Discursos João Paulo II 1981 - Sábado, 21 de Novembro de 1981


VISITA PASTORAL DO SANTO PADRE

AO SANTUÁRIO DE COLLEVALENZA E A TODI

(22 DE NOVEMBRO DE 1981)

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

NA CERIMÓNIA DE CHEGADA


Collevalenza, 22 de Novembro de 1981



Senhor Ministro e caros cidadãos
de Collevalenza e de Todi e da região inteira!

1. Devo exprimir-vos um obrigado sincero pelo acolhimento cordial que me reservastes, vindo em tão grande número e com tanta devoção a este lugar a fim de me apresentardes a vossa saudação ao retornar eu à hospitaleira Terra da Úmbria. Digo retornar, porque já pela quarta vez; desde o início do meu serviço pontifical, me é dado vir a esta histórica Região, que, ficando situada no centro da Itália, parece exprimir e concentrar as características da população inteira da Península: o equilíbrio, a laboriosidade, o apreço dos valores morais e o autêntico espírito religioso. A todas as povoações da Úmbria atesto o meu afecto e o meu apreço.

2. Hoje estou aqui entre vós como peregrino, a um ano de distância da publicação da Encíclica Dives in misericordia, na qual, integrando o que já havia escrito na Redemptor Hominis, convidava a dirigir o olhar para Deus nosso Pai, o único de quem toda a paternidade toma o nome nos céus e na terra (cf. Ef Ep 3,15), como toma consistência a real dignidade do homem-filho.

Dizia naquele documento que da verdade acerca do homem é preciso remontar, em Cristo, à verdade do mistério do Pai e do seu amor (cf. vol. Ensinamentos III, 2, 1980, pág. 1533-34).

Quereria dizer agora que este itinerário espiritual do homem para Deus, baseado na mediação de Cristo revelador, sugeriu-me o presente itinerário, que é propriamente uma peregrinação ao Santuário do Amor Misericordioso. Feliz a Úmbria, feliz em particular é a vossa antiga e ilustre Cidade, caros habitantes de Todi, porque ao lado das numerosas e bem conhecidas tradições religiosas, ao lado de tantos artísticos e sugestivos templos e monumentos cristãos, possui este Santuário, que é centro eleito de espiritualidade e de piedade. Com o seu próprio nome, com a sua imponente construção e a actividade espiritual, pastoral e formativa que ali é promovida, ele recorda e proclama a todos a grande e consoladora verdade da misericórdia paterna do Senhor. Que seria do homem se não tivesse o seu supremo fundamento em Deus? Que seria dele, se não tivesse, no alto do Céu, um Pai que o segue e o ama com a generosidade da sua providência? Que seria dele, pecador, se não pudesse contar com a certeza de ter neste mesmo Pai aquele que sempre o compreende e perdoa com a generosidade da sua misericórdia?

Pois bem, irmãos e irmãs, com interrogativos como este, a que já com a minha Encíclica pretendia chamar todos os filhos da Igreja para uma resposta convicta de fé, interpela-nos também este insigne Santuário, que tão oportunamente surgiu entre vós. Ele constitui um "sinal", e por conseguinte um convite a meditar e a acolher a eterna mensagem da salvação cristã, corno brota do desígnio misericordioso de Deus Pai.

3. Encontrando-me nesta Terra no ano centenário do nascimento de São Francisco, desejo elevar o meu pensamento devoto também a ele, na recordação do sublime ensinamento que nos deixou precisamente a respeito da misericórdia divina. No seu Cântico das Criaturas disse, entre outras coisas: "Louvado sejas, meu Senhor, por aqueles que perdoam pelo teu amor, e suportam as enfermidades e as tribulações: (...) que por ti Altíssimo serão coroados". Francisco, mestre do amor e de perdão, invoca a misericórdia generosa de Deus.

Nem posso esquecer o vosso concidadão Frei Jacopone de Todi, que, sendo discípulo do Santo de Assis, traduziu e interpretou na originalidade da sua arte a chama interior de amor a Deus, como resposta pessoal ao amor anterior e preveniente de Deus por nós. No nome dos Santos da Úmbria, na recordação de Jacopone e de tantos outros homens da Todi franciscana e cristã, dou início à peregrinação hodierna, e a todos dirijo desde já a minha cordial saudação com a Bênção Apostólica.



