Discursos João Paulo II 1982 - Quinta-feira, 28 de Janeiro de 1982

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS ESPANHÓIS DAS PROVÍNCIAS


DE SEVILHA E GRANADA EM VISITA


«AD LIMINA APOSTOLORUM»


Sábado, 30 de Janeiro de 1982





1. É para mim razão de verdadeira alegria encontrar-me hoje com este numeroso grupo vosso, composto pelos Pastores da região sul da Espanha, e em concreto das províncias eclesiásticas de Sevilha e Granada.

Sei que se trata de, aproximadamente, a quarta parte de toda a querida Nação espanhola; região de rica história, cristã e pré-cristã, e de venerável tradição eclesial que remonta à era apostólica.

Por isso, ao encontrar-me convosco por ocasião da vossa visita "ad limina", e ao pensar nas comunidades, cuja palpitação de fé cristã trazeis até aqui, vem à minha mente aquele pensamento paulino de tantas ressonâncias comunitárias: "Dou graças ao meu Deus todas as vezes que me lembro de vós. Em todas as minhas orações peço sempre com alegria por todos vós, recordando-me da parte que tomastes na difusão do Evangelho, desde o primeiro dia até agora. Estou persuadido de que Aquele que começou em vós a boa obra a completará até ao dia de Cristo Jesus" (Ph 1,3-6).

São estes os sentimentos que dominam o meu espírito neste contacto pessoal — como Bispo de Roma e Sucessor de Pedro — com os Irmãos e Pastores de uma parte do rebanho de Cristo.

Nos encontros individuais convosco fui adquirindo conhecimento mais profundo das vossas Igrejas locais, que me facilita o cumprimento daquela missão recebida do Mestre: "confirma fratres tuos" (Lc 22,32). Deste modo, repassando alegrias e preocupações, realizações e esperanças, e alentando o esforço de construção incessante da Igreja de Cristo, vamos caminhando para uma cada vez maior fidelidade a Ele.

2. O momento actual é particularmente importante para o Povo de Deus nas vossas circunscrições eclesiais, já que a situação especificamente religiosa e os factores de ambientes sócio-culturais, económicos e políticos, apresentam à fé dos vossos fiéis, e o farão em não menor grau no próximo futuro, múltiplos desafios a que não podeis ser insensíveis como Pastores. Isto requererá de vós claros discernimentos, seguras opções tomadas a partir do Evangelho e iniciativas decididas que sejam idóneas para orientar com eficácia as consciências dos vossos diocesanos.

O caminho, que se abre à vossa responsabilidade de guias do Povo de Deus, é muito amplo. Sem qualquer dúvida, não vos faltará a graça prometida pelo Mestre aos Seus Apóstolos, e o vosso zelo sugerir-vos-á cada dia as respostas que tereis de ir dando às perguntas apresentadas pelas almas a vós confiadas. Nesta ocasião quero, por minha parte, limitar-me a chamar-vos a atenção para alguns pontos concretos, que julgo especialmente oportuno assinalar à vossa solicitude pastoral.

3. Quero, antes de tudo, referir-me ã religiosidade popular, que o meu Predecessor Paulo VI chamava também "piedade popular" ou "religião do povo" (cf. Evangelii nuntiandi EN 48), e da qual eu mesmo tratei, fazendo-me eco das conclusões do quarto Sínodo dos Bispos, na Exortação Apostólica Catechesi tradendae (n. 54) e noutras ocasiões (cf. Homilia em Zapopán, 30 de Janeiro de 1979, nn. 2, 5).

A vossa situação concreta podem aplicar-se muitas das reflexões aí contidas. Com efeito, os vossos povos, que mergulham as raízes na antiga tradição apostólica, receberam depois numerosas influências culturais, que lhes deram características próprias. A religiosidade popular, que dai surgiu, é fruto da presença fundamental da fé católica, com uma experiência própria do sagrado, que encerra por vezes a exaltação ritualista dos momentos solenes da vida do homem, uma tendência devocional e uma dimensão muito festiva.

Todos estes factores, que estão presentes e caracterizam em parte a religiosidade do vosso povo, merecem a vossa atenção continuada, o vosso respeito e cuidado — sei bem que a isso tendes dedicado o vosso estudo em vários momentos —, ao mesmo tempo que a vossa incessante vigilância, a fim de os elementos menos perfeitos se irem progressivamente purificando e os fiéis poderem chegar a uma fé autêntica e a uma plenitude de vida em Cristo.

