Discursos João Paulo II 1981 - Quinta-feira, 19 de Março de 1981


VISITA PASTORAL DO SANTO PADRE

À TERNI (ITÁLIA)

(19 DE MARÇO DE 1981)

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

AOS SACERDOTES E RELIGIOSOS


DA DIOCESE DE TERNI


Residência Episcopal de Terni

Quinta-feira, 19 de Março de 1981



1. Não podia faltar, mesmo num dia intenso como este, o encontro convosco, caríssimos Sacerdotes e Religiosos que, em virtude da Sagrada Ordenação e da missão recebida das mãos do Bispo, fostes promovidos ao "serviço de Cristo Mestre, Sacerdote e Rei, participando do Seu ministério, por meio do qual a Igreja aqui na terra é incessantemente edificada corno Povo de Deus, Corpo de Cristo e Templo do Espírito Santo" (Dec. Presb. Ord., 1).

Vejo com vivíssimo prazer que estão aqui presentes os Irmãos do Episcopado Umbro. A Eles dirijo uma saudação particularmente cordial.

Desejei passar alguns momentos no meio de vós, caros Sacerdotes, para vos manifestar o meu especial afecto, e para que possais sentir-vos cada vez mais fortes e alegres na fé, que desejo cresça cada vez mais em Cristo, também por motivo desta minha visita (cf. Flp Ph 1,25-26).

2. A realidade tão sublime que trazeis em vós mesmos marcados por um especial carácter que vos configura a Cristo Sacerdote, de modo que podeis actuar em Seu nome (cf. Decr. Presb. Ord., 2) — comporta a consciência da grandeza da missão recebida e da necessidade de vos adaptardes cada vez mais a ela. É necessário diante do dom do Senhor ter clara e radicada convicção acerca do próprio ser de sacerdotes de Cristo, depositários e administradores dos mistérios de Deus, instrumentos de salvação para os homens. Estas certezas de fé não permitem duvidar da própria identidade, ficar titubante acerca do valor da própria vida e hesitar diante do caminho encetado.

Estou aqui no meio de vós para reforçar e aprofundar estas convicções, para as tornar invencíveis e constantes, convidando-vos a uma sempre mais íntima união com Cristo, nossa razão de vida e nossa força.

Por vezes a nossa sintonia de fé com Jesus pode-se enfraquecer e atenuar, se a Sua presença em nós é ofuscada por propensões e raciocínios humanos, devido aos quais sejamos incapazes de fazer brilhar toda a grandiosa luz que Ele representa para nós. "Cada sacerdote — como eu dizia aos Ordenandos de Nagasaqui, a 25 de Fevereiro último — capacita-se que pode iluminar quem está nas trevas, só na medida em que ele mesmo aceitou a luz do Mestre Jesus Cristo". Às vezes, falamos talvez d'Ele influenciados por princípios e dados de sabor sociológico, político e psicológico, em vez de fazermos derivar os critérios da nossa vida de um Evangelho vivido com integridade, com alegria, com aquela confiança e aquela imensa esperança que a Cruz de Cristo encerra.

3. Vós, caros Sacerdotes, por motivo até do vosso ministério, sois obrigados a viver no meio dos homens, a conhecer como bons pastores as próprias ovelhas, e a procurar conduzir também aquelas que não estão neste redil, a fim de que também elas oiçam a voz de Cristo (cf. Dec. Presb. Ord., 3). Todavia, enquanto realizais esta obra de aproximação, é necessário que os homens vejam em vós as testemunhas dignas de crédito do Amor divino e de um Reino que, iniciado na terra, se aperfeiçoará na vida eterna.

Também a particular realidade sócio-cultural da Igreja que está em Terni, Narni e Amélia — realidade a vós bem conhecida nas suas exigências e tensões, nas suas causas e nas suas orientações, e que parece às vezes opor graves obstáculos à penetração de urna mentalidade cristã — exige que se encontrem em vós não dirigentes sociais ou hábeis administradores, mas autênticos guias espirituais, que se esforcem por orientar e melhorar o coração dos fiéis para que, convertidos, vivam no amor de Deus e ao próximo e se empenhem na elevação e na: promoção do homem. Não nos iludamos julgando servir o Evangelho cedendo à tentação de "diluir" o nosso carisma num exagerado interesse pelos problemas temporais. Não nos esqueçamos que o sacerdote deve ser representante dos valores sobrenaturais, sinal e agente de unidade e de fraternidade.

