento do meu pontificado. A este apelo para a renovação da fé nas vossas comunidades, quero juntar um louvor pelo sentido de solidariedade e de caridade evangélica de que dais testemunho animando os vossos centros culturais e sobretudo provendo às necessidades das comunidades mais pobres, quer estejam perto ou longe.

Exorto-vos também a preservar e aprofundar as riquezas da vossa cultura arménia, sem dúvida original e à qual — acentuei-o no início deste encontro — a vossa Igreja, por assim dizer, deu vida e crescimento. Não nasceu o alfabeto arménio com a primeira tradução da Bíblia na vossa língua, durante o século V, graças ao célebre monge, São Mesrob Machtotz? Moisés de Khorète, grande cronista do seu tempo, Gregório de Narek, o místico e poeta do século II, Norcès o Gracioso, o tão célebre catholicos do século XII, são alguns entre muitos outros grandes nomes da cultura arménia. Sois herdeiros de um maravilhoso património de literatura e poesia, de história e filosofia, de teologia e mística, de música sacra e manuscritos não raro admiravelmente iluminados, de catedrais, de igrejas e de mistérios de grande valor artístico e histórico. Todos estes tesouros vos permitem comunicar à alma e ao génio do vosso povo, um espírito modelado de fé religiosa. Desejo vivamente que continueis a dedicar o melhor de vós próprios à conservação e à transmissão, e mesmo à renovação da cultura arménia na sua integridade.

Recordais-vos sem dúvida, a este propósito, que no mês de Junho passado, na tribuna da UNESCO, me foi dado exprimir como testemunha e como filho de uma nação diversas vezes condenada pelos seus vizinhos a desaparecer, mas que sobreviveu — não apoiando-se nos recursos da sua força física — unicamente apoiando-se na sua própria cultura, incessantemente animada por um grande sopro haurido do Evangelho. Ao inserirdes-vos o melhor possível nos vossos diversos centros de diáspora, continuai a ser vós mesmos. Sede firmes no terreno da vossa cultura arménia, com a tenacidade, a inteligência e a fé que caracterizam o vosso povo, mas sede vigilantes em recusar e condenar o recurso à violência e ao terrorismo. Os vossos descendentes recolherão, na época definida pela história, os frutos da vossa fidelidade, do vosso ardor e da vossa paciência. Peço a Deus, todo-poderoso e misericordioso vos dê a vós próprios e a todos os vossos irmãos Arménios, a coragem de perdoar e de continuar a escrever a vossa misteriosa história na esperança. Em nome do Senhor, sinto-me feliz em vos abençoar.

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

À UNIÃO DE PRODUTORES E DISTRIBUIDORES

DE ENERGIA ELÉCTRICA


Segunda-feira, 9 de Fevereiro de 1981



Senhores

Manifestastes o desejo de vos encontrar com o Papa por ocasião da reunião anual da Comissão Directiva da vossa União Internacional. Agradeço-vos a vossa cordialidade e a vossa confiança. Sede bem-vindos.

Sem entrar, evidentemente compreendê-lo-eis sem dificuldade nas questões técnicas demasiado complexas que são objecto dos vossos debates, é fácil intuir a importância da vossa missão de Produtores e de Distribuidores de energia eléctrica.

Hoje, a actividade de quase todos os sectores da vida humana está dependente da, energia eléctrica que vós lhes forneceis, inclusivamente esta Casa: não para a iluminação, mas para o funcionamento de tantos aparelhos de que o homem moderno não pode prescindir na sua vida e no seu trabalho. A mais pequena interrupção causa problemas difíceis, vezes graves, sobretudo se é em grande escala, como acontece em certos momentos em que a desligação se torna necessária. É um dos pontos em que os homens de hoje tomam consciência da sua comum dependência. Sei que vos prodigais para lhes evitar estes obstáculos.

Os consumadores depositam confiança em vós. Mas tendes difíceis problemas a resolver, devido ao progressivo e rápido aumento do consumo, e ao facto que as fontes energéticas, em comparação com as necessidades, têm desenvolvimento insuficiente, e até mesmo crises. Em todo o caso, não se deveria desperdiçar a energia de que o Criador nos permitiu dispor, quando se conhecem as carências de que o nosso mundo sofre. É tanto vãs como os responsáveis dos países, sois chamados a prever as necessidades e as vicissitudes do futuro, a prever os movimentos bruscos, a procurar, com muita imaginação, resolução e prudência, novas fontes de energia eléctrica, a colaborar, como exige a solidariedade, no piano nacional e internacional, entre países europeus e as instituições da comunidade internacional, para que a repartição seja regular e não conheça crises nocivas.

