Discursos João Paulo II 1992 - Luanda, 7 de Junho de 1992


VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA JOÃO PAULO II

A ANGOLA E SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE

APELO DO SANTO PADRE DURANTE

A CELEBRAÇÃO DA PALAVRA


NA ESPLANADA DA CATEDRAL


DE M'BANZA CONGO


Segunda-feira, 8 de Junho de 1992



Ai de mim se não evangelizar!” (1Co 9,16).

1. Estas palavras foram pronunciadas por São Paulo, o Apóstolo das nações. São palavras fortes. Nelas se exprime um mandato missionário, quase como se fossem uma pressão interior. O Apóstolo escreve: “...não sendo de maneira espontânea, é um cargo que me está confiado” (1Co 9,17).

Ministro do Evangelho. Lembrando os começos da evangelização de Angola há 500 anos; lembrando, ao mesmo tempo, o século passado no qual a evangelização do vosso país fez grandes progressos, desejamos elevar hoje um preito de acção de graças à santíssima Trinidade por todos aqueles para quem as palavras do Apóstolo das nações se tornaram um programa de vida e de vocação.

O meu pensamento dirige–se necessariamente a M’Banza Congo que em 1984 se tornou sede de Diocese pela segunda vez, pois a antiga Diocese do Congo, que datava de 1596, se transformou depois em Diocese de Angola e Congo até 1940. A antiga diocese foi marcada por diversas vicissitudes: morte prematura de bispos; longos períodos de “sede vacante”; insuficiência numérica de missionários; carência de agentes de evangelização à altura da sua missão. Depois, graves acontecimentos ligados à chegada de estrangeiros ao país perturbaram a vida social e repercutiram negativamente na evangelização: o flagelo desumano e injusto do comércio dos escravos e a intromissão belicosa desses estrangeiros na vida do reino do Congo. Os pecados dos homens complicam as dificuldades que acompanham sempre qualquer esforço de evangelização.

Os tristes acontecimentos que se deram durante a comemoração dos 500 anos da evangelização do Congo, acontecimentos que tiveram a sua maior expressão na morte trágica do primeiro Bispo desta diocese, Dom Afonso Nteka, levam–me a crer que Deus não quer desviar M’Banza Congo da rota que o próprio Salvador percorreu: sem efusão de sangue, não há redenção.

Rendo homenagem ao jovem Bispo e peço a todos que se inclinem perante a sua memória. E faço–o numa profissão de esperança: as dificuldades que acompanham a Missão do Congo, não impediram o florescimento da Igreja dos dois lados da actual fronteira administrativa. A força da Páscoa de Cristo e a acção do seu Espírito, com a colaboração dos missionários, catequistas e todo o povo cristão, levará esta Igreja local a crescer ainda mais e a tornar–se um foco de irradiação cristã por todo o território à volta de M’Banza Congo.

2. Falava antes desta pressão interior, um imperativo do Apóstolo. Mas de onde vem ela? De onde, ao longo de todos estes séculos e até ao fim dos tempos?

Para dar uma resposta a esta pergunta, é preciso subir àquele monte da Galileia onde os Apóstolos ouviram as palavras de Cristo, antes de subir para a Casa do Pai:

“Foi–Me dado todo o poder no céu e na terra: Ide, pois, ensinai todas as nações, baptizando–as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando–as a cumprir tudo quanto vos tenho mandado. E Eu estarei sempre convosco, até ao fim do mundo” (Mt 28,19-20).

3. Com estas palavras o mesmo Cristo responde à pergunta sobre o dever de evangelizar “todas as nações”, de anunciar o Evangelho a todos os homens em cada época e em cada lugar. O “poder – de Cristo – no céu e na terra” tem a sua fonte definitiva na redenção do mundo realizada por Ele mediante a cruz. E na ressurreição, Cristo manifestou–se como o Senhor que permanece connosco, no Espírito que é fonte de vida, “até ao fim do mundo”.

Aqueles que empreendem a obra da evangelização desejam responder ao amor do Redentor, que Ele nos manifestou mediante as suas obras e seus ensinamentos e, em definitivo, com o sacrifício da Cruz: deu a Sua vida por nós! Aqueles que empreendem a obra da evangelização seguem a verdade divina deste amor, pois somente n’Ele se encontra a salvação do homem e da humanidade.

