Discursos João Paulo II 1997 - 24 de Junho de 1997

MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO PREPÓSITO-GERAL DOS PADRES DAS ESCOLAS PIAS




Rev.do Padre JOSÉ MARIA B. XURIACH
Prepósito-Geral dos Padres das Escolas Pias

1. No IV centenário da abertura em Roma da «primeira escola pública popular gratuita da Europa», por obra de São José de Calasanz, desejo unir-me à alegria deste Instituto e de quantos, graças ao ministério educativo e evangelizador dos Padres das Escolas Pias, receberam uma sólida formação humana e cristã.

O encontro, na Primavera de 1597, entre José de Calasanz e Antonio Brendani, pároco de Santa Doroteia, constituiu para o vosso Fundador a ocasião de uma conversão mais total ao Evangelho, que o levou a abandonar legítimas aspirações pessoais para encontrar na pequena escola de «Trastevere » um «melhor modo de servir a Deus, ajudando esses pobres filhinhos» (Vincenzo Berro, Annotazioni della Fondatione della Congregatione e Religione delle Scuole Pie [1663], tomo 1°, pág. 73).

Desta primeira experiência educativa, convenientemente transformada e qualificada por José de Calasanz, no Outono sucessivo nasceu o primeiro núcleo das Escolas Pias, exemplo de educação cristã aberta a todos, que daria origem às escolas populares em sentido moderno.

Como recordava o meu venerado Predecessor Bento XV, por ocasião do terceiro centenário da aprovação da obra de José de Calasanz, «ele (Calasanz) foi o primeiro entre todos a inventar também este caminho para a caridade cristã: quando aos jovens se oferecia com dificuldade a educação elementar, ele assumiu a tarefa de ensinar gratuitamente aos filhos dos pobres, para que devido à pobreza não fossem totalmente privados da educação » (AAS [1917] 9, pág. 105).

2. José de Calasanz, sábio intérprete dos sinais do seu tempo, considerou a educação, oferecida de modo «breve, simples e eficaz» (cf. Constitutiones [1622] n. 216), garantia de bom êxito na vida dos alunos e fermento de renovação social e eclesial. Além disso, viu na escola uma maneira nova de evangelizar e, por isso, quis que fossem os religiosos e preferivelmente os sacerdotes a assumirem a tarefa de educadores, empenhando-os em oferecer aos jovens uma cultura global em que a dimensão religiosa fosse considerada e vivida de modo profundo. Consequentemente, José de Calasanz traçava a figura do sacerdote educador dos pequeninos e dos pobres, elevando ao mesmo tempo à dignidade ministerial um múnus que os contemporâneos consideravam humilde e de escasso prestígio.

Seguindo as suas pegadas, os Irmãos das Escolas Pias, os inumeráveis «Irmãos desconhecidos das Escolas Pias», elogiados por Pio XII (cf. Audiência de 22 de Novembro de 1948), deram ao longo dos séculos testemunho de fidelidade a Cristo na dedicação quotidiana à missão educativa em prol dos jovens e ao anúncio do Evangelho. Estes foram e continuam a ser semeadores de esperança. Antes, o educador torna-se ele mesmo semente capaz de produzir frutos para um mundo melhor.

3. Com a sua intuição genial, José de Calasanz abriu um fértil sulco na sociedade, que depois muitos outros fundadores e fundadoras continuaram e aprofundaram, e assim hoje a escola é um dos campos em que a Igreja pode realizar com maior eficácia a sua missão evangelizadora. Justamente, portanto, o meu venerado Predecessor Pio XII, em 1948, proclamou-o «Padroeiro celeste de todas as Escolas populares cristãs do mundo» (Breve Providentissimus Deus, em AAS [1948] 11, PP 454-455).

Os contemporâneos de José de Calasanz viram na sua obra de «evangelização dos pobres» (cf. Lc Lc 7,22) um sinal da proximidade do Reino dos Céus e favoreceram a sua rápida expansão em numerosos países da Europa. Hoje, quatro séculos mais tarde, as iniciativas de José de Calasanz estão presentes em cerca de trinta nações do mundo. O empenho hodierno no campo da educação, considerado como um dos deveres fundamentais do Estado moderno, não só não inutiliza a tarefa das Escolas católicas, mas torna-a ainda mais urgente. Com efeito, por um lado estas consentem corresponder ao direito das famílias de assegurar aos próprios filhos uma educação fundada sobre os valores perenes do Evangelho e, por outro, oferecem à inteira sociedade centros educativos em que à qualidade da educação se une a de um sério trabalho formativo. Portanto, renovo com vigor os bons votos por que em todos os países democráticos finalmente se actue de modo concreto uma verdadeira paridade para as escolas não estatais que seja, ao mesmo tempo, respeitadora do seu projecto educativo: com efeito, tais escolas oferecem um serviço de interesse público, apreciado e procurado por inúmeras famílias.