De modo especial devereis fomentar e canalizar as três devoções peculiares, que têm sido desde há séculos e continuam a sê-lo ainda, objecto de predilecção na religiosidade popular das vossas gentes. Refiro-me à devoção a Jesus Cristo no mistério da sua Paixão e no Sacramento da Eucaristia, assim como à devoção à sua Mãe Santíssima nos mistérios de dor, de gozo e de glória.

4. Intimamente relacionada com isso, e como solução gradual do anteriormente indicado, quero recordar-vos aqui a necessidade de uma evangelização intensa e esmerada dos vossos fiéis. Nos documentos citados e nas conclusões da Conferência de Puebla, a que tantas vezes me tenho referido — dedicada precisamente ao estudo deste tema — encontrareis valiosas orientações nesta tarefa.

É preciso tratar de obter uma evangelização que mobilize toda a Igreja e todas as suas estruturas, com o testemunho fiel do Evangelho, com a pregação viva e adequada, com a liturgia da Palavra bem preparada, com a catequese nas paróquias, nas famílias, no âmbito da escola e de outras instituições ou comunidades, com uma activa presença no importante campo dos meios de comunicação social que podem multiplicar tantos esforços, com o contacto pessoal e com a intensa preparação para os Sacramentos e a devida celebração deles (cf. Evangelii nuntiandi EN 41-47 Catechesi tradendae, nn. 67-70).

Assim poderá conseguir-se que a religiosidade popular vá sendo robustecida nos seus elementos válidos e completada no seu conjunto, de tal maneira que se chegue à solidez da vida cristã.

5. Para que essa evangelização desejada possa ser realidade cada vez mais consoladora, tereis de cuidar com particular diligência dos agentes evangelizadores, que partilham convosco essa tarefa: os sacerdotes, religiosos, religiosas e mais pessoas consagradas por titulo especial ao Senhor, na Igreja.

Por isso, enfrentai com firmeza e compreensão as situações difíceis dos vossos sacerdotes, estai muito perto deles, para que, vivendo com alegria e fidelidade a sua dedicação a Cristo e à Igreja, superem os obstáculos que encontra o ministério no nosso tempo e as tentações, que possam insinuar-se, de abandono, de desapontamento ou de falta de entusiasmo.

Tratai-os como irmãos, com amizade e intimidade verdadeira, apoiai-os em todo o momento, confortai-os e fazei-lhes sentir com a vossa atitude que eles, além de serem os vossos colaboradores mais preciosos, são a parcela eclesial que merece as primícias do vosso tempo e das vossas energias.

De modo equivalente, buscai a colaboração e apoio dos religiosos, com vivo apreço pelo seu estado e no espírito do documento sobre as relações Bispos-religiosos, publicado pelas Sagradas Congregações para os Bispos, e para os Religiosos e os Institutos Seculares. Tudo isso servirá para melhor coordenar e potenciar as forças vivas da Igreja, com a ajuda valiosa de todas as almas consagradas.

Sei que, por ocasião de Quinta-feira Santa de 1978, dirigistes uma carta especial aos Sacerdotes. Animo-vos a que prossigais nos propósitos nela manifestados, em especial de cuidar diligentemente das vocações ao sacerdócio, tão necessárias nas vossas dioceses e em toda a igreja, das quais, graças a Deus, se vai notando já, nalgumas partes da vossa região eclesial, um prometedor aumento.

6. Outro campo, que reveste grande importância e pode fazer sentir o seu notável influxo sobre as vocações, é o da família. A ela vos peço dediqueis um abnegado e perseverante cuidado, como recentemente indiquei na Exortação Apostólica Familiaris consortio.

Com efeito, na família cristã, fundada na fé viva e na piedade verdadeira, baseiam-se muitas esperanças para o futuro. Por isso a Igreja prestou sempre interesse singular a este tipo de apostolado, cuja importância não diminuiu nos vossos próprios ambientes. Melhor, vai conquistando cada vez mais lugar de maior relevo, já que as circunstâncias externas è a nova ordenação legal no campo civil sobre este tema, podem fender o edifício da unidade familiar, com não pequeno dano para a sociedade inteira.