4. Sinto uma emoção particular, como Pastor da Igreja universal, ao pisar estas terras de M’Banza Congo. É que aqui o cristianismo tem uma história cinco vezes centenária, uma tradição que mergulha nas sombras do passado e gestas que espantam pela audácia.

Se hoje damos graças a Deus por todos aqueles a quem Angola deve a evangelização, é porque desejamos mostrar ao mesmo tempo a sua necessidade nos dias de hoje, e para o futuro da vossa Pátria.

Vós pastores, missionários, catequistas e simples leigos, a quem dirijo a minha saudação afectuosa e calorosa – sinal de homenagem e portadora de estímulo –, herdastes uma tarefa exigente, uma responsabilidade histórica e uma tradição que reclama fidelidade.

5. O trabalho dos primeiros missionários ao estender até a estas paragens a chama da Fé foi uma epopeia de sacrifícios e consolações, de luzes e sombras, de angústias e esperanças: foi assim o início e desse jeito sobreviveu o cristianismo por cinco séculos nestas paragens.

Esse processo de evangelização, como uma pequena semente, foi–se desenvolvendo até chegar a ser o que hoje é a realidade cristã de Angola: uma hierarquia solidamente estabelecida, e os cristãos participando, em torno aos seus pastores, da vida da Igreja. Nesta recordação da história, não podemos esquecer o nome de um grande rei, cuja memória o povo do Congo lembrou durante séculos: o rei Dom Afonso I, Mvémba–Nzínga, que foi naquele tempo o maior missionário do seu povo. E apraz–me recordar também as relações directas que o Reino do Congo procurou ter com a Santa Sé em Roma, enviando aí embaixadores que os meus antecessores acolheram com admiração e carinho.

Mas, como dizia o Concílio Vaticano II “A Igreja não está fundada verdadeiramente nem vive plenamente, nem é sinal perfeito de Cristo entre os homens se, com a hierarquia, não existe e trabalha um laicado autêntico” (Ad Gentes AGD 21).

Uma das principais características da Segunda Evangelização de Angola iniciada em 1866 está na mobilização do laicado local, principalmente aqueles que têm o nome de catequistas. As provações por que a Igreja em Angola tem passado durante estes últimos trinta anos marcados pela guerra da independência, seguida da guerra civil, certamente teriam causado o desaparecimento de grande parte das comunidades cristãs, se não tivesse havido catequistas, conscientes e responsáveis, à altura das circunstâncias.

De facto, a oração comunitária, a catequese a todos os níveis, a resistência ao ateísmo oficial, não deixaram morrer as comunidades cristãs – como sucedeu a partir de 1934 após a expulsão dos missionários – porque os catequistas mobilizaram e enquadraram o povo na defesa dos valores religiosos e morais. Centenas deles foram mártires: pagaram com a vida a sua coragem e determinação. Deus queira que os seus nomes não sejam esquecidos e os seus exemplos sejam seguidos para a edificação das futuras gerações. Aproveito a ocasião para saudar e felicitar todos os agentes da evangelização de Angola, sobretudo vós, catequistas: alguns ostentam no peito a medalha “Pro Ecclesia et Pontifice” como sinal de reconhecimento da Sé Apostólica pelos serviços prestados e pelos sacrifícios suportados.

E como não recordar as outras formas de serviço à vida da Igreja, a missão de outros trabalhadores do Evangelho?: “animadores da oração, do canto e da liturgia, chefes de comunidades cristãs, de grupos bíblicos, encarregados de obras caritativas, administradores dos bens da Igreja, dirigentes de várias associações de apostolado” (Redemptoris Missio RMi 73). Todos, formaram e formam, em comunhão de espírito e de fé, uma unidade harmónica para a edificação da Igreja angolana. Que o Deus da Paz, vos abençoe!

6. “Fiz–me fraco com os fracos, a fim de ganhar os fracos. Fiz–me tudo para todos, a fim de salvar a todos. E tudo isso faço por causa do Evangelho, para dele me fazer participante” (1Co 9,22-23). Eis o programa de acção apostólica para todos: para o clero e para os leigos, ministros da Boa Nova.

O seu serviço indica os caminhos da paz. O Evangelho que servem é o evangelho da paz. E quanto não o necessita vossa Pátria tão devastada por esses anos de guerra civil!

