Discursos João Paulo II 1997 - 21 de Junho de 1997

Caríssimos Sócios do Círculo de São Pedro, exorto-vos a oferecer a vossa qualificada colaboração a este primordial empenho de toda a Comunidade diocesana de Roma em vista do Jubileu. Sabei ser generosos missionários do Evangelho, anunciando-o nos vários ambientes, aos quais se dirigem as vossas louváveis actividades assistenciais e caritativas. Prossegui nas pegadas da grande tradição de hospitalidade dos Romanos, à qual oportunamente se referiu o vosso Presidente no seu discurso. Esforçai-vos por ser sinal concreto da caridade do Papa a quantos se encontram em necessidade, em sentido quer material quer espiritual, bem como aos peregrinos que aqui vierem de todas as partes do mundo por ocasião do Jubileu.

Confio as vossas actividades e os vossos propósitos à materna protecção da Virgem Santíssima, Salus Populi Romani, para que guie os vossos passos, tornando- vos operadores de solidariedade e de paz em todos os lugares em que se desenvolve a vida quotidiana da Cidade e dos seus habitantes. Com tais sentimentos, invocando a celeste intercessão dos Santos Pedro e Paulo, de coração concedo a cada um de vós, às vossas famílias e a todos os vossos beneficiários uma especial Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO CONGRESSO MUNDIAL


DE ENDOSCOPIA GINECOLÓGICA


21 de Junho de 1997



Ilustres Senhoras e Senhores

1. Estou feliz por dirigir uma cordial saudação a cada um de vós, reunidos nestes dias em Roma, provenientes dos cinco continentes, para participar no World Congress of Ginecologic Endoscopy. Saúdo em particular o Professor Carlo Romanini, Director do Instituto de Obstetrícia e Ginecologia da Universidade de Roma «Tor Vergata», e agradeço- lhe as amáveis expressões que quis dirigir-me em nome dos presentes.

Com o vosso Congresso, quisestes salientar a contribuição que a aplicação dos extraordinários desenvolvimentos das ciências pode oferecer à qualidade da vida humana, sublinhando ao mesmo tempo os profundos significados presentes na vossa actividade científica e profissional. Com efeito, a Endoscopia ginecológica leva-vos diariamente ao limiar mesmo do mistério da vida, do qual o homem é chamado a aproximar-se com espírito humilde e confiante, resistindo a todas as tentativas de manipulação.

Nas vossas intensas jornadas de estudo, pudestes aprofundar as perspectivas do encontro entre a investigação científica e o «Evangelho da vida» e, superando o angusto horizonte das competências específicas, propusestes-vos a considerar o conjunto das instâncias fundadas sobre a originalidade da pessoa humana. Assim, a vossa pesquisa adquiriu um forte valor sapiencial, devido à visão antropológica e ética global em que se desenvolveu.

E oportunamente. Com efeito, a ciência desvinculada dos valores autênticos que definem a pessoa, corre o perigo de decair em exercício instrumental, sucumbindo à lei da demanda e da oferta. Em vez de responder às profundas necessidades do homem, limita-se então a produzir fragmentos de solução para as suas exigências imediatas. Assim, separa- se da íntima conexão que remete a actividade do homem à profundidade do seu ser criado à imagem de Deus.

2. A tarefa histórica que, na investigação científica, irmana crentes e homens de boa vontade, consiste em promover, para além de cada convencionalidade jurídica, quanto favorece a dignidade do homem. Quem tem o dom da fé sabe que na origem de cada pessoa existe um acto criativo de Deus, um desígnio de amor que espera poder realizar-se. Esta verdade fundamental, acessível também com as forças limitadas da razão, deixa entrever a altíssima missão inscrita na sexualidade humana: com efeito, esta é chamada a cooperar com o poder criador de Deus.