4. Desejaria indicar-vos ainda um ponto de reflexão. Sois membros do Presbitério de uma Igreja particular, cujo centro de unidade é o Bispo, para o qual cada sacerdote, que aspire a uma verdadeira fecundidade do ministério deve ter urna atitude convicta de comunhão e de obediência. "Esta obediência sacerdotal — recorda-nos o Concílio — funda-se na participação mesma do ministério episcopal, conferida aos Presbíteros por meio do Sacramento da Ordem e a missão canónica" (Decr. Presb. Ord., 7).

Na actividade pastoral, tendo embora em conta as diversas problemáticas locais, reine um espírito de entendimento e de cooperação entre as iniciativas paroquiais e as diocesanas, por sua natureza abertas a horizontes mais vastos e a exigências mais gerais, como as respeitantes ao mundo do trabalho, das comunicações sociais, da escola, da cultura e da presença no campo civil.

A união entre os Presbíteros e o Bispo é especialmente necessária hoje, quando as várias iniciativas apostólicas transcendem muitas vezes os limites de uma paróquia ou diocese, e requerem que os sacerdotes unam as próprias forças às dos Irmãos, sob a guia daqueles que governam a Igreja.

5. Amadíssimos Sacerdotes e Religiosos, desejaria dizer-vos muitas outras coisas e desejaria ouvir a cada um de vós as ansiedades mais pessoais, mas não me é consentido prolongar demasiado este encontro. Termino renovando a minha grande confiança em vós, e exortando-vos a depositar a confiança n'Aquele que "fixou o número das estrelas e deu a cada uma o seu nome" (Sl 147/146, 4), e pronunciou o vosso nome chamando-vos desde o seio materno (cf. Is Is 49,1). A nossa confiança funda-se radicalmente neste "amor preferencial e consacratório de Deus", que sobretudo não abandona aqueles que, chamados a participar no Sacerdócio do Seu Filho, se dirigem a Ele confiantemente. Precisamente para isto, recorda-nos São Paulo que em todas as tribulações "somos nós mais que vencedores por Aquele que nos amou" (Rm 8,37). Concluo com a exortação do autor da Epístola aos Hebreus: "Não percais a vossa confiança, à qual uma grande recompensa está reservada. É preciso, efectivamente, que persevereis, cumprindo a vontade de Deus e alcançando assim a promessa" (He 10,35-36) .

Sob o olhar de Maria, Mãe dos Sacerdotes e dos Religiosos, tão venerada em Terni como Mãe da Misericórdia, continuai com novo entusiasmo o vosso caminho, e acompanhe-vos a minha Bênção Apostólica.



VISITA PASTORAL DO SANTO PADRE

À TERNI (ITÁLIA)

(19 DE MARÇO DE 1981)

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

NO ENCONTRO COM OS DOENTES E AS RELIGIOSAS


Catedral de Terni

Quinta-feira, 19 de Março de 1981



Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. Com grande intensidade de sentimentos, saúdo-vos a todos que levais no espírito e no corpo o peso e o sinal doloroso da Cruz de Cristo e que estais de modo especial, com o vosso humano sofrimento, unidos e inseridos no Mistério pascal.

Estou aqui convosco, caríssimos, para vos dizer que uma espiritual união me liga a cada pessoa que sofre; ou que está imobilizada e tolhida num leito, numa cadeira; ou que, por causa da própria dor e inabilidade, se julga já inútil; ou que às vezes sente, como Cristo no Getsémani, "pavor e angústia" (cf. Mc 14,33).