Estas simples palavras quereriam mostrar-vos que o Papa compreende o compromisso da vossa profissão e pretende ajudar-vos a haurir as energias espirituais e morais de que manifestastes desejo ao pedir esta audiência. Encontrá-las-eis em particular na consciência de terdes um grande serviço público a assegurar, com regularidade e longo alcance, na consciência de contribuirdes para o bem comum de todos os vossos compatriotas e talvez também para a educação da responsabilidade deles no modo de gastar a energia, Peço a Deus fortifique em vós esta consciência dos vossos deveres, que vos fará procurar soluções justas, corajosas e proveitosas para todos.

A necessidade da energia que vos é familiar leva-me a pensar nesta energia moral de que os membros da sociedade têm também necessidade para resolver, com dignidade e equidade, os graves problemas humanos que enfrentam em todos os campos; mas esta energia brota apenas do coração das pessoas bem formadas e não se propaga senão pela irradiação de tais personalidades e pelo acolhimento que lhes é dado livremente. Peço que esta energia não venha nunca a faltar no nosso tempo, nos nossos países. Para os cristãos, se quisermos continuar o confronto, a Igreja apresenta-se também coma uma imensa rede irrigada secretamente pela vida de Cristo ressuscitado, como membros de um mesmo Corpo. Desejo também que muitos se alimentem desta Vida misteriosa, que é o grande dom de Deus.

Ao terminar estas reflexões, faço-vos os meus melhores votos pelas responsabilidades que tendes e peço a Deus abençoe as vossas pessoas, as vossas Esposas que me é grata saudar convosco, e as vossas famílias.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DO CÍRCULO DE ROMA


Sábado, 7 de Fevereiro de 1981



Caros e ilustres Senhores do Círculo de Roma!

Com afáveis palavras o vosso Presidente, Advogado Vittorino Veronese, quis apresentar-me as vossas pessoas e o vosso Circulo, na sua organização, nas suas ideias orientadoras e nas suas finalidades. Agradeço-lhe de coração e também a vós, pela vossa qualificada presença, que me proporciona encontrar-me hoje com personalidades da Cultura e da Diplomacia, unidas todas pelos ideais humanos, espirituais e religiosos, que estimulam os ânimos busca da verdade, do bem, da beleza, da justiça, da paz e da solidariedade,

1. A vossa Associação desde o seu início quis tomar o nome "Roma", e isto não só porque tem a sua sede social na Urbe, mas porque entendia reconhecer que Roma, com e sua história, com as suas riquezas artísticas, mas ainda mais com a sua herança cristã, representou durante séculos e representa também hoje um estimulo exaltante, um ponto constante de referência e de orientação para o homem contemporâneo, o qual, ao chegar a, esta maravilhosa e extraordinária Cidade, se sente em casa própria, porque ninguém é estrangeiro em Roma: não o era, na antiguidade clássica, quem aqui chegava de longínquos confins e admirava os seus monumentos e a sua sábia legislação jurídica, fundamentalmente respeitosa das várias diversidades étnicas; não o é o turista de hoje, respirando nela uma atmosfera de abertura e de universalidade, que são quase a especifica característica da Urbe.

O africano Santo Agostinho, bispo de Hipona, vibrava de entusiasmo por Roma, "caput gentium", e quando em 410 os soldatos de Alarico a invadiram e a saquearam, ele, meditando no plano providencial de Deus, afirmava que a Roma pagã estava para desaparecer para fazer surgir a Roma cristã; e cheio de admiração pelas antigas virtudes éticas dos Romanos, que tinham conseguido criar o glorioso império, convidava os cristãos a seguirem o exemplo deles: "... non solum ut talis merces talibus hominibus redderetur, Romanorum imperium ad humanam gloriam dilatatum est; verum etiam ut cives aeternae illius civitatis, quamdiu hic peregrinantur, diligenter et sobrie filia intueantur exempla, et videant quanta dilectio debeatur supernae patriae propter vitam aeternam, si tantum a suis civibus terrena dilecta est propter hominum gloriam" (De Civitate Dei, V, 16: PL 41, 160).

