Discursos João Paulo II 1981 - Quinta-feira, 10 de Dezembro de 1981

Estas relações dizem também respeito, evidentemente, à presença activa da comunidade católica na Jugoslávia, como tive a honra de recordar aqui a Sua Excelência o Senhor Cvijetin Mijatovic, então Presidente da República, quando da prezada visita que se dignou fazer-me o ano passado. Os católicos do seu país, em conformidade com um direito fundamental já reconhecido por todos, mesmo ao nível das Nações Unidas, querem muito simplesmente ver assegurado o próprio espaço de liberdade espiritual, no plano individual e comunitário, e isto, em tudo o que comportam as exigências e as características da Mensagem evangélica a que eles aderem, como recordei no documento sobre a liberdade religiosa enviado a 1 de Setembro de 1980 a todos os Chefes de Estado dos Países signatários do Acto final de Helsínquia. Estes católicos das diversas nacionalidades jugoslavas, leais para com o seu país e preocupados pelo bem comum, desejam igualmente oferecer o próprio contributo para o progresso da sociedade civil, para a promoção do bem do homem, como eles manifestaram abundantemente. No espírito da comunhão que os liga ao Sucessor do Apóstolo Pedro, posso reafirmar aqui toda a estima e profunda confiança que nutro por eles e de modo particular pelos Bispos jugoslavos, tão zelosos na sua obra pastoral.

É sem dúvida possível que, entre o Estado e a Igreja, ambos responsáveis pelo bem do homem a títulos diversos e complementares, surjam dificuldades sobre pontos concretos. Elas não devem nunca agravar-se em prejuízo dos direitos legítimos, nem ficar sem solução justa. Basta, para as vencer, manifestar compreensão recíproca e boa vontade activa, no respeito mútuo das autoridades respectivas. A Igreja, nestes casos, está sempre disposta ao diálogo a todos os níveis, e espera encontrar as mesmas disposições favoráveis da parte das diferentes Autoridades na Jugoslávia. Será também uma honra para si, Senhor Embaixador, contribuir para facilitar este caminho, no interesse de todos.

Confio-lhe o cuidado de agradecer a Sua Excelência o Senhor Sergej Kraigher, Presidente da Presidência da República Socialista Federativa da Jugoslávia, os bons votos de que Vossa Excelência foi intérprete, e de lhe transmitir os que eu formulo pelo alto cargo que ele desempenha ao serviço de todos. Os meus votos quereriam abranger também todas as populações jugoslavas, cujos esforços aprecio, acompanhando-as em todas as suas provações, como no desastre aéreo que enlutou recentemente tantas famílias, e também nas suas esperanças de felicidade, de progresso e de paz. E Vossa Excelência, Senhor Embaixador, pode estar certo de encontrar sempre aqui acolhimento favorável, e os meus melhores votos pela nobre missão que hoje inicia.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS ITALIANOS DA CALÁBRIA


POR OCASIÃO DA VISITA


«AD LIMINA APOSTOLORUM»


Quinta-feira, 10 de Dezembro de 1981



Se é sempre uma alegria, para mim, encontrar-me com todas as categorias de fiéis e de pessoas, é-o sobretudo quando, como Pastor de toda a Igreja, posso dirigir-me, individualmente ou em grupos, aos Pastores das Igrejas locais, para deles obter de modo mais directo informações sobre os problemas das suas dioceses, as dificuldades de hoje, as perspectivas para o futuro.

Assim as solicitudes do cuidado pastoral são sentidas mais de perto, ao vivo, são compartilhadas, tornam-se comuns, e ao mesmo tempo podem chegar às linhas de solução ao serviço do único Supremo Pastor e em proveito de todas as almas.

Hoje tenho a alegria de estar entre vós, Bispos de uma terra rica e generosa como a Calábria. Rica, sob o ponto de vista da natureza, em sol, ar, luz e mar. Rica, sob o ponto de vista humano e religioso, em bondade, coração, generosidade, sentido de hospitalidade, em grandes valores espirituais e cristãos, sobretudo nos grandes afectos da família, ainda unida, solidária e numerosa. Terra de tradições religiosas, em que difundida e sentida é a devoção a Nossa Senhora, e numerosas sempre foram as vocações sacerdotais e religiosas, oferecidas generosamente ao serviço também de outras partes da Itália e do mundo.