A minha solicitude por todas as vítimas desta guerra faz–me lançar daqui um premente apelo a favor dos refugiados: a guerra fê–los partir; a paz constrói–se com o seu regresso.

Queridos angolanos, naquele ano de 1491, Jesus Cristo, na pessoa dos seus missionários, pediu e recebeu condigna hospedagem nestas terras acolhedoras do antigo Reino do Congo. O Papa apela a que a generosidade de que os vossos antepassados, há cinco séculos, deram provas com os primeiros missionários, seja hoje nobre distintivo do coração e mentalidade dos angolanos, face aos refugiados que começam a regressar ao país. Eles contam com a vossa solidariedade para se tornar possível o reencontro de tantas famílias dispersas e o recomeço da sua vida. O seu regresso é certamente uma das condições necessárias e urgentes para que Angola possa reencontrar aquela normalidade de vida que lhe permita projectar e edificar o futuro.

Certo que, embora decisiva, a solidariedade nacional não basta! Dirijo–me à Comunidade Internacional para lhe pedir que continue a apoiar os povos menos favorecidos. Angola e diversos outros países da África Austral carecem da vossa ajuda para não morrerem de fome, para encetarem o caminho do desenvolvimento e para se consolidarem como Nação irmã e companheira de todas as demais Nações dentro da única família humana.

7. Amados irmãos e irmãs: Angola tem quinhentos anos de encontro de culturas, situação que a maioria dos povos de África não conhece. Isso faz de vosso país um povo distinto, que não se pode incluir simplesmente numa determinada corrente que arrasta os países da África Austral. Nuns, os colonizadores viveram entre os colonizados. Aqui, os colonizadores, apesar de tudo, conviveram com os povos que encontraram. Daí a diferença específica que distingue o povo angolano.

Por isso, no vosso louvável esforço de inculturação do Evangelho, não esqueçais que se trata de “um caminho lento que acompanha toda a vida missionária e que responsabiliza os vários agentes da missão ad gentes, as comunidades cristãs à medida que se vão desenvolvendo, e os Pastores que têm a responsabilidade de discernimento e de estímulo na sua realização (Redemptoris Missio RMi 52).

8. A liturgia de hoje, antes de conduzir–nos junto a Cristo e aos Apóstolos, sobre o monte da Ascensão, leva–nos sobre um outro monte, que o profeta Isaías vê com os olhos da alma. Este é “o monte do templo do Senhor” (Is 2,2).

O profeta vê como afluem para este monte numerosos povos a dizer: “Vinde, subamos à Montanha do Senhor, à Casa do Deus de Jacob: Ele nos ensinará os seus caminhos, e nós andaremos pelas suas veredas(Redemptoris Missio RMi 2,3). E logo a seguir: “Ele julgará as nações. Das suas espadas forjarão relhas de arados, e das suas lanças farão foices.

Casa de Jacob, vinde, caminhemos à luz do Senhor” (Redemptoris Missio RMi 2,4-5).

Povos da África, povo de Angola:

O Deus da paz esteja convosco!

Caminhai na luz do Evangelho de Deus!





VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA JOÃO PAULO II

A ANGOLA E SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE

DISCURSO DO SANTO PADRE

AOS CATEQUISTAS NA CATEDRAL DE BENGUELA


Terça-feira, 9 de Junho de 1992



Queridos evangelistas e catequistas,
Amados irmãos e irmãs,

Ide, pois, e ensinai... a cumprir tudo quanto vos tenho mandado” (Mt 28,19-20).

1. Um profundo sentimento de regozijo me invade a alma, neste momento, ao encontrar-me convosco, obreiros importantes do Reino de Deus e fervorosas testemunhas de Cristo Ressuscitado. Pelos quatro cantos desta imensa e amada Nação, vós estais ao serviço do seu mandato evangelizador. Uma saudação afectuosa a cada um de vós, envolvendo nela todos os catequistas de Angola, tanto os presentes como os ausentes. A todos desejo confirmar na missão eclesial, que generosamente cumpris, em comunhão com os vossos bispos e sacerdotes.

