Discursos João Paulo II 1997 - 8 de Junho de 1997

A obra de Edviges produziu frutos também numa outra dimensão. O século XV, com efeito, é na história de Cracóvia o século dos Santos e estes estiveram ligados estreitamente à Universidade Jagelónica. Naquela época aqui estudava, e mais tarde ensinava, São João de Kety, cujos restos mortais se encontram precisamente nesta Colegiada académica de Santa Ana. E, além dele, vários outros, como o Beato Estanislau Kazimierczyk, Simão de Lipnica, Ladislau de Gielniów, ou então Miguel Giedroyc, Isaac Boner, Miguel de Cracóvia e Mateus de Cracóvia, que gozam de fama de santidade, formaram-se aqui. São apenas alguns de entre a inteira multidão daqueles que, na via da busca da verdade, chegaram aos cumes da santidade e formam a beleza espiritual desta Universidade. Penso que, durante esta celebração jubilar, não pode ser transcurada também esta dimensão.

3. Permiti-me, caros Senhores, dirigir-me agora directamente à Pontifícia Academia de Teologia de Cracóvia, herdeira da Faculdade de Teologia da Universidade Jagelónica, fundada por Santa Edviges há seiscentos anos. Não só na história da teologia polaca, mas também naquela da ciência e da cultura polacas ela desempenhou — como eu disse — um papel excepcional. Estive intimamente unido à essa Faculdade, por ter seguido os estudos filosófico-teológicos durante a ocupação, ou seja, na clandestinidade, e sucessivamente por ter obtido ali o doutoramento e a habilitação. Hoje, apresentam-se-me diante dos olhos, antes de tudo, os anos das dramáticas lutas pela sua existência no período da ditadura comunista. Participei nelas pessoalmente como Arcebispo de Cracóvia. Aquele período doloroso merece, sob todos os pontos de vista, uma cuidadosa documentação e um aprofundado estudo histórico. A Igreja jamais se resignou ao facto de uma eliminação unilateral e injusta da Faculdade, por parte das autoridades do Estado de então. Fez de tudo para que o ambiente universitário de Cracóvia não fosse privado de um «studium» académico de teologia. Não obstante as numerosas dificuldades e vexações por parte das autoridades, a Faculdade existia e actuava junto do Seminário Maior de Cracóvia, antes como Pontifícia Faculdade de Teologia, e depois a questão maturou a tal ponto que pôde nascer em Cracóvia a Pontifícia Academia de Teologia, como Ateneu composto de três faculdades, em ideal continuidade com a antiquíssima Faculdade de Teologia da Universidade Jagelónica. Como, então, não agradecer hoje, por ocasião desta celebração jubilar, a Deus que nos permitiu não só defender este grande bem espiritual da Faculdade de Teologia, mas também desenvolvê-lo e conferir-lhe uma nova e ainda mais rica forma académica? E assim a Pontifícia Academia de Teologia, juntamente com outros Ateneus católicos na nossa Pátria, oferece o próprio contributo ao desenvolvimento da ciência e da cultura polaca, permanecendo contemporaneamente como uma particular testemunha da nossa época — época de lutas pelo direito à presença dos Ateneus teológicos no contexto académico da Polónia dos nossos tempos.

4. As hodiernas celebrações jubilares suscitam na minha mente uma série de interrogativos e de reflexões de carácter geral e muito essencial: o que é a Universidade Qual é o seu papel na cultura e na sociedade Alma Mater. Alma Mater Jagelonica... É este o apelativo com que se qualifica a Universidade, e isto tem o seu sentido profundo. Mater — mãe, isto é, aquela que gera, educa e forma. Uma Universidade traz em si uma semelhança à mãe. É semelhante a ela pela solicitude materna. É solicitude de carácter espiritual: gerar as almas para o saber, para a sabedoria, para a formação das mentes e dos corações. É um contributo que não se pode comparar a nenhuma outra coisa. Pessoalmente, após anos, vejo sempre melhor quanto devo à Universidade: o amor pela Verdade, a indicação das vias para a procurar. Um grande papel exerciam na minha vida os grandes professores, que tive ocasião de conhecer: pessoas que me enriqueceram e continuam a fazê-lo, com a grandeza do seu espírito. Não posso resistir à necessidade do coração, de recordar hoje os nomes de, pelo menos, alguns deles: os Professores Stanislaw Pigon, Stefan Kolaczkowski, Kazimierz Nietsch, Zenon Klemensiewicz — são os da Faculdade de Letras, já falecidos. A eles se ajuntam os Professores da Faculdade de Teologia: Padre Konstanty Michalski, Jan Salamucha, Marian Michalski, Ignacy Rózycki, Wladyslaw Wicher, Kazimierz Klósak, Aleksy Klawek. Quantos conteúdos e quantas pessoas se escondem atrás do nome: Alma Mater!