Todavia, ao mesmo tempo, sob o ponto de vista económico e social, como Vós mesmos quisestes sublinhar no relatório sobre a situação sócio-religiosa da vossa região, terra pobre de recursos, como, em geral, toda a Região meridional italiana. As condições do terreno não consentem uma intensiva agricultura em larga escala. O processo de industrialização, já em curso há vários anos também em diversas partes do Sul, não atingiu na Região calabresa os níveis suficientes para responder às crescentes exigências da população habituada desde há muito ao sofrimento e ao abandono. A tudo isto acrescenta-se a ameaça quase permanente de calamidades naturais — e penso no terremoto, que constitui a oculta insídia de toda a Região meridional e tem causado muitas vezes desolação e ruína em vastas e bonitas áreas da vossa terra.

Não se pode permanecer insensível diante dos problemas, tão numerosos, graves e antigos, da assim chamada "questão meridional", com as diferenças económicas e sociais entre o Norte e o Sul; nem se pode ignorar que também dentro da questão meridional existe, como Vós lhe chamais, uma "questão calabresa", que tem por atrás de si múltiplas causas de natureza histórica, geográfica, cultural e social.

É por todas estas razões que a Calábria, como também todo o Sul, se tornou, ao menos há quase dois séculos, e continua a ser terra de emigração.

Um fenómeno, este, que deve ser considerado de modo mais particular, pois enquanto em geral a Itália, tradicional terra de emigração, se transformou rapidamente há algum tempo em terra de imigração, invertendo a antiga realidade, a Calábria, juntamente com outras poucas regiões italianas, continua a mandar para fora da própria terra a sua riqueza maior, isto é os próprios filhos, as forças mais vigorosas e mais jovens.

É um dos problemas mais angustiantes hoje, sobre o qual quereria chamar de modo particular a vossa atenção e a de toda a Igreja local, confiada aos vossos cuidados pastorais.

Conhecendo bem o fenómeno e os problemas da emigração do mundo, porque já antes de ter sobre os ombros a grave responsabilidade de toda a Igreja, tive ocasião de me encontrar muitas vezes, como Bispo e como Cardeal, com os compatriotas emigrados para fora da pátria em vários Países do mundo, para aquém e além do oceano, e nas minhas viagens internacionais destes três anos tive sempre contacto com os grupos imigrados nas nações que os recebem.

Na encíclica Laborem exercens, embora reconhecendo o direito, que tem o homem, de deixar o próprio País por vários motivos, apresentei a emigração como uma perda do País do qual se emigra: efectivamente, afastam-se homens e também membros de uma grande comunidade, unificada pela história, tradição e cultura, para iniciar um caminho, frequentemente incerto, no seio de outra sociedade, unida por outra cultura e muitas vezes também por outra língua.

O fenómeno da emigração, interna e externa, tão difundido no mundo, com proporções numéricas calculáveis em não poucas dezenas de milhões, deve solicitar continuamente a atenção e o cuidado pastoral da Igreja, seja de acolhida seja de partida, com o olhar vigilante sobre toda a ampla gama das suas implicações.

Apresentam-se numerosos e complexos problemas de natureza não só económica, política, social, jurídica e internacional, mas também, e sobretudo, de natureza humana, pessoal, familiar, ética e religiosa.

Mais uma vez o protagonista, e em geral vítima, do complexo e grave problema da emigração é o homem. A Igreja, visando o homem, não pode deixar de considerar a emigração, como aliás fez desde quando o problema se apresentou em toda a sua gravidade e complexidade, com instituições apropriadas e figuras de apóstolos, como a Santa Cabrini e o Bispo de Placência, João Baptista Scalabrini. Por isso a Santa Sé constituiu, há mais de dez anos, uma Pontifícia Comissão especializada em tais problemas, para os estudar e acompanhar, e para dar úteis indicações aos agentes pastorais.

