Discursos João Paulo II 1996 - Quinta-feira, 12 de Dezembro de 1996

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL


VIETNAMITA EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM»


Sábado, 14 de Dezembro de 1996





Estimado Senhor Cardeal
Queridos Irmãos no Episcopado

1. É com grande alegria que vos recebo por ocasião da vossa visita «ad Limina », a vós que tendes a tarefa pastoral do povo de Deus no Vietname. Viestes junto dos túmulos de Pedro e Paulo para reforçar a consciência da vossa responsabilidade de sucessores dos Apóstolos e sentir mais intensamente a vossa comunhão com o Bispo de Roma. Com efeito, as visitas «ad Limina» têm uma importância particular na vida da Igreja, «já que constituem como que o ponto alto das relações dos Pastores de cada uma das Igrejas particulares com o Romano Pontífice» (Pastor bonus, art. 29). Elas ressaltam de maneira importante a catolicidade da Igreja e a unidade do Colégio Episcopal. Agradeço calorosamente ao Senhor Cardeal Paul Joseph Pham Dình Tung, Arcebispo de Hanoi e Presidente da vossa Conferência Episcopal, as palavras comovedoras que me dirigiu em vosso nome, manifestando deste modo a fidelidade das vossas comunidades ao Sucessor de Pedro. Saúdo, com particular afecto, os Bispos do vosso País que não se puderam unir a vós. Teria desejado profundamente encontrar todos os Bispos, para manifestar a minha proximidade às suas pessoas e às suas comunidades diocesanas e para lhes dizer com que interesse sigo o trabalho que desempenham em cada uma das suas Dioceses. A visita «ad Limina» duma Conferência Episcopal completa é não só uma manifestação visível dos vínculos espirituais, que unem as suas Igrejas particulares à Igreja universal, mas também um sinal de que a liberdade religiosa é respeitada num país. Exprimo a esses Bispos a minha solidariedade e a minha profunda comunhão com o seu ministério apostólico ao serviço do povo que lhes foi confiado. Através de vós, dirijo-me também aos fiéis vietnamitas que, com coragem, dão testemunho de Cristo na vossa terra ou fora do País, bem como a todo o povo do Vietname, ao qual manifesto a minha profunda simpatia.

2. Depois da chegada do Evangelho no século XVI, a Igreja no vosso País conheceu numerosas provas. Ela sofreu, várias vezes, a perseguição por causa da fé em Cristo Redentor. Marcada pela santidade e pelo martírio de numerosos filhos seus, ela tornou-se uma Igreja glorificada pelo seu zelo ao serviço de Deus e dos seus irmãos. Quereria recordar aqui a figura heróica dos 117 mártires que tive o privilégio de canonizar em 1988. Este testemunho, que os filhos e as filhas do vosso País deram a Cristo por amor de Deus e dos seus irmãos, criou um vínculo particular entre a comunidade cristã e todos os Vietnamitas. Participando inteiramente das alegrias e das esperanças, das tristezas e das angústias do povo (cf. Gaudium et spes GS 1), ela demonstrou que permanece enraizada de modo profundo nesse País. Se, com o decorrer dos séculos, por vezes surgiram incompreensões entre a Igreja e a comunidade civil, é preciso reafirmar que os católicos são membros leais da nação: hoje, como no passado, eles contribuem para o progresso social do País e demonstram um interesse pelo bem comum que não é inferior ao dos outros cidadãos. Apesar de ser um pequeno rebanho, a Igreja quer estar plenamente presente nas realidades do País, com a vocação que lhe é própria. Ela encontra-se a caminho com todos os membros da nação, pois partilha a mesma história, o progresso e as provas comuns. Ela não age em espírito de rivalidade ou na busca do seu próprio interesse, mas deseja viver em comunhão e em harmonia com todos.

A missão da Igreja é transmitir uma mensagem de vida e de amor, mediante acções concretas em benefício da dignidade humana, duma vida melhor, num espírito de compaixão pelos mais pobres e desfavorecidos. Com humildade e em colaboração com os outros componentes da nação, os católicos participam no renovamento e na transformação das realidades humanas. Ao viver a sua vocação de unidade e de serviço por todo o povo, a Igreja reconhece e partilha a grande riqueza da cultura vietnamita e os seus valores humanos e espirituais; e deseja aprofundar as relações de fraternidade, de diálogo e de colaboração com todos.