O ambiente escolar em que, infelizmente, se encontram a viver as novas gerações exige de facto que a Escola cristãmente inspirada continue a ser oferecida a quantos buscam nela um lugar ideal de formação e de evangelização. Os modelos negativos que com frequência são propostos aos jovens do nosso tempo exigem que os religiosos empenhados no âmbito educativo continuem «com fidelidade criativa» (cf. Vita consecrata VC 37) a sua própria missão, tendo em vista realizar o mandato de Jesus: «Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa Nova a toda a criatura » (Mc 16,15).

Com efeito, a educação constitui um moderno areópago em que a Igreja, hoje mais do que nunca, é chamada a desempenhar a sua missão de evangelização e de caridade cultural (cf. Vita consecrata, VC 96).

4. José de Calasanz não se limitou a promover a «escola para todos», ideal que sucessivamente foi reconhecido como um dos direitos fundamentais do homem; ele quis que a sua escola, animada por mestres especialmente empenhados na evangelização, se destinasse «principalmente aos jovens pobres » (Constitutiones [1622] n. 4, 198). Tal delineamento, que no século XVI parecia deveras inovativo, revela-se hoje mais do que nunca actual. De facto, nas áreas marginalizadas dos países abastados e sobretudo nas nações em vias de desenvolvimento, muitas crianças ainda são insuficientemente escolarizadas ou encontram-se totalmente abandonadas à própria sorte, de tal forma que a evangelização dos pobres continua a ser um sinal profético da presença do Reino de Deus no meio dos homens (cf. Vita consecrata VC 89-90). Se José de Calasanz soube ver no rosto daquelas crianças romanas, abandonadas a si mesmas, o reflexo da face de Cristo, agora compete a vós, em um mundo onde os povos e as pessoas só são valorizados e tidos em consideração em função da sua relevância económica, mostrar ao mundo que os pequeninos e os pobres continuam a ser os preferidos do coração de Cristo.

Se a Escola católica é um lugar preferencial de evangelização, hoje a escola popular de José de Calasanz é em muitos casos um lugar de missão. Como recordei na Exortação pós-sinodal Vita consecrata, os religiosos educadores devem sentir-se particularmente comprometidos «a serem fiéis ao seu carisma originário e às suas tradições, cientes de que o amor preferencial pelos pobres encontra uma das suas aplicações particulares na escolha dos meios mais aptos para libertar os homens daquela grave forma de miséria que é a falta de formação cultural e religiosa» (n. 97). 5.

Nas vossas obras educativas são cada vez mais numerosos os leigos que compartilham convosco o ministério de José de Calasanz, de diferentes maneiras e a vários níveis. Segundo o exemplo do vosso Fundador que, desde o princípio, associou sacerdotes e leigos ao seu apostolado educativo, exorto-vos a juntos interpretar vias de qualificada e fraterna colaboração no âmbito da elaboração e da transmissão da cultura, para que a riqueza do carisma peculiar do vosso Instituto possa continuar a dar frutos na Igreja e na sociedade (cf. Ibid., 54). Em vista desta finalidade, será necessário intensificar a formação espiritual, teológica e cultural, a fim de que religiosos e leigos possam realizar o ideal do educador cristão na tríplice fidelidade «ao espírito do vosso Fundador, à Igreja e à causa da Escola católica» (Paulo VI, Alocução de 26 de Agosto de 1967).

A Maria, a primeira mestra e discípula de Jesus, sob cuja protecção se colocou o vosso Fundador, chamando-vos «Pobres da Mãe de Deus» (Constitutiones [1622] n. 4), confio Vossa Reverência, bem como toda a Ordem de José de Calasanz. O exemplo da Virgem vos encoraje a seguir Cristo em tudo, com o espírito das crianças, destinatárias privilegiadas do Reino de Deus (cf. Lc Lc 18,16-17).

Com estes bons votos, concedo a todos de coração uma especial Bênção apostólica.

Vaticano, 24 de Junho de 1997.