A vocação de cada Universidade é o serviço à verdade: descobri-la e transmiti- la a outros. De modo eloquente expressou- a o artista que projectava a capela de São João de Kêty, que decora esta Colegiada. O sarcófago do Mestre João foi deposto sobre os ombros das figuras que personificam as quatro tradicionais Faculdades da Universidade: Medicina, Direito, Filosofia e Teologia. Isto faz vir à mente precisamente esta forma de Universidade que, através do esforço de investigação de muitas disciplinas científicas, gradualmente se aproxima da Verdade suprema. O homem supera os confins de cada uma das disciplinas do saber, de maneira a orientá-las para aquela Verdade e para o cumprimento definitivo da própria humanidade. Pode-se aqui falar da solidariedade de várias disciplinas científicas ao serviço do homem, chamado a descobrir a sempre mais completa verdade sobre si mesmo e sobre o mundo que o circunda.

O homem tem a viva consciência do facto que a verdade está fora e «acima» de si mesmo. O homem não cria a verdade, ela mesma se manifesta diante dele, quando a procura com perseverança. O conhecimento da verdade gera a alegria espiritual (gaudium veritatis), única no seu género. Quem de vós, caros Senhores, não viveu em menor ou maior medida, um semelhante momento no seu trabalho de pesquisa? Desejo-vos que instantes deste género sejam frequentes no vosso trabalho. Nesta experiência de alegria por ter conhecido a verdade, pode-se ver também uma confirmação da vocação transcendente do homem, até mesmo do seu abrir-se ao infinito.

Se hoje, como Papa, estou aqui convosco, homens de ciência, é para vos dizer que o homem de hoje tem necessidade de vós. Tem necessidade da vossa curiosidade científica, da vossa perspicácia ao apresentar as perguntas e da vossa honestidade ao procurar-lhes as respostas. Tem necessidade também daquela transcendência específica, que é própria das Universidades. A busca da verdade, mesmo quando se refere a uma realidade limitada do mundo ou do homem, jamais termina, remete sempre para alguma coisa que está acima do objecto imediato dos estudos, para os interrogativos que abrem o acesso ao Mistério. Como é importante que o pensamento humano não se feche à realidade do Mistério, que não falte ao homem a sensibilidade ao Mistério, que não lhe falte a coragem de descer ao profundo!

5. São poucas as coisas tão importantes na vida do homem e da sociedade, quanto o serviço do pensamento. O «serviço do pensamento», a que faço alusão, não é na sua essência outra coisa senão o serviço da verdade na dimensão social. Todo o intelectual, independentemente das convicções pessoais, é chamado a deixar-se guiar por este sublime e difícil ideal e a exercer uma função de consciência crítica, em relação a tudo o que expõe a risco a humanidade ou a diminui.

Ser homem de ciência obriga! Obriga, antes de tudo, a uma particular solicitude pelo desenvolvimento da própria humanidade. Quero recordar aqui um homem conhecido pessoalmente por muitos de entre os que aqui estão presentes, como também por mim. Ligado ao ambiente científico de Cracóvia, era professor no Politécnico de Cracóvia. Para a nossa geração tornou-se uma particular testemunha da esperança. Estou pensando no Servo de Deus Jerzy Ciesielski. A sua paixão científica esteve unida, de modo indissolúvel, à consciência da dimensão transcendente da verdade. Unia a sua escrupulosidade de cientista com a humildade do discípulo, à escuta daquilo que a beleza do mundo criado diz a respeito do mistério de Deus e do homem. Do seu serviço como cientista, do «serviço do pensamento » ele fez uma via rumo à santidade. Ao falarmos da vocação do homem de ciência, não podemos ignorar também esta perspectiva.