Assim pois, vós, com grande cuidado e inculcando o mesmo aos vossos sacerdotes e colaboradores, atendei ao sector dos Movimentos

familiares cristãos, de espiritualidade ou de apostolado. Ordenai prudentemente a preparação remota, próxima e imediata para o matrimónio; tratai de conseguir que os lares dos vossos fiéis sejam verdadeiramente outras tantas igrejas domésticas (cf. Familiaris consortio FC 55). E através da família e da organização diocesana e paroquial, programai um intenso apostolado juvenil, que mantenha e acrescente a fé dos vossos jovens — verdadeiro tesouro da Igreja — como cristãos de hoje e que serão os dirigentes e responsáveis do futuro eclesial e social.

7. Finalmente, não posso deixar de referir-me ao momento difícil da situação económico-trabalhista na vossa região. O doloroso fenómeno do extenso desemprego que a vossa região sofre, no campo e na cidade, exige de vós um testemunho de iluminação e compromisso, uma pregação adequada e um empenho exigente em favor da implantação de maior justiça social.

E também, segundo as circunstâncias, uma chamada urgente à comunicação cristã de bens, eficazmente canalizada através das vossas organizações de caridade (cf. Laborem exercem, n. 18).

Estou certo que as reflexões que irão surgir durante a próxima Semana Social da Espanha, dedicada precisamente a este importante tema, vos oferecerão elementos muito úteis para despertar uma verdadeira colaboração solidária, dentro das vossas possibilidades e da vossa competência, para dardes importante ajuda à progressiva solução deste doloroso fenómeno, que semeia em muitas pessoas e muitas famílias da vossa região, da Espanha e de fora dela, tantas inquietações e estreitezas, com repercussões humanas e morais muito graves.

Não deixeis, pois, de inculcar nos vossos leigos mais bem dispostos o sentido de responsabilidade que lhes compete neste campo, para que sejam artífices de promoção na sociedade e requeiram as oportunas intervenções dos poderes públicos, sem cujo eficaz esforço não poderá conseguir-se a cura de uma chaga social de tal importância e extensão.

8. São estas algumas das reflexões que desejei partilhar convosco, seguro de que, como pastores prudentes da vossa grei, sabereis incorporá-las no vosso esforço eclesial.

Na caridade de Cristo, que nos impele e une, recebei a minha palavra de ânimo a fim de prosseguirdes na vossa generosa entrega à Igreja. Tornai-a extensiva a todos os vossos sacerdotes, religiosos, religiosas, almas consagradas, seminaristas, pais de família e leigos comprometidos, que trabalham convosco nas paróquias, nas instituições e associações católicas.

Dizei-lhes que o Papa pensa neles, se lembra deles nas suas orações e se alegra com a fidelidade que têm à Igreja. Seja a Mãe de Jesus e nossa a melhor advogada diante do Pai para nos obter d'Ele a plenitude de vida em Cristo. E seja penhor dessa plenitude a Bênção Apostólica que a todos cordialmente concedo.



                                                   Fevereiro de 1982



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR ISAAC FEM IDE SAGAY


NOVO EMBAIXADOR DA NIGÉRIA


JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO


DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Segunda-feira, 1 de Fevereiro de 1982



Senhor Embaixador

Aceito com satisfação as Cartas Credenciais que designam Vossa Excelência como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário do seu Pais junto da Santa Sé. Dou-lhe calorosas boas-vindas a este novo cargo, e ao mesmo tempo que lhe exprimo a minha gratidão pelas amáveis saudações que me transmitiu da parte do Presidente da Nigéria desejaria pedir-lhe queira retribuir-lhe os cordiais bons votos.

As relações diplomáticas entre a Santa Sé e a Nigéria são um sinal de compreensão e respeito mútuos; ao mesmo tempo testemunham o comum desejo de trabalhar conjuntamente, em amistosa colaboração, para o melhoramento da pessoa humana e da sociedade. A Santa Sé e a sua Nação, cada uma no seu próprio campo específico de responsabilidade, esforçam-se por promover a elevação espiritual, moral e cultural dos homens e das mulheres, como também das famílias e das comunidades de que eles fazem parte.