3. Queridos Irmãos no Episcopado, dou graças a Deus pelo zelo e pela generosidade que manifestais, apesar das grandes dificuldades, nas actividades de ensinar, governar e santificar quantos vos foram confiados em nome de Cristo. Encorajo-vos sobretudo a prosseguir com fervor a vossa missão de pregar o Evangelho, que é a primeira missão do Bispo. «Os Bispos são, efectivamente, os arautos da fé, que levam a Cristo novos discípulos, e os doutores autênticos, isto é, investidos na autoridade de Cristo, que ao povo a eles confiado pregam uma fé para ser crida e praticada na vida, e a ilustram à luz do Espírito Santo, tirando do tesouro da Revelação coisas novas e velhas (cf. Mt Mt 13,52), a fazem frutificar e afastam com cuidado os erros que ameaçam a sua grei (cf. 2Tm 4,1-4)» (Lumen gentium LG 25). O anúncio tem como primeiro objecto Cristo, no qual se realiza a plena e autêntica libertação do mal, do pecado e da morte, e no qual Deus nos comunica a sua própria vida. É esta Boa Nova que todos os homens têm o direito de conhecer e os Bispos são os seus primeiros missionários.

A missão profética da Igreja realiza-se cada vez que, à luz do Evangelho, ela faz uma leitura corajosa das questões fundamentais que se apresentam ao seu tempo, e quando intervém, sobretudo, em favor dos pobres, dos doentes, dos marginalizados ou dos jovens. A sua vocação é trabalhar por promover a civilização do amor, a fraternidade, a solidariedade, a unidade, a justiça e a paz. A tarefa apostólica que recebestes torna-vos «testemunhas de Cristo diante de todos os homens, interessando-se não só por aqueles que seguem já o Príncipe dos Pastores, mas dedicando-se também com toda a alma àqueles que... ignoram o Evangelho e a misericórdia salvadora de Cristo» (Christus Dominus CD 11). A missão da Igreja é universal, ela dirige-se a todos os homens.

4. Enquanto nos preparamos para entrar no Terceiro Milénio, a perspectiva do Grande Jubileu oferece à Igreja uma feliz ocasião para «perscrutar os sinais dos tempos e interpretá-los à luz do Evangelho» (cf. Gaudium et spes GS 4). Somos convidados a dirigir o nosso olhar para o futuro, conscientes de que o amanhã pertence a Cristo, que já se nos manifesta. A fim de acolher uma nova primavera de vida cristã, a Igreja no Vietname é chamada a uma renovação pastoral, missionária e espiritual, para entrar no terceiro milénio com a audácia dos discípulos de Cristo. A vida apostólica deve renovar-se continuamente, para responder às necessidades do tempo e às carências dos povos. Certamente, a Igreja «não pode transpor o limiar do novo milénio sem impelir os seus filhos a purificarem-se, pelo arrependimento, de erros, infidelidades, incoerências, retardamentos. Reconhecer as cedências do ontem é acto de lealdade e coragem que ajuda a reforçar a nossa fé, tornando-nos atentos e prontos para enfrentar as tentações e as dificuldades de hoje» (Tertio millenio adveniente TMA 33). Cada fiel é convidado à conversão do coração e ao acolhimento de Cristo na própria existência. «Hoje como nunca, urge que todos os cristãos retomem o caminho da renovação evangélica, acolhendo com generosidade o convite apostólico de “ser santos em todas as acções” (1P 1,15)» (Christifideles laici CL 16).

Mas a Igreja também é convidada a dar graças a Deus pelas maravilhas realizadas sob a acção do Espírito Santo, apesar da pobreza dos seus meios. Ela deseja oferecer a todos a mensagem de vida e de amor que lhe foi legada pelo seu Senhor, Jesus Cristo. «Não tenho ouro nem prata, mas vou dar-te o que tenho: Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, levanta-te e começa a andar!» (Ac 3,6), dizia o Apóstolo Pedro à porta do Templo.

A Igreja tem no Concílio Vaticano II uma fonte preciosa para o renovamento de toda a sua vida. «A melhor preparação para a passagem bimilenária não poderá exprimir-se senão pelo renovado empenho na aplicação, fiel quanto possível, do ensinamento do Vaticano II, à vida de cada um e da Igreja inteira» (Tertio millenio adveniente TMA 20). Por conseguinte, exorto-vos a basear nele a inspiração da vossa pastoral.