Sinto sinceramente que as minhas palavras são insuficientes e inadequadas para vos exprimir o meu sincero compartilhar, a minha compaixão. No entanto, ao mesmo tempo, eu e vós acreditamos firmemente, à luz da Palavra de Deus, que existe uma dimensão, incomensurável tanto pelos sentidos como pela simples razão humana, na qual o vosso sofrimento e o de todos os homens adquire um significado profundo e se transforma de fraqueza em força, de pobreza em riqueza, quando é iluminado pela Cruz de Jesus. "O que é fraco, segundo o mundo, é que Deus escolheu para confundir o que é forte... assim, ninguém se vangloriará diante de Deus" (1Co 27 1Co 29). Como o Pai celeste escolheu para a salvação dos homens a Cruz, sinal de ignomínia e de fraqueza, assim escolheu a vossa enfermidade para que esta cruz, colocada sobre os ombros e inserida nas vossas carnes, se torne — juntamente com a de Cristo — instrumento e sinal de salvação para vós, que a suportais na fé e na esperança cristã, e para todos os outros homens necessitados de salvação. Então podereis dizer sinceramente com São Paulo: "Prefiro gloriar-me das minhas fraquezas, para que habite em mim a força de Cristo. Alegro-me nas minhas enfermidades.., por Cristo, pois, quando me sinto fraco, então é que sou forte" (2Co 12,10).

2. Portanto, peço-vos, Irmãos e Irmãs aqui presentes, como também a todos os que em Terni sofrem nas enfermarias dos hospitais ou nas suas casas, que vos insirais com fé no mistério da Cruz de Cristo, oferecendo-Lhe a vossa dor humana, a fim de que Ele, unindo-a à sua, a ofereça ao Pai em oblação pura. Com o sofrimento e a oração podeis fazer um bem imenso em favor da Igreja e da humanidade.

Os Santos, os cristãos autênticos, iluminados pela graça do Espírito, intuíram o significado e a fecundidade da sua dor.

Nesta Catedral há um túmulo, sobre o qual se lê esta simples e tocante frase: "Giunio Tinarelli, testemunha de fé e de amor no sofrimento". Vós sabeis quem foi Giunio Tinarelli: um vosso concidadão nascido em 1912; portanto vosso contemporâneo. Aos doze anos, para ganhar o pão, começou a trabalhar, primeiro na Tipografia Alterrocca e depois nas secções das Usinas de aço de Terni. Mas, ainda muito jovem, foi vítima de terrível doença, que o imobilizaria por dezoito anos, até à morte, ocorrida em 1956, aos quarenta e quatro anos. Naquela imobilidade, naquele sofrimento, quanta fé, quanto amor o vosso Giunio transmitiu aos que iam visitá-lo, não já para o confortar ou consolar, mas para dele receber alívio e alento!

Ao recordar este modelo cristão, peço-vos que rezeis e ofereçais os vossos sofrimentos pela Humanidade, pela Igreja, e também por mim, para que o meu universal serviço pastoral se realize sempre segundo a vontade de Deus. E em nome da Humanidade, da Igreja e em meu nome digo-vos: "Obrigado!". Que o Senhor, rico em misericórdia, dê a paz e a alegria interior a todos vós e recompense com a sua graça também aqueles que de vós cuidam amorosamente com generoso desinteresse: os vossos familiares, os amigos, os médicos, os enfermeiros, os sacerdotes, as religiosas.

3. Desejo em seguida dirigir a minha cordial e afectuosa saudação a todas as Religiosas de Terni, reunidas nesta Catedral para o encontro de hoje, que deseja ser recíproca edificação do espírito.

Caríssimas Irmãs em Cristo! Quando sentistes no vosso coração, pelos caminhos imperscrutáveis, o convite para seguir "a vocação", respondestes generosamente com as palavras da Virgem Santíssima: "Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra" (Lc 1,38).

Tende sempre presente que a "vossa vocação religiosa" é um tesouro peculiar da Igreja e que a vossa presença no meio do Povo de Deus deve ser para todos um sinal visível do Evangelho. O vosso apostolado, tão diversificado, tão múltiplo e tão fecundo de bem, é contínuo sinal da perene vitalidade do Corpo místico de Cristo, no qual trazeis — com a vossa generosa dedicação, com o vosso admirável escondimento — aquela particular sensibilidade de mães e de irmãs espirituais.