Na fadiga quotidiana de um estudioso é necessária também uma particular sensibilidade ética. Com efeito, não basta a solicitude pela rectidão lógica, formal do processo do pensamento. As actividades da mente devem estar necessariamente inseridas no clima espiritual das indispensáveis virtudes morais, como a sinceridade, a coragem, a humildade, a honestidade, juntamente com uma autêntica solicitude pelo homem. Graças à sensibilidade moral é conservado um ligame muito essencial para a ciência, entre a verdade e o bem. Estes dois problemas não podem, com efeito, estar separados entre si! O princípio da liberdade da pesquisa científica não pode estar separado da responsabilidade ética de todo o estudioso. No caso dos homens de ciência, essa responsabilidade ética é particularmente importante. O relativismo ético e as atitudes puramente utilitaristas constituem um perigo não só para a ciência, mas de forma directa para o homem e para a sociedade.

Outra condição para um justo desenvolvimento da ciência, que eu desejaria sublinhar, é a concepção integral da pessoa humana. A grande controvérsia sobre o tema do homem aqui, na Polónia, não terminou de modo algum com a queda da ideologia marxista. Continua e, sob um certo aspecto, até se intensificou. As formas de decadência da concepção da pessoa e do valor da vida humana tornaram-se mais subtis, e por isso mesmo mais perigosas. Hoje há necessidade de uma grande vigilância neste sector. Abre-se aqui um vasto campo de acção, precisamente diante das Universidades, para os homens de ciência. Uma visão deformada ou incompleta do homem faz com que a ciência se transforme, com facilidade, de um benefício numa séria ameaça ao homem. Os progressos que as investigações científicas hoje realizaram, confirmam plenamente tais temores. Do ser sujeito e fim, o homem não raro tornou-se objecto ou até mesmo «matéria-prima»: basta recordar as experiências da engenharia genética, que despertam grandes esperanças, mas, ao mesmo tempo, também e não poucos temores pelo futuro do género humano. São deveras proféticas as palavras do Concílio Vaticano II, às quais recorro frequentemente nos encontros com o mundo da ciência: «Mais do que os séculos passados, o nosso tempo precisa de uma tal sabedoria, para que se humanizem as novas descobertas dos homens. Está ameaçado, com efeito, o destino do mundo, se não surgirem homens cheios de sabedoria» (Gaudium et spes GS 15). Eis o grande desafio que no campo da pesquisa e da didáctica se põe hoje diante das instituições académicas: a formação de homens não só competentes na sua especialização ou ricos de saber enciclopédico, mas dotados sobretudo de autêntica sabedoria. Só pessoas assim formadas serão capazes de assumir a responsabilidade quanto ao futuro da Polónia, da Europa e do mundo.

6. Sei que a ciência polaca está actualmente a braços com muitos problemas difíceis, como de resto a inteira sociedade polaca.

Falei a respeito disto, de modo mais amplo, durante o encontro no Vaticano com os Reitores das Universidades polacas. Não faltam, contudo, as luzes da esperança. Os estudiosos polacos, às vezes em condições muito difíceis, levam avante com grande dedicação as investigações e a didáctica. Não raro atingem posições que contam na ciência mundial. Hoje, desejo exprimir o meu sincero apreço por todos aqueles que estão empenhados a favor da ciência polaca, mediante a sua fadiga quotidiana, e congratular-me pelos sucessos que conseguem.

Vivíssimos agradecimentos por este encontro! Desejava-o tanto para testemunhar, mais uma vez, que as questões da ciência não são indiferentes à Igreja. Quereria que vós, Senhores, estivésseis sempre certos de que a Igreja está convosco — e, conforme à própria missão — quer servir-vos. Peço aos aqui presentes que transmitam as minhas cordiais saudações aos Senados Académicos, aos professores, aos docentes, ao pessoal administrativo e técnico e à juventude universitária das Instituições das quais vindes. Estou cordialmente grato aos representantes das autoridades de governo pela sua presença.

Dirijo-me, por fim, às veneradas Festejadas: Universidade Jagelónica e Pontifícia Academia de Teologia, com os melhores votos de toda a abundância dos dons do Espírito Santo para o ulterior serviço da Verdade.