5. Vossa Eminência, Senhor Cardeal, prestou homenagem à fé viva dos leigos das suas dioceses. Sinto-me feliz por recordar aqui a coragem e o fervor dos fiéis que sofreram tantas provas sem faltar à sua adesão a Cristo. Faço votos por que cada um deles «tenha sempre viva consciência de ser um “membro da Igreja”, a quem se confia um encargo original insubstituível e indelegável, que deverá desempenhar para o bem de todos. Numa tal perspectiva, assume todo o seu significado a afirmação conciliar sobre a necessidade absoluta do apostolado de cada pessoa» (Christifideles laici CL 28). Compreendo as dificuldades que provêm das limitações impostas a quantos receberam de Cristo a tarefa de organizar o apostolado dos fiéis e a quantos desejam fazer obras de apostolado. Contudo, eles não se devem desencorajar: ao contrário, é preciso favorecer a responsabilidade dos leigos — como recorda o Concílio — que se exerce quer na Igreja quer no mundo (cf. Apostolicam actuositatem AA 9). Compete-lhes participar de modo activo na vida da Igreja e na sua missão de anunciar o Evangelho entre os seus irmãos. Eles são chamados a descobrir e a viver profundamente a sua vocação e missão pessoal e comunitária. Onde a comunhão fraterna entre os discípulos de Cristo se enfraquecer, também se debilita a credibilidade do seu testemunho e da sua missão.

Convido os leigos a partilhar de modo cada vez mais generoso os dons que receberam, dedicando-se à animação das paróquias, empenhando-se na catequese e na educação dos jovens, participando nos movimentos espirituais ou nas obras caritativas. Cada baptizado deve assumir a sua parte de responsabilidade e de serviço na Igreja. Para isto, é preciso que a formação humana, espiritual e doutrinal dos leigos tenha um lugar reconhecido na pastoral. Deste modo, poder-se-ão formar comunidades eclesiais cada vez mais fraternas e unidas, fundadas numa profunda comunhão em Cristo, único Salvador do mundo. Elas poderão servir efectivamente a unidade entre todos os homens.

6. Desejaria dirigir agora uma saudação cordial aos sacerdotes, vossos colaboradores directos no serviço do povo de Deus. Tenho conhecimento do fervor, da disponibilidade e a preço de que fadigas eles se dedicam ao seu ministério. Oxalá Deus os confirme na sua vocação de edificadores de comunidades cristãs, em total união com os seus Bispos e lhes conceda a esperança nos momentos difíceis. Encorajo-os sobretudo a dar na sua vida a prioridade à pessoa de Cristo, a conformarem-se com Ele em todas as coisas, e a dar testemunho duma vida renovada n’Ele! «O contacto com os representantes das tradições espirituais não cristãs e, em particular, as da Ásia, persuadiu-me de que o fruto da missão depende em grande parte da contemplação. O missionário, se não é contemplativo, não pode anunciar Cristo de modo credível. Ele é uma testemunha da experiência de Deus e deve poder dizer como os Apóstolos: “O que nós contemplamos... o Verbo da vida... nós vo-l’O anunciamos” (1Jn 1,1-3)» (Redemptoris missio RMi 91).

Dirijo o meu pensamento e a minha oração a quantos se preparam para o sacerdócio e esperam com fervor o dia em que receberão a ordenação, que os tornará partícipes do ministério de Cristo Sacerdote, para edificar a Igreja. Faço votos por que sejam rapidamente criadas as condições que vos permitirão abrir seminários que são tão necessários, e acolher neles todos os jovens que, com generosidade, desejam consagrar a sua vida ao serviço da Igreja e dos seus irmãos.

No que se refere aos Institutos de vida consagrada, tenho conhecimento da actividade que os seus membros desempenham, discreta mas eficazmente, nos diversos âmbitos da assistência, tais como os hospitais, os leprosários, os orfanatos, as creches, as casas para pessoas deficientes: eles partilham da vida do seu povo e dão um maravilhoso testemunho cristão e evangélico. Eis por que seria construtivo e apreciado pela população que fossem abertos noviciados para formar esses humildes servidores do bem comum. Convido todos os membros desses Institutos a aprofundar a sua vocação na tríplice dimensão da consagração, da comunhão e da missão, e espero que encontrem um novo ardor, a fim de enfrentarem espiritual e apostolicamente os desafios que hoje se apresentam à sociedade (cf. Vita consecrata VC 13).