Desejo repetir-vos aqui, hoje, quanto disse às Religiosas na minha peregrinação apostólica no México: "A vossa vocação é uma vocação que merece a máxima estima por parte do Papa e da Igreja, ontem como hoje. Por isso, vos quero manifestar a minha alegre confiança em vós e animar-vos a não desfalecerdes no caminho empreendido, que vale a pena prosseguir com renovado espírito e entusiasmo... Quanto podeis fazer hoje, pela Igreja e pela Humanidade! Elas esperam a vossa generosa entrega, a dedicação do vosso coração livre, que dilate incalculavelmente as suas potencialidades de amor num mundo que está a perder a capacidade de altruísmo, de amor sacrificado e desinteressado. Recordai-vos, com efeito, que sois místicas esposas de Cristo e de Cristo crucificado" (AAS 71, 1979, p. 177).

Como Maria Santíssima vós escolhestes Jesus, ao qual estais ligadas com os sagrados e suaves ligames da pobreza, castidade e obediência. Vivei em serena alegria e praticai estes votos com generosa dedicação, sempre fiéis ao carisma específico das vossas Congregações!

Sobre todos vós, Irmãos e Irmãs, invoco a abundância dos dons do Senhor e, de todo o coração, concedo-vos a Bênção Apostólica, sinal da minha afectuosa benevolência.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DA CONFERÊNCIA NACIONAL


DOS VIGÁRIOS PARA OS RELIGIOSOS


NAS DIOCESES DOS ESTADOS UNIDOS


Sexta-feira, 20 de Março de 1981



Caros Irmãos em Cristo

Desejo fazer chegar muito cordiais boas-vindas a cada um de vós, hoje. É alegria para mim encontrar-me com os Vigários para os Religiosos dos Estados Unidos, e com todos os que trabalham com eles numa área muito importante da vida e do ministério da Igreja.

1. Ao falar do papel dos Vigários Episcopais para os Institutos Religiosos, o Documento da Santa Sé Mutuae Relationes mostra que esta tarefa é serviço de colaboração com o ministério pastoral do Bispo. Na verdade, o mandato transmitido ao Vigário Episcopal consiste em ajudar a desempenhar uma tarefa que, de sua natureza, pertence exclusivamente ao Bispo, tarefa que é particular solicitude pela vida religiosa e pela coordenação orgânica dessa vida, dentro das actividades pastorais da diocese (cf. Mutuae Relationes, 54). Todos vós, de um modo ou de outro, vos estais esforçando por estar ao lado dos vossos Bispos enquanto estes oferecem ajuda e ânimo aos milhares de homens e mulheres que generosamente entregaram as suas vidas a Jesus Cristo, e se estão esforçando por viver a própria consagração eclesial com amor perseverante, amor que bem merece o esforço permanente deles e lhes inspira os seus sagrados votos de castidade, pobreza e obediência. O vosso, na verdade, é esplêndido apostolado que pode ajudar a sustentar indivíduos e Congregações religiosas inteiras, na esperança e fervor, e na verdade completa dos seus carismas.

2. Todos vós, quer sejais Religiosos quer não, sois chamados a oferecer humildemente a vossa colaboração como irmãos e irmãs que partilham com os Religiosos uma comum aprendizagem de Cristo Senhor. Tendes, com aqueles que vós servis, um comum chamamento à santidade no seguimento de Jesus. Ao mesmo tempo, os requisitos profissionais do vosso apostolado implicam minuciosa compreensão da vida religiosa, especialmente nas suas essenciais dimensões eclesiais.

Por este motivo, vós mesmos deveis repetidamente reflectir em toda a doutrina do Concílio Vaticano II que afecta a vida religiosa, tanto como nas directrizes papais pós-conciliares e nas da Sagrada Congregação para os Religiosos e os Institutos Seculares. O Documento Mutuae Relationes, preparado conjuntamente pela Sagrada Congregação para os Bispos e pela Sagrada Congregação para os Religiosos e os Institutos Seculares, é especialmente importante para o serviço que vos estais esforçando por prestar na Igreja.

3. Nas discussões e no diálogo em que participais, nos conselhos que dais, e nas decisões que podeis ser chamados a tomar, é importante que vos refirais constantemente à essência da vida religiosa. Deste modo se acentuará o valor da consagração à pessoa de Jesus Cristo — consagração que é feita na Sua Igreja e pela Sua Igreja, e em resposta a uma vocação pessoal recebida de Cristo por meio da acção do Seu Espírito. A vossa tarefa consiste em chamar efectivamente a atenção para a finalidade dos votos religiosos, mostrando como, nas palavras do Concílio Vaticano II, eles se destinam a "mais vigoroso florescimento da santidade da Igreja e maior glória da única e indivisa Trindade, que em Cristo e por meio de Cristo é a fonte e a origem de toda a santidade" (Lumen Gentium LG 47).