É precisamente nesta cooperação que a liberdade humana encontra a própria expressão mais elevada e o seu limite insuperável. Daqui deriva também o peculiar significado da vossa actividade profissional e científica, destinado a perscrutar os segredos da natureza para chegar a decifrar a sua verdade profunda, tornando assim possível a actuação concreta das opções que nela se inspiram. Trata-se de um caminho que, afastando- se de ideologias dominantes, expõe com frequência à incompreensão e à marginalização, exigindo portanto constante fidelidade à verdade de Deus e à verdade do homem. Mas é também um caminho que, formando mentalidades abertas à verdade, se torna um eminente exercício de caridade.

3. Para tudo isto é necessária uma clarividente assunção da responsabilidade ética. No nosso tempo, tal compromisso não raro assume características dramáticas, sobretudo diante dos «atentados, relativos à vida nascente e terminal, que apresentam novas características em relação ao passado e levantam problemas de singular gravidade: é que, na consciência colectiva, aqueles tendem a perder o carácter de “crimes” para assumir, paradoxalmente, o carácter de “direitos”... » (Encíclica Evangelium vitae EV 11). Desta forma, a questão ética coloca-se no horizonte da cultura e na raiz da vida pessoal e colectiva.

Perante a tentação da autonomia e da apropriação, a Igreja recorda aos contemporâneos que «a vida do homem provém de Deus, é dom Seu, é imagem e figura d’Ele, participação do Seu sopro vital» (Ibid., n. 39), e que «a vida é tal quando se difunde e se dá: na fraternidade, na solidariedade, na geração de vidas novas, no supremo testemunho do martírio; diante da tentação da negação autodestruidora recorda que “a vida é sempre um bem”» (cf. Ibid., n. 34).

Esta perspectiva, não alheia à investigação racional, encontra a plenitude de luz na revelação cristã. É nas sendas da fé, com efeito, que o homem se torna capaz de entrever nas próprias realidades de sofrimento e de morte, que dramaticamente permeiam a sua existência, uma autêntica possibilidade de bem e de vida. Então, no rosto desfigurado do Crucificado, reconhece as semelhanças de Deus; na sua cruz, a árvore da vida.

4. Dois séculos de progressiva separação entre fé e cultura e os resultados — sob determinados aspectos preocupantes — da modernidade desafiam os crentes a assumir um papel exemplar e profético e a tornar-se pólo propulsor para a construção da civilização do terceiro milénio.

A fé cristã não considera contingente e transitória a preocupação pelo futuro do homem. Na perspectiva da meta escatológica, esta impele os crentes a empenhar- se no mundo actual em prol de um desenvolvimento que respeite cada uma das dimensões humanas, porque a «glória de Deus é o homem vivo» (Santo Ireneu, Adv. haer. IV, 20, 7).

Portanto, é necessário identificar na renovada relação entre fé, práxis social e investigação científica, perfis profissionais adequados às exigências do nosso tempo e aos valores perenes do homem, capazes de realizar a integração entre fé e vida. Com efeito, «o Evangelho da vida é para bem da cidade dos homens. Actuar em favor da vida é contribuir para o renovamento da sociedade, através da edificação do bem comum» (Encíclica Evangelium vitae EV 101).

Ilustres Professores, na véspera do terceiro milénio, renovo a cada um de vós o convite a fazer-se promotor da civilização do amor, sustentando os vossos jovens estudantes e colaboradores no caminho formativo para fazer com que esta se difunda e se consolide cada vez mais em relação à salvaguarda da vida.

Com estes bons votos, concedo a vós e a quantos trabalham convosco em um âmbito científico tão importante, uma especial Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DO SÍNODO DOS BISPOS


DA IGREJA ARMÉNIO-CATÓLICA


23 de Junho de 1997





Venerados Irmãos no Episcopado

1. O meu coração está repleto de santa exultação no momento em que dou as boas-vindas a Sua Beatitude Jean Pierre XVIII Kasparian, Patriarca da Cilícia dos Arménios, e ao Sínodo dos Bispos da Igreja arménio-católica. As portas da casa dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, as portas da fraternidade universal, abrem-se para acolher com o santo ósculo todos vós, irmãos em Cristo e testemunhas fiéis do Seu Evangelho.