7. Por ocasião do Grande Jubileu, desejei reunir uma Assembleia especial do Sínodo dos Bispos para a Ásia, «que ilustre e aprofunde a verdade sobre Cristo, como único Mediador entre Deus e os homens e único Redentor do mundo» (Tertio millenio adveniente TMA 38). Este Sínodo propõe-se avaliar as circunstâncias nas quais actualmente se encontram os povos e as culturas do vosso continente, e preparar a Igreja para que cumpra melhor a sua missão de amor e de serviço. A preparação e celebração desta assembleia continental é uma ocasião para caminhar com a Igreja universal rumo ao terceiro Milénio, no seguimento de Cristo, no Espírito. É motivo de alegria que a Igreja que está no Vietname possa oferecer à Igreja universal o contributo da sua longa e rica experiência de testemunho evangélico, por vezes vivida até ao heroísmo pelos seus pastores e fiéis. As directrizes pastorais que esta assembleia emanará, serão pontos de apoio para fortalecer a fé e dar um novo impulso apostólico às comunidades.

8. Queridos Irmãos no Episcopado, no final deste encontro fraterno, quereria encorajar-vos, bem como a todos os vossos Irmãos, a prosseguir o vosso ministério apostólico na esperança que nos é dada pelo Natal do Senhor, o qual celebraremos daqui a poucos dias. Deus quis manifestar-se como «o Emanuel», Aquele que está connosco, ontem, hoje e sempre. Ele seja a vossa força e a vossa luz! Oxalá Ele vos ajude a conservar a unidade nas Igrejas particulares confiadas à vossa solicitude! Reforçe a unidade dos Bispos com o Papa e entre eles, e a unidade dos sacerdotes com o Papa e com os seus pastores, na comunhão da Igreja universal!

Confio-vos à protecção materna da Mãe de Cristo, Nossa Senhora de La-Vang, da qual celebrareis, no dia 15 de Agosto próximo, o segundo centenário das aparições. Ela seja para vós e para os vossos fiéis uma guia segura no caminho que conduz ao Senhor Jesus, seu Filho! A cada um de vós, aos Bispos que não se puderam unir a vós, aos sacerdotes, aos religiosos, às religiosas e a todos os leigos do Vietname, que vivem no País ou no estrangeiro, concedo de coração a Bênção Apostólica!



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PEREGRINOS DA ESLOVÉNIA


14 de Dezembro de 1996



Venerados Irmãos no Episcopado
e no Sacerdócio Caríssimos Eslovenos

1. Estou feliz por dirigir a todos vós as minhas cordiais boas-vindas na recordação dos dias intensos que transcorri na vossa querida Nação, de 17 a 19 do passado mês de Maio. Hoje, desejo renovar- vos o meu obrigado pela maravilhosa hospitalidade que me foi reservada por ocasião dessa memorável Visita pastoral e pelos multíplices testemunhos de afecto que então me foram manifestados.

Saúdo cordialmente D. Franc Kramberger, Bispo de Maribor, a quem agradeço as amáveis palavras que me quis transmitir em nome de todos. Dirijo um especial pensamento a D. Alojzij Šuštar, Arcebispo Metropolitano de Liubliana e Presidente da Conferência Episcopal Eslovena, que não pôde estar presente neste encontro, assegurando-lhe a minha proximidade espiritual na oração e na comunhão fraterna. Depois, saúdo os Bispos, os Sacerdotes, os Religiosos, as Religiosas e os Leigos empenhados nos Movimentos e nas Associações eclesiais de apostolado. Dirijo um deferente pensamento também às Autoridades civis, em particular ao Presidente da República, Sua Excelência o Senhor Milan Kucan, que quiseram participar nesta vossa peregrinação a Roma.

Enfim, saúdo todos vós, caríssimos irmãos e irmãs da nobre Nação eslovena que, com a vossa presença aqui em Roma, junto dos Túmulos dos Apóstolos e dos Mártires, desejais consolidar o vosso tradicional vínculo de fidelidade e comunhão com a Sé de Pedro.

2. A Visita pastoral que tive a alegria de realizar na última Primavera — a primeira Visita pastoral de um Papa na Eslovénia —, desenrolou-se na recordação dos 1.250 anos da presença do Evangelho na vossa Terra, levado até vós nos meados do século VIII pelos monges beneditinos provenientes de Salisburgo, Aquileia e Panónia.