Ao invocar a intercessão dos Santos Padroeiros: Estanislau, Bispo e Mártir, João de Kety, Edviges, fundadora da Universidade Jagelónica e da sua Faculdade de Teologia — a todos concedo, do íntimo do coração, a Bênção Apostólica.

Antes de o fazer, não posso deixar de revelar um pormenor que é difícil esquecer. Vieram-me à mente muitos pormenores quando eu preparava este discurso, mas devo absolutamente acrescentar um deles, embora não apareça no texto. Quero evocar o dia 6 de Novembro de 1939.

Naquela época eu era estudante de Polonística e claramente já estávamos em guerra. Nesse dia estive na rua Golebia, no nosso Instituto. Ainda pude falar com os professores — com o Prof. Nietsch — que se apressavam para ir ao encontro desejado pelas autoridades alemãs. Jamais regressaram desse encontro, não voltaram para casa, foram deportados para Sachsenhausen.

Na história da Universidade de Cracóvia verificaram-se decerto muitos outros episódios como este. Mas estes confirmam que esta nossa Alma Mater é uma Alma Mater que sofre, que se sacrifica. Evoco estes meus professores, os que faleceram, os dos campos de concentração, os que regressaram e logo depois morreram, e rezo pela sua vida em Deus, porque em última análise cada mãe quer doar-se a fim de que se possa realizar a vocação de cada homem em Deus. Estou deveras grato aos senhores aqui presentes.

Depois de conceder a Bênção Apostólica, o Santo Padre acrescentou ainda as seguintes palavras improvisadas:

Quando olho para este púlpito vejo ainda D. Jan. Quantos anos este servo de Deus, tão unido à igreja de Santa Ana, serviu o mundo académico de Cracóvia! Senhores, muitos são os pensamentos, as recordações escondidas profundamente na memória e no coração, mas não nos devemos prolongar em demasia. Muito obrigado!

Talvez eu deva evocar mais uma pessoa e um episódio. Nos anos das lutas pela Pontifícia Faculdade de Teologia, que já tem 600 anos, muitíssimo me ajudou o extinto Prof. Adam Vetulani. Muitos o fizeram, mas recordo-me dele porque me esteve particularmente próximo. Deus recompense todos vós!

Magis ratio quam vis!

Deus esteja convosco!



VIAGEM APOSTÓLICA DE JOÃO PAULO II À POLÓNIA



NA VISITA AO TÚMULO DE FREI JOÃO DE DUKLA


NA VÉSPERA DA SUA CANONIZAÇÃO


9 de Junho de 1997





1. «Cantai ao Senhor um cântico novo, cantai ao Senhor terra inteira» (Sl 95[96], 1).

Caros Irmãos e Irmãs, como se alegra o meu coração, porque hoje, no meu itinerário de peregrino, me é dado deter- me na cidade em que nasceu o Beato João de Dukla. Volto com a memória ao dia de há muitos anos, quando visitei o santuário de Dukla, em particular a capela do Beato João «no deserto», como se costumava dizer. Hoje, venho de novo à vossa cidade, que com toda a sua história «canta ao Senhor um cântico de glória e de louvor», pelo dom deste piedoso religioso, cuja canonização se realizará amanhã em Krosno.

Saúdo de todo o coração os Padres Bernardinos, fiéis guardiães deste lugar. Sois vós que cuidais das relíquias do vosso excelente coirmão João. Saúdo cordialmente também os sacerdotes que trabalham nesta cidade, em primeiro lugar o Decano, e também as autoridades civis e todos os habitantes de Dukla e dos arredores. Hoje, num certo sentido, é a vossa festa, que Deus na sua bondade preparou para vós. Eis o dia que o Senhor nos deu. Saúdo também aqueles que vieram de longe, de várias partes do País, sobretudo o Episcopado, tendo à frente o Primaz, e como escutámos não só do País mas também do estrangeiro, de além-fronteiras orientais, de além-fronteiras meridionais e de outras fronteiras ainda, para participarem neste nosso encontro comum.