A sua presença hoje aqui testemunha a intenção do seu Governo de trabalhar em harmonia com a Santa Sé. Do mesmo modo a Santa Sé e mais especificamente a Igreja Católica na Nigéria, desejam contribuir para um futuro melhor do seu País. Tal como Jesus de Nazaré foi um homem "o Qual andou de lugar em lugar, fazendo o bem" (Ac 10,38), assim também os seguidores de Cristo procuram distinguir-se nas obras de caridade e de justiça nas próprias relações com todos os seus compatriotas, independentemente do credo ou de qualquer outra distinção social. Para esclarecer este ponto, permita-me que faça referência às instituições educativas da Igreja na Nigéria. Entre outras finalidades, estas instituições procuram ajudar cada pessoa a desenvolver as suas capacidades e talentos únicos, de modo que, tendo recebido uma sólida formação nos vários campos de estudo, cada um possa, como bom cidadão, contribuir para o bem estar e o desenvolvimento ulterior da comunidade. Elas estão ao serviço dos pais, para os ajudar a exercer o próprio direito de escolher o tipo de educação que desejam dar aos filhos, de harmonia com os seus princípios morais e religiosos.

Dentro de poucas semanas, terei a grande alegria de visitar o amado povo da Nigéria. Aguardo esta peregrinação pastoral com grande expectativa. Será uma ocasião de encontro com muitos dos meus irmãos e irmãs em Cristo, e de me unir a eles para louvar e glorificar o nome de Deus, nosso Criador e Redentor. Ser-me-á dada a oportunidade de saudar os membros de outras religiões, especialmente os de fé muçulmana, pelos quais a Igreja Católica nutre elevada estima. Aguardo com satisfação o encontro com Sua Excelência Alhaji Shehu Shagari, Presidente da Nigéria, juntamente com os outros dirigentes da sua Nação. Peço que esta viagem de amizade e fé consolide os laços de compreensão e fraternidade que já nos unem.

A Vossa Excelência desejo-lhe feliz êxito na nova missão que está para empreender e, no desempenho dela, pode estar certo de toda a necessária assistência da parte da Santa Sé.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO LIX CURSO


PROMOVIDO PELO COLÉGIO DE DEFESA DA NATO


Sala do Consistório

Segunda-feira, 1 de Fevereiro de 1982



É uma satisfação dar-vos, mais uma vez, as boas-vindas ao Vaticano, membros do Colégio de Defesa da NATO, como também às vossas famílias. É-me grata a oportunidade de vos saudar e apresentar algumas breves considerações. Como no passado, também este ano me sinto impelido a falar-vos sobre a paz, dado que, em virtude das oportunidades de estudo e diálogo que vos são proporcionadas, tendes especial contributo a dar para a grande obra da paz.

Os acontecimentos dos últimos meses tornaram o mundo cada vez mais consciente dos complexos obstáculos que não deixam de tornar difíceis os esforços sinceros destinados a criar a justiça e a harmonia na sociedade hodierna. É verdade que o nosso mundo está agitado por divisões e tensões, com a opressão e o derramamento de sangue — terrificantes realidades tão profundamente radicadas e difundidas, que alguns dos nossos irmãos e irmãs perdem a esperança de que a paz venha a ser alcançada. Perderam simplesmente a esperança. Mas não devemos ceder ao fatalismo nem desesperar. Sem dúvida, devemos responder à situação com esperança constante e esforço incansável. A paz é possível. Pode ser alcançada. Nós, que somos crentes, estamos convencidos desta verdade porque sabemos realmente que Deus é o fundamento da paz. Deus quer dar a sua paz ao mundo. Quer promover a paz em todas as nações, entre todos os povos e em cada coração humano.

Segundo o desígnio divino, contudo, Deus cria a paz não independentemente do homem mas em continua colaboração com o homem mesmo. A paz é um dom de Deus confiado a nós. Como eu disse na minha mensagem para o recente Dia Mundial da Paz, "embora a paz seja um dom, o homem não está nunca dispensado da sua responsabilidade de a procurar e de empenhar-se no sentido de a instaurar, mediante esforços pessoais e comunitários ao longo da história. O dom divino da paz, portanto, é sempre também uma conquista e uma realização humana; com efeito, ele é proposto ao homem para ser acolhido de modo livre e, depois, ser progressivamente posto em prática pela sua vontade criadora" (n. 5). Dado que a paz é não só um dom de Deus, mas também uma conquista e uma realização humana, ela constitui um objectivo para o qual os crentes e os não-crentes, em igual medida — portanto todos os homens de boa vontade —, podem unir-se e colaborar para o melhoramento do mundo inteiro.