                                                                                    Julho de 1997

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO «VI CURSO ANUAL DE


VERÃO SOBRE ASTROFÍSICA»


3 de Julho de 1997



Senhoras e Senhores
Queridos amigos jovens

É sempre um prazer para mim receber os participantes no Curso anual de Verão sobre Astrofísica, promovido pelo Observatório do Vaticano, e é-o igualmente este ano. Dou-vos as cordiais boas-vindas aqui, tornando-as extensivas também ao grupo de amigos e benfeitores do Observatório do Vaticano que se uniram a vós nestes últimos dias da vossa sessão de estudo.

«Jovem, regozija-te na tua mocidade... lembra-te do teu Criador nos dias da tua juventude» (Qo 11,9 Qo 12,1). Ao ver este grupo de jovens estudantes provindos de muitos países diferentes, vêm à mente estas palavras da Sagrada Escritura. Sem dúvida, tendes boas razões para vos alegrardes com as dádivas que Deus vos concedeu, ao olhardes para o futuro com confiança. A minha esperança é de que a investigação nas vastas extensões do universo e nos mistérios do tempo e do espaço desperte em vós o temor da sabedoria infinita do Criador e um respeito cada vez maior pela dignidade de cada ser humano criado à Sua imagem. Pois o futuro da família humana depende não só do desenvolvimento do conhecimento e da tecnologia, mas dos esforços de homens e mulheres de sabedoria, clarividência e solicitude apaixonada pela edificação de um mundo de justiça, paz e autêntica solidariedade.

Prezados amigos, ao formular-vos os meus sinceros bons votos pelos vossos estudos, invoco cordialmente sobre vós e as vossas famílias as bênçãos mais ricas de Deus Todo-poderoso.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL


DO BURKINA FASSO E DO NÍGER


EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM»


4 de Julho de 1997



Prezados Irmãos no Episcopado

1. Acolho-vos com grande alegria nesta casa, a vós que recebestes do Senhor o cargo de guiar a Sua Igreja no Burkina Fasso e no Níger. Viestes a Roma para efectuar a vossa visita ao túmulo dos Apóstolos e para vos encontrar com o Sucessor de Pedro, a fim de receberdes luz e apoio para a vossa missão episcopal, «para a edificação do Corpo de Cristo» (Ep 4,12), em comunhão com a Igreja universal. Agradeço a D. Jean- Baptiste Somé, Bispo de Diebugu e Presidente da vossa Conferência Episcopal, as amáveis palavras e a apresentação clarividente da vida da Igreja no vosso país. Através de vós, dirijo uma saudação afectuosa a cada uma das vossas comunidades diocesanas e ao conjunto dos habitantes da vossa região, cuja hospitalidade calorosa pude apreciar em duas ocasiões. Permiti-me citar aqui o Cardeal Zoungrana, grande figura da Igreja que está no Burkina Fasso, bem como os novos Bispos recentemente eleitos, a quem transmito o meu encorajamento e a minha ardente oração. A criação de novas Dioceses no vosso país é um sinal eloquente da vitalidade da Igreja no meio dos povos desta região. No ano em que a Igreja no Níger celebra o quinquagésimo aniversário da sua fundação, sinto-me feliz por me associar à alegria e à esperança de D. Guy Romano, há pouco nomeado Bispo de Niamey, e da comunidade católica desse país, cujo dinamismo evangélico me é conhecido.

2. Na véspera do novo milénio, a Igreja celebrará solenemente o primeiro centenário do início da evangelização no Burkina Fasso. É bom que graças à vossa iniciativa os cristãos tenham sido convidados a conhecer e meditar a história das suas comunidades no curso deste século, que viu germinar e crescer a semente lançada desde a fundação do primeiro posto de missão em Koupéla, em 1900. Juntamente convosco, presto homenagem aos missionários que se despenderam com zelo admirável a fim de que fosse transmitida a Boa Nova e nascessem as comunidades autóctones que hoje vemos desenvolver-se de maneira notável. Ao fazerem memória deste caminho da Igreja que está no Burkina Fasso rumo ao seu centenário, os cristãos dão graças ao Senhor com ardor por todas as dádivas recebidas e serão encorajados a perseguir com fervor a obra empreendida pelos seus pais na fé.