VISITA PASTORAL DO SANTO PADRE

AO SANTUÁRIO DE COLLEVALENZA E A TODI

(22 DE NOVEMBRO DE 1981)

PALAVRAS DO PAPA JOÃO PAULO II

NO ENCONTRO COM OS DOENTES


Santuário de Collevalenza, 22 de Novembro de 1981



Caros Irmãos e Irmãs no Senhor!

1. É com particular comoção que vos dirijo a palavra neste momento que precede a celebração da Santa Missa junto deste Santuário do Amor Misericordioso. Desejo exprimir-vos, em primeiro lugar, o meu afecto, testemunhar-vos o meu apreço e exortar-vos a perseverar corajosamente no caminho difícil, em que vos colocou a providência de Deus que, se às vezes parece misteriosa nos seus desígnios, contudo é sempre movida por amor infinitamente sábio e solícito.

No Evangelho são frequentes os acenos aos encontros de Jesus com pessoas doentes. Ele não permaneceu indiferente diante de nenhuma situação de sofrimento humano, mas teve para com todos um gesto de ajuda e uma palavra de conforto. Esta sua atitude passou para a Igreja, que d'Ele aprendeu a amar os doentes e a esforçar-se por levar-lhes, juntamente com a palavra esclarecedora da fé, o auxílio concreto que as circunstâncias tornavam possível.

2. Vós compreendeis, portanto, porque o Papa deseja encontrar-se com aqueles que sofrem e sente como seu particular dever demonstrar a cada um o renovado testemunho do amor de Deus e o fervoroso convite a reavivar a esperança, o sofrimento, desde quando Cristo o tomou sobre Si, assumiu valor, inestimável: tornou-se fonte de energia salvadora para a pessoa que o suporta e para todo o género humano.

Consenti-me, por conseguinte, dizer também a vós que tenho em grande estima o contributo que podeis dar à causa do Reino de Cristo no mundo. A Liturgia convida-nos, hoje, a meditar na natureza e felicidade deste Reino. Pois bem, como sabeis, Jesus não o conquistou com a força, nem confiou o futuro dele à violência das armas. Regnavit a ligno Deus — Deus reinou pela Cruz!

Foi com o sofrimento e com a morte que Jesus venceu as forças do mal, invertendo a situação desesperadora em que se encontrava a humanidade e conquistando para todos os filhos de Adão o direito de serem cidadãos do Reino de amor e de liberdade que, prenunciado aqui na terra na Igreja, terá a sua plena realização no Céu.

3. A morte de Cristo na Cruz marcou para sempre a história humana: agora, no combate dramático entre o bem e o mal, de que ela é cenário e testemunha, o contributo mais válido para a imposição das forças do bem não poderá ser dado senão pelo sofrimento acolhido e oferecido em amorosa comunhão com o Filho de Deus, que no altar renova a suprema imolação realizada "uma vez para sempre" no Gólgota.

Como não reflectir sobre esta dimensão misteriosa e fascinante da participação humana na redenção, agora que estamos para iniciar a celebração da Eucaristia, em que Jesus estará entre nós na realidade da sua Páscoa da morte e da ressurreição?

Entregai-me os vossos sofrimentos, Irmãos e Irmãs! Levá-los-ei ao altar, para os oferecer a Deus Pai em união com os de seu Filho unigénito e para implorar, em nome também destes, paz para a Igreja, compreensão recíproca entre as nações, a humildade do arrependimento para quem pecou, a generosidade do perdão para quem foi ofendido, para todos a alegria de uma renovada experiência do amor misericordioso de Deus. A Virgem Santíssima, que "estava junto da Cruz de Jesus" (cf. Jo Jn 19,25) enquanto Ele morria por nós, suscite nos nossos corações sentimentos adequados a esta hora de luz e de graça. Amém.



VISITA PASTORAL DO SANTO PADRE

AO SANTUÁRIO DE COLLEVALENZA E A TODI

(22 DE NOVEMBRO DE 1981)

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

AOS RELIGIOSOS DO AMOR MISERICORDIOSO


Collevalenza, 22 de Novembro de 1981



Caríssimos Irmãos e Irmãs

No princípio deste desejado encontro convosco, Escravas e Filhos do Amor Misericordioso, apraz-me dirigir-vos as palavras de São Paulo aos Coríntios: "Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, Pai das misericórdias e Deus de toda a consolação" (2Co 1,3).