Tal sentido da "romanidade" o vosso Círculo pretende manter e desenvolver, mediante iniciativas que vim sara, em particular, a reaproximação entre cristãos em espírito ecuménico.

Desejo manifestar-vos a minha satisfação por esta explícita finalidade "ecuménica" do Sodalício, que sentiu desde os primeiros tempos da sua fundação as exigências de trabalhar intensamente pelo restabelecimento da unidade dos cristãos, segundo as orientações do Concílio Vaticano II, o qual afirmou que as iniciativas ecuménicas contribuem para promover a equidade e a verdade, a concórdia e a colaboração, a caridade fraterna e a união, e fez votos por que todos os cristãos se reúnam naquela unidade de uma e única Igreja, que foi dada par Cristo, desde o inicio, a Sua Igreja (cf. Decr. Unitatis Redintegratio UR 4).

2. O vosso Sodalício nasceu também para favorecer o mútuo conhecimento e a melhor cooperação de propósitos entre pessoas, que desempenham uma qualificada actividade na vida e na cultura internacional, levando-as a um claro testemunho católico.

Os vários encontros, as conferências, os debates que promovestes nestes anos, enfrentando temas e argumentos de viva actualidade, deram ao Círculo uma fisionomia de grande seriedade, pelo esforço de abertura, de encontro e de aproximação com a cultura e a realidade contemporânea.

Faço votos por que a vossa Associação realize plenamente a orientação dada neste campo pelo Concílio Vaticano II: "Os fiéis... vivam portanto muito unidos aos outros homens da sua época e procurem perceber perfeitamente as suas maneiras de pensar e de sentir, expressas pela cultura. Unam os conhecimentos das novas ciências e doutrinas e das últimas descobertas com a moral e os ensinamentos da doutrina cristã, para que a cultura religiosa e a :rectidão moral caminhem, junto dos mesmos homens, no mesmo passo do conhecimento das ciências e da técnica em progresso incessante, e assim consigam ales apreciar e interpretar todas as coisas com sensibilidade autenticamente cristã" (Const. Gaudium et Spes GS 62).

Tal sensibilidade, que faz julgar e interpretar toda a realidade a científica, a humana, a histórica, a artística, a social e a política não deve contudo permanecer a nível puramente teorético, porque no cristão não pode existir separação entre teoria e praxis. O "claro testemunho católico", que deve inspirar o vosso diálogo com a cultura contemporânea, significa sobretudo o testemunho concreto e activo da vossa fé, a ponto de estimular os homens a glorificarem o Pai celeste (cf. Mt Mt 5,16).

No início do segundo século, Santo Inácio, bispo de Antioquia e mártir, escrevia aos Efésios: "Como a árvore é conhecida pelos seus frutos, assim aqueles que se professam discípulos de Cristo serão conhecidos pelas suas obras. Portanto não é questão de professar a fé com as palavras, mas é necessária a forca da para serem fiéis até ao fim" (Carta aos Ep 14,2).Estas palavras conservam uma extraordinária actualidade.

Faço votos, portanto, por que o vosso Círculo continue, com dinamismo sempre jovem, o seu caminho no espírito das suas altas finalidades, enquanto sobre todos vós, sobre os vossos familiares e sobre os que vos são caros invoco a abundância das graças divinas, em penhor das quais vos concedo de coração a Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS JORNALISTAS DA ASSOCIAÇÃO


DA IMPRENSA ESTRANGEIRA


Sexta-feira, 5 de Fevereiro de 1981



Ilustres membros da Associação da Imprensa Estrangeira na Itália!

1. Sinto-me particularmente feliz ao receber, nas vossas pessoas, os qualificados Representantes da imprensa estrangeira em Roma. Agradeço-vos por este encontro familiar e exprimo, em particular, o meu grande apreço ao vosso Presidente por ter sido o intermediário desta audiência e por tê-la introduzida com as suas gentis palavras. É-me ainda propícia esta ocasião para externar a minha satisfação a todos os membros da Associação, a qual, seja pelo carácter internacional dos que a compõem, seja, o que mais vale, pelo espírito de colaboração que a distingue, constitui um exemplo de trabalho bem organizado na vossa actividade de informadores e formadores da opinião pública.