Para os fiéis dos dois países, este tempo jubilar é a ocasião privilegiada para enraizar mais profundamente a própria fé em Jesus Cristo, único Mediador e Salvador de todos os homens; permitir-lhes-á também renovar o seu esforço missionário a fim de que o anúncio da salvação possa alcançar um maior número de pessoas. Nesta perspectiva, a obra de edificação da Igreja-Família, que perseguis com abnegação e com grande solicitude pela inculturação do Evangelho, dá testemunho do amor e do respeito que, como discípulos de Cristo, tendes em relação aos vossos povos, às suas culturas e à África inteira. Faço ardentes votos por que a Exortação apostólica Ecclesia in Africa, fruto do momento de graça que foi a Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a África, venha a constituir para cada uma das vossas Igrejas locais a carta da sua própria missão evangelizadora no início da nova etapa que se abre à sua frente.

3. Em comunhão convosco no vosso múnus episcopal, os vossos sacerdotes trabalham com generosidade para fazer nascer e crescer o povo de Deus, como testemunhas fiéis de Cristo no meio dos seus irmãos e irmãs. O Concílio ensina que, chamados à perfeição pela graça do seu baptismo, os sacerdotes devem buscar a santidade de uma maneira particular, em virtude do ministério próprio que lhes é confiado no sacramento da Ordem (cf. Presbyterorum ordinis PO 12). Portanto, convido aqueles que têm «como dever primordial anunciar o Evangelho de Deus» (Ibid., n. 4), a conformar toda a própria existência com a grandeza do mistério que eles mesmos anunciam, mediante uma vida espiritual que se alimenta da Palavra de Deus na sua vida e na vida dos homens. Recordem-se também que é na celebração da Eucaristia, «fonte e ápice de toda a evangelização », que se enraíza a sua vida sacerdotal! Juntamente com Cristo que entregou a vida pela salvação de todos os homens, tornar-se-ão verdadeiros servidores dos seus irmãos.

Para reavivarem incessantemente o sentido da missão que lhes é confiada e para lhes corresponderem de maneira adequada, os sacerdotes devem buscar a formação permanente em todas as idades e em todas as condições de vida. Com efeito, sustentando o exercício do ministério sacerdotal, esta formação «tende a fazer com que o Padre seja um crente e se torne sempre mais crente: que veja sempre verdade própria, com os olhos de Cristo» (Pastores dabo vobis PDV 73). Portanto, faço votos por que nas vossas Dioceses permaneça viva esta solicitude indispensável para o cumprimento da tarefa pastoral dos sacerdotes.

A próxima abertura de um novo seminário interdiocesano de primeiro ciclo é um importante sinal de esperança para o futuro da Igreja. O discernimento exigente das vocações e a necessidade de dar aos candidatos ao sacerdócio uma solidez humana, espiritual e pastoral são graves responsabilidades dos Bispos, primeiros representantes de Cristo na formação sacerdotal (cf. Ibid., n. 65).

A vitalidade e o desenvolvimento da vida consagrada, especialmente dos Institutos que surgiram na vossa região, constituem significativos progressos para uma autêntica inculturação da mensagem evangélica. «Se a vida consagrada mantiver a força profética que lhe é própria, torna-se fermento evangélico dentro de uma cultura, capaz de a purificar e elevar» (Vita consecrata VC 80).

4. Mediante os vossos relatórios, constatei o importante papel que os leigos desempenham na vida das vossas comunidades. Através da diversidade dos seus compromissos, realizam a própria vocação de baptizados na Igreja e na sociedade. Dirijo-lhes o apelo a permanecerem «assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à fracção do pão e às orações» (Ac 2,42), sobretudo participando activamente na vida das paróquias e das comunidades cristãs de base, que são lugares privilegiados de nascimento e desenvolvimento da Igreja-Família. Formulo votos por que nos seus numerosos movimentos de apostolado e reuniões espirituais encontrem os instrumentos para criar, em união fraterna, ardentes centros de evangelização e que, mediante a sua acção na vida da cidade se tornem fermentos de transformação da sociedade.

Desejais sustentar os jovens das vossas Dioceses nas suas aspirações a encontrar um lugar activo e reconhecido na Igreja-Família e na vida do seu país. Como já o fiz, exorto os jovens africanos a ter a audácia evangélica de assumir o desenvolvimento da sua nação, de amar a cultura do seu povo, de trabalhar para a sua redinamização, permanecendo fiéis à sua herança cultural, aperfeiçoando o seu espírito científico e técnico, e sobretudo dando testemunho da sua fé cristã (cf. Ecclesia in Africa ).