Sei que durante estes dias estais reunidos aqui em Roma para completar o estudo do ius particulare, previsto pelo Código de Direito Canónico das Igrejas Orientais. Trata-se de um empenho de grande importância e significado. Com efeito, se o Código deseja recolher as indicações comuns a todas as Igrejas orientais que já vivem em plena comunhão com esta Sé Apostólica, contudo a Igreja católica sabe que cada uma das Igrejas orientais possui a sua própria história, as suas tradições específicas, não só no âmbito litúrgico, mas também no contexto disciplinar. Já o Concílio Vaticano II recorda que «desde os primeiros tempos, as Igrejas do Oriente seguiam disciplinas próprias, sancionadas pelos Padres e pelos Concílios, mesmo ecuménicos. E como certa diversidade de usos e costumes... não se opõe de modo algum à unidade da Igreja, até lhe aumenta o decoro e muito contribui para o cumprimento da sua missão, o sagrado Concílio, para tirar qualquer dúvida, declara que as Igrejas do Oriente, conscientes da necessária unidade de toda a Igreja, têm o poder de se regularem segundo as próprias disciplinas, como mais conformes à índole dos seus fiéis e mais aptas para prover ao bem das almas» (Unitatis redintegratio UR 16). Portanto, afirma ainda o Concílio, é «intenção da Igreja católica que permaneçam salvas e íntegras as tradições de cada Igreja ou rito particular, e igualmente ela quer adaptar o seu teor de vida às várias necessidades dos tempos e dos lugares » (Orientalium Ecclesiarum OE 2).

2. Por conseguinte, o que estais realizando durante estes dias é, num certo sentido, o cumprimento da obra representada pelo Código oriental: codificais as normas específicas que dizem respeito à vossa Tradição e levais a cabo, respeitando a justa autonomia e a liberdade do vosso património específico, a obra legislativa que concerne à vossa Igreja.

Existe nisto um valor simbólico para o qual desejo chamar a atenção: a Santa Sé, enquanto provê à tutela dos elementos da comum pertença católica, defende e salvaguarda o direito das Igrejas orientais sui iuris a expressarem, segundo as formas estabelecidas, o que lhes é próprio, em conformidade com o seguinte princípio: «A evangelização dos povos se cumpra de modo que, conservando a integridade da fé e dos costumes, o Evangelho possa expressar-se na cultura de cada povo, isto é, na catequese, nos ritos litúrgicos próprios, na arte sacra, no direito particular e por fim em toda a vida eclesial» (Código de Direito Canónico das Igrejas Orientais, cân. 584 § 2). Portanto, universal e particular fundem-se e implicam-se reciprocamente na edificação da una sancta.

Ser católico não mortifica de modo algum a vossa índole arménia mas, pelo contrário, sustém-na e salvaguarda-a, colocando-a em íntima comunhão com muitas outras expressões da fé comum e consentindo a outras Igrejas o gozo da contribuição da vossa originalidade.

3. Veneráveis Irmãos, a codificação do ius particulare constitua para vós a ocasião inspiradora para nele modelar a prática pastoral, procurando «voltar às origens dos [vossos] antepassados», como o Concílio aspira, «se porventura por circunstâncias de tempo ou de pessoas » lhes viessem a faltar (Orientalium Ecclesiarum OE 6). Com efeito, do respeito pela própria identidade promana o esforço de a viver integralmente, actuando em prol da sua completa recuperação, para a tornar o mais comunicável possível aos fiéis de hoje. Na realidade, isto comporta o empenhamento constante em redescobrir as vossas fontes patrísticas e litúrgicas, para lhes inspirar a catequese, a vida espiritual e até mesmo a vossa arte sacra.

Os meus sinceros votos são por que a vida da vossa Igreja tenha sempre impressos os sinais do espírito do povo arménio, espírito do qual muitos monumentos religiosos, além das obras literárias de inestimável valor, constituem um testemunho explícito. Alguns desses monumentos já foram restituídos ao antigo esplendor e ao uso litúrgico, outros infelizmente ainda continuam abandonados às intempéries. Empenhando-vos neste empreendimento, contribuireis de maneira eficaz para redescobrir as comuns raízes religiosas de todo o povo arménio, e podereis oferecer um notável impulso ao progresso da causa ecuménica.