Além disso, ela realizou-se no novo clima de liberdade civil e de democracia, inaugurado depois da obtenção da independência política, conquistada há cinco anos. Neste renovado contexto social, abriram-se novas esperanças de progresso e paz. Todavia, não faltam perigos de um desenvolvimento na direcção de um materialismo prático, caracterizado pelo individualismo e pelo hedonismo.

3. Mediante a minha Visita pastoral, eu quis consolidar a vossa fé e a vossa comunhão secular com Cristo e a Sua Igreja, perante os desafios deste último período de século, já no limiar do Terceiro Milénio cristão. Com efeito, convidei-vos a revisitar as profundas raízes cristãs da cultura da vossa Terra, situada no centro da Europa como uma encruzilhada entre o Oriente e o Ocidente.

Recordo com alegria os momentos mais significativos que caracterizaram aqueles dias: a liturgia vespertina com o clero e os religiosos na Catedral de Liubliana, o encontro intenso e caloroso com os jovens em Postojna, o diálogo com os representantes do mundo da cultura na Catedral de Maribor e as duas solenes Celebrações eucarísticas em Stožice e em Maribor, animadas pelo canto de numerosos e sugestivos coros. Recordo ainda, com profundo reconhecimento, o grande interesse e a enorme participação com que todos vós, caríssimos Irmãos e Irmãs eslovenos, acompanhastes esta minha Viagem pastoral na vossa querida Terra.

Hoje renovo o encorajamento que dirigi no momento de me despedir de vós: continuai a tarefa empenhativa de haurir da vossa secular tradição cristã a linfa vital para enfrentar com coragem e determinação os compromissos actuais e futuros. «Se é verdade que não se pode resolver de uma só vez as dificuldades económicas herdadas do passado, é contudo verdade que, com a paciência, a disponibilidade ao diálogo, a capacidade de perdão e de reconciliação, todos poderão olhar para o futuro com confiança. Com efeito, em conjunto, podem- se enfrentar mais facilmente os desafios do momento actual e elaborar propostas de soluções satisfatórias» (Discurso em Maribor, ed. port. de L’Osservatore Romano de 25 de Maio de 1996, pág. 8).

A este renovado clima de diálogo e colaboração entre as diversas componentes do País, a Comunidade católica da Eslovénia deseja oferecer o seu contributo específico. Faço votos por que o diálogo e a colaboração entre os Pastores da Igreja e as Autoridades civis possa aprofundar-se cada vez mais, a fim de concorrerem juntos, no respeito das competências recíprocas, para a construção do bem comum.

4. Caríssimos Irmãos e Irmãs! Com a vossa presença em Roma, centro de irradiação da civilização que o velho Continente fecundou, dais testemunho da vocação do Povo esloveno a ser ponte entre as diferentes tradições culturais europeias, favorecendo assim a paz e a compreensão entre os homens. A árvore que será iluminada na Praça de São Pedro por ocasião do próximo Natal, e que este ano provém da vossa linda e florescente Terra, é sinal particularmente eloquente deste empenho.

Obrigado, caríssimos, também por este significativo dom. Formulo cordiais votos a todos vós aqui presentes, aos vossos compatriotas que ficaram na Pátria e a todos os eslovenos que, por vários motivos, estão a viver nas diversas partes do mundo, para que transcorrais com serenidade e intensidade o período de preparação para as Festas natalícias, já próximas. Com estes bons votos, ao invocar a materna protecção de Maria, «Auxílio dos cristãos» e «Rainha da Eslovénia», concedo do íntimo do coração a todos vós uma especial Bênção Apostólica.



ENCONTRO DO PAPA JOÃO PAULO II


COM UM GRUPO DE JOVENS


DA ACÇÃO CATÓLICA ITALIANA


21 de Dezembro de 1996

Agradeço-vos de coração, caríssimos Jovens da Acção Católica, vindos de diversas partes da Itália para este Encontro – que já se tornou habitual – que nos permite desejar reciprocamente os votos de Bom Natal e feliz Ano Novo. Acolho-vos com alegria: desde os meninos e meninas, jovens e moças, até aos adolescentes. Saúdo-vos com afecto, juntamente com os vossos responsáveis e educadores, a começar pelo Presidente nacional e pelo Assistente geral. Agradeço- vos as expressões de afecto que me dirigistes.


No encontro de Natal do ano passado, entreguei à A.C.R. a Mensagem «Dêmos às crianças um futuro de paz». Tenho a certeza que a acolheste com muito empenho. Sei que posso contar com os jovens da Acção Católica!