Quereria dirigir um encorajamento particular aos catequistas titulares e auxiliares, aos «catequistas pais e mães de família», cujo papel é primordial na transmissão da fé. Exorto-os a utilizar os meios que lhes são oferecidos para aprofundar o próprio conhecimento de Cristo e da doutrina da Igreja. Assim, poderão cumprir a sua missão de modo mais competente, compartilhando com os seus irmãos a própria experiência do encontro com o Senhor. Bispos e sacerdotes, sede para eles guias atentos e sustentáculos quotidianos! Por outro lado, sob a vossa direcção, em íntima união com os seus sacerdotes, os catequistas desempenham um papel precioso no acolhimento e acompanhamento das pessoas que desejam pôr-se em caminho na sequela de Cristo, em vista de os conduzir, ao longo do catecumenato, a uma adesão de fé sincera e a uma plena integração na comunidade eclesial. Com efeito, o Baptismo significa e actua o «novo nascimento no Espírito, instaura vínculos reais e indivisíveis com a Trindade, torna-nos membros do Corpo de Cristo, que é a Igreja. Portanto, um itinerário de conversão que não chegasse ao Baptismo, ter-se-ia detido a meio da estrada» (Ecclesia in Africa ).

5. Nas sociedades africanas, a família ocupa um lugar fundamental. Assim, é necessário preservar os seus valores essenciais. A família cristã deve ser um lugar privilegiado onde se dá testemunho de Cristo e do seu Evangelho. Educadora para cada um dos seus membros, ela é escola de formação humana e espiritual. Os cristãos recordar-se-ão também de que «o matrimónio exige um amor indissolúvel; graças a esta estabilidade, pode contribuir eficazmente para realizar em plenitude a vocação baptismal dos esposos» (Ibid., n. 83). Uma séria preparação dos jovens para o sacramento do matrimónio levá-los-á à conquista e à plena maturidade do seu compromisso, formando uma verdadeira comunidade de amor. Encorajo-vos portanto a favorecer o acompanhamento das famílias cristãs nas diferentes etapas da sua formação e do seu desenvolvimento. Dedicai uma atenção muito especial às jovens famílias, para as ajudar a descobrir e a viver a sua vocação e as suas responsabilidades. Estai próximos das que se encontram mais expostas às dificuldades da vida.

6. Graças às suas obras de entreajuda, de promoção social, de serviço no mundo da saúde e da educação, a Igreja no vosso país participa no desenvolvimento do homem e da sociedade. Quereria elogiar aqui o admirável trabalho de tantos cristãos, sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos que demonstram com generosidade que a caridade está no âmago da missão da Igreja. Faço votos por que, de Uagadugu, ainda ressoem os meus apelos à solidariedade para com os povos do Sahel. É preciso recordar também que «o progresso de um povo, porém, não deriva primariamente do dinheiro, nem dos auxílios materiais, nem das estruturas técnicas, mas sobretudo da formação das consciências, do amadurecimento das mentalidades e dos costumes. O homem é que é o protagonista do desenvolvimento, não o dinheiro ou a técnica» (Redemptoris missio RMi 58). Alegro-me pelo empenhamento dos pastores e dos animadores de comunidades nesta obra de educação das consciências. Ainda recentemente vós, Bispos do Burkina Fasso, exortastes os fiéis e todos os homens de boa vontade a salvaguardar e a consolidar a paz social, a fim de contribuir para «humanizar a sociedade » num período delicado da vida colectiva. Formulo ardentes votos por que a paz e a concórdia reinem entre todas as componentes das nações da vossa região e que se encontre uma solução definitiva, fundada sobre a justiça e solidariedade, para os problemas que ainda se apresentam.

7. Nas pegadas do Concílio Vaticano II, o Sínodo africano recordou com insistência que «a atitude de diálogo é o modo de ser do cristão tanto na comunidade, como com os outros crentes e com os homens e mulheres de boa vontade » (Ecclesia in Africa ). Os relacionamentos fraternos dos católicos com os outros crentes devem, portanto, manifestar concretamente a comum responsabilidade dos discípulos de Cristo no testemunho que eles devem dar do Evangelho. Numerosos são também na vossa região os fiéis do Islão. E felicito-me pelas relações serenas que na maioria das vezes existem entre os crentes. Desejo vivamente que o conhecimento mútuo se desenvolva cada vez mais. A possibilidade, reconhecida pela sociedade, de escolher livremente a própria religião contribuirá para criar uma atmosfera de respeito, de fraternidade e de verdade que há-de favorecer um trabalho conjunto em benefício da promoção das pessoas e da colectividade. Neste mesmo espírito de diálogo fraterno, os cristãos dêem preclaro testemunho da sua fé em Jesus Salvador junto daqueles que seguem a religião tradicional ou outras correntes de pensamento!