4. Veneráveis e estimados Irmãos, sei que vos preparais para recordar com uma solene celebração os 17 séculos da conversão do povo arménio ao cristianismo. Trata-se de um evento que constitui para a Igreja universal uma ocasião para reflectir e dar graças ao Senhor, pois vós sois o primeiro povo que, como tal, abraçou a fé e se tornou cristão. Por este acto, e também pela história de fidelidade a Cristo que vos custou um elevadíssimo preço de sangue, sinto necessidade de expressar um cordial agradecimento em nome de todo o Povo cristão.

As vicissitudes de então demonstram que nenhuma conversão de massa é possível, sem uma conversão pessoal e interior: a história do rei Tiridates e a profunda aflição da sua alma, que de perseguidor o levou a tornar-se paladino de Cristo e do seu Povo, constitui um sinal eloquente desta profunda verdade.

Depois, o estreito vínculo entre o baptismo da Arménia e a Igreja da Capadócia, realizado através da figura de Gregório, o Iluminador, indica aquela fecunda abertura ecuménica que caracterizou toda a história do povo arménio, levando-o a acolher com reconhecimento não só a contribuição capadócia, mas também siríaca, bizantina e latina. Os arménios souberam receber estas contribuições com grande abertura de espírito, amalgamando-as com o contributo original da própria sensibilidade: daí nasceu um modelo eclesial e cultural, aberto e fecundo, que representa uma referência moderna para muitos outros povos.

5. Desejo de coração e rezo a Deus para que os arménios sejam sempre testemunhas dignas deste seu glorioso passado. Faço votos por que a celebração do 17° século do baptismo do vosso Povo seja para todos vós uma preciosa ocasião para intensificar o comum ligame de pertença, não só às raízes étnicas, mas também à comum fé cristã, que se identifica intimamente com tal pertença. De facto, celebrar um evento passado tão importante torna-se uma mensagem de esperança para os homens de hoje, que será tanto mais eloquente quanto mais claramente manifestar a unidade no contemporâneo esforço de evangelização. Uma comum origem não pode deixar de levar a um compromisso conjunto em prol de um comum testemunho. Portanto, quanto mais se fortalecer a unidade mediante a memória histórica e religiosa, tanto mais forte e convincente será o anúncio de Cristo, morto e ressuscitado, que vós sois chamados a renovar no nosso tempo, olhando já para o Grande Jubileu do Ano 2000.

Com estes sentimentos, asseguro a minha oração por vós aqui presentes, pela vossa querida Igreja, pelos filhos do Povo arménio, sobretudo por quantos padecem dificuldades e angústias, tanto espirituais como materiais. Invoco sobre cada um, por intercessão da Bem-aventurada Virgem e dos vossos santos Padroeiros, a abundância dos favores celestes, em penhor dos quais a todos concedo do íntimo do coração uma especial Bênção apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DA ASSEMBLÉIA DA HIERARQUIA CATÓLICA


DO EGIPTO EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM»


24 de Junho de 1997





Beatitude
Prezados Irmãos no Episcopado

1. É com grande alegria e com afecto fraterno que vos acolho por ocasião da vossa visita ad Limina. A vossa vinda a Roma constitui antes de mais uma peregrinação aos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo, exemplos de testemunho de Cristo, oferecido até ao dom do próprio sangue; é também um acto que manifesta a comunhão das Igrejas locais espalhadas pelo mundo inteiro com o Sucessor de Pedro. A vossa presença na Cidade eterna, ao aproximar-se a solenidade dos beatos Apóstolos, sublinha a dimensão de unidade entre as comunidades católicas. Agradeço ao vosso Patriarca as suas cordiais palavras que me consentem sentir-me próximo dos fiéis dos quais vós sois os Pastores.