4. A vossa própria estima pela vida religiosa, e o profundo apreço que tendes pelos valores individuais que ela encarna para bem da Igreja, podem ser vigoroso apoio para os vossos irmãos e irmãs, tanto nas circunstâncias ordinárias das suas vidas diárias como em momentos de crise. Estando cientes da importância vital dos Religiosos na Igreja, estareis em posição de ajudar os outros a chegar a um sereno convencimento de que esta instituição eclesial, como o resto da Igreja de Cristo, tem de sofrer tribulação no mundo (cf. Jo Jn 16,33). Na verdade, não é maravilha que a santidade da vida religiosa encontre oposição e mesmo seja atacada pelo demónio. O apelo de São Pedro à vigilância calma é extremamente importante hoje: "O demónio, vosso adversário, anda ao redor de vós, como leão que ruge buscando a quem devorar. Resisti-lhe firmes na fé..." (1P 5,8 ss.).

5. Como vós mesmos tendes o especial papel de amparar e alimentar a vida religiosa, sereis capazes de propor e repropor, a Religiosos isolados e a comunidades inteiras, os valores perenes inerentes à vida religiosa consagrada. É expressão da vossa caridade e parte da vossa missão. Cada um de vós terá oportunidades para fazer isto, de uma maneira ou de outra: como representante do Bispo no seu cuidado pastoral pela vida religiosa nas suas relações com a Igreja local e universal, ou simplesmente como amigo, conselheiro ou confidente, como esclarecido colega cristão, director espiritual ou confessor.

6. Pelos vossos contactos com eles, podeis prestar grande serviço aos Religiosos e à Igreja no seu conjunto, insistindo na importância da oração em qualquer programa genuíno de renovamento. A intimidade pessoal com Jesus Cristo, mantida pela oração e pela Eucaristia, é condição essencial para a contribuição eficiente dos Religiosos para a vida da Igreja. A sociedade precisa da incessante pregação das bem-aventuranças; e precisa de as ver praticadas na vida dos Religiosos.

Além dos contactos pessoais, muitos de vós terão indubitavelmente de se ver responsabilizados, de uma maneira ou de outra, em planear ou coordenar encontros, aulas ou seminários, em que os Religiosos estarão presentes. Em tudo isto, a sublime doutrina da Igreja sobre a vida religiosa deveria ser pressuposta e manifestada de maneira apropriada.

A condição ontológica da união com Deus, de ser uma nova criatura em Jesus Cristo, consagrada a Ele por votos eclesiais, dá aos Religiosos uma fonte de profunda fecundidade nos trabalhos do apostolado. A renúncia vivida, que se une à Cruz de Cristo, dá aos Religiosos singular eficiência ao falarem aos seus irmãos e irmãs da plenitude da vida pascal em Jesus Ressuscitado. Ao abraçarem a pobreza de Cristo, os Religiosos têm possibilidade real de prestar serviço genuíno aos pobres e ser instrumentos eficientes de evangelização quanto a eles. Até pela humilde análise dos limites dos seus conhecimentos pessoais serão os Religiosos capazes de ir avante reafirmando sentidamente a validez da mensagem que estão procurando comunicar. Por meio da renúncia generosa ao amor conjugal, serão os Religiosos capazes de convencer muita gente da primazia absoluta do amor de Cristo e da Sua profunda capacidade de encher o coração humano com uma alegria que é contagiosa. Tendo entregado as suas vidas a Cristo, poderão os Religiosos estar verdadeiramente abertos ao Seu Espírito Santo, abraçando na integridade a palavra de Deus como ela é pregada pela Igreja, estando assim preparados para um real diálogo salvador, que leva à elevação da humanidade e à glória do nome de Cristo.