8. Estimados Irmãos no Espiscopado, a diversidade das situações da Igreja nos vossos países, bem como as grandes necessidades das vossas Dioceses, especialmente em termos de pessoal apostólico, não me são desconhecidas. Assim, encorajo- vos a continuar, no interior da vossa Conferência Episcopal, uma generosa solidariedade em vista da missão. A partilha dos recursos humanos e materiais, mesmo quando se enfrentam necessidades urgentes, é uma expressão da comunhão que deve existir entre todas as Igrejas locais. Tende o cuidado de ajudar as Dioceses mais necessitadas a formar animadores e catequistas que permitam constituir comunidades vivas e activas. Convido os sacerdotes, os religiosos e as religiosas a tornarem-se disponíveis ao Espírito Santo, aos seus Bispos ou aos seus Superiores, a aceitarem ser enviados a anunciar o Evangelho para além das fronteiras da sua Diocese ou do seu país (cf. Ecclesia in Africa ). Hoje compete a vós dar aos outros o que vós mesmos recebestes de missionários que chegaram de outros lugares e que o Senhor fez crescer no meio de vós.

9. No termo do nosso encontro, desejaria unir-me uma vez mais, com o pensamento e o coração, ao povo que vos é confiado na terra do Burkina Fasso e do Níger. Já entrámos na preparação directa do Grande Jubileu do Ano 2000, um tempo em que somos convidados a fixar o nosso olhar na pessoa de Cristo, Filho de Deus que Se fez homem. Portanto, é com confiança que vos convido a enfrentar o futuro na Sua presença. No meio das dificuldades e dos conflitos que o continente africano conhece, que as vossas comunidades sejam audaciosos sinais de esperança, pela caridade que saberão viver e transmitir. Oxalá demonstrem a todos que o Senhor não abandona aqueles que sofrem, quem se sente rejeitado ou excluído da sociedade! Confio as esperanças e os sofrimentos dos vossos povos à intercessão materna da Mãe do Salvador. Do íntimo do coração vos concedo a Bênção apostólica, que de bom grado torno extensiva aos sacerdotes, aos religiosos, às religiosas, aos catequistas e a todos os fiéis leigos das vossas Dioceses.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO 44° CAPÍTULO GERAL


DOS PADRES DAS ESCOLAS PIAS


Sábado, 5 de Julho de 1997



Caríssimos Irmãos

1. Estou feliz por dirigir a minha cordial saudação a todos vós, congregados em Roma para o vosso Capítulo Geral, que se celebra no quarto centenário da abertura da primeira escola pública popular gratuita da Europa, por obra de São José de Calasanz, na Primavera de 1597, no bairro romano denominado «Trastevere».

Recordando o passado, propondes-vos a analisar o presente, para enfrentar os seus desafios. É a isto que vos impele o tema da vossa Assembleia capitular, convidando-vos a reflectir sobre: «O carisma e o ministério das Escolas Pias hoje». Desejais interrogar-vos sobre o modo como corresponder às exigências de hoje, com acentuada sensibilidade no que concerne às actuais necessidades da Igreja e da sociedade, permanecendo todavia fiéis ao espírito das origens. Não posso deixar de vos encorajar a este propósito, mais oportuno do que nunca.

Dirijo a minha saudação ao Pe. José Maria Balcells Xuriach, Prepósito-Geral da Congregação, agradecendo-lhe as devotas expressões que quis transmitir-me em nome dos presentes. Ao mesmo tempo, desejo fazer chegar à inteira Família dos membros das Escolas Pias um vivo agradecimento pela preciosa obra no difícil campo da educação, encorajando-a neste importante serviço a favor das jovens gerações. Trata-se de um apostolado não fácil, mas indispensável para a difusão do Evangelho e da cultura cristã, bem como para a formação de fiéis amadurecidos e responsáveis.

2. Compreendeu-o bem o vosso Fundador, que não se limitou a promover a «escola para todos», mas tomou como modelo Cristo e procurou transmitir aos jovens, além da ciência profana, também a sabedoria do Evangelho, ensinando- lhes a captar, nas vicissitudes pessoais e na história, a acção amorosa de Deus Criador e Redentor.