Enquanto vos recebo aqui, o meu pensamento dirige-se às vossas comunidades; estas são as herdeiras do evangelista Marcos que, há quase dois mil anos, levou o Evangelho à vossa região, depois de ele mesmo ter sido confirmado na fé e na missão da contemplação do Senhor e da proximidade aos Apóstolos. Rezo para que os cristãos das vossas Dioceses, a exemplo dos seus predecessores, sejam autênticos discípulos de Cristo, haurindo na leitura do Evangelho e nos sacramentos a força para testemunhar. Como Igreja sois chamados a tornar visível a face de Cristo na vossa terra, a fim de que os nossos contemporâneos possam descobrir o esplendor e a luz do nosso Deus, que ilumina cada acção humana, conferindo o seu pleno significado à existência.

2. Mediante a vossa ordenação episcopal fostes escolhidos para guiar o povo de Deus, para o instruir e para organizar com caridade afectiva os vários serviços diocesanos. Procurais estar ao lado dos vossos sacerdotes e dos vossos fiéis, formando assim comunidades unidas, em que cada um está pronto a ajudar e apoiar os próprios irmãos. Em particular, muito me alegram as relações de colaboração confiante e fraterna que entreteceis com os sacerdotes diocesanos, relações assentes «sobretudo, nos vínculos da caridade sobrenatural» (Concílio Ecuménico Vaticano II Christus Dominus CD 28). Sobre eles grava às vezes dolorosamente o peso quotidiano e de situações difíceis. Sustentai-os na sua vida espiritual, uma vez que o seu apostolado implica antes de tudo a proximidade ao Maestro, que infunde graça para o serviço pastoral e a coragem de realizar gestos proféticos de diálogo e de reconciliação.

Juntamente convosco, exorto os sacerdotes a não transcurarem o tempo da oração pessoal e da meditação. A vida em intimidade com Cristo forja o seu ser profundo, conformando-os todos os dias com o Sumo Sacerdote. Empenhando-se em celebrar a Liturgia das Horas sozinhos ou em conjunto, unem-se à Igreja e tomam consciência do facto que a missão fundamental do ministro ordenado é apresentar os homens do seu tempo cada dia a Deus, a fim de que o Senhor faça deles um povo santo, infundindo-lhes o Seu Espírito.

Para que possam exercer o seu ministério, os sacerdotes devem também dispor de dignas condições de vida material, que lhes consintam dedicar-se às tarefas pastorais. Sei que vos preocupais, em todas as Eparquias, por que os ministros sagrados beneficiem das mesmas vantagens e das mesmas protecções sociais, a fim de poderem, sem temer o futuro, consagrar-se totalmente à tarefa que lhes é própria.

Desejo prestar homenagem à coragem e ao trabalho paciente dos sacerdotes, em especial ao seu ministério de proximidade. Estes procuram encontrar regularmente os fiéis, para os ajudar a viver a própria vida cristã e a aprofundar o significado dos sacramentos, bem como para os sustentar nas várias decisões que devem tomar quotidianamente. Salientais também o cuidado com que anunciam o Evangelho nas homilias dominicais, preparadas com muita atenção e com grande solicitude pedagógica. Assim fazendo, introduzem os fiéis no mistério do dogma cristão. Neste âmbito, graças aos programas de catequese estabelecidos a nível das paróquias, das Eparquias e de toda a Igreja local, e graças ainda ao vosso ensinamento, os fiéis refortalecem-se na sua fé para serem testemunhas sólidas. A finalidade do ensinamento catequético é «fazer com que a fé, ilustrada pela doutrina, se torne viva, clara e activa nos homens» (Ibid., 14).

3. Na vossa actividade episcopal, vigiai em particular sobre a pastoral das vocações, exercendo um discernimento atento dos candidatos ao sacerdócio e formando os seminaristas, a fim de que estejam prontos a tornar-se os vossos colaboradores directos. O dinamismo da Igreja de amanhã fundamenta-se em grande parte sobre a atenção dedicada à preparação para o sacerdócio. Não hesiteis em convidar os jovens a dedicar-se total e radicalmente a Cristo. É graças à sua influência benéfica e à sua alegria espiritual que os sacerdotes podem levar os jovens a empenhar-se na sequela de Cristo no ministério ordenado.