O conforto, que procura ao meu íntimo esta peregrinação, é sem dúvida também vosso, derivado da certeza de ser fielmente acolhidos pela bondade divina, mesmo "em toda a nossa tribulação". Se Deus e o Seu amor são para nós a consolação que ninguém nos pode tirar — "ninguém vos poderá tirar a vossa alegria" (Jn 16,22) —, somos chamados ao mesmo tempo a alimentar em nós a solicitude insuprimível de fazer que todos participem em tal amor.

1. Para libertar o homem dos próprios temores existenciais, daquelas apreensões e ameaças que sente sobranceiras da parte de indivíduos e Nações, para ele ver cicatrizadas as muitas lacerações pessoais e sociais, é necessário que à presente geração — a que também se estende a Misericórdia do Senhor cantada pela Virgem Santíssima (cf. Lc Lc 1,50) — seja revelado "o mistério do Pai e do Seu amor". O homem tem a necessidade íntima de abrir-se à misericórdia divina, para se sentir radicalmente compreendido na debilidade da sua natureza ferida; necessita de estar firmemente convencido daquelas palavras a vós queridas, que formam muitas vezes o objecto da vossa reflexão, isto é que Deus é Pai cheio de bondade à procura, por todos os meios, de confortar, ajudar e tornar felizes os próprios filhos; busca-os e segue-os com amor incansável, como se Ele não pudesse ser feliz sem eles. O homem — até o mais perverso, o mais miserável e por fim o mais perdido — é amado com ternura imensa por Jesus, que é para ele um pai e uma terna mãe.

2. Destas breves indicações resulta que a vossa vocação parece revestir carácter de viva actualidade. É certo que a Igreja durante os séculos, mediante também a obra das várias Ordens e Congregações Religiosas, tem proclamado sempre e professado a misericórdia divina, sendo dela administradora solícita no campo sacramental e no das relações fraternas, mas desejaria fazer notar apenas que a vossa especial profissão atinge directamente o núcleo de tal encargo e habilita-vos institucionalmente a exercitá-la.

Do coração faço votos por que o espírito do vosso Instituto, que traz consigo o fervor dos inícios, se exprima sempre numa piedade sólida, numa desinteressada dedicação e num ardente esforço apostólico; como testemunham as grandiosas construções que surgiram em poucos decénios à volta deste Santuário, e as multidões que vêm aqui renovar e aumentar a própria vida cristã.

Do coração animo tudo o que é realizado no campo da assistência e da santificação do clero diocesano. Tal missão entra no fim específico da Congregação dos Filhos do Amor Misericordioso, para cuja realização as Escravas prestam o seu delicado contributo. Lê-se, de facto, no Livro dos Costumes que traduz na prática as Constituições: "ajudarão os Sacerdotes em tudo, mais com os factos do que com as palavras", e tudo isto com espírito de alegre e generosa dedicação. Particular esforço é realizado para animar entre os Sacerdotes diversas e progressivas formas de certa vida comum." (cf. Decr. Presb. Ord., 8).

As Escravas, por outro lado, exercem nas suas Casas uma série de adequadas assistências que testemunham generosa elasticidade na adaptação às exigências caritativas dos lugares e aos pedidos da Autoridade eclesiástica.

3. E agora, caros Irmãos e Irmãs, quereria dirigir-vos uma ardente exortação a que sejais esclarecidamente fiéis à vossa vocação.

Conscientes da necessidade que tem o homem moderno de encontrar-se com o amor do "Pai das misericórdias", e alegres por estar consagrados à difusão de tal amor, ofereceis, primeiro que tudo, no âmbito da vossa grande Família, um testemunho sereno e convincente de caridade fraterna. "Congregavit vos in unum Christi amor": foi Cristo Senhor que se interessou por cada mm de vós e vos reuniu em Congregações distintas, mas numa Família única, para percorrerdes, com diferentes modalidades, o mesmo caminho de perfeição, no desempenho da missão evangelizadora. O encargo de proclamar a misericórdia do Salvador requer um testemunho probante de união e de mútuo amor misericordioso, como o próprio Jesus recomendou com a força trágica da Sua última hora: "Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei" (Jn 15,12). Esse amor fraterno é, em si mesmo, prova e evangelização da misericórdia: "Todos sejam um só... para que o mundo creia que Tu Me enviaste" (Jn 17,21).