Segundo o exemplo do divino Mestre, que «viu uma grande multidão e compadeceu- Se deles, porque eram como ovelhas sem pastor. Começou então a ensiná-los» (Mc 6,34), dedicou-se particularmente aos pobres. Portanto, São José de Calasanz pode justamente ser considerado o verdadeiro fundador da moderna escola católica, que visa a formação integral do homem e está aberta a todos. A iniciativa que tomou há 400 anos conserva ainda hoje uma sua específica razão de ser: no ambiente secularizado em que se encontram a viver as novas gerações é mais importante do que nunca que lhes seja oferecida uma escola cristãmente inspirada. Por este preciso motivo, na Carta que há alguns dias diriji ao vosso Prepósito-Geral, expressei de novo os bons votos por que «em todos os países democráticos finalmente se actue de modo concreto uma verdadeira paridade para as escolas não estatais que seja, ao mesmo tempo, respeitadora do seu projecto educativo» (24 de Junho de 1997, n. 4, publicada na pág. 4 deste n. de L'Osservatore Romano).

3. Objecto da vossa reflexão, durante este Capítulo Geral, é a missão específica dos Religiosos das Escolas Pias no hodierno mundo da educação. A este propósito, apraz-me evidenciar que correspondem a um vosso peculiar carisma que, como tal, constitui uma significativa contribuição eclesial. A vossa obra na escola deve reflectir a vossa total consagração a Deus, na sequela de Cristo. Isto consente-vos tornar presente no mundo da cultura aquele horizonte transcendente em que a questão do sentido da existência humana encontra uma resposta plena, à luz do desígnio de Deus em Cristo, por meio do Espírito.

Por isso, os valores da fé deverão permear os vossos projectos pastorais e pedagógicos não menos que a sua realização concreta. Sustentados pelo amor e pela dedicação a Jesus Cristo, sois chamados a acompanhar aqueles que Deus confia aos vossos cuidados, orientando-os com o vosso conselho na resposta à vocação que Deus dirige a cada um.

Como filhos de José de Calasanz, também não deixareis de dar prioridade à educação de quem, por algum motivo, se encontra marginalizado e excluído. Fiéis ao vosso carisma originário e às vossas tradições, procurareis fazer quanto está ao vosso alcance para oferecer a tais jovens a oportunidade de libertar-se da grave forma de miséria que é a falta de formação cultural e religiosa.

Além disso, quereria recordar-vos com afecto que esta vossa presença específica no mundo da educação cristã só será possível se cada um dos membros das Escolas Pias e todas as comunidades da Ordem cultivarem com diligência uma profunda espiritualidade evangélica, alimentada pela escuta da Palavra de Deus, pelas celebrações litúrgicas, pela oração pessoal e comunitária, pela prática das virtudes e pelo constante empenhamento ascético. De tudo isto vos deu exemplo o vosso santo Fundador, que vos deixou também a memória escrita nas Constituições e nas Cartas.

4. Caríssimos Irmãos, na vossa missão educativa cooperaram desde o início educadores leigos, cuja contribuição numérica e qualitativa se multiplicou nos nossos dias. O vosso Fundador recomendava- vos que considerásseis os mais próximos em espírito e dedicação como verdadeiros membros da comunidade. Com o seu testemunho de fé e a sua competência profissional, esses tornamse exemplo concreto e vivo da vocação laical para todos os alunos.

Com efeito, é tarefa precisamente dos educadores cristãos leigos integrar na sua vida pessoal e na sua actividade pedagógica quer a fé quer a cultura, tornando assim presente o Evangelho no nosso mundo secular. E isto não em maneira puramente teórica ou intelectualista, mas na própria concretitude do exercício da sua missão educativa: no contacto quotidiano com os alunos, ajudam- nos a conjugar vitalmente valores humanos e cristãos. Desta forma, os educadores leigos contribuem para a evangelização das jovens gerações e, através destas, para a renovação da sociedade do futuro.

5. Caríssimos Padres das Escolas Pias, desejo abundantes frutos para a vossa Assembleia capitular e formulo votos por que cada um saiba haurir constantemente da riqueza do ensinamento de Cristo Mestre, cujas palavras «são espírito e vida» (Jn 6,63), em benefício de quantos estão confiados ao vosso ministério docente.

Maria Santíssima, cujo nome resplandece no mesmo título da vossa Ordem de «Pobres da Mãe de Deus», e a quem São José de Calasanz recomendava frequentemente o Instituto, vos assista sempre, tornando fecundos os vossos afãs apostólicos. Recordai o que o Santo vos pedia, exortando-vos a invocá-la com plena confiança: «Que a importunidade se refira à nossa Mãe e não aos homens, pois as nossas importunidades não lhe são incómodas, mas aos homens sim» (Carta 58). Portanto, não temais ser «importunos» com a Virgem Santíssima, que venerais a título especial como vossa Mãe!