2. Como nos parece próximo o Beato João neste templo, onde são conservadas as suas relíquias! Desejava muito vir aqui, para escutar, no silêncio do convento, a voz do seu coração e, juntamente convosco, aprofundar o mistério da sua vida e da sua santidade. Era uma vida doada totalmente a Deus. Iniciou no eremitério vizinho. Foi precisamente ali, no silêncio e entre as lutas espirituais, que «Deus o arrebatou», de tal maneira que a partir daquele momento permaneceram juntos até ao fim. Entre estes montes aprendeu a oração ardente e a viver os mistérios de Deus. Consolidava- se lentamente a sua fé e fortalecia-se o seu amor, para mais tarde produzir frutos salvíficos não mais na solidão do eremitério, mas entre as paredes do convento dos Franciscanos Conventuais, e depois no dos Bernardinos, onde transcorreu o último período da sua vida. O Beato João conquistou para si a fama de sapiente pregador e zeloso confessor. A ele acorriam milhares de pessoas sedentas da sadia doutrina de Deus, para escutarem as suas pregações, ou então, junto da grade do confessionário, procurarem conforto e conselho. Tornou-se famoso como guia de almas e prudente conselheiro de muitos. Os textos dizem que, não obstante a velhice e a perda da vista, ele continuava a trabalhar, pedindo que lhe fossem lidas as pregações, para poder continuar. Dirigia-se ao confessionário às apalpadelas, para poder converter as almas e as conduzir a Deus.

3. A santidade do Beato João brotava da sua fé profunda. Toda a sua vida e o impulso apostólico, o amor pela oração e pela Igreja, tudo isto estava baseado na fé. Constituía para ele uma força, graças à qual sabia rejeitar tudo o que era material e temporal, a fim de se dedicar àquilo que era de Deus e espiritual. Quero agradecer efusivamente ao Arcebispo de Przemysl ter-me convidado a Dukla, e os seus esforços a fim de que este encontro pudesse ser realizado. Agradeço aos sacerdotes, aos religiosos e às religiosas, presentes nesta diocese de confim que, seguindo as pegadas do Beato João, conduzem o Povo de Deus pelas vias da fé. Deus vos recompense este vosso esforço e a vossa fadiga. No meu agradecimento, incluo os doentes e os que sofrem, os que carregam a cruz da velhice e da solidão, na vizinha localidade de Korczyna e noutros lugares do Gólgota humano. Dirijo-me também aos jovens: não tenhais medo das contrariedades, não vos desencorajeis por causa delas mas, cheios de confiança na poderosa ajuda do piedoso João, com coragem e entusiasmo levai a luz do Evangelho. Tende coragem de vos tornar o sal da terra e a luz do mundo. Oramos aqui, neste lugar, também para obter numerosas vocações sacerdotais e religiosas e pelas novas vocações apostólicas entre os leigos. Que eu saiba, aqui não faltam vocações e, antes, são abundantes, mas a messe é grande e o mundo inteiro espera.

4. Irmãos e Irmãs, visitai com frequência este lugar! É o grande tesouro desta terra, porque aqui o Espírito do Senhor fala aos corações dos homens, por meio do vosso santo Concidadão. Ele diz que a vida pessoal, familiar e social deve ser edificada sobre a fé em Jesus Cristo. Com efeito, a fé dá o sentido a todos os nossos esforços. Ajuda a descobrir o verdadeiro bem, estabelece uma correcta hierarquia dos valores, permeia a vida inteira. Com que precisão é expresso tudo isto nas palavras da Carta de São João Apóstolo: «Tudo o que nasceu de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé» (1Jn 5,4). São João no céu escute como o aplaudis aqui. Agora é preciso terminar este primeiro encontro e esperar amanhã. Devemos ainda rezar e depois vos concederei a minha Bênção.



VIAGEM APOSTÓLICA DE JOÃO PAULO II À POLÓNIA



DURANTE O RITO DA BÊNÇÃO


DO HOSPITAL "JOÃO PAULO II"


Cracóvia, 9 de Junho de 1997

Meus Queridos

1. Sinto-me muito feliz por que, no decurso da minha peregrinação na terra natal, me foi dado visitar o Hospital Especializado de Cracóvia e benzer a Policlínica de Cardiologia, recentemente construída. É-me grato poder encontrar-me, nesta ocasião, com os doentes e com aqueles que cuidam deles. Venho a vós com comoção e agradeço à Direcção e aos Funcionários este convite.