Para construir a alma, antes mesmo que as estruturas, de uma Congregação, é necessário praticar um amor que requer muitas vezes sacrifício e renúncia pessoal, em sintonia com tudo o que testemunhou Cristo, sobretudo com o selo da Sua extrema doação.

Recordá-lo sugere o convite a que se aprofundem cada vez mais as raízes do vosso espírito de Família, mediante uma identificação intensa com os sentimentos de Cristo Crucificado e de Cristo Eucaristia, cujas imagens trazeis no vosso emblema: "Tende entre vós os mesmos sentimentos que havia em Cristo Jesus..., que se humilhou a Si mesmo,... até à morte de cruz" (Ph 2,5-8).

Não é possível serdes Arautos da Misericórdia sem a assimilação intensa do sentido e do valor das últimas doações de um amor divino infinitamente mais poderoso do que a morte: o Crucifixo e a Eucaristia; de um amor inexaurível, "em virtude do qual o Senhor deseja sempre unir-se e identificar-se connosco, indo de encontro a todos os corações humanos", conforme escrevia eu há uni ano na Carta Encíclica Dives in Misericordia (n. 13), que vos propondes recordar dentro de poucos dias com um solene encontro internacional.

Na contemplação de tal amor é menos difícil resistir a uma aura secularizante que, sob o pretexto de certo tipo de presença no mundo, pode ter empobrecido a fé, tornado menos viva a confiança e menos sobrenatural a caridade; é mais fácil alimentar o bom espírito que vos foi transmitido, para realizardes em vós a bem-aventurança dos "misericordiosos", com o fim não só de obter mas também de irradiar misericórdia.

Este Santuário, que foi desejado para exaltar e continuamente celebrar as provas mais requintadas do Amor Misericordioso, considerai-o como ponto constante de referência, berço da vossa vocação, e centro e sinal da vossa particular espiritualidade. Seja nele sempre proclamado o alegre anúncio do Amor Misericordioso, mediante a Palavra, a Reconciliação e a Eucaristia. É palavra evangélica a que vós aqui pronunciais, para confortar é convencer os irmãos acerca da inexaurível benevolência do Pai celeste. É tornar possível a experiência de um amor divino — mais poderoso que o pecado — acolher os fiéis no Sacramento da Penitência ou Reconciliação, que sei é aqui administrado com esforço constante. É revigorar tantas almas fatigadas e cansadas — à procura de um alimento que traga doçura e robustez no caminho — oferecer-lhes o Pão Eucarístico.

Este sublime ministério da Misericórdia, como também toda a vossa aspiração e actividade, confio-os a Maria Santíssima — por vós venerada sob o título de Medianeira; invocando-a com fervor — a fim de que deseje maternalmente tornar favorável e apressar para vós o dom do seu Filho Jesus e, por outro lado, a vossa plena abertura para com Ele.

O meu incitamento e a minha saudação alcancem igualmente todos os que, Escravas e Filhos das várias Comunidades da Itália, da Espanha e da Alemanha, não estão aqui presentes, com particular pensamento de conforto e de ânimo para as duas jovens Comunidades missionárias do Brasil. Desejo à vossa querida Madre Fundadora, aqui no meio de vós, que vos veja a todos decididamente encaminhados para a santidade, segundo as suas aspirações maternas.

Dirijo depois uma particular saudação, gesto de bons votos de alegria e de prosperidades cristãs, aos vossos amigos e a todos quantos sustentaram as vossas iniciativas apostólicas, ao mesmo tempo que a todos e a cada um concedo a minha afectuosa Bênção.



VISITA PASTORAL DO SANTO PADRE

AO SANTUÁRIO DE COLLEVALENZA E A TODI

(22 DE NOVEMBRO DE 1981)

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

AOS CIDADÃOS DE TODI


Praça do Povo

Domingo, 22 de Novembro de 1981



Caríssimos cidadãos de Todi!