A Igreja tem o dever de pensar nos enormes problemas dos agrupamentos humanos que estão a superar todas as previsíveis dimensões, como na América do Sul, para onde a Calábria enviou, numa primeira etapa, tantos dos seus filhos; assim como depois, numa segunda etapa, os enviou em grupos para as grandes cidades da Europa, e, como um fenómeno de massa, para as grandes cidades italianas do Norte.

Surgiram os grandes problemas da emigração, que são sobretudo problemas do emigrante: o impacto geralmente traumatizante com as áreas superindustrializadas dos Países de chegada; a separação e, não raro, o desmembramento da família; a disparidade de tratamento legislativo; a inferioridade no âmbito dos direitos, a qual muitas vezes se torna exploração; a solidão e a marginalização.

Eis alguns dos tantos aspectos do fenómeno da emigração, que eu, bem conhecendo a vossa solicitude e o vosso empenho neste campo, recordo à vossa consideração para vos estimular a prosseguir sempre em frente, ainda mais para a frente nesta estrada do auxílio ao emigrante conforme os modos próprios da Igreja, sobretudo com o serviço pastoral.

Estou bem a par da generosidade de tantos sacerdotes, que fizeram livremente a opção de se tornar emigrantes para estar junto dos irmãos obrigados, pela necessidade, a deixar o lugar de origem. É dever da Igreja local de partida não deixar faltar a assistência humana e religiosa aos próprios filhos que estão longe. Um cuidado pastoral dispensado na própria língua, com a linguagem da cultura de origem, embora na obrigação de o emigrante se inserir na cultura do Pais de chegada, tem a vantagem de ser instrumento eficaz no contributo para salvaguardar valores que devem ser conservados, para fazer do emigrante cristão um animador do mundo contemporâneo, um colaborador na obra de evangelização.

A Igreja da Calábria, sempre rica em energias humanas e generosa ao oferecê-las aos outros, não deixará de desempenhar a sua parte no campo da emigração. Se alta é, a taxa da emigração da Calábria, também alto deve ser o contributo da Igreja local no cuidado pastoral dos emigrantes. Estou certo que os Pastores e os Sacerdotes se empenharão de maneira adequada.

Desejaria considerar convosco também outros aspectos da vossa específica acção pastoral em terras da Calábria, cuja responsabilidade nos foi confiada pelo Espírito Santo: mas parecia-me mais urgente salientar um aspecto, diria característico, que na acção dos Bispos da vossa Região, como aliás também de outras, deve ser prioritário e visto na justa dimensão para uma resposta sempre mais adequada, segundo as exigências do momento.

Alegro-me ao saber que assumis como empenhos prioritários a catequese, a vida litúrgica e sacramental, o empenho social de testemunho cristão, o serviço de caridade, a pastoral da família, da juventude, das vocações além de outras prudentes iniciativas. Todos são campos por mim muito apreciados, e sobre os quais tive ocasião — e tê-la-ei ainda — de me deter com os Bispos das outras Regiões italianas, que vêm este ano a este encontro das Visitas "ad limina", tão corroborante para mim e para todos. Coragem! Segui com toda a vossa atenção e com toda a vossa tenácia estes programas, vastos e empenhativos, a fim de as caríssimas populações, a vós confiadas, poderem sempre progredir na vida de fé profunda, de invencível esperança, de convicto amor a Deus e aos irmãos, para uma verdadeira promoção humana e cristã da sua terra forte e generosa.

Dizei-lhes que o Papa as ama, as acompanha, as conforta; e, juntamente convosco, as abençoa de grande coração.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS ITALIANOS DA CONFERÊNCIA


EPISCOPAL DA SICÍLIA EM VISITA


«AD LIMINA APOSTOLORUM»


Sexta-feira, 11 de Dezembro de 1981



Senhor Cardeal,
Venerados Irmãos no Episcopado!

1. É um dia de sincera alegria, este, para mim e para vós, pois o presente encontro comunitário, concluindo os colóquios mantidos com cada um de vós, é um vivo e eficaz testemunho de fé e de comunhão na caridade.Com as visitas "ad limina" quisestes tornar-vos intérpretes e fiadores da fé das vossas Igrejas particulares e ainda da união na caridade, que as une todas entre si e, de modo especial, com a Igreja de Roma e com o seu Bispo, que, enquanto Sucessor de São Pedro na sé de Roma, é Vigário de Cristo na terra, Supremo Pastor e Chefe Visível de toda a Igreja, e "perpétuo e visível princípio e fundamento da unidade tanto dos Bispos como da multidão dos fiéis" (Lumen gentium LG 23).