Agradeço o vosso testemunho de amor e adesão à Igreja e a seriedade dos vossos anseios, patente nas palavras com que o Senhor Bispo D. Óscar Lopes Fernandes Braga ilustrou a vossa fecundidade apostólica. As suas palavras espelham aquilo que vós, caros catequistas, representais na história, já cinco vezes centenária, da Igreja nesta terra angolana. A coragem e a generosidade de sucessivas gerações de catequistas permitiram edificar comunidades vivas, fazer com que um povo – por natureza aberto à vida espiritual – descobrisse a beleza da mensagem de Cristo.

2. Caros catequistas, grande é a vossa missão na Igreja! Sois um verdadeiro laicado de vanguarda. Tantas vezes se ficou a dever a vós a consolidação das novas Comunidades Cristãs, quando não a primeira pedra na sua implantação, com o primeiro anúncio do Evangelho àqueles que o não conheciam. Se os missionários não podiam estar presentes ou tiveram de partir logo após um primeiro anúncio bem rápido, fostes vós, os catequistas, quem sustentou e formou os catecúmenos, preparou o povo cristão para os sacramentos, ensinou a catequese, assumiu a animação da vida cristã da sua aldeia ou do seu bairro.

Como não louvar a maturidade cristã e o sentido da responsabilidade, que vós manifestastes nas grandes provações que se abateram sobre vós e sobre a vossa gente, durante a guerra dos últimos anos?! Isto para citar apenas uma das últimas páginas, por vós escrita com lágrimas e até com sangue. Quantos e quantos evangelistas e catequistas, “firmes na fé”, aguentaram ameaças e sofrimentos, viveram na pele os horrores da guerra!? Tantas vezes com raro ou nenhum contacto com os seus pastores, conseguistes manter vivas as comunidades cristãs que o Senhor vos tinha confiado!

O povo cristão agradece a Deus o exemplo e o apego, à Santa Igreja, dos seus Evangelistas e Catequistas. Deus não deixa sem recompensa um copo de água dado por amor; muito menos deixará sem recompensa, caros catequistas, o vosso glorioso serviço ao Evangelho e às comunidades cristãs, durante estes anos de sofrimento.

3. Quero exprimir-vos aqui, caríssimos catequistas, a mais profunda gratidão da Igreja e do Papa por tudo quanto fizestes pelos vossos irmãos. Não posso deixar de fazer uma menção especial daqueles catequistas que, durante tantos anos, ficaram totalmente isolados, pela guerra, nas matas! Vós sacrificastes tudo para não abandonar o rebanho do Senhor: vivestes a sorte da vossa gente, e não desanimastes, diante das enormes dificuldades que se vos deparavam. Às vezes tivestes de percorrer dezenas, até centenas de quilómetros para pedir um conselho ao missionário ou ao Bispo e entregar-lhe as vidas e necessidades da missão, para regressar depois com a Eucaristia e o mínimo disponível para sobreviver: viram-vos chegar quase nus, mas com o Evangelho debaixo do braço! Fostes verdadeiras testemunhas de Cristo e do Evangelho. Só graças a vós, valorosos evangelistas e catequistas, a Igreja pôde sobreviver, em tantos lugares!

Sei dos grandes sofrimentos e enormes humilhações, infligidos quer a vós próprios quer aos vossos familiares: à vossa esposa, aos vossos pais, aos vossos filhos... Como não pensar nas dezenas de catequistas vítimas da guerra ou do totalitarismo?! Sacrificaram a vida, apenas porque se recusaram a abandonar a fé ou a deixar de alimentar a sua comunidade com a Palavra de Deus. Vós já sabeis o que é sofrer por Cristo: raptados, ultrajados, flagelados, muitos até assassinados... e tudo perdoastes! Sacrificastes-vos com uma dignidade cristã admirável... sem odiar ninguém. Destes um verdadeiro testemunho de Cristo! Glória a vós, por este testemunho de responsabilidade e maturidade cristã! O Papa devia-vos esta homenagem de louvor!

4. Queridos irmãos e irmãs, estes homens e mulheres de Deus que sacrificaram as suas vidas por Cristo são a prova da maturidade da fé em Angola, e são agora nossos intercessores junto do Senhor. As páginas gloriosas dos primeiros cristãos foram aqui rescritas pelos evangelistas e catequistas angolanos. Grande é a esperança da Igreja, posta nesta Nação! Eu sei que a evangelização há-de dar muito fruto, em Angola; e conto com os cristãos angolanos para estender a Boa Nova ao inteiro Continente africano.