4. Dou graças ao Senhor pela longa tradição, pela rica história da Igreja copto-católica e pelo apostolado activo do conjunto dos fiéis. Manifestais os vossos vínculos fraternos durante os diversos encontros periódicos. Com efeito, no seio das instâncias patriarcais, colaborais activamente a fim de realizar as estruturas necessárias em vista de um melhor dinamismo pastoral, preocupando- vos por associar estreitamente os sacerdotes, os religiosos, as religiosas e os leigos à vossa missão nas várias comissões do Patriarcado e das Eparquias.

5. Elaborastes também um programa de preparação para o matrimónio, com a finalidade de ajudar os fiéis a compreenderem o sentido deste sacramento e assumirem plenamente as suas responsabilidades de cônjuges e de pais, respeitadores do significado da sexualidade no matrimónio vivida segundo o desígnio de Deus, da dignidade da mulher e do valor de cada vida humana confiada pelo Criador. É oportuno que os sacerdotes e os leigos chamados a seguir os casais de noivos recebam a formação teológica, espiritual e psicológica necessária para apresentar o pensamento da Igreja neste contexto. Preparar com seriedade os jovens para a vida conjugal é particularmente importante, pois estes são chamados a ser, mediante o exemplo da sua vida e com as suas opções morais específicas, testemunhas de Cristo, perante os seus filhos e os seus compatriotas. Assim, os seus irmãos descobrirão a alegria de viver na liberdade dos filhos de Deus.

Estou feliz pelo trabalho que realizastes em prol da reforma dos vários rituais e para a sua tradução em língua moderna, inspirados pelo desejo de conservar o vosso específico património litúrgico e espiritual, e de o transmitir às jovens gerações. Assim, permitis ao povo cristão melhor compreender o dogma cristão e participar de forma mais activa na Liturgia divina.

6. É um sinal eloquente para os homens o facto de existir, entre todas as comunidades católicas do Egipto, uma justa repartição dos bens e dos dons, manifestação do amor de Deus. Agradeço às Igrejas locais e aos movimentos que vos sustentam financeiramente. Exorto-os a continuar e intensificar os esforços a favor das vossas Eparquias. Esta partilha deve também realizar-se cada vez mais no seio do vosso Patriarcado, a fim de que as Eparquias que recebem maiores subvenções acorram em ajuda das mais pobres ou de recente fundação. Assim, realizais entre vós e com os vossos irmãos de outros Países uma obra de caridade comparável àquela que existia no tempo dos Apóstolos, quando «os discípulos, cada qual segundo as suas posses, resolveram, então, enviar socorros aos irmãos da Judeia» (Ac 11,29).

7. O Patriarcado copto-católico e o Vicariato latino do vosso país têm uma longa tradição educativa. Conheço os sacrifícios que esta obra comporta para as vossas comunidades. Propondo a gratuidade da frequência escolar nalgumas escolas, tendes conta das condições de vida actual, que às vezes põem em perigo a vida das famílias, que têm sempre menos meios para prover às suas necessidades fundamentais, no que concerne à nutrição e educação dos jovens. Sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos empenham-se na formação intelectual da juventude egípcia cristã e muçulmana. Além disso, a comunidade educativa contribui para o desenvolvimento da personalidade integral dos jovens, propondo- lhes os valores humanos, espirituais e morais essenciais, no respeito de quantos não compartilham as convicções cristãs; os pais que matriculam os próprios filhos nas escolas católicas devem aceitar o facto que os discípulos de Cristo não podem deixar de anunciar os valores cristãos sobre os quais se fundam as suas convicções, o seu ensinamento e o seu estilo de vida.