Em 1913, o Conselho da Cidade de Cracóvia havia deliberado construir, precisamente aqui, no Bialy Pradnik, os Institutos Sanitários Municipais. A construção foi concluída quatro anos depois. Este ano, o Hospital celebra o octogésimo aniversário da sua existência e do generoso serviço aos doentes. Como não recordar, nesta circunstância, todos os que, expondo ao perigo a própria saúde, se apressaram em levar, como bons samaritanos, a ajuda ao homem que sofre? Inclinamos a cabeça, pensando especialmente naqueles que pagaram o preço supremo e ofereceram a própria vida. Alguns de nós certamente recordam o Doutor Aleksander Wielgus, falecido em 1939 depois de ter contraído a tuberculose, ou então a Doutora Sielecka-Meier, falecida pelo mesmo motivo nos primeiros anos depois da libertação. Como não recordar também o trabalho das Servas do Sagrado Coração, repleto de dedicação evangélica? Com o seu serviço aos doentes, o tributo da saúde, às vezes até da vida, escreveram uma bonita página na história deste Hospital. Aqui, por duas vezes, esteve hospitalizada a Beata Irmã Faustina.

Agora este hospital especializado foi enriquecido com uma nova Clínica de Cardiocirurgia. Quero exprimir palavras de sincero apreço aos seus construtores. É mérito de muitas pessoas, seria difícil enumerar aqui todos os seus nomes. Hoje damos graças a Deus pelo dom do trabalho humano e pela solidariedade para com o doente.

2. «Sempre que fizestes isto a um destes Meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes» (Mt 25,40).

Com estas palavras de Cristo dirijo-me a vós, que trabalhais neste hospital e, por vosso intermédio, a todos os agentes da saúde na Polónia. Nutro uma grande consideração e respeito pelo vosso serviço. Ele exige espírito de sacrifício e dedicação ao doente, e por isso tem uma dimensão profundamente evangélica. Na perspectiva da fé, o vosso serviço mostra-se dirigido ao próprio Cristo, misteriosamente presente no homem provado pelo sofrimento. Por isso, a vossa profissão é digna do máximo respeito. É uma missão de valor extraordinário, cuja melhor definição é constituída pela palavra «vocação».

Sei bem em que condições extremamente difíceis às vezes deveis trabalhar. Tenho confiança em que na Polónia todos os problemas do serviço sanitário serão resolvidos, de modo sábio e justo, para o bem dos pacientes e daqueles que cuidam deles.

Recebei hoje a expressão do meu apreço por este generoso trabalho, realizado com abnegação. Num certo sentido, vós assumis o peso do sofrimento e da dor das vossas irmãs e dos vossos irmãos, querendo dar-lhes alívio e restituir- lhes a suspirada saúde. O meu apreço dirige-se, de modo particular, a todos os que permanecem com coragem apegados à lei divina, que guia a vida humana. Mais uma vez repito quanto escrevi na Encíclica Evangelium vitae: «A vossa profissão quer-vos guardiães e servidores da vida humana. No actual contexto cultural e social, em que a ciência e a arte médica correm o risco de extraviar- se da sua dimensão ética originária, podem ser às vezes fortemente tentados a transformarem-se em fautores de manipulação da vida, ou até mesmo em agentes de morte. Perante tal tentação, a sua responsabilidade é hoje muito maior e encontra a sua inspiração mais profunda e o apoio mais forte, precisamente na intrínseca e imprescindível dimensão ética da profissão clínica, como já reconhecia o antigo e sempre actual juramento de Hipócrates, segundo o qual é pedido a cada médico que se comprometa no respeito absoluto da vida humana e da sua sacralidade» (cf. n. 89).

Alegro-me por que o ambiente médico na Polónia, na esmagadora maioria, assume essa responsabilidade, não só cuidando da vida e sustentando-a, mas também com firmeza não empreendendo acções, que levariam à sua destruição. Elogio de todo o coração os médicos, os enfermeiros e todos os agentes do mundo da saúde polaco, que põem a lei divina «Não matarás» acima de quanto admite a lei humana. Elogio-vos por este testemunho que estais a dar, de modo especial nos últimos tempos. Peço- vos que continueis com perseverança e entusiasmo o vosso louvável dever de servir a vida em todas as suas dimensões, segundo as especializações que vos são próprias. A minha oração sustentar-vos-á neste serviço.