1. Nas minhas visitas apostólicas, eis-me aqui, chegado também até vós, na vossa magnífica Cidade, aceitando de bom grado o vosso convite, tão cordial e atencioso, que me chegou durante a peregrinação ao vizinho Santuário de Collevalenza! É grande a minha alegria em encontrar-me no meio de vós!

Saúdo em primeiro lugar o Senhor Presidente da Câmara com os componentes da Junta Municipal, os Responsáveis dos vários Organismos regionais e provinciais, todas as Autoridades civis, militares e escolares, que de modo diverso mas com igual empenho desenvolvem a própria actividade em benefício dos cidadãos: a todos eles vai a expressão da minha estima e o voto sincero de poderem sempre desempenhar eficazmente, na comum concórdia e na serenidade, as suas tarefas ao serviço do homem no seu desenvolvimento terreno.

Saúdo em seguida o Bispo, D. Décio Lúcio Grandoni, que governa com amor e dedicação esta Diocese, e com ele saúdo os seus Colaboradores, os Sacerdotes e os Religiosos, com quem me vou encontrar daqui a poucos instantes, e, depois, as Religiosas e os Leigos mais intimamente empenhados no trabalho pastoral. A todos faço votos de fidelidade religiosa e copiosas satisfações espirituais nos respectivos campos de apostolado.

Com especial intensidade de sentimentos saúdo todos vós, caríssimos, irmãos e irmãs que representais perante os meus olhos a Diocese de Todi com as suas esperanças e com os seus problemas, com as suas aspirações e com a sua tenacidade: os pais e as mães de família, que hoje têm deveres tão prementes e difíceis a cumprir; as pessoas anciãs, que, dotadas de prudência e experiência, são parte valiosíssima no conjunto social e familiar; os jovens, que sofrem mais intensamente os abalos dos tempos actuais e cada vez devem ser mais compreendidos e amados; as crianças e os adolescentes, objecto de ternura e sinal de confiança; os professores e os educadores, sobre os quais pesa nobilíssima responsabilidade; os trabalhadores de todas as categorias, que devido à sua fadiga, quotidiana estão na base da eficiência e do progresso da sociedade; os doentes e os que sofrem, que pela sua dor comprometem os irmãos no valioso exercício da caridade.

Agradeço a todos, um por um, pessoalmente, a vossa presença e, comovido com a vossa bondade, repito-vos as palavras de São Paulo: "Que o Senhor da paz vos conceda a paz em todo o tempo e por todas as formas. O Senhor seja com todos vós" (2Th 3,16).

2. Nesta vossa Cidade bastante conhecida, que era centro de Diocese já no século II, quereria ter mais tempo à disposição para lhe respirar a mística atmosfera, para lhe admirar as belezas artísticas e os monumentos, carregados de história, que recordam profundas tradições civis e religiosas; sobretudo quereria entrar nas oficinas do vosso trabalho, nos centros das vossas actividades, para me encontrar convosco, para ouvir as vossas vozes, ver os vossos rostos, confortar os vossos doentes e acariciar o vossos filhos.

.Vim para vos assegurar que sois amados por Cristo e que Ele quer unicamente a vossa felicidade! E deseja que continueis a amar-vos, a compreender-vos, a ajudar-vos mutuamente nas várias necessidades! A bondade e a caridade reinem em vós, nas vossas casas, nas vossas organizações, nas escolas, nos lugares de trabalho, de estudo e divertimento. Cristo reine sempre nos vossos corações e nas vossas famílias. Sejam abundantes em todos vós os frutos do Espírito, isto é: a caridade, a alegria, a paz, a paciência, a benignidade, a fidelidade, a mansidão e a temperança (cf. Gál Ga 5,22),

Faço votos por que nas vossas casas resplandeça sempre a chama da bondade e da fé cristã!

3. Apraz-me agora deixar-vos um pensamento que vos sirva de recordação e como propósito. O que hoje mais impressiona, na sociedade moderna, em que vivemos, é talvez a perda, em muitos, do verdadeiro sentido da vida. Num vasto sector da sociedade contemporânea ofuscou-se ou algumas vezes perdeu-se o significado transcendente da existência. E, já não conhecendo porque e para quem se vive, é fácil ser arrastado pelo ímpeto das paixões, pelo egoísmo, pela crueldade, pela anarquia dos sentidos, pela destruição da droga e pelo desespero.