Transmiti a todos aqueles que estão empenhados neste serviço, aos homens e à Igreja, o meu cordial encorajamento. Os educadores e os pais recordem-se que os jovens têm necessidade de modelos e que a escola é um lugar de convivência pacífica e de integração social, onde cada um é chamado a reconhecer o próximo, a acolhê-lo com a sua sensibilidade e a reconhecê-lo como um irmão. Assim, os jovens aprenderão que aquilo que conta para a edificação social é a solidariedade entre todos e o respeito de cada pessoa. São estas as condições fundamentais para a paz e o desenvolvimento dos seres humanos. Aprecia-se a atenção dedicada pelas Autoridades egípcias e pelo conjunto dos vossos concidadãos à elevada qualidade do ensino e da educação humana e moral nas escolas católicas, bem como ao empenho dos fiéis na pastoral caritativa e na assistência médica e social.

8. Nos vossos relatórios quinquenais recordastes os vínculos fraternos que vos unem à Igreja copto-ortodoxa e as possibilidades de colaboração oferecidas a nível de ensino da religião e da ajuda caritativa. Constituem um primeiro passo no diálogo ecuménico e um apelo a prosseguir na vossa abertura às outras Igrejas e às relações ecuménicas com estas. Associo-me também aos sofrimentos dos quais me fizestes partícipes e que experimentais diante das incompreensões daqueles que são os vossos irmãos muito queridos, com os quais compartilhais a mesma tradição espiritual e o mesmo desejo de fazer conhecer e amar o Senhor. Os Pastores e os fiéis católicos jamais cessem, apesar das dificuldades, de realizar gestos fraternos. Recordem-se que o amor convida ao amor e que uma atitude caritativa exorta à reciprocidade! Os testemunhos de caridade contribuem para restabelecer e manter um clima sereno entre as Igrejas e para encontrar soluções aos problemas que ainda obstaculizam a comunhão plena. A este propósito, alegrome pelos sinais tangíveis oferecidos pelas vossas comunidades no sentido de ajudar generosamente a Igreja copto-ortodoxa, em particular cedendo-lhe algumas igrejas para celebrar a Liturgia divina com os seus fiéis.

O diálogo e a reaproximação não excluem o facto de que cada comunidade deve respeitar as sensibilidades próprias das outras comunidades e o modo específico de expressar a comum fé em Cristo e de celebrar os sacramentos que as Igrejas devem reconhecer reciprocamente como administrados em nome do mesmo Senhor. De facto, o Catecismo da Igreja Católica recorda de forma preclara que «o Baptismo constitui o fundamento da comunhão entre todos os cristãos » (n. 1271), pois é «o vínculo sacramental da unidade que existe entre todos aqueles que por meio dele foram regenerados » (Concílio Ecuménico Vaticano II Unitatis redintegratio UR 22).

9. É importante que todos os homens de boa vontade se unam para reduzir as incompreensões, as divisões e as rupturas que podem obstaculizar a vida quotidiana; cada um deve empenhar-se a fim de que todos os sectores da população de um país, não obstante numericamente exígua, sejam tratados com o respeito e a atenção a que têm direito no seio da sociedade e que cada pessoa seja considerada um cidadão a pleno título. No campo da salvaguarda das pessoas e dos povos, a Igreja tem uma missão particular. «Sente-se interpelada pelo preciso dever de reduzir tais fracturas» (Exortação Apostólica Ecclesia in Africa ) e a construir pontes entre todas as componentes culturais de um povo. Neste espírito, a Igreja convida de modo incansável os cristãos e os muçulmanos a procurarem sinceramente compreender- se uns aos outros e a protegerem-se e promoverem juntos, para todos os homens, a justiça social, os valores morais, a paz e a liberdade. Como recordaram recentemente os Patriarcas católicos do Oriente, «o Islã não é o inimigo, mas o interlocutor de um diálogo indispensável para a edificação da nova civilização humana ». Da mesma forma, «o Cristianismo... não é o inimigo, mas o principal interlocutor no diálogo indispensável para a edificação de um mundo novo» (3ª Carta pastoral, Natal de 1994, n. 40).