3. A vós, caros doentes, que participais neste encontro, assim como àqueles que não podem estar presentes aqui connosco, dirijo palavras de cordial saudação. Todos os dias procuro estar próximo dos vossos sofrimentos. Posso dizê-lo, porque conheço bem a experiência de um leito hospitalar. Precisamente por isto, com mais insistência na oração quotidiana invoco a Deus por vós, peço força e saúde; oro, para que no sofrimento e na doença não percais a esperança; oro para que sejais capazes de depor a vossa dor aos pés da cruz de Cristo. Sob o ponto de vista humano, a situação de um homem doente é difícil, dolorosa, às vezes até mesmo humilhante. Mas é precisamente por este motivo que estais, de modo particular, próximos a Cristo e num certo sentido participais fisicamente no Seu sacrifício. Procurai recordar-vos disto. A paixão e a ressurreição do nosso Salvador ajudar-vos-ão a esclarecer o mistério do vosso sofrimento.

É graças a vós, graças à vossa comunhão com o Crucificado, que a Igreja possui riquezas inestimáveis no seu tesouro espiritual. Graças a vós, os outros podem recorrer a Ele. Nada enriquece os outros como o dom gratuito do sofrimento. Por isso, recordai sempre, de modo especial quando vos sentis abandonados, que a Igreja, o mundo, a nossa Pátria têm tanta necessidade de vós. Recordai também que o Papa precisa de vós.

Devo admitir que durante os 58 anos vividos na Polónia tive poucas experiências em hospitais. Só quando eu era jovem, porque meu irmão maior era médico, e depois devido ao acidente que tive no fim da guerra. Só isto. Experiências muito mais numerosas tive-as em Roma. Visitei a Policlínica «Gemelli» pelo menos quatro vezes, quer por alguns dias, quer por algumas semanas. O Dr. Buzzonetti, que me acompanha nesta viagem, pode testemunhá-lo.

Para concluir, quero dizer a todos vós que esperei muito este encontro. Ele não podia faltar no meu itinerário de peregrino. Oro, para que a força da fé vos sustente nestes difíceis momentos da vossa vida, cheios de tormentos. Oro para que a luz do Espírito Santo vos sirva de ajuda, a fim de descobrirdes que o sofrimento enobrecido pelo amor «é um bem, diante do qual a Igreja se inclina com veneração, com toda a profundidade da sua fé na redenção» (Salvifici doloris, 24). Ao recomendar a Deus todos os doentes e quantos cuidam deles, abençoo todos vós de coração.



VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA JOÃO PAULO II À POLÓNIA


SAUDAÇÃO DO SANTO PADRE


DURANTE A VISITA À IGREJA CONSAGRADA


A SANTA EDVIGES


9 de Junho de 1997



1. «Exultei quando me disseram: “Iremos à casa do Senhor”» (Sl 121[122], 1).

Repito esta confissão do Salmista ao vir hoje aqui, a esta igreja e à vossa comunidade paroquial. Também eu me alegrei quando, enquanto se decidia o programa da peregrinação, me foi dito que «viríamos à casa do Senhor» — a esta casa em Krowodrza, onde a Padroeira é Santa Rainha Edviges. Desejava retornar a este lugar onde, em 1974, como Arcebispo de Cracóvia, celebrei pela primeira vez a Santa Missa, por ocasião do início do ano escolar. Recordo esta praça e aquela pequenina casa, que era ao mesmo tempo a casa para a catequese e o centro da paróquia nascente. Faltava ainda a igreja, faltava até mesmo a licença para a construir, mas já havia outra Igreja, a Igreja feita de pedras vivas sobre o fundamento de Cristo. Havia a comunidade dos fiéis, que se reunia sob o céu aberto, suportando todos os incómodos, para celebrar a Eucaristia, para escutar a palavra de Deus, para se confessar, para orar... Os fiéis estavam reunidos também por um grande desejo de que neste lugar, no meio dos edifícios do bairro que estava a surgir, fosse construída uma igreja, uma casa do Senhor, que fosse também a casa para as futuras gerações dos seus confessores. Não pouparam fadigas nem sacrifícios, e realizaram esta obra. Por disposição da divina Providência, hoje posso entrar neste templo, para dar graças a Deus precisamente aqui convosco, pelo dom da santidade da Rainha Edviges, que me foi dado canonizar ontem.