Devemos dirigir o olhar para Cristo: só Ele "é a luz que resplandece nas trevas; Ele é a luz verdadeira que a todo o homem ilumina" (Jn 1,5 Jn 1,9).

Jesus é o Verbo encarnado, o Revelador e o Redentor, que anuncia com palavra absoluta e definitiva, porque divina, o sentido autêntico da vida, dom precioso dado por Deus, que é o Amor misterioso e misericordioso, que devemos aceitar e fazer frutificar, em função e na perspectiva da felicidade eterna. "Eu sou a Luz do mundo — disse Jesus. Quem Me segue não andará nas trevas, mas terá a luz da vida" (Jn 8,12). É desta luz fundamental e essencial que têm viva necessidade os homens, sempre, mas particularmente hoje. Como o cego de Jericó, recordado pelo Evangelho, o homem moderno deve dirigir-se a Jesus, com total confiança. "Que queres que te faça?" — perguntou-lhe o Divino mestre; o cego respondeu: "Senhor, que eu veja!". E Jesus curou-o dizendo: "Vê. Salvou-Te a tua fé" (cf. Lc Lc 13,35-43).

Só Cristo pode iluminar-nos de modo pleno sobre o problema da vida e da história: estai sempre convencidos disto e testemunhai coerente e corajosamente esta vossa fé!

4. Caríssimos amigos!

Encontrando-me na vossa Cidade, é um dever, pelo menos para concluir, citar Frei Jacopone de Todi, o poeta e o místico por todos nós conhecido, que, através de tantas vicissitudes contrastantes, exprimiu com apaixonada acentuação lírica o seu ardente amor a Cristo, com espírito algumas vezes atormentado, outras vezes franciscanamente alegre e sereno. No "louvor" sobre o "Pranto de Nossa Senhora", ele descreve, em comovente síntese, a paixão e a morte de Cristo na Cruz e faz irromper da sensibilidade materna de Maria, desejosa de morrer com Jesus, as mais ternas invocações: "Ó Filho, filho, filho! — Filho amoroso lírio — filho doce e agradável — filho meu delicado!". E Jesus do alto da cruz manifesta-lhe a sua última vontade, que se pode parafrasear deste modo: "Mãe, porque choras? Eu quero que tu fiques para ajudar estes meus irmãos!".

É uma poesia estupenda, mas é sobretudo mensagem válida para sempre. Fomos confiados a Maria! Implorai-a também vós, aconchegai-vos ao seu materno afecto, invocai-a confiante e fervorosamente, a fim de que mantenha sempre Viva nos vossos espíritos a fé no Amor misericordioso de Cristo!

Com este voto, de todo o coração vos concedo a propiciadora Bênção Apostólica, que de bom grado faço extensiva a todas as pessoas que vos são queridas!



VISITA PASTORAL DO SANTO PADRE

AO SANTUÁRIO DE COLLEVALENZA E A TODI

(22 DE NOVEMBRO DE 1981)

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

DURANTE O ENCONTRO COM


O CLERO DE TODI E DE ORVIETO


Catedral de Todi

Domingo, 22 de Novembro de 1981



Caríssimos Sacerdotes

Desejei encontrar-me convosco, membros do clero secular e regular das dioceses de Todi e de Orvieto, unidas na pessoa do Bispo, para manifestar-vos a minha profunda afeição e o meu incitamento na vossa, vida, e no vosso ministério sacerdotal. Tenho o gosto de ver-vos recolhidos nesta insigne Catedral tudertina, que, juntamente com a ainda mais conhecida de Orvieto, reassume admiravelmente a fé, a arte e a história das populações desta terra. Causa-me também prazer saber-vos desejosos de viver comigo um momento de fraterna e gozosa comunicação eclesial. Saúdo-vos com viva cordialidade: todos desejo abraçar, confortar e a todos agradecer o caloroso acolhimento. Saúdo, em particular, o vosso Bispo, Dom Décio Lúcio Grandoni, e os dois Vigários-Gerais.