Ao encontrar-me hoje convosco, recordo com júbilo a recente libertação do General James Dozier. O momento em que foi libertado foi de grande alegria para quantos esperaram e rezaram para que o deixassem livre. Isto deu-nos nova razão para acreditar que o flagelo do terrorismo pode terminar. E renovou a nossa convicção de que os meios não violentos constituem o único caminho para realizar estáveis reformas políticas e sociais em cada país.

Como membros do Colégio de Defesa da NATO, sejam as vossas actividades sempre motivadas pela profunda confiança na possibilidade da paz e por um profundo respeito da dignidade de toda a pessoa humana. Peço a Deus Todo-Poderoso vos assista em todos os vossos esforços para construir um futuro caracterizado pela harmonia, a justiça e a paz. Deus vos abençoe, e abençoe as vossas famílias.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À JUNTA PROVINCIAL DE ROMA


Segunda-feira, 1 de Fevereiro de 1982



Senhor Presidente
Egrégios Membros da Junta Provincial de Roma
Senhoras e Senhores

1. Sinto-me sinceramente feliz por este encontro, por vós solicitado com amável cortesia logo após ter sido possível formar a nova Administração. Isto me alegra, porque no pedido de Audiência divisei a afirmação da disponibilidade para um diálogo sereno e aberto com a Autoridade eclesiástica, do qual é licito esperar frutos benéficos para a população desta terra, a vós e a mim tão querida.

Sede portanto bem-vindos à casa do Papa! Dirijo-vos a minha saudação, unida a um caloroso agradecimento pelos sentimentos que, em nome de todos, expressou tão dignamente o vosso Presidente. É-me grato, em particular, retribuir os vossos votos augurais: oxalá o novo Ano proporcione a todos vós e aos vossos familiares paz e prosperidade, e vos ofereça também a oportunidade de dedicar-vos com denodo ao desempenho do mandato que a confiança dos cidadãos vos outorgou.

Compreendo plenamente a gravidade dos problemas que se vos apresentam. Desejaria vos servisse de conforto a certeza do leal contributo que a Autoridade eclesiástica entende oferecer, no plano pastoral que lhe é próprio, para o bem-estar da população, para o renascimento da sua consciência civil, moral e religiosa, para a sua constante elevação humana e espiritual, em conformidade com a vocação histórica que constitui o seu património mais verdadeiro e característico.

2. A província, que vós sois chamados a administrar, é herdeira de memórias augustas e venerandas, que a tornam uma terra conhecida em todas as partes do mundo e cara a todo o coração que não seja insensível aos valores da civilização. Pode-se dizer que não há, neste território, centro urbano, por menor que seja, não há localidade ou paisagem, que não tenha o próprio nome registado em documentos famosos, nos quais se aplica o humano saber. E que riqueza, depois, de monumentos amados e estudados pelos historiadores, pelos arqueólogos, pelos literatos, pelos artistas, pelos santos de todas as épocas! É um património inestimável, cuja guarda e promoção são postas também nas vossas mãos.

De facto, no âmbito das competências e mediante os órgãos da Administração Provincial, cabe-vos concorrer para harmonizar a vida de uma capital tão característica, como é a cidade de Roma, com a das cidades e dos pequenos centros, que surgem nos campos circunstantes, onde mais sentidos são ainda os valores simples e genuínos da vida, mais autêntico o relacionamento humano, mais imediato o contacto com a natureza e com as pujantes belezas da criação.

Missão vossa especifica é conciliar, por assim dizer, as possibilidades oferecidas por uma grande metrópole, como Roma, com as conservadas por uma "província" tão singular como é a que se distende ao redor. A facilidade, que hoje é dada às pessoas de se deslocarem da capital aos pequenos centros, e vice-versa, por razões de trabalho ou de turismo nos dias festivos, apresenta aspectos positivos que devem ser considerados devido ao intercâmbio de experiências, à integração das mentalidades, ao recíproco enriquecimento humano. Compete-vos tomar as oportunas iniciativas para fazer com que tais possibilidades se traduzam em concretas realizações, capazes de promover o desenvolvimento homogéneo do território e o equilibrado relacionamento das comunidades humanas, que nele residem.

3. Parte importante das vossas responsabilidades é constituída por actividades de carácter educativo assistencial, mediante as quais a vossa Administração entende satisfazer as situações de necessidade, em que vivem as famílias ou cada um dos cidadãos. Não é necessário que me delongue para exprimir o meu apreço por aquilo que diz respeito a uma espécie de serviço que, indo em favor de quem é mais fraco e provado, não pode não suscitar um eco de particular simpatia no meu ânimo de pastor.