Nestes dias cada um de vós referiu-me com muita sinceridade e singeleza quais são, neste tempo dramático e exaltante, as alegrias e as esperanças, as expectativas e as exigências do bom povo da Sicília, ao qual neste momento tão significativo desejo dirigir a minha afectuosa saudação e manifestar a minha cordial simpatia.

Uma simpatia, motivada pela natural bondade do povo siciliano, que, traz no próprio coração — juntamente com as riquezas da sua longa e perturbada história — intensíssima carga de indomável força ao enfrentar as adversidades; de generosa dedicação aos fracos e aos pequeninos; de ardente entusiasmo pelos nobres ideais; de respeitosa gentileza para com o visitante; e além disso transmitiu, de geração em geração, o sentido da sacralidade do núcleo familiar; a alegria pela presença das crianças saudadas sempre como precioso dom do Pai celeste, e também como garantia e esperança para o futuro; a confiança terna e filial em relação à Divina Providência; uni acentuado e profundo "sentido religioso", que se exprimiu e se exprime naquela "piedade popular", tão cheia de símbolos, de sinais e de gestos, que envolvem o fiel em todas as múltiplas dimensões da sua personalidade.

2. Desde o inicio do seu anúncio, a mensagem cristã encontrou no coração dos sicilianos terreno fertilíssimo para dar à Igreja frutos admiráveis de santidade e de graça. A Sicília é verdadeiramente uma ilha de Santos. Pude percorrer com emocionada admiração o Calendário Litúrgico das vossas Igrejas particulares e notei como Deus, em todos os séculos, lhes tenha concedido Santos e Santas, pertencentes a todas as condições. É uma longa série sagrada de homens e mulheres, que na vossa terra, em meio de dificuldades e perseguições, viveram o Evangelho de maneira simples e total: Ágata, Luzia, Rosália, Libertino, Euplo, Filipe de Agira, Berillo, Marciano, Calógero, Agatão Papa, Metódio, Leão, José Hinógrafo, Simeão, Silvestre, Nicolau Politi, Lourenço de Frazzanó, Conrado Confalonieri, Alberto de Trápani, Pedro Tomás, Benedito de San Fratello, e tantos outros Santos e Santas, Beatos e Beatas, dignos filhos de uma terra naturalmente generosa e intensamente religiosa. Nem posso não recordar, neste momento, o Beato Jordão Ansalone, mártir, que tive a alegria de elevar às honras dos altares em Manila no dia 18 de Fevereiro passado, durante a minha peregrinação apostólica no Extremo Oriente.

3. No meio destas luzes de graça e santidade, ao tesouro verdadeiramente precioso dos valores humanos e cristãos que a boa gente de Sicília transmite diligentemente há séculos, aparecem todavia algumas sombras, que devem levar à reflexão todos os homens preocupados com a autêntica promoção humana, espiritual e social da Região. Existem infelizmente alguns fenómenos aberrantes, já seculares. Trata-se daquela mentalidade ou estrutura chamada "mafiosa" que é causa, a vários níveis e com diversas manifestações, de crimes deletérios para o bom nome mesmo da Sicília e da sua gente; tal mentalidade destorcida e que leva à dissolução pretende desprezar a lei e poder violá-la impunemente; daqui o multiplicar-se da violência e dos homicídios, cujos mandantes e executores são protegidos pela solidariedade, infelizmente generalizada pelo temor de represálias e de vinganças. Uma não bem entendida concepção da honra associa-se a esta atitude. Tais fenómenos provocam uma laceração na ordem ética da sociedade. Sei que a Igreja, que está na Sicília, sempre reagiu com força contra este tipo de violência — recordo a vossa Nota de Outubro de 1974 —, e recentemente o Cardeal Arcebispo de Palermo, por ocasião da Solenidade de Cristo Rei, convidou fiéis e autoridades a rezarem juntos è a meditar, à luz da Palavra de Deus, sobre tais pragas morais e sociais, para lhes resistir com firmeza.