Mas, como cada categoria na Igreja, precisam os Religiosos de apoio, compreensão e amor. Encontrarão isto de maneira eminente em Maria, Mãe de Jesus e Mãe da Igreja, que, sendo modelo de santidade, tem especial relação com todos os Religiosos. Ao mesmo tempo, na esfera temporal, este encargo compete a todos vós que fostes chamados pelos vossos Bispos para proteger a vida religiosa na Igreja, hoje. O vosso é verdadeiramente um apostolado importante no Corpo de Cristo. E oxalá vós mesmos encontreis novo vigor e ânimo nas palavras do Apóstolo Paulo: "Levai os fardos uns dos outros, e assim cumprireis a lei de Cristo" (Ga 6,2). Maria vos ajude a todos vós a fazer isto para a glória do Seu Filho Jesus, que é o Salvador de todos nós.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO CONSELHO DA SECRETARIA


DO SÍNODO DOS BISPOS


Palácio Apostólico

Sábado, 21 de Março de 981



Irmãos caríssimos

1. Antes de encerrarmos este encontro, agradeço do coração a todos vós terdes-me proporcionado a oportunidade de estar convosco e vos falar sobre o assunto de grande importância, que foi tratado tão diligentemente na última assembleia do Sínodo: "As tarefas da família cristã no mundo contemporâneo".

Na verdade, estais a testemunhar agora de novo a grande actualidade que tem a mencionada questão na sociedade do nosso tempo, assim como naquela ocasião foi demonstrado pelos mesmos Padres Sinodais. É isto confirmado, além disso, por muitas pessoas, distribuídas pelo mundo, terem seguido com atenção o trabalho do Sínodo usando também os múltiplos meios de comunicação social, e ainda por as mesmas deliberações do Sínodo terem sido depois consideradas em toda a parte por peritos.

Também vós, neste encontro, examinastes profundamente aquelas conclusões do referido Sínodo, a fim de poderdes compreender a sua elevada significação e, ao mesmo tempo, considerar como elas podem ser introduzidas na vida da Igreja. Finalmente, apresentais-me agora os resultados das vossas discussões. Ao mesmo tempo que por elas vos manifestamos o Nosso reconhecimento, certificamo-vos que as usaremos na preparação do documento que há-de ser redigido nesta matéria, assim como anunciei na alocução antes do Angelus Domini de 28 de Dezembro passado.

2. Aproveitando, além disso, a ocasião favorável do vosso encontro, considerastes também as opiniões e proposições que, sobre o assunto do último Sínodo, foram transmitidas pelas Conferências Episcopais, ou pelas reuniões dos Bispos do rito oriental, pelos dicastérios da Cúria Romana e pela União dos Superiores-gerais. Desejamos assim dar os maiores agradecimentos a todos aqueles que sujeitaram essas proposições à vossa madura consideração, e dá-los também a vós mesmos que as examinastes com agudeza de espírito.

Na verdade, estimamos o mais possível as regras segundo as quais perscrutastes as várias opiniões sobre o assunto do recente Sínodo. Escolhestes para vós como normas de critério: primeiro, a universalidade da questão, de maneira que abranja toda a Igreja e a toda diga respeito; depois, a sua mais urgente necessidade; e, por último, a razão e a utilidade dela, tanto doutrinal como pastoral.

E das coisas, que assim indicastes, nós deliberaremos por nossa vez; pois serão utilíssimas para nós, a fim de chegarmos a estabelecer o assunto que há-de ser tratado no próximo Sínodo.

3. Já suficientemente se evidencia por si — e o Sínodo precedente, em que ainda agora trabalhastes, persuade-o — quanta importância e vantagem mostra, para a vida de toda a Igreja, esta instituição, que nasceu por vontade prudentíssima do Nosso Predecessor Paulo VI, aceitando e executando os votos do Concílio Vaticano II. Na realidade, por meio do Sínodo, os Bispos das Igrejas locais distribuídas pelo mundo trazem a Pedro as experiências e as riquezas da vida cristã nos seus territórios; e, por meio dele, também Pedro robustece os irmãos na fé e preside à caridade universal com verdade e eficácia.

O Sínodo torna-se portanto instrumento utilíssimo daquela colegialidade, que elevou à devida luz o Concílio Vaticano II. Pois, "assim como, por instituição do Senhor, São Pedro e os restantes Apóstolos formam um Colégio Apostólico, assim de igual modo estão unidos, entre si, o Romano Pontífice, sucessor de Pedro, e os Bispos, sucessores dos Apóstolos" (Lumen Gentium, LG 22).