2. A vós, operadores da comunicação social, provenientes de tantos Países e de diferentes culturas, desejo propor estas palavras da Sagrada Escritura: "Como água fresca para a boca do sedento, assim é uma boa nova vinda de terras longínquas" (Provérbios, 25, 25). Nestas palavras inspiradas a "boa informação" tem para o homem em caminho a mesma importância de uma refrescante fonte nascente em terra árida. Ao ser tal o específico valor da vossa contribuição, é fácil imaginar como a sua realização seja complexa e árdua, especialmente quando se trata de fazer que os leitores compreendam melhor a vida, a vocação, o testemunho e o trabalho da Igreja de Roma e do seu Bispo, Sucessor de Pedro e Pastor da Igreja universal. Compreendo as dificuldades que encontrais em fazer que sejam conhecidas e esclarecidas através dos vossos órgãos de informação a actividade e a realidade da Igreja, a qual é antes de tudo mistério de fé (cfr. Lumen Gentium LG 1).

3. Precisamente para vos ajudar neste vosso esforço, o próximo Dia Mundial para as Comunicações Sociais entende proclamar o valor insubstituível de uma "liberdade responsável" no exercício da vossa actividade como nunca delicada: o tema desse dia mundial é precisamente o seguinte: "As comunicações sociais ao serviço da liberdade responsável do homem". De facto, somente na liberdade e mediante a liberdade responsável é que podereis desempenhar a vossa missão de observadores e informadores, e desenvolvê-la sob a forma de "boa nova aos países longínquos". O vosso leit-motiv seja portanto: "Informar melhor para ser mais responsável e mais livre". A informação é um caminho, através do qual cada pessoa assume livremente maior responsabilidade diante dos destinos da humanidade. Sem uma "boa informação", não há exercício de responsabilidade, visto que a liberdade responsável da humanidade depende de uma exacta compreensão e de uma nova coordenação da informação no mundo inteiro. O voto que surge destas considerações é por que as "boas notícias" possam circular dentro de todos os "países longínquos" sem excepção ou limitação de classes, e sem interpretações unilaterais.

4. Não sendo possível entrar aqui na parte essencial do argumento e tratá-la de maneira completa, limito-me a recordar uma expressão dirigida pelo meu venerado Predecessor Pio XII aos editores e escritores: "Certainly a first postulate of such freedom is to have access to the truth" (Discorsi e Radiomessaggi di Sua Santità Pio XII, vol. VIII, p. 171). Liberdade para a verdade, liberdade na unidade e liberdade na caridade: eis os estímulos mais dinâmico e mais intensos desta liberdade. Mas como já disse em outras ocasiões, desejo convidar-vos a não considerardes esta liberdade como sinónimo de desregramento, a tal ponto de reivindicar até "o direito ao mal moral" (cfr. A.A.S., 1980, PP 81-82), mas, pelo contrário, exorto-vos a tornardes-vos os advogados, os defensores a nível internacional desta liberdade, de que necessitam os homens de hoje, e de que também a Igreja tem tanta necessidade para ela mesma existir. Como já vos disse o Papa Paulo VI durante a audiência agora recordada pelo vosso Presidente, repito-vos com veemência: "Estai atentos em defender sempre e em toda a parte os justos direitos e a verdadeira liberdade das pessoas sem caírdes em discriminações parciais, como, infelizmente, sucede por causa dos regimes políticos em causa, ou das preferências pessoais que nos tornam sensíveis unicamente para com as vítimas cujas ideias ou convicções compartilhamos... Não permaneçais mudos quando a dignidade e a honra da pessoa humana são ameaçadas pela violência, pela exploração económica, pelo relaxamento dos costumes, do qual a nossa sociedade permissiva com demasiada frequência dá um triste espectáculo" (Ensinamentos de Paulo VI, vol. 7, 1976, p. 189).

5. Ilustres Senhores, sede sempre dignos desta missão, que qualifica tão nobremente o serviço por vós prestado. Os vossos leitores têm direito de contar convosco, com o vosso sentido de responsabilidade e com a plena fidelidade a tudo o que honra a vossa profissão: objectividade, lealdade e sábia ponderação ao apresentar as notícias, sem nunca perder de vista as consequências possíveis para os vossos destinatários e as exigências do verdadeiro bem da sociedade.

Pela minha parte peço ao Senhor que vos ajude a bem continuardes, com coragem e senso de responsabilidade, o vosso trabalho que desejo agora confortar com uma especial Bênção, em sinal e auspício de benevolência e de espiritual compreensão e apoio.




Discursos João Paulo II 1981 - Terça-feira, 17 de Fevereiro de 1981