Com estes sentimentos, concedo-vos de coração a minha Bênção que de bom grado torno extensiva aos vossos Coirmãos e Colaboradores, bem como a todos aqueles que o vosso empenho educativo tem em vista.



PALAVRAS DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PADRES ROGACIONISTAS


DO CORAÇÃO DE JESUS NO CENTENÁRIO


DO NASCIMENTO DA SUA CONGREGAÇÃO


Sábado, 26 de Julho de 1997





A hodierna celebração eucarística, na memória litúrgica dos Santos Joaquim e Ana, pais de Maria Santíssima, reveste um significado particular, de modo especial para vós, caros Padres Rogacionistas do Coração de Jesus, aos quais saúdo cordialmente. Estou feliz por me unir a vós ao dar graças ao Senhor pelo centenário do nascimento da vossa Congregação, que brotou do coração generoso do Beato Aníbal Maria de França, cujo septuagésimo aniversário da morte celebra-se neste ano. A Eucaristia é o ápice da oração eclesial: nela encontra cumprimento também a oração de Cristo e da Igreja pelas vocações, segundo o explícito mandato do Senhor: «Por isso, pedi ao Senhor da messe que mande trabalhadores para a Sua messe» (Mt 9,38). Nestas palavras evangélicas Aníbal Maria de França encontrou a «via» para responder plenamente à vontade de Deus. Fazendo-a sua, tornou próprios os sentimentos do Coração do Bom Pastor, repleto de compaixão pelo rebanho do Pai.

Por intercessão de Maria, Mãe de toda a vocação cristã, e dos seus Santos Pais, que hoje veneramos, imploremos o dom do Espírito Santo, para que forme na Igreja homens e mulheres apaixonados de Cristo e do Evangelho, prontos a darem-se a si mesmos, com todo o coração e com todas as forças, pelo Reino de Deus. E o vosso Beato Fundador obtenha, para vós e para a vossa inteira Família espiritual, o dom de um renovado florescimento apostólico e missionário.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


POR OCASIÃO DO XXIII CONSELHO GERAL


DA ALIANÇA MUNDIAL DAS IGREJAS REFORMADAS






À Drª Jane Dempsey Douglass
Presidente da Aliança Mundial das Igrejas Reformadas

Sinto-me feliz por aproveitar o ensejo proporcionado pela presença do Cardeal Edward I. Cassidy, Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, no encontro realizado por ocasião do XXIII Conselho Geral da Aliança Mundial das Igrejas Reformadas, realizado de 8 a 20 de Agosto em Debrecen (Hungria), para enviar calorosas saudações a Vossa Excelência e aos participantes nesta importante Assembleia, que tem como tema: Romper as Correntes da Injustiça!

Desde o Concílio Vaticano II, a Aliança Mundial das Igrejas Reformadas e a Igreja católica empenharam-se em duas fases de diálogo internacional, tendo em vista a resolução das diversidades doutrinais que ainda nos impedem de alcançar a unidade visível à qual Cristo chama os Seus discípulos. Outros contactos significativos também contribuíram para aumentar a compreensão entre nós. A Igreja católica está determinada a dar continuidade a este diálogo teológico, de forma a podermos aumentar as convergências já alcançadas e enfrentar as questões que ainda devem ser resolvidas, a fim de juntos podermos louvar o Senhor Jesus Cristo, único Mediador entre Deus e a humanidade (cf. 1Tm 2,5).

Nos anos passados, tive a ocasião de visitar alguns países na Europa Central e Oriental onde com frequência, desde há séculos, católicos e cristãos reformados se embatiam uns contra os outros. Recordo-me bem da minha visita a Debrecen, em 1991. Ali participei num serviço ecuménico na Igreja reformada e em seguida visitei o monumento dedicado às vítimas protestantes das guerras religiosas, que nesse lugar são homenageadas. Isto constituiu um sinal de que católicos e reformados devem continuar a buscar uma purificação das memórias, como parte integrante da sua comum peregrinação rumo à unidade. Todas as comunidades cristãs têm mártires da fé (cf. Ut unum sint UUS 83) e frequentemente a tragédia que está por detrás disto consiste no facto de a caridade evangélica, que deveria inspirar cada um, não ter sido bastante forte a ponto de assegurar um igual respeito recíproco.


Discursos João Paulo II 1997 - 24 de Junho de 1997