Um sinal consolador dessa fecundidade apostólica está patente no dom da vocação religiosa e sacerdotal concedido a um ou mais dos filhos e filhas dos evangelistas e catequistas. Foi no ambiente do seu lar cristão que o chamamento de Deus entrou no coração e na vontade desses filhos. E, por isso, falando dos evangelistas e catequistas e do seu importante papel na Igreja, quero lembrar também o papel escondido mas valioso das suas esposas, as esposas dos catequistas. Colaborando na criação de um ambiente cristão em casa, ensinando aos filhos o caminho de Deus, ajudando o seu marido no trabalho do apostolado, estas mães cristãs são também por vezes as mães da comunidade cristã. Deus abençoe as famílias dos nossos evangelistas e catequistas!

5. Ao Pai do Céu, fonte de todo o dom perfeito, elevo a minha prece instante para que, superados definitivamente os difíceis problemas do passado, possais agora ter todos a consolação da presença e apoio dos vossos pastores.

A vossa acção completa a do sacerdote, e mostra o verdadeiro rosto da Igreja, que deve ser missionária em todos os seus membros, tanto leigos como clérigos. Felicito assim todos os catequistas que aceitaram consagrar o seu tempo, as suas forças e o seu coração, ao trabalho na vinha do Senhor. E encorajo também todos os outros leigos, para que cada um, segundo os dons recebidos, se dedique ao apostolado no seu ambiente de vida e de trabalho, particularmente associados em Movimentos de Apostolado.

6. Queridos irmãos: as exigências do Evangelho são grandes, tanto na vida da Igreja como no mundo. A vossa boa vontade, não basta, porque “o trabalho dos catequistas vai-se tornando cada vez mais difícil e exigente, devido às mudanças eclesiais e culturais em curso”. Daqui a necessidade urgente duma “preparação doutrinal e pedagógica mais cuidada, e uma constante renovação espiritual e apostólica” (Redemptoris Missio RMi 73), no espírito de Cristo.

Essa preparação requer os meios adequados, de entre os quais sobressai a Escola de Catequistas, já presente em muitas das vossas Dioceses. Exorto as restantes dioceses a envidarem esforços para habilitarem os seus catequistas com a mesma formação. Deste modo, o seu apostolado será alimentado pelas fontes vivas; os seus diálogos e acções serão habitados pela presença de Jesus, que é “Caminho, Verdade e Vida” (Jn 14,6). Os catequistas poderão assim continuar a edificar a Igreja nesta terra, num encontro lúcido entre o melhor da sua cultura e a Revelação cristã.

7. Caros irmãos e irmãs, não podeis irradiar senão aquilo que já sois dentro de vós mesmos. Com a Sua graça, deveis tornar-vos sempre mais conformes Àquele cuja imagem trazeis em vós – Jesus Cristo. Angola precisa de sinais vivos de Cristo, que mantenham com firmeza, no seu coração, a Palavra de Deus, que se unam a Ele por meio dos sacramentos, que ponham em prática as bem-aventuranças e que amem todos, de modo particular os mais humildes dos seus irmãos e irmãs.

Numa palavra, sede santos. A santidade é a força mais poderosa para levar a Cristo os corações dos homens. Lembrai aquele passo do Evangelho sobre a videira e os ramos (Cfr. Jo Jn 15,5): na união dos “ramos” com a “única videira”, está a fonte concreta e a medida certa da actividade apostólica e do dinamismo missionário da mesma Igreja.

8. Prezados catequistas, o desafio da vida cristã é exigente, mas sabemos pela fé que “nada é impossível a Deus” (Lc 1,37). A graça e o amor de Cristo jamais faltarão. Não desanimeis, apesar dos obstáculos práticos ou até por vezes da falta de meios, porque é precisamente na vossa fraqueza que o poder de Deus se manifesta (Cfr. 2Co 12,9). Por meio do Espírito Santo sereis capazes de dizer: “quando me sinto fraco, então é que sou forte”(Cfr. 2Co 12,10).

Nesta feliz circunstância do meu encontro convosco, quero desejar-vos que esteja convosco o Senhor Jesus Cristo e a Sua imensa bondade, para avançardes sempre, sem medo dos obstáculos. Ele venceu o mundo! Agradecei ao Senhor o dom da vossa vocação, pela qual Cristo vos chamou e escolheu de entre os demais homens e mulheres para serdes instrumentos da Sua salvação. Correspondei com generosidade à vossa vocação, e tereis o vosso nome escrito no céu (Cfr. Lc Lc 10,20)!