O que eu me permitiria salientar é antes o dever de fazer um esforço para que tais formas de assistência cheguem à realização sempre melhor da ideia implícita no significado etimológico do termo: "ad-sistere" significa, de facto, estar próximo, colocar-se junto de quem está em necessidade para o ajudar. Trata-se, isto é, de se mover na linha de uma assistência que faça a pessoa necessitada perceber uma aproximação cordial e partícipe, graças à qual seja levada a recobrar ânimo e confiança, porque sabe poder contar com alguém.

Não há dúvida que esta espécie de relacionamento não é favorecido por serviços vindos, por assim dizer, do alto, em estruturas complexas e anónimas, que terminam condicionando e mortificando as pessoas que a essas se dirigem. Parece, ao contrário, que resultados melhores podem ser esperados de formas de presença actuadas mediante estruturas de proporções reduzidas, em que a pessoa, chamada a participar activamente, possa sentir-se a verdadeira protagonista do serviço. Isto ocorre quando a assistência é estruturada de modo a responsabilizar cada uma das famílias em dificuldade, oferecendo-lhe apoios adequados, ou quando se empenha em alargar, à volta de quem está em necessidade, a esfera de acção da solidariedade social, a fim de receber estimulo para enfrentar os próprios problemas, sem ser arrancado — dentro do possível — do contexto humano onde cresceu.

Deste modo de agir, o cristão tem um modelo insuperável no Mestre divino, que ao encarnar-Se — é o sugestivo mistério por nós contemplado no Natal — "veio para junto" de cada ser humano, para caminhar com ele, oferecendo ajuda, sem criar por isso alguma dependência.

Na luz deste exemplo transcendente, é-me grato renovar a todos vós o meu augúrio de bom trabalho, inspirado sempre e somente pela preocupação de satisfazer, do melhor modo possível, as expectativas que em vós de novo depositam os cidadãos desta amada Província de Roma, à qual envio de coração, também nesta circunstância, a minha saudação e bênção.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS ESPANHÓIS DA PROVÍNCIA DE SARAGOÇA


EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM»


Terça-feira, 2 de Fevereiro de 1982



Amadíssimos Irmãos no Episcopado
da província eclesiástica de Saragoça

1. Dou-vos as minhas cordiais boas-vindas a este encontro, com o qual culmina a vossa visita ad limina Apostolorum, que preparastes com tanta diligência e iniciastes nesse espírito de sincera comunhão com o Sucessor de Pedro "no vínculo da unidade, da caridade e da paz" (Lumen gentium LG 22).

Por isso, ao receber-vos agora conjuntamente, depois do colóquio individual com cada um de vós, manifesto-vos com todo o prazer os meus sentimentos de profunda benevolência, que por meio de vós faço extensivos a todos os membros das vossas respectivas comunidades eclesiais.

Posso assegurar-vos que para elas se dirige com frequência o meu pensamento cheio de afecto e as recordo na oração, para que o Senhor as mantenha e corrobore cada dia mais na sua tradição de fé, que tem as suas raízes nos primeiros tempos da era cristã.

2. Reunidos no nome de Cristo e com a aproximação dos vossos fiéis, que se fazem presentes em vós, sentimos o chamamento urgente do Mestre, levando-nos a pensar nos caminhos pelos quais temos de guiá-los, a fim de viverem do modo mais pleno possível o mistério da sua incorporação em Cristo, modelo de vida e meta da sua existência temporal e eterna.

Assim pois, a primeira reflexão que desejo compartilhar agora convosco refere-se precisamente a esta transmissão da mensagem cristã e à educação na fé dos membros da grei de Cristo, que a Providência confiou à vossa solicitude de Pastores.

Bem sei que vós, os vossos sacerdotes e agentes da pastoral estais sensibilizados neste tema. Pois, de facto, para lograr esse objectivo é importantíssimo reforçar ao máximo a organização de uma catequese adequada, começando pelas paróquias. Catequese orgânica e progressiva que abrange as crianças, os adolescentes, os jovens e os adultos. Não perdeu actualidade esse fundamental método de apostolado, que tanto pode contribuir para a sólida formação religiosa dos cristãos, e que por isso foi cultivado, no passado, com um esmero que há-de ser estimulado e melhorado no presente (cf. Catechesi tradendae CTR 15).