Sim, caríssimos Irmãos no Episcopado, deve-se reagir, não convém absolutamente ressignar-se! Diante destas aberrações é preciso ajudar os fiéis a formarem e a maturarem uma recta consciência ética; deve-se fazer com que — e aqui dirijo-me de modo particular às competentes Autoridades — a todos seja dado trabalho digno, oportuna instrução e que todos se sintam e sejam verdadeiramente iguais perante a lei.

Nem se pode passar sob silêncio o grave problema do desemprego juvenil, que conduz a fáceis caminhos para a criminalidade, a violência, a droga, e põe os jovens na impossibilidade concreta de formarem uma família; como também o da emigração, que tantas lacerações provoca no campo afectivo e familiar, além dos sérios problemas no plano pastoral.

4. Para vir ao encontro das justas e legítimas expectativas do povo siciliano, a Igreja deve fazer todo o esforço para dar o próprio contributo específico, original, concreto e eficaz.

É necessária a presença diligente e o testemunho incansável dos sacerdotes. A Sicília tem necessidade de sacerdotes, numerosos, zelosos e culturalmente preparados. Toda a Comunidade eclesial deve trabalhar e pedir ao Senhor que não faltem as vocações eclesiásticas; que floresçam os Seminários Menores de Ginásio-Liceu e os Maiores. Faço votos por que os Institutos Teológicos — o de "São Paulo" de Catânia, o "Ignatium" e o "São Tomás" de Messina, e, em particular a Faculdade Teológica "São João Evangelista" da Sicília, recentemente erigida por mim — sejam centros de estudo a alto nível cientifico mas também ardentes forjas de preparação espiritual, especialmente para os candidatos ao sacerdócio. A todos os seminaristas da Sicília a minha saudação, e aos seus 2.500 sacerdotes e 1.300 religiosos a minha palavra de afectuoso apreço e de fraterno encorajamento para o seu insubstituível ministério. Que estejam junto do seu povo, compreendam os seus anseios e exigências. A vida, o ensinamento e o exemplo de Don Luigi Struzo — que na total fidelidade ao seu carisma sacerdotal soube infundir não só nos sicilianos mas nos católicos italianos o sentido do direito-dever da participação na vida politica e social à luz da doutrina da Igreja — estejam presentes e inspirem o próprio apostolado de evangelização e de promoção humana. Serão os Sacerdotes os principais artífices da pastoral catequética na Sicília, em conformidade com as sugestões e directrizes, contidas na minha Exortação Apostólica Catechesi tradendae como também no vosso documento publicado no primeiro domingo do Advento de 1980. Serão os sacerdotes os principais formadores e plasmadores da recta consciência moral dos seus fiéis; os guias sábios para que a rica "religiosidade popular" não se esvazie em sinais exteriores ou em manifestações de simples sentimento, mas seja orientada num continuo caminho de fé; uma fé baseada numa catequese permanente, a todos os níveis, mediante a reflexão sobre a Palavra de Deus e sobre o ensinamento da Igreja, e vivida, dia após dia, na coerência moral, requerida pelas exigências do Evangelho. Talvez — como vós recomendastes no documento de 1972 sobre "As festas cristãs na Sicília" e como reafirmastes no de 1980 sobre a "Pastoral catequética" — "seja necessário purificar as festas de eventuais incrustrações supersticiosas e impróprias ou de qualquer modo alheias à sensibilidade moderna".

Para serem autênticos "ministros de Cristo e dispensadores dos mistérios de Deus" (cf. 1Co 4,1), os sacerdotes deverão dar um testemunho de intensa vida espiritual enraizada na oração e meditação; com momentos ou pausas de reflexão como os Exercícios Espirituais possivelmente anuais, para um encontro silencioso com o Senhor.

Será também oportuno estudar, com vigilante atenção e necessário discernimento, o problema da distribuição do Clero, para que haja um justo equilíbrio de energias no vasto campo da actividade pastoral, que hoje, perante uma população de quase 5 milhões de pessoas, deve enfrentar problemas sempre mais complexos, como o dos Seminários, das paróquias, da catequese permanente, da formação cristã dos jovens, dos novos casais, das famílias, do mundo operário, dos instrumentos da comunicação social e da cultura.