Que vos acompanhe a Sua Luz e a Sua Graça, que para todos imploro por intercessão de Nossa Senhora de Fátima, o título por que é honrada e invocada nesta catedral a Mãe do Redentor. E a Virgem fiel, seja para todos a nossa Mãe, durante a caminhada da vida! Para vós, Catequistas de Angola, para as vossas famílias, e para todos os fiéis das vos sas comunidades, vai com paternal afecto a minha Bênção Apostólica.



VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA JOÃO PAULO II

A ANGOLA E SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE

DISCURSO DO SANTO PADRE

NA REUNIÃO DO CONSELHO DA SECRETARIA GERAL


DA ASSEMBLEIA ESPECIAL PARA A ÁFRICA


DO SÍNODO DOS BISPOS


Luanda, 9 de Junho de 1992

Venerados Cardeais,
Senhores Bispos,
Amados Sacerdotes e Religiosos,
Senhoras e Senhores,
Caros irmãos e irmãs,

1. Sinto-me particularmente feliz por participar, pela segunda vez em terra africana, na Reunião do Conselho da Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos em Assembleia Especial para a África. Uno-me à vossa reflexão e à vossa oração pelo desejado fruto da próxima Assembleia: a profunda renovação da Igreja em África. Dirijo uma cordial saudação ao Pastor desta Arquidiocese, o Eminentíssimo Senhor Cardeal Alexandre do Nascimento, aos Bispos aqui presentes, e de modo especial aos Membros do Conselho, que, sendo provenientes de todas as regiões do continente africano, representam as diversas Igrejas locais. Saúdo-vos a todos aqui reunidos, a vós que, testemunhando Cristo ressuscitado, sois sinal de uma Igreja a caminho.

2. O facto de este encontro se desenrolar na própria catedral, com a presença do povo de Deus, pastores e fiéis, faz-me recordar o caminho sinodal percorrido até agora, pela Igreja que peregrina em África. Fez-se já um longo caminho desde aquele primeiro anúncio, feito na Solenidade da Epifania do ano 1989.

Os frutos do Sínodo dependem, em grande medida, da sua preparação. Todos tomastes conhecimento dos Lineamenta, que assinalam a etapa de preparação remota. Fruto de um trabalho colegial e tipicamente “africano”, os Lineamenta tinham por objectivo suscitar a reflexão sobre o nosso ser Igreja, o aprofundamento da nossa fé, e a oração nas comunidades pelo êxito do Sínodo africano. Foram amplamente divulgados pelo continente africano, para que a vida eclesial deles recebesse força e encorajamento.

A partir dos Lineamenta, as Conferências Episcopais, os Bispos, as comunidades e todos os membros do povo de Deus foram convidados a associar-se, de maneira concreta, ao caminho sinodal. Eles tomaram a sério o convite para “caminhar juntos” (syn–odos).

O caminho percorrido constou de reflexão e de estudo da realidade eclesial: para descobrir melhor qual seria a vontade de Deus para esta Igreja em África; para individuar os novos desafios pastorais à luz da fé; para ser testemunhas (Cfr. At Ac 1,8) d’Aquele, que nos chamou a participar da Sua própria vida, e testemunhas fiéis à missão por Ele confiada. Um caminho feito não apenas de reflexão, mas também de oração, invocando o auxílio divino para levar por diante o compromisso eclesial, neste momento da história, centrado no tema do Sínodo: “A Igreja em África e a sua missão evangelizadora rumo ao ano 2000. "Vós sereis minhas testemunhas"”(Cfr. At Ac 1,8).

3. Agradecemos, pois, ao Senhor o trabalho de preparação da Assembleia, realizado até agora pelas dioceses, pelas comunidades e pelos vários organismos, pelo povo de Deus em toda a África. A África inteira está em estado de Sínodo. Todos ofereceram a sua parte: o trabalho intelectual, a sábia reflexão oportunamente proposta, as centelhas de intuição, a alegria de viver como cristão partilhada com os irmãos, os sofrimentos dos doentes e a oração de todos.