Preciosa ajuda podem prestar aos sacerdotes os religiosos, as religiosas e os leigos melhor formados, que nesta transmissão da fé aos outros hão de encontrar uma eficaz forma de realizar as exigências apostólicas inerentes à própria vocação cristã (cf. Apostolicam actuositatem AA 3).

3. Outro campo que se deve ter bem em consideração no transmitir a mensagem de salvação é o do ensino da religião na escola, pública e particular. Não se trata de invadir esferas indevidas, mas de dar uma resposta ao dever evangelizador da Igreja, de acordo com o explícito desejo da grande maioria dos pais, os primeiros responsáveis da educação dos seus filhos. Verdadeiro direito original que obriga todas as instâncias, públicas ou particulares, e a ser exercido dentro do pleno respeito à justa liberdade das consciências.

Por outra parte, um autêntico direito-dever dos pais, que hão-de sentir a grave responsabilidade imposta pela sua missão. E que há-de comprometer também as pessoas e instituições que estão em contacto com eles e ao seu serviço. Nisto tem o seu lugar importante a paróquia e a escola.

Nesta perspectiva deve-se ver o papel de relevo que a escola católica continua a ter, como tipo de serviço à formação integral da pessoa humana que não perdeu vigência, mas a conserva plenamente no actual momento histórico da vossa região e de toda a Espanha.

4. É óbvio que, ao tratar da transmissão da fé e da educação completa das novas gerações, não se pode prescindir do insubstituível papel que desempenha a família. Mais ainda, é ela precisamente que oferece por si mesma possibilidades imensas, que se devem valorizar em toda a sua extensão.

Por isso mesmo exorto-vos a intensificar o mais possível, mediante os vossos departamentos diocesanos de pastoral familiar, os planos de um apostolado bem cuidado e prioritário neste sector, seguindo as linhas-mestras por mim indicadas na recente Exortação Apostólica Familiaris consortio. Assim podereis dar válida resposta a problemática que a transformação da sociedade espanhola e a sua disposição legal estabelecem neste terreno.

5. Em íntima conexão com os planos que acabo de indicar, devereis colocar igualmente os serviços de promoção das vocações ao sacerdócio e à vida consagrada, que na família sã e cristã encontram o melhor clima para o seu crescimento.

Neste urgente e transcendental problema, sei que estais a realizar um trabalho sério em âmbito regional, para favorecer a resposta dos jovens ao chamamento do Senhor. Congratulo-me convosco e vos abençoo amplamente nesse empreendimento e peço a Deus que acompanhe o vosso esforço. Para que novas vocações maturadas preencham os vazios que se vão criando no apostolado e vos permitam ir em auxílio de outras porções eclesiais mais necessitadas, como tendes feito zelosamente até hoje.

Encorajo igualmente os vossos sacerdotes e comunidades cristãs a ajudar-vos nesse trabalho, assumindo à responsabilidade vocacional que lhes compete.

6. As vossas dioceses têm prevalente carácter rural, e a esta condição devereis acomodar a vossa pastoral evangelizadora e catequética, ajustando-a às situações do vosso povo, para que eleve todos os seus valores humanos e, morais e responda às suas expectativas.

Conheço as vantagens e problemas, as dificuldades e limitações que esse horizonte impõe aos vossos sacerdotes e fiéis. E para eles vai o meu vivo apreço e estímulo a continuarem a ser fiéis à sua vocação, a trabalharem com entusiasmo, a renovarem a sua entrega generosa e sacrificada à Igreja de Cristo, que nisto espera o seu testemunho de vida.

Mas o irregular crescimento da vossa região comporta também, às vezes, fenómenos de rápida urbanizarão, que propõe desafios à evangelização em sectores como o operário, o universitário e profissional. Também nestes ambientes dever-se-á dar um impulso aos movimentos leigos de apostolado, para assegurar eficaz presença evangelizadora da Igreja.

7. O actual momento sócio-político vivido pela vossa região, no contexto mais amplo da vida de toda a Nação, não deixará de se vos apresentar com uma nova problemática à qual, como Pastores e guias na fé, devereis prestar a devida atenção.