Ao lado da obra dos sacerdotes e religiosos, estará a não menos preciosa e meritória das oito mil Irmãs, que trabalham na Ilha no campo da educação, da catequese, da assistência aos doentes e naquele, aparentemente anónimo e desconhecido, do silêncio orante nos mosteiros de clausura, onde com a adoração eucarística perpétua, com a "laus perennis" e com a mortificação imploram as divinas bênçãos.

Um particular empenho apostólico a Igreja espera-o do Laicado católico, que na Sicília tem longa e nobre tradição. As numerosas Confrarias, os vários ramos da Acção Católica, os Grupos, os Movimentos e as Comunidades agirão certamente de modo que não se fechem em si mesmos, nem tornem absolutas as próprias experiências, mas haverão de viver e trabalhar, juntamente com os outros, nas mais amplas comunidades paroquiais, em leal adesão aos seus Pastores. A promoção do Laicado será portanto uma das principais solicitudes do vosso serviço episcopal.

5. Caríssimos Irmãos no Episcopado!

Ao término das vossas visitas ad limina, sinto a necessidade de vos dirigir uma palavra de aprazimento pela exemplar comunhão de coração e de alma, que qualifica a vossa Conferência Episcopal, e pelo incansável zelo por vós dedicado ao vosso serviço eclesial; uma palavra além disso de Encorajamento para o trabalho vasto e muitas vezes difícil, que deveis quotidianamente enfrentar. E muito me alegro também pelo exemplo que dais no campo delicado e promissor das relações no plano do Ecumenismo.

Confio-vos e toda a dilecta Sicília à Virgem Santíssima, que o vosso povo, com sensibilizada ternura, chama "a Bela Mãe". A Ela, Mãe de Deus e Mãe da Igreja, ao seu Coração Imaculado, apresento os meus e os vossos votos: a Ela, que na Ilha é com devoção venerada em tantos Santuários, intimamente ligados à história, ora triste ora alegre, da vossa Região: o Santuário de Gulfi, na diocese de Ragusa; de Montalto, na diocese de Messina; do Terzito, na diocese de Lípari; de Valverde, na diocese de Acireale; de Custonaci, na diocese de Trápani; de Gibilmanna, na diocese de Cefalú; de Tíndari, na diocese de Patti, da "Madonna delia Sciara", de Mompileri, na diocese de Catânia; de Nossa Senhora das Lágrimas, em Siracusa. São estes, lugares privilegiados de graça e de oração; são fortalezas espirituais, em que os sicilianos retemperam a sua fé em Cristo, seguindo o exemplo de Maria, o incomparável modelo de fé, a humilde e nobre "escrava do Senhor".

Penhor da minha continua comunhão convosco e com todos os irmãos e irmãs da Sicília, seja a Bênção Apostólica que verdadeiramente de coração vos concedo.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR ALEJANDRO BANEGAS


NOVO EMBAIXADOR DAS HONDURAS


JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO


DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Sábado, 12 de Dezembro de 1981



Senhor Embaixador

As palavras que Vossa Excelência me dirigiu ao apresentar as Cartas Credenciais que o acreditam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário das Honduras junto da Santa Sé, foram-me particularmente gratas por me fazerem sentir a adesão de todos os amadíssimos filhos hondurenhos.

Ao agradecer-lhe, Senhor Embaixador, a expressão destes sentimentos, assim como a deferente saudação que me transmitiu da parte do Senhor Presidente da República, dou-lhe as mais cordiais boas-vindas, ao mesmo tempo que lhe asseguro o meu apoio para a importante missão que lhe foi confiada.

Vossa Excelência aludiu aos esforços realizados por esta Sé Apostólica em favor da paz, da harmonia e maior colaboração entre os povos. Antes de tudo, é necessário ter presente que a paz é fruto da ordem inscrita na sociedade humana pelo seu divino Fundador, e que os homens, sempre desejosos de uma justiça mais perfeita, hão-de fazer amadurecer.