Desejando, por isso, no desempenho do Nosso ministério, utilizar de todos os modos os auxílios, conselhos e votos de todo o Episcopado católico, com o maior gosto julgamos fazer assim a vontade do Nosso Predecessor Paulo VI que desejou que, pelo Sínodo dos Bispos, aos mesmos fosse dada a faculdade "de participarem de modo mais claro e eficaz na Nossa solicitude pela Igreja universal" (Motu proprio Apostolica Sollicitudo, AAS, 57, 1965, p. 776).

Unimo-Nos, de facto, ao parecer do Mesmo, segundo o qual se "redunda em utilidade para o Nosso cargo primacial que, para bem e serviço da Igreja universal, Cristo tenha entregue essa participação ao Apóstolo Pedro e, depois dele, aos seus legítimos sucessores nesta Sé Romana, não menos resulta todavia esta em honra do Colégio dos Bispos; pois tal entrega, associa-se, de algum modo por este motivo, com o Romano Pontífice no cuidado da Igreja universal" (Insegnamenti di Paulo VI, V, 1967, p. 468).

Logo, ao mesmo tempo que desejamos e pedimos instantemente que o Sínodo dos Bispos continue a desempenhar o seu papel ainda melhor e mais plenamente, e que se torne cada vez maior esta recíproca e auxiliar cooperação entre a principal Sé da Igreja e as Igrejas particulares, com a melhor das vontades concedemos a cada um de vós a, Bênção Apostólica.



Apelo Pontifício em favor da Terra Santa

Desejo hoje recordar e recomendar aos Irmãos no Episcopado, aos Sacerdotes, aos Religiosos e a todos os Fiéis a anual colecta, realizada no período quaresmal e, em particular, na Sexta-feira Santa, para ir ao encontro das necessidades dos nossos irmãos cristãos que vivem na Terra de Jesus. Ao fazer meu o apelo, dirigido pelo meu Predecessor Paulo VI na sua Exortação Apostólica Nobis in animo, de 25 de Março de 1974, convido todos os fiéis a darem o seu contributo, destinado não só em favor dos Lugares Santos propriamente ditos, mas sobretudo ao apoio e desenvolvimento das obras pastorais, caritativas, educativas e sociais que foram intensificadas pela Igreja naquela abençoada terra, junto dos Santuários e dos Lugares Santos.

Entre estas instituições, é-me grato recordar as 123 Escolas; os 3 Seminários menores; os 4 Seminários maiores; os 5 Institutos de estudos superiores; a Universidade de Belém; os 7 Hospitais; as 14 Escolas maternas e o Centro "Efeta" para os pequeninos surdos-mudos.

Não duvido que todos os católicos do mundo sentirão o dever de ajudar, conforme as suas disponibilidades, os irmãos que vivem na Terra santificada pela vida, paixão, morte e ressurreição de Cristo.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PEREGRINOS DA CROÁCIA E DA ESLOVÉNIA


Sábado, 21 de Março de 1981



Caríssimos Irmãos e Irmãs

I. A Providência divina concedeu-me hoje a alegria de me encontrar convosco, amados fiéis da Croácia e da Eslovénia, que terminais a vossa peregrinação na Itália com a visita ao Papa, para lhe exprimirdes a vossa fidelidade e a vossa dedicação.

Recebo-vos com espírito comovido e saúdo antes de mais os venerados Prelados aqui presentes, acompanhados por Sua Ex.cia Reverendíssima D. Franjo Kuharic, Arcebispo de Zagrábia e Presidente da Conferência Episcopal e, mediante eles, todo o Episcopado que tem ao próprio cuidado a vida da Igreja que está na Jugoslávia.

2. Seguindo o caminho da fé dos vossos pais, quisestes visitar, na Itália, os lugares caros à piedade e à memória de São Bento, cujo XV centenário do nascimento foi celebrado este ano. Ao mesmo tempo, quisestes venerar São Círio e São Metódio, apóstolos dos povos eslavos, proclamados há não muito tempo Padroeiros da Europa, juntamente com São Bento.