O vosso povo tem uma rica história, que tanto influiu na história pátria e por ele é justamente estimada. Será necessário esforçar-se, portanto, para que, partindo de uma firme base religiosa, o povo fiel se expresse coerentemente em atitudes práticas de fidelidade às próprias convicções religiosas, e não duvide em tratar de plasmá-las num humanismo existencial consequente, respeitoso e aberto aos outros. Mantendo sempre clara consciência da sua própria identidade eclesial, que requer comunhão afectiva e efectiva com os seus pastores e com o Papa.

8. À Virgem Santíssima do Pilar, tão venerada em Aragão e na Espanha, confio todas estas intenções e necessidades. A Ela, que sempre esteve tão perto em todas as vicissitudes da vida dos seus filhos, peço que vos proteja e guie, que oriente maternalmente os vossos sacerdotes, religiosos, religiosas, seminaristas, almas consagradas e fiéis, e mantenha e fortifique a solidez da sua vida de fé. Assim o espero, com a minha cordial Bênção Apostólica para vós e para as vossas comunidades eclesiais.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR CARLOS ALBERTO SERRANO BONILLA


NOVO EMBAIXADOR DA COSTA RICA


JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO


DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Quinta-feira, 4 de Fevereiro de 1982



Senhor Embaixador

Com viva complacência o recebo hoje, neste acto de apresentação das Cartas que o acreditam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da costa Rica junto da Santa Sé.

Agradeço vivamente a deferente saudação que me transmitiu, enviada pelo Senhor Presidente da República, assim como as amáveis palavras com que Vossa Excelência se fez intérprete dos cristãos sentimentos do querido povo costa-riquense, cuja adesão à Igreja e ao Papa é bem conhecida. Povo que, além disso, se caracterizou pelo amor à paz e ao trabalho, tratando de seguir as orientações marcadas pela doutrina social católica.

Foi a consciência da sua missão própria que impulsionou sempre a Igreja na tarefa de serviço aos homens, tarefa que tem a sua meta final na eternidade, mas há-de ir realizando-se já através do caminho por este mundo, vivendo desde agora numa tensão de esperança definitiva. Esta esperança gera aspirações profundas e universais que, abarcando todos os homens e todo o homem, comportam a exigência de uma vida plena realmente livre, digna do ser humano.

No seu afã de auxílio aos homens, a Igreja não busca interesses ou vantagens humanas, mas tem o desejo de servir. Nesta linha — como diz o Concílio Vaticano II — ela quer em todo o momento e em todas as partes "pregar com verdadeira liberdade a fé; ensinar a sua doutrina acerca da sociedade; exercer sem peias a própria missão entre os homens; e pronunciar o seu juízo moral mesmo acerca das realidades politicas, sempre que os direitos fundamentais da pessoa ou a salvação das almas o exigirem" (Gaudium et spes GS 76). Tarefa delicada e difícil, que ela se esforça por desempenhar inspirada no amor e nos ensinamentos do Evangelho, segundo as diversas circunstâncias e situações, a fim de conseguir ser luz e fermento na sociedade.

Vossa Excelência acaba de aludir à importância e ao significado do trabalho na convivência social. Com efeito, enquanto por um lado crescem o progresso e a técnica, por outro diminui o pedido da mão-de-obra, condenando muitos trabalhadores, com frequência jovens, a um sentimento de frustração, com todas as consequências que ele traz consigo.

Por isso, a doutrina social cristã e os ensinamentos do Magistério continuam a proclamar que o trabalho é um dever e ao mesmo tempo um direito de todo o homem. E que, em consequência, é uma tarefa irrecusável daqueles que regem os destinos dos povos e as relações sócio-económicas aplicar todos os meios ao seu alcance para cada cidadão poder encontrar a oportunidade de um trabalho adequado (cf. Gaudium et spes GS 67), e assim evitam-se situações injustas nas quais se regula a actividade laboral com prejuízo para os trabalhadores.

É claro, por outro lado, que só se o homem puder realizar dignamente a sua vocação pessoal, familiar e social, se alcançará o objectivo tão desejado da paz e da sua progressiva consolidação. Estas constituem as metas para as quais atraio constantemente os homens, convencido de servir assim a verdadeira causa da dignidade da pessoa humana. E são também as metas para as quais orienta a Hierarquia costa-riquense. Muito confio na sua preciosa colaboração, na de muitos cristãos e de outras pessoas de recta consciência.


Discursos João Paulo II 1982 - Quinta-feira, 28 de Janeiro de 1982