Coube-nos viver numa época em que se sente, em muitas partes e a diferentes níveis, uma fome profunda de paz, a qual "não pode conseguir-se se não se salvaguardar o bem dos indivíduos e os homens não comunicarem entre si com confiança as riquezas do seu espírito e das suas faculdades criadoras. São absolutamente necessárias a vontade firme de respeitar os outros homens e povos bem como a sua dignidade e o exercício dedicado da fraternidade, em ordem à construção da paz. Assim, a paz é também fruto do amor que ultrapassa os limites da justiça" (Gaudium et spes GS 78).

A paz deve realizar-se na verdade; deve construir-se sobre a justiça; deve estar animada pelo amor; deve propagar-se na liberdade. Só na liberdade — esse grande valor de cada pessoa, de cada povo e de toda a humanidade — é possível criar um clima de entendimento e convivência necessários para que a nobre Nação hondurenha continue a construir o seu presente e o seu futuro históricos.

A Igreja nas Honduras, guiada pelos seus Pastores, também quer colaborar generosamente nesta tarefa; e fá-lo-á cada dia mais com planos modernos de evangelização, obras de caridade e de apostolado. Mas esta acção não será possível se as diferentes instâncias responsáveis da sociedade não tornarem viável o exercício da verdadeira liberdade em todas as suas manifestações. Devem procurar garantir a cada homem e a cada mulher a possibilidade de aplicarem plenamente o seu potencial humano. Devem reconhecer-lhes um espaço autónomo, juridicamente protegido, para que todo o ser humano possa viver, só ou colectivamente, segundo as exigências da sua consciência.

A Igreja não pretende monopolizar intervenção alguma na sociedade, dado que, em harmonia e mútuo respeito com os que dirigem os destinos de cada nação, ela quer apenas servir a grande causa do homem, especialmente do mais pobre e necessitado. Só assim é possível elevar a dignidade de cada cidadão e edificar o tão desejado bem comum para todos.

Perante as nobres esperanças que o Governo do seu País depõe na missão do Sucessor de Pedro, esta Sé Apostólica — como já tive ocasião de dizer na XXXIV Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (2 de Outubro de 1979) — proclama que "a razão de ser de toda a politica é o serviço ao homem, é a adesão, cheia de solicitude e de responsabilidade, aos problemas e às tarefas essenciais da sua existência terrena, com a sua dimensão e alcance social". Mas tudo isso não se pode levar a termo se não se reconhecer a primazia dos valores espirituais, com a qual se consegue que o desenvolvimento material, técnico e cultural esteja ao serviço do que é constitutivo do homem, quer dizer, que lhe permita o pleno acesso à verdade, ao desenvolvimento moral, à total possibilidade de usufruir dos bens da cultura herdados e de os multiplicar mediante a criatividade.

Estes bens e valores devem encontrar a sua justa expressão no âmbito da família. A este respeito conheço a viva preocupação da Igreja hondurenha por defender esse importantíssimo sector da sociedade, que merece todo o apoio e tutela. Somente com o renascimento espiritual, fruto de um delicado compromisso de todos, se garantirá a civilização cristã, a que o meu Predecessor Paulo VI costumava chamar com particular afecto "a civilização do amor".

Ao renovar-lhe, Senhor Embaixador, a minha benevolência pelo cumprimento da sua missão, invoco sobre Vossa Excelência, sobre as Autoridades que houveram por bem confiar-lha e sobre todos os amadíssimos filhos das Honduras, abundantes e selectas graças divinas.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


ÀS FILHAS DE MARIA AUXILIADORA


POR OCASIÃO DO XVII CAPÍTULO GERAL


E CELEBRAÇÃO DO CENTENÁRIO DA MORTE


DA FUNDADORA SANTA MARIA DOMINGAS MAZZARELLO


Sábado, 12 de Dezembro de 1981



Caríssimas Irmãs

Enquanto dirijo o meu agradecimento à nova Madre-Geral pelas belas palavras que, em nome de todas, quis dirigir-me, saúdo cada uma de vós que viestes fazer visita ao Vigário de Cristo, por ocasião do XVII Capítulo Geral, etapa importante para a vida do vosso Instituto. Desse, de facto, deverão brotar as novas Constituições que, depois de aprovadas pela Autoridade eclesiástica, vos hão-de trazer segura orientação para a prática dos vossos ideais religiosos nesta sociedade aberta para o horizonte do 3º milénio cristão.