Este ano, ao pensar no próximo Dia Mundial da Paz, confio-vos a tarefa de viver e difundir o perdão, tornando-vos, deste modo, construtores de paz. Olhando para o presépio, onde está deitado o pequeno Menino na palha da manjedoura, podemos compreender facilmente o que é o perdão: ir ao encontro do outro que me ofendeu, aproximar-me dele, que se afastou de mim. Deus foi fiel à humanidade pecadora, a ponto de vir morar no meio de nós.

O lindíssimo cântico de Natal «Tu scendi dalle stelle» diz assim: «Quanto te custou teres-me amado!». O Filho de Deus amou-nos, a nós que o ofendemos; também nós devemos amar aqueles que nos ofendem e, deste modo, vencer o mal com o bem. Detestar o pecado, mas amar o pecador: este é o caminho da paz, a via que o Senhor nos ensina, desde o mistério do seu Natal.

Quando olho para vós, jovens, vejo quase os coetâneos do jovem Jesus. A estes jovens coetâneos de Jesus quero oferecer uma Benção e os votos cordiais de Bom Natal!



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

A UM GRUPO DE PEREGRINOS DA POLÓNIA

POR OCASIÃO DO NATAL


23 de Dezembro de 1996

Venerado Irmão
Senhor Embaixador
Estimados Concidadãos

1. Amanhã, à meia-noite, ressoará em toda a Polónia o cântico natalício:

«Na noite profunda ressoa uma voz:
Levantai-vos, pastores,
Deus nasce para vós!
Apressai-vos a Belém!
para saudar o Senhor!».

Estes versos natalícios traduzem na linguagem do cântico a narração do Evangelho de São Lucas, que será proclamado durante a «Missa dos Pastores». Eis: Maria e José chegam a Belém para serem registrados, segundo a disposição das autoridades romanas. Durante a noite, tendo-se completado «os dias para o parto, Maria deu à luz o seu Filho primogénito. Enfaixou-O e colocou- O numa manjedoura, pois não havia lugar para eles na hospedaria. Naquela região havia pastores que passavam a noite nos campos, tomando conta do rebanho. Um anjo do Senhor apareceu aos pastores; a glória do Senhor envolveu-os em luz e eles ficaram com muito medo. Mas o anjo disse aos pastores: “Não tenhais medo! Eu anuncio-vos a Boa Notícia, que será uma grande alegria para todo o povo: hoje, na cidade de David, nasceu-vos um Salvador que é o Messias, o Senhor. Isto vos servirá de sinal: encontrareis um recém-nascido, envolto em faixas e deitado numa manjedoura”» (Lc 2,6-12).

Leremos a continuação do trecho durante a Missa da Aurora. Logo que os anjos se afastaram, os pastores decidiram ir a Belém. Encaminharam-se à pressa e «encontraram Maria, José e o recém-nascido deitado na manjedoura. Tendo-O visto, contaram o que o anjo lhes anunciara sobre o Menino. E todos os que ouviam os pastores ficavam maravilhados com aquilo que contavam» (Lc 2,16-18). No cântico natalício tudo isto é traduzido com linguagem poética e musical.

Aquilo que o cântico «Na noite profunda» expressou como narração, o maravilhoso cântico natalício polaco «Deus nasce», escrito pelo poeta Francisco Karpinski, transforma-o em mistagogia, num hino que introduz no mistério.

«Deus nasce, o poder humano confunde- se, o Senhor dos céus é despojado! O fogo desvanece, o fulgor é velado e o Infinito põe-se limites!».

Com estas palavras, o poeta apresentou o mistério da encarnação do Filho de Deus, actuando os contrastes a fim de expressar aquilo que é essencial para o mistério: o Deus infinito, assumindo a natureza humana, adquiriu contemporaneamente os limites próprios da criatura. E continua:

«...O Infinito põe-se limites.
Desprezado, revestido de glória, mortal Rei dos séculos!»

Enfim, o cântico natalício recorre às palavras de São João:

«E o Verbo fez-Se homem e veio habitar entre nós!».

Assim, as estrofes natalícias traduziram em linguagem musical quanto contêm as leituras das três Santas Missas do Natal do Senhor: da meia-noite, da aurora e do dia.