4. A evangelização é o tema central e unitário do Sínodo, articulado em cinco subtemas (proclamação da Boa Nova, inculturação, diálogo, justiça e paz, comunicação social). Eis o núcleo central da evangelização: Cristo, Deus e homem, morto e ressuscitado, único Salvador da humanidade e Mediador entre Deus e os homens (Cfr. At Ac 2,14-36 Ac 3,11-16 Ac 4,10-12).

O continente africano foi evangelizado em diversas etapas:

1) Nos primeiros séculos do cristianismo, foram instituídas as antigas Igrejas do Egipto e do Norte de África. Elas deram à Igreja grandes figuras, tais como Atanásio, Clemente e Cirilo de Alexandria, Orígenes, Cipriano e Agostinho;

2) Nos séculos XV e XVI, apareceram as Igrejas ao Sul do Sara, fruto sobretudo da evangelização dos franciscanos, jesuítas e dominicanos;

3) No século XIX, teve início um novo período que regista um extraordinário esforço missionário que constituiu Igrejas em todas as nações africanas, e criou comunidades florescentes e robustas, plenas de tal dinamismo missionário que causa a admiração da Igreja universal. Diversas Igrejas celebram o centenário da sua evangelização, fruto de uma fé proclamada e acolhida.

Neste momento da história, quase no limiar do Ano 2000, a Igreja em África tem pela frente o desafio de prosseguir na via do feliz anúncio e proclamação de Cristo, Caminho, Verdade e Vida (Cfr. Jo Jn 14,6). A proclamação desta Boa Nova deve ser feita por palavras e factos. A reflexão sinodal dos Bispos, à volta de Pedro, deve levar a individuar as novas necessidades e a urgência deste compromisso. É uma obrigação que diz respeito a todos os baptizados.

5. A Assembleia Especial é um acontecimento eclesial de primária grandeza para a África, um kairos, um momento de graça, no qual Deus manifesta a Sua salvação. Toda a Igreja é convidada a acolher plenamente este tempo de graça, a aceitar e difundir a Boa Nova. O esforço de preparação para o Sínodo irá beneficiar não apenas a própria celebração sinodal, mas redundará já agora em favor das Igrejas locais que peregrinam em África, cuja fé e testemunho se reforçam, tornando-se elas cada vez mais maduras.

Ao mesmo tempo, este acontecimento tem uma dimensão universal. Em cada assembleia sinodal, toda a Igreja se torna presente. Quando os representantes do Colégio Episcopal, se reunem una cum et sub Petro para enfrentar os desafios pastorais que se apresentam à Igreja em África neste momento da história, rumo ao ano 2000, é toda a Igreja que exprime a consciência da solidariedade eclesial, pela qual todos se sentem responsáveis pela Igreja em qualquer lugar onde esta se encontre.

6. Agradeço de coração a todos os Bispos que participaram como Membros do Conselho, ao longo das diversas etapas da preparação desde 1989 até hoje.

Ao longo deste tempo, o Conselho da Secretaria para a Assembleia Especial para a África prestou um duplo serviço: por um lado, encorajou o povo de Deus, Pastores e fiéis, à reflexão do tema sinodal; por outro lado, ofereceu os seus sábios e prudentes conselhos à Secretaria Geral do Sínodo e ao Papa, com vista às oportunas decisões a tomar para assegurar o êxito pleno da obra sinodal. Dirigindo-se tanto aos Pastores da Igreja em África como ao Pastor da Igreja universal, o Conselho realizou, de facto, um serviço eclesial extraordinariamente importante.

7. Agora teve início a preparação próxima da Assembleia com o Instrumentum laboris, cuja apresentação acabamos de ouvir.

O documento de trabalho não servirá apenas para oferecer aos Bispos de África as ideias e as propostas resultantes da consulta feita em todas as dioceses, segundo o questionário dos Lineamenta, mas ajudará também a definir melhor a “Ordem do dia” da Assembleia e a preparar o debate sinodal, de um modo cada vez mais profundo e eficaz. Todos encontrarão no “Instrumentum laborisum novo encorajamento para continuar a acompanhar espiritualmente os bispos que se preparam para participar na Assembleia.

Nesta nova etapa de preparação mais imediata da Assembleia, a todos encorajo a prosseguir a reflexão, o aprofundamento e sobretudo a oração pelo feliz sucesso e os bons frutos espirituais e pastorais do Sínodo.