1. Desde os tempos da Comunidade de Mornese, desde os primórdios heróicos e prometedores do Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora, foi percorrido longo caminho, marcado por provas e sacrifícios, mas também coroado de frutos consoladores e preciosos para a vossa Família e para a Igreja inteira, pelos quais desejamos ser gratos ao Senhor do profundo do espírito. As cerca de 200 Filhas de Maria Auxiliadora, deixadas por Santa Maria Domingas Mazzarello no momento da sua morte, de que este ano se celebra o centenário, tornaram-se mais de 17.000, espalhadas por 62 Nações, por todos os Continentes; e as Casas, no período de um século, passaram de cerca de 26 a quase 1.500.

Diante da prova dos factos, soaram hoje proféticas as palavras do Bispo de Acqui de então, Dom G. Sciandra, presente na cerimónia da primeira profissão a 5 de Agosto de 1872: "Há um cúmulo de circunstâncias que demonstram especial Providência do Senhor por este novo Instituto". Assim exerceis hoje o vosso apostolado pela juventude em todos os sectores da formação, em toda a ordem e grau, e em escolas também de nível universitário, como ainda no campo das missões, sempre em sintonia com as finalidades do carisma de fundação. Diante de um conjunto tão complexo de obras, nascidas do impulso de Don Bosco e da fidelidade obediente de uma jovem, humilde de origem e pobre de cultura mas rica de Espírito Santo, enquanto por um lado é natural verificar que o dedo de Deus está presente em tão grande crescimento, por outro é solicitada a vossa responsabilidade quanto às jovens de hoje, aos seus problemas e às suas esperanças. Por outras palavras, sois chamadas a assegurar a continuidade da vossa missão, dirigida a responsabilizar também as filhas desta geração na aventura maravilhosa de uma vida segundo o Evangelho, missão que de vós requer uma alma cheia de alegria.

2. É essa alegria uma das notas características do carisma pedagógico salesiano, assimilado integralmente pela Madre Maria Domingas, com absoluta fidelidade e intuição pessoal. Ela, na verdade, preocupava-se continuamente com a alegria das suas filhas, como se esta fosse a prova principal da santidade delas, e costumava perguntar com frequência a cada uma: "Estás alegre?". Trata-se daquela alegria que Jesus prometeu aos seus e é sempre recomendada por São Paulo (cf. Flp Ph 3,1 Ph 4,4), que fez dela um dos primeiros frutos do Espírito: "Mas o fruto do Espírito é caridade, alegria" (Ga 5,22).

Tal atitude de alegria está radicada, em primeiro lugar, num profundo sentimento de fé, em que domina e é sempre preponderante a presença do Senhor, como Aquele que ama e salva, como Pai que tem cuidado, na sua providência, de todas as nossas coisas. Se não aprofundamos tal contacto interior com o Pai do Céu, para que nos resguarde de todos os nossos temores, das nossas dúvidas e angústias, e nos consinta vencer tudo isto, é vão pensar na alegria do coração e menos ainda procurar exprimi-la. Daí resultaria uma atitude forçada e não convincente.

Do contacto intenso com Deus, de um convicto espírito de fé, que encontra expressão concreta na constante adesão à Igreja e ao seu Magistério, vós tirareis as motivações profundas da vossa alegria salesiana, e também a capacidade de discernimento das situações e sobretudo dos corações das jovens, discernimento inteligente e sobrenatural que inconfundivelmente qualificou o ministério educativo de Don Bosco e da Madre Maria Domingas.

3. A propósito de tal ministério desejaria agora deter-me um momento no bem conhecido sistema preventivo salesiano encerrado no trinómio: "razão — religião — amor". O respeito das exigências da razão e da religião — isto é uma confiada atitude diante dos valores naturais e sobrenaturais da pessoa — é certamente fundamental num propósito educativo. Todavia, por limitação de tempo, acrescentarei uma palavra apenas sobre a terceira característica do sistema preventivo, isto é a do amor, ou, para exprimir-me com Don Bosco, "carinho".


Discursos João Paulo II 1981 - Quinta-feira, 10 de Dezembro de 1981