2. Enquanto penso nestas expressões da piedade popular, voltam-me à mente todos os outros cânticos natalícios, cuja riqueza musical e teológica é enorme. Recordo-me das igrejas polacas, onde ressoam melodias sublimes, repletas de alegria e às vezes de melancolia, sentimentais no tom e nos conteúdos, que narram as verdades profundas relacionadas com o evento e o mistério do nascimento do Filho de Deus. Recordo-me de Nowa Huta, onde à meia-noite eu celebrava a «Missa dos pastores», de Bienczyce, de Mistrzejowice, ou ainda de Wzgórza Krzeslawickie, na época em que se devia lutar pela construção das igrejas. Naquele tempo, os cânticos natalícios representavam um sinal singular da unidade do povo que vinha, como em Belém, até Cristo que «não tinha encontrado lugar». Essas mesmas pessoas queriam convidar Jesus aos próprios corações, às suas comunidades e à sua vida quotidiana. Os cânticos natalícios não só pertencem à nossa história; num certo sentido, formam a nossa história nacional e cristã. São muitos, e possuem uma notável riqueza espiritual. Dos mais antigos aos actuais, dos litúrgicos aos populares. Recordo-me, por exemplo, do mencionado cântico natalício dos montanheses, que tanto gostamos de evocar: Oh, pequenino, pequenino!

Não devemos perder esta riqueza. Por isso, ao partir hoje o pão branco do Natal, formulo bons votos a todos vós, queridos concidadãos, tanto na Pátria como aqui em Roma e no mundo inteiro, para que saibais entoar os cânticos natalícios, meditando sobre quanto eles transmitem e sobre o seu conteúdo, e saibais encontrar neles a verdade sobre o amor de Deus, que por nós Se fez homem.

No hodierno intercâmbio dos bons votos poder-se-iam introduzir ainda muitos elementos, pondo-nos à escuta dos cânticos natalícios. Mas apraz-me recordar o anúncio, repleto de ardor, em favor da paz: «Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade » (cf. Lc Lc 2,14), unido ao cântico natalício Enquanto Cristo nasce.

Este cântico torna-se para mim particularmente eloquente este ano, durante o qual o Papa da Polónia pôde deter-se diante da Porta de Brandeburgo, em Berlim. Foi uma experiência muito profunda também para o Chanceler da Alemanha moderna, Helmut Kohl, que me acompanhava naquela circunstância. Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade — são as palavras do cântico natalício Enquanto Cristo nasce.

Enfim, desejo citar de novo o cântico Deus nasce e terminar dirigindo a fervorosa oração a Jesus recém-nascido:

«Levantai a mão, ó Menino divino!
Abençoai a Pátria amada com bons conselhos e bem-estar.
Com a Vossa força, sustentai a dela.
Abençoai a nossa casa e o quintal em redor, todas as aldeias e cidades.
E o Verbo encarnou e habitou entre nós».

Boas-festas a todos os presentes, a cada uma das famílias, aos compatriotas na Polónia e aos polacos do mundo inteiro. Deus vos recompense.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR IRAWAN ABIDIN NOVO EMBAIXADOR


DA REPÚBLICA DA INDONÉSIA JUNTO DA SANTA SÉ


23 de Dezembro de 1996



Senhor Embaixador

É com sincera boa vontade que o recebo no Vaticano e aceito as Cartas Credenciais mediante as quais Vossa Excelência é designado Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República da Indonésia junto da Santa Sé. Estou-lhe grato pelas saudações que me transmitiu da parte de Sua Excelência o Senhor Presidente Soeharto, em nome do seu Governo e Povo, e retribuo-Lhe formulando bons votos para o seu dinâmico País, que tive a alegria de visitar em 1989 como amigo de todos os indonesianos, cuja calorosa hospitalidade experimentei em todos os momentos.

Vossa Excelência identificou as causas da paz, da justiça social, do respeito mútuo e da cooperação generosa entre os povos, bem como a ordem internacional justa e pacífica como áreas de comum solicitude tanto para o seu País como para a Santa Sé, e nas quais ambos podem colaborar de diversas maneiras. Uma análise atenciosa da situação em inúmeras partes do mundo demonstra que muito ainda deve ser realizado para edificar a paz sobre fundamentos sólidos. Eis o motivo por que a Santa Sé se alegra quando os países assumem um papel activo nas negociações bilaterais e multilaterais, tendo em vista a resolução das tensões ou a consolidação das formas de acordo e cooperação já existentes. As iniciativas e os esforços da Indonésia no sentido de buscar uma solução pacífica para as situações de conflito e tensão nos países fronteiriços do Sudeste da Ásia muito a honram.