1. Teria tantas coisas para dizer-vos e tantas para ouvir de vós, mas o tempo breve não mo consente; limitar-me-ei por isso a expor-vos alguns pensamentos que me são sugeridos pelas circunstâncias da hodierna visita ao Santuário do Amor Misericordioso em Collevalenza.

Falando a Sacerdotes com cura de almas, que são sinais vivos e eficazes da misericórdia de Deus, não encontro considerações mais estimulantes do que as derivadas desta virtude, que está no centro da Igreja, como fonte repuxante, de que todos se aproximam para dessedentar-se. Nunca como neste tempo, precisou o homem tanto da misericórdia que é necessária não só para o progresso espiritual de cada alma mas também para o humano em conjunto, civil e social. Ela, de facto, se foi vivida em plenitude, poderá renovar o tecido das relações no interior dos vossos presbitérios e dará às vossas comunidades diocesanas maior consistência e alento de amizade, de bondade, de concórdia, de mútua estima e confiança, e de colaboração de boa, vontade. Vivendo esta espiritualidade, poderá haver entre vós disparidades de vistas, diversidades de livres opiniões e multiplicidade de iniciativas pastorais, mas não vos faltará nunca a unidade de fé, de caridade e disciplina: não vos faltará nunca o sentido da compreensão e da indulgência para com as fraquezas alheias. Em particular vós, Sacerdotes anciãos, encontrareis o modo de compreender os vossos irmãos mais jovens; e vós, jovens, sabereis estabelecer com os vossos Superiores relações de sinceridade e confiança, sem tirar a quem dirige, o dever da responsabilidade, e a vós próprios, o mérito da obediência. É neste esforço de recíproca misericórdia que se realiza e celebra o mistério da redenção na Igreja. Fazei dela, tanto no seu interior carisma de perdão e de amor, como no seu exterior exercício de serviço a qualquer necessidade dos irmãos, o vosso programa sacerdotal, para viver em plenitude de fé e de justiça o mistério de Cristo morto e ressuscitado.

2. Mas a caridade pastoral exige que saibais usar essa misericórdia para conforto das almas confiadas às vossas solicitudes. Pode dizer-se que os Sacerdotes são os primeiros e directos promotores das obras de misericórdia corporal e espiritual. É assim mesmo! Mas que inclui tudo isto? Tudo isto importa novo conceito da função do pastor, que deve saber "compadecer-se" (Ph 2,1), deve ter no coração uma boa compaixão (Ep 4,32) e não deve fechar-se diante de um irmão que se encontra em necessidade; numa palavra, deve fazer-se bom samaritano (cf. Lc Lc 10,30-37). Está fora de dúvida que a função pastoral exige o exercício de uma autoridade: o pastor é chefe, é guia e é mestre; mas depressa sucede uma segunda exigência, é a do serviço. A autoridade no pensamento de Cristo não é em benefício de quem a exerce, mas em vantagem daqueles a quem se dirige. A autoridade é dever e sobretudo ministério para com os outros, para os conduzir à vida eterna. Esta função pastoral, se exercida com tal espírito, leva à sua expressão mais plena, isto é, ao dom total de si, ao sacrifício; precisamente como Jesus disse e praticou Ele mesmo: "o bom pastor dá, a vida pelo seu rebanho" (Jn 10,11). Nesta visão está encerrada uma soma de qualidades pastorais: a humildade, o desinteresse e a ternura (recordai-vos do discurso de Paulo aos cristãos de Mileto, cf. Act Ac 20,17-38); mas também uma soma de exigências da arte pastoral, como o estudo da teologia pastoral, da psicologia e da sociologia, para evitar condescendência exagerada nas relações com as almas individuais e com as comunidades.

Em particular, este amor misericordioso vós o praticais na administração dos Sacramentos, lugar privilegiado de misericórdia e perdão.