Estamos cientes das dificuldades que existem em diversas partes do continente africano: falta de paz, situações políticas difíceis, intolerâncias e discriminações persistentes, problemas sociais e económicos, problemas de comunicação, desencorajamento face ao multiplicar-se das dificuldades. Apesar de tudo, porém, a Igreja corajosamente continua, e deve continuar, a anunciar a Boa Nova e a ser testemunha de Cristo ressuscitado em todos os campos da vida pessoal e da convivência humana.

8. Como ouvimos na leitura dos Actos dos Apóstolos, os discípulos receberam de Jesus a missão de testemunhar e proclamar a Sua ressurreição (Cfr. At Ac 10,42). Do mesmo modo, também a nós o Senhor nos envia a anunciar a Boa Nova da salvação e a ser Suas testemunhas.

“Deus – diz o texto – ungiu com o Espírito Santo e com o poder a Jesus de Nazaré, o Qual andou de lugar em lugar, fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo diabo” (Cfr. At Ac 10,38). No domingo passado, celebrámos a festa do Pentecostes. O Espírito do Senhor desceu sobre nós e fomos transformados: os nossos temores foram convertidos em coragem, a nossa cegueira foi mudada em luz esplendorosa, a nossa fraqueza humana foi transformada em força e esperança, para sermos verdadeiras testemunhas de Cristo e da relevância da sua mensagem para a África.

As comunidades cristãs de África são chamadas, em primeiro lugar, a viver o mistério pascal, a conhecer melhor a mensagem de salvação trazida por Cristo e a receber o dom do Espírito Santo. Assim, radicadas em Cristo e impregnadas do Espírito, elas serão capazes de dar testemunho da riqueza da fé que receberam no seu baptismo. Eis o melhor modo de se prepararem para a Assembleia Sinodal.

Neste caminho de preparação, acompanha-nos a Virgem Maria, Rainha da paz, Rainha da África. A Igreja persevera em oração num mesmo espírito com Maria, a Mãe de Jesus (Cfr. At Ac 1,14). Ela, a Mãe da Igreja, nos proteja e nos guie neste nosso compromisso com vista ao ano 2000 e ao Sínodo.



VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA JOÃO PAULO II

A ANGOLA E SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE

DISCURSO DO SANTO PADRE

NA CERIMÓNIA DE DESPEDIDA


NO AEROPORTO DE LUANDA


Quarta-feira, 10 de Junho de 1992



Excelentíssimo Senhor Presidente da República,
Venerados Irmãos no episcopado,
Ilustres membros do Governo e do Corpo Diplomático,
Queridos angolanos,

1. No termo desta Visita pastoral, sinto o dever de exprimir o meu profundo reconhecimento a todos quantos se prodigalizaram para a tornar possível.

O meu agradecimento vai em primeiro lugar para Vossa Excelência, Senhor Presidente da República, pelo seu deferente acolhimento e pelo trato fidalgo que me reservou; agradeço depois aos membros do Governo e demais Autoridades, pelas facilidades proporcionadas, nos diversos lugares, ao bom desenvolvimento do programa estabelecido. Agradeço à Transportadora Aérea Angolana todas as facilidades e atenções prestadas durante esta minha Visita.

Particular apreço e gratidão desejo manifestar a todos os meus Irmãos no episcopado, aos sacerdotes, aos religiosos, às religiosas e a tantas pessoas e entidades que, com dedicação e desprendimento, prestaram um valioso serviço na concretização da minha viagem apostólica.

Uma palavra de apreço dirijo-a ainda aos homens e mulheres da comunicação social, pelo notável esforço realizado na imprensa local e estrangeira, na rádio e na televisão, de modo a fazerem participar o conjunto dos angolanos, bem como os outros ouvintes de além-fronteiras, nos eventos desta minha Visita.

2. Ao querido povo angolano, que me reservou um acolhimento tão amigo, quereria dizer o meu sentido obrigado. O meu pensamento dirige-se, por igual, a todos os filhos desta pátria amada, quaisquer que sejam as suas origens étnicas, as suas crenças religiosas, a sua cultura, ou a sua posição sócio-política.


Discursos João Paulo II 1992 - Luanda, 7 de Junho de 1992