Portanto, os cristãos têm o legítimo direito e dever de se empenhar na vida pública, colocando as suas competências ao serviço das colectividades locais, para participarem na edificação da sociedade, na paz entre todos e na gestão do bem comum. No seu ensinamento, a Igreja recordou com frequência os princípios de justiça e de equidade na participação na vida social. Com efeito, ninguém deve ser excluído da res publica pelas suas opiniões políticas ou religiosas. Cada uma das culturas é assinalada para sempre pelas contribuições religiosas e civis das diversas civilizações que prevaleceram numa determinada região e que devem ser consideradas como elementos da cultura comum (cf. Exortação Apostólica pós-sinodal Uma esperança nova para o Líbano, 93). Portanto, compete ao conjunto dos artífices da vida social assegurar, em nome da simples reciprocidade, a liberdade necessária à vida religiosa e moral, sem que esta comporte uma exclusão do povo ao qual se pertence e se ama, porque representa as próprias raízes e é o povo dos próprios antepassados. Nesta perspectiva, exorto os cristãos das vossas comunidades a serem indefessamente fermentos de concórdia e reconciliação.

10. Nos vossos relatórios, sublinhastes o importante lugar ocupado pelos religiosos e pelas religiosas junto do povo egípcio em sectores, por exemplo, da educação, da saúde, das operações caritativas, da promoção da paridade entre homem e mulher, e das relações com os cristãos das outras confissões e com os muçulmanos. Transmiti-lhes as minhas cordiais saudações. Dou graças ao Senhor por aquilo que lhes permite realizar. Presentes no meio dos homens, as pessoas consagradas evocam de modo profético, através da prática dos conselhos evangélicos, que Cristo ocupa o primeiro lugar e pode colmar quantos se empenham no Seu seguimento. O povo cristão precisa de homens e mulheres que se dediquem totalmente ao Senhor e aos seus irmãos, e que possam expressar este amor a Deus e ao próximo mediante opções coerentes e projectos concretos. Estou grato às Congregações e aos Institutos que enviam regularmente ao vosso país pessoas novas para enfrentarem as necessidades pastorais mais urgentes.

11. Estimados Irmãos da Igreja copto-católica, deveis fazer frente a numerosas dificuldades no crescimento das vossas comunidades que nem sempre dispõem dos lugares de culto necessários para os seus encontros litúrgicos, cujos fiéis às vezes são impelidos a deixar a própria Igreja devido ás condições sociais impostas aos cristãos. Oferecei aos membros das vossas Eparquias os meios espirituais que lhes consentem permanecer firmes na fé no meio dos seus concidadãos, a fim de que a Igreja continue legitimamente presente e visível no país!

Há pouco tempo fui ao Líbano para entregar aos cristãos desse país a Exortação Apostólica pós-sinodal Uma esperança nova para o Líbano, fruto da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos. Convido-vos a prestar atenção a esse documento, que contém aspectos concernentes às várias comunidades católicas orientais e aos ligames com os homens de outras religiões.

12. Beatitude, desejo manifestar-lhe os meus calorosos bons votos por ocasião do trigésimo aniversário da sua Ordenação episcopal, para reavivar em Vossa Eminência a dádiva de Deus, recebida com a imposição das mãos. Apresento as minhas cordiais saudações também a todos os sacerdotes e a quantos de entre vós celebram neste mês de Junho o aniversário de Ordenação. Rezo ao Espírito Santo para que esteja ao vosso lado e vos cumule com os seus dons! A minha oração dirige-se ainda ao conjunto dos católicos de rito copta e do Vicariato apostólico latino. Transmiti a todos a saudação afectuosa e o caloroso encorajamento do Sucessor de Pedro. Nas dificuldades presentes, os discípulos de Cristo não percam a esperança e oxalá o Espírito inspire sentimentos de concórdia e paz em todos! Por intercessão do Apóstolo Marcos, concedo de todo o coração a Bênção apostólica a vós e aos membros do povo de Deus confiado à vossa solicitude pastoral.




Discursos João Paulo II 1997 - 21 de Junho de 1997