Ao mesmo tempo, a Indonésia sente-se justamente orgulhosa dos resultados alcançados até agora nos seus progressos como Nação. Torna-se cada vez mais evidente que o crescimento de uma nação não pode ser compreendido somente como um progresso material. Pelo contrário, ele deve visar o bem e o desenvolvimento integrais do povo, e é necessário que inclua uma visão ética e moral dos direitos e deveres em relação à sociedade. Exige que cada um compartilhe os benefícios do desenvolvimento, e que nenhum grupo seja deixado à margem da sociedade por motivos de preconceitos ou interesses egoístas dos demais grupos.

Como Vossa Excelência observou, a Indonésia desempenha a tarefa permanente de promover a harmonia e a estabilidade entre os inúmeros grupos étnicos e culturais presentes nas suas Ilhas, mediante um sistema de estruturas legais e políticas integralmente imbuídas de respeito pelas tradições das suas populações. Rezo para que os problemas que, é inevitável, acompanham tais esforços sejam sempre resolvidos através dum diálogo que procure uma compreensão clarividente do bem comum, reconheça a presença da diversidade legítima, respeite os direitos humanos e políticos de todos os cidadãos e promova uma determinação comum em edificar uma nação assente na justiça para todos e na solidariedade para com aqueles que se encontram em necessidade.

Em virtude da Pancasila, na Indonésia muitas tradições religiosas vivem lado a lado em harmonia, e todos os cidadãos gozam dos mesmos direitos e deveres, independentemente da origem étnica ou das práticas religiosas e culturais. Os princípios que deram origem a esta situação favorável e que merecem o apreço de todos devem ser proclamados sempre de novo, a fim de evitar que a sua importância vital para a vida da Nação seja esquecida ou subestimada. É necessário vigiar para assegurar que a liberdade religiosa, a coexistência pacífica entre os fiéis e a dignidade equânime de todos os cidadãos sejam efectivamente respeitadas, de forma especial perante determinadas interpretações deturpadas da religião e o perigo da intolerância religiosa, que está sempre pronta a manifestar- se, como recentemente testemunharam alguns graves episódios que muito me amarguraram. Todas as pessoas que têm a peito o bem da Indonésia devem procurar assegurar que o espírito e os princípios da Pancasila sejam aplicados de maneira correcta.

Ao reflectir sobre os recentes acontecimentos que atingiram Timor Leste, faço votos por que se promova um diálogo mais fecundo a todos os níveis. Todos aqueles que, de alguma forma, são responsáveis pelo futuro de Timor Leste devem estar persuadidos da necessidade de se alcançar uma solução justa e pacífica o mais depressa possível. Este é, desde há muito tempo o profundo desejo da população local.

Senhor Embaixador, aprecio imensamente a sua amável referência à contribuição dos concidadãos católicos para a vida da Nação. A Igreja desempenha muitas actividades no campo social, da saúde e da educação — actividades das quais toda a sociedade beneficia. Na esteira do ensinamento do seu Fundador, Jesus Cristo, a Igreja cumpre também a importante missão de iluminar e formar as consciências dos cidadãos em relação aos seus direitos e deveres como parte integrante da comunidade nacional. O principal objectivo de tudo isto é assegurar que nada se faça contra a dignidade humana e que todos sejam tratados com o respeito devido às queridas criaturas de Deus. Desde o empenho activo dos mesmos nas vicissitudes que ocasionaram a independência, há pouco mais de 50 anos, os católicos indonesianos, apoiados e encorajados pela Santa Sé, têm trabalhado assiduamente para o bem da Nação e continuarão a servir o próprio País com amor e orgulho. Este foi o significado das palavras proferidas pelo Cardeal Darmaatmadja, durante o encontro entre o Senhor Presidente Soeharto e a Assembleia Nacional dos Católicos, a 2 de Novembro de 1995: «Juntamente com os nossos numerosos predecessores, também nós queremos empenhar-nos em todos os sectores do desenvolvimento nacional (...) Jurámos ser 100% indonesianos, precisamente porque desejamos ser 100% católicos ». O amor genuíno pelo país constitui uma parte importante do dever e do estilo de vida de cada católico.


Discursos João Paulo II 1996 - Quinta-feira, 12 de Dezembro de 1996