Todos estes motivos me tornam particularmente grato o encontro convosco, e põem em ressalto a importância da vossa peregrinação, que poderíamos chamar 'europeia". Ela traz à memória a devota peregrinação de compatriotas vossos e de outros fiéis provenientes de regiões eslavas, acompanhada, há precisamente cem anos, pelo ilustre Bispo de Djakovo, D. Josip J. Strossmayer, e realizada com o principal propósito de agradecer ao Papa Leão XIII a Carta Encíclica Grande Munus, que proclamava Cirilo e Metódio santos da Igreja Universal, indicando como exemplo, a todo o povo cristão, as suas figuras e a sua obra apostólica.

Também vós quisestes manifestar ao Papa a vossa gratidão pela recente Carta Apostólica Egregiae Virtutis, com a qual ele proclamou Cirilo e Metódio Padroeiros da Igreja, juntamente com São Bento. Apreciei muito esta vossa delicada atenção e também eu vos desejo exprimir o meu reconhecimento.

3. Em muitas ocasiões tive oportunidade de indicar o significado, para a Igreja e para a Europa, da obra de São Bento, São Cirilo e São Metódio.

São Bento, gigante da fé e da civilização, numa sociedade abalada por tremenda crise de valores e de instituições, afirmou com a força da sua obra formadora o primado do espírito, defendendo assim quer a dignidade pessoal do homem, como filho de Deus, quer a dignidade do trabalho, entendido como serviço aos irmãos.

Partindo de tal afirmação das exigências superiores do homem, São Bento, mediante a obra silenciosa e eficaz dos seus monges, permeou de sentido cristão a vida e a cultura dos povos europeus. Também a civilização contemporânea vive uma crise de identidade e de ideais, que apresenta muitas analogias com a daquele longínquo último quartel do século V da era cristã, e é necessário, portanto, como então, recuperar uma visão transcendente, revitalizar a consciência à luz dos valores perenes.

4. Impelidos pelos mesmos ideais e animados pelas mesmas finalidades idênticas do Patriarca do Ocidente, cooperaram na história e na cultura dos povos eslavos, mais ou menos em meados do século IX, os dois grandes Irmãos, Cirilo e Metódio, provenientes do Oriente. Estes, formados em Constantinopla, trouxeram o contributo da antiga cultura grega, e da tradição da Igreja oriental, que assim se inseriu profundamente na formação religiosa e civil de povos que, de modo relevante, colaboraram para a construção da Europa moderna.

Cirilo e Metódio, como Bento, testemunhas de diversas culturas que neles se encontram e integram idealmente, basearam a própria obra civilizadora no anúncio do Evangelho e dos valores que dele emanam. Tal anúncio idêntico foi veículo de recíproco conhecimento e de união entre os diversos povos da Europa, assegurando-lhes um património comum, espiritual e cultural.

De Cirilo e Metódio, em particular, enviados pela Igreja de Constantinopla e confirmados pela Sé Apostólica, à qual ficaram sempre unidos, provém depois um convite especialíssimo para a unidade da Igreja, bem acentuado, desde o século passado, pela obra de zelantes e iluminados Pastores das vossas Dioceses, como D. Anton Martin Slomsek, Bispo esloveno de Maribor, e o já mencionado D. Josip Strossmayer.

Dilectos Irmãos e Irmãs

Agradeço-vos ainda de coração este vosso testemunho hodierno de fé e a silenciosa certeza, que ele me oferece, do vosso compromisso cristão. Exorto-vos a trazer no coração a lembrança desta vossa peregrinação, como estímulo contínuo para vós e para os vossos entes queridos, a perseverar no caminho traçado pelos grandes Padroeiros Bento, Cirilo e Metódio. Dirigi-Lhes com esperança, a vossa confiante oração, para que protejam a Europa com a sua poderosa intercessão, não permitindo que ela se afaste da adesão a Cristo, e assegurando-lhe aquela verdadeira unidade que se funda no acolhimento da fé e da moral cristã, no compromisso do amor recíproco e da defesa incansável da paz.

Ao voltardes para as vossas casas, dizei aos vossos queridos familiares e aos vossos compatriotas que o Papa os ama, os ampara com a sua oração e os encoraja a perseverarem num caminho de fé amadurecida e irradiante. A todos dirijo a minha saudação cheia de afecto, ao mesmo tempo que vos concedo uma especialíssima Bênção Apostólica.




Discursos João Paulo II 1981 - Quinta-feira, 19 de Março de 1981