2. Ao unir-me a vós nesta acção de graças, quero saudar os Pastores locais, em primeiro lugar Monsenhor Jan, o qual desde o início, por disposição do então Arcebispo de Cracóvia, agora Sucessor de Pedro, organizava a vida desta paróquia. Saúdo a comunidade das Religiosas da Sagrada Família de Nazaré que, desde os primeiros anos da existência da paróquia, vieram apoiar os sacerdotes no seu trabalho catequético, caritativo e litúrgico. Por fim, quero abraçar com o coração todos vós aqui presentes e a inteira comunidade paroquial, que representais. Sei que é uma comunidade viva, que irradia o espírito de fé e de piedade, e tem também uma grande solicitude pelo homem, pelo seu desenvolvimento — não só espiritual, mas também cultural e físico. Esta vida concentra- se em numerosos grupos, comunidades de oração, litúrgicas, caritativas, culturais, desportivas... Cada um pode encontrar aqui um lugar para alargar os próprios interesses, mas também para aprofundar a fé. E esta é uma actividade digna de reconhecimento. Como diz o Salmista: «Até pássaros encontram casa, e as andorinhas, ninho... junto dos Vossos altares, Senhor dos exércitos, Vós, o meu rei e meu Deus» (Sl 83[84], 4). Estas palavras estabelecem com clareza a orientação da vida e da actividade da comunidade paroquial. Tudo o que nela acontece, deve realizar-se «junto dos altares», deve conduzir rumo ao altar. A vida das comunidades que actuam na paróquia — quer das que estão ligadas directamente à liturgia, à catequese ou à oração, quer também daquelas que promovem a cultura e o desporto — é deveras frutuosa, verdadeiramente edifica o homem, se em definitivo a aproxima de Cristo, deste Cristo que Se oferece sobre o altar, em sacrifício ao Pai, e Se dá totalmente aos homens, para os santificar. Faço votos aos pastores, às religiosas, ao inteiro povo de Deus desta paróquia e a todas as comunidades paroquiais da Igreja na Polónia, por que o fiel perseverar ao lado de Cristo presente na Eucaristia, frutifique com a felicidade na vida de cada um de vós. «Felizes os que habitam em Vossa casa, sempre Vos hão-de louvar!» (Sl 83[84], 5).

3. Desta igreja olho para Cracóvia, a minha dilecta cidade. Tenho na memória todos os bairros, todas as paróquias, que eu visitava como Pastor da Arquidiocese. A partir daquele tempo surgiram dezenas de novas igrejas, que então só estavam nos desejos e nos projectos do Arcebispo. Ao meu sucessor foi dado realizá-las e benzê-las. Dou graças à divina Providência por todas estas novas paróquias de Cracóvia e de Nova Huta, que já existem ou que, graças à benevolência das autoridades locais, agora estão a surgir onde há necessidade. Abraço- as todas com o coração e a oração.

Enfim, quero acrescentar ainda algo que não está escrito nesta folha. Estou persuadido de que a rainha Edviges conhecia os escuteiros de Krowodrza e decidiu associar-se a eles. Bem o fez! Teve, porém, de esperar 600 anos a canonização. Desde quando se associou aos escuterios de Krowodrza, tudo foi feito.

Desejo ainda dirigir-me aos grupos que se encontram fora da igreja com os seus estandartes. Na sua maioria são estandartes do Exército Nacional. Dado que me desejavam muita saúde, quero dizer-lhes que fui ao Hospital, mas não me quiseram hospitalizar. Deixaram-me ir embora, tendo anotado somente o meu nome e o sobrenome, que agora utilizarão sempre.

À protecção repleta de amor de Santa Edviges confio-vos, a vós aqui presentes, a vossa paróquia e todas as paróquias na Polónia, enquanto de coração abençoo todos vós.



VIAGEM APOSTÓLICA DE JOÃO PAULO II À POLÓNIA

SAUDAÇÃO DO SANTO PADRE

NA CERIMÓNIA DE DESPEDIDA


NO AEROPORTO INTERNACIONAL DE CRACÓVIA


10 de Junho de 1997



Caros irmãos e irmãs
Meus compatriotas


Discursos João Paulo II 1997 - 8 de Junho de 1997