Como é sabido, o Pai que nos tornou filhos no Baptismo mantém-se fiel ao seu amor mesmo quando, por própria culpa, o homem se separa d'Ele. A Sua misericórdia é mais forte que o pecado, e o sacramento da Confissão é disso o sinal mais expressivo, quase um segundo Baptismo, como lhe chamou os Padres da Igreja. Na Confissão; a mesma graça do Baptismo renova-se de facto por uma nova e mais rica inserção no mistério de Cristo, e da Igreja. Também, a fragilidade e a enfermidade física do homem são, pela misericórdia de Cristo, ocasião de graça; como acontece também na Unção dos enfermos que reexprime e renova a inserção total do cristão doente no mistério pascal, come sinal eficaz de alívio e perdão. Com efeito, neste sacramento Cristo faz sua a fragilidade do homem e resgata-a, para na debilidade da criatura se manifestar plenamente o poder de Deus (cf. 2Co 12,9-10).

.Mas para o doente também a Eucaristia é sacramento da misericórdia divina, sendo viático para a última viagem e destinado assim a suster o doente na passagem desta vida para o Pai e a muni-lo com a garantia da ressurreição, segundo as palavras do Senhor: "Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna e Eu ressuscitá-lo-ei no último dia" (Jn 6,54). É acto de verdadeiro amor confortar os doentes com este sacramento, o último, antes que eles vejam a Deus para além dos sinais sacramentais e participem alegres no banquete do Reino.

3. Caríssimos Sacerdotes, na administração destes sacramentos da misericórdia, sede sempre diligentes e fervorosos, sem poupar energias e tempo, profundamente conscientes de que "a Igreja vive vida autêntica, quando professa e proclama a misericórdia — o mais estupendo atributo do Criador e Redentor — e quando aproxima os homens das fontes da misericórdia do Salvador, de que ela é depositária e distribuidora" (Enc. Dives in misericordia, DM 13). Tende no vosso zelo pastoral aquela paciência e aquela bondade, de que o Senhor mesmo nos deixou exemplo, tendo vindo não para julgar mas para salvar (cf. Jo Jn 3,17). Como Cristo, sede vós também intransigentes com o mal, mas misericordiosos para com as pessoas. Entre as dificuldades, que podem encontrar, devem os fiéis sentir — nas palavras e no coração vossos, pastores — o eco da voz do Redentor "manso e humilde de coração" (Mt 11,29).

Seguindo os exemplos a vós deixados pelas luminosas figuras de sacerdotes e Bispos — entre os quais recordo o digno e zeloso Prelado Dom Alfonso De Sanctis, a quem se deve a erecção do Santuário do Amor Misericordioso continuai a vossa, obra de animação cristã entre estas queridas populações de Todi e de Orvieto. Cuidai da vida de oração e de bondade para serdes ministros exemplares e portadores de alegria e serenidade para todos. Cultivai a intimidade com Cristo, mediante sincera e profunda vida interior, recordando-vos sempre de que a vossa missão é ser testemunhas do sobrenatural e anunciadores de Cristo aos homens do nosso tempo, que notam cada vez mais, embora as aparências possam por vezes fazer pensar o contrário, o chamamento e a necessidade de Deus.

Confio estes votos à, Virgem Santíssima, Mãe de Misericórdia. Ela não deixará de proteger-vos e de assegurar ao vosso sacerdócio a sua materna e poderosa intercessão. Faça ela reflorir o número daqueles que aspiram ao sacerdócio e seguem o divino Cordeiro até aonde quer que Ele vá.

Com a minha Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NA ASSEMBLEIA PLENÁRIA


DO PONTIFÍCIO CONSELHO «COR UNUM»


Segunda-feira, 23 de Novembro de 1981



Caros amigos

É para mim especialmente agradável receber-vos esta manhã, quando se vai realizando a décima Assembleia plenária do Conselho Pontifício Cor Unum, ao qual ofereceis a vossa preciosa colaboração. Agradeço ao Cardeal Bernardin Gantin os sentimentos acabados por ele de me expressar em vosso nome; e formulo votos cordiais pelo bom restabelecimento do Padre Roger du Noyer, actualmente na Clínica Gemelli onde eu próprio beneficiei de cuidados tão competentes e atentos. Desejaria, neste encontro familiar, animar-vos a dar graças ao Senhor pelo primeiro e frutuoso decénio de Cor Unum, a renovar e difundir as vossas convicções fundamentais sobre a necessidade deste grande serviço eclesial, e a ir mais longe pelos caminhos concretos dos objectivos fixados desde o ponto de partida e sempre de actualidade.


Discursos João Paulo II 1981 - Sábado, 21 de Novembro de 1981