Discursos João Paulo II 1997

O vosso Conselho Geral encontra-se a poucos anos de distância do Grande Jubileu do Ano 2000, quando os cristãos hão-de comemorar a Encarnação do Filho de Deus, nossa única luz e esperança. Rezo para nos aproximarmos deste aniversário num espírito de gratidão genuína por termos começado, nestes últimos anos e mediante a graça de Deus, a sanar as divisões do passado. O Senhor nos ajude a continuarmos a enfrentar juntos o desafio apresentado pela oração, em benefício dos Seus discípulos: «Para que todos sejam um só... a fim de que o mundo acredite» (Jn 17,21). Com estes sentimentos, invoco as bênçãos de Deus para a vossa Assembleia: «A graça e a paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo estejam convosco» (Rm 1,7).

Vaticano, 30 de Julho de 1997.

                                                                              Agosto de 1997

JOÃO PAULO II


MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO BISPO DE IGLESIAS POR OCASIÃO


DO ACAMPAMENTO NACIONAL


DOS ESCUTEIROS CATÓLICOS ITALIANOS






Ao Venerado Irmão D. ARRIGO MIGLIO
Bispo de Iglesias
Assistente Eclesiástico Geral da AGESCI


1. É já iminente o «Acampamento Nacional das Comunidades Chefes» dessa Associação, que terá o seu ápice no grande «campo» nos «Piani di Verteglia », na Província de Avelino, onde se encontrarão cerca de doze mil escuteiros-chefes italianos, para reflectir sobre o tema «Estradas e pensamentos para o amanhã».

Agradeço-Te de coração e aos Responsáveis da AGESCI terdes-me convidado para este importante encontro, que traz à minha mente o encontro jubiloso tido com os «rovers» e as «sentinelas », que participaram no Acampamento Nacional nos «Piani di Pezza», a 9 de Agosto de 1986. Recordando aqueles momentos de grande entusiasmo juvenil e de ardente testemunho evangélico e não podendo, infelizmente, desta vez ir pessoalmente, desejo enviar para a circunstância a Ti e a todos os participantes uma especial mensagem.

2. Caríssimos chefes educadores da AGESCI, saúdo-vos com as palavras a vós familiares e que em tantas ocasiões apresentámos uns aos outros, quando vos encontrei nas minhas visitas às paróquias de Roma ou às dioceses italianas: Boa caminhada!

Dou graças ao Senhor pelo percurso do escutismo por vós realizado e pelo empenho e a constância que hoje demonstrais como educadores: sois colaboradores preciosos para a Igreja e para a inteira sociedade italiana, na missão educadora das crianças, dos adolescentes e dos jovens a vós confiados.

O Acampamento Nacional que estais a viver viu-vos «peregrinos» através das regiões do País, quase numa cadeia ideal que as unia entre si num comum empenho de solidariedade para com as gerações mais jovens. Agora, vê-vos reunidos numa «cidade» feita de tendas, imagem eficaz da condição do povo dos crentes, em caminho rumo «à cidade assentada sobre sólidos fundamentos, cujo arquitecto e construtor é Deus» (He 11,10). Ela representa para cada um de vós e para a vossa inteira Associação uma extraordinária ocasião de estímulo e de verificação, para definirdes sempre melhor os elementos qualificantes da vossa presença e do vosso empenho na Igreja e na sociedade, para orientardes o vosso caminho e o dos jovens a vós confiados, rumo a horizontes de esperança e de renovada confiança na beleza da vida e do serviço, para vos ajudardes reciprocamente a superar as dificuldades que encontrais como educadores, bebendo na rica e já longa tradição do escutismo católico por vós herdada.

3. Pusestes-vos a caminho depois de terdes escutado as múltiplas «chamadas» que vos chegam de várias partes: dos meninos e das suas famílias, dos jovens, da sociedade, das Igrejas particulares em que estais inseridos. São outros tan

tantos desafios que advertis no desempenho dum serviço educativo que exige, em primeiro lugar de vós, um caminho de crescimento espiritual e humano, para serdes testemunhas credíveis dos valores que propondes. Todos estamos bem convictos de que — como disse o meu venerado Predecessor, o Servo de Deus Paulo VI — o mundo hoje tem necessidade mais de testemunhas que de «mestres» (cf. Evangelii nuntiandi EN 41): por isso, no vosso Caminho dirigistes o olhar antes de tudo para o único Mestre, Jesus Cristo, escutando quotidianamente a sua Palavra e procurando os reflexos do Seu vulto naqueles que vivem com fidelidade o Seu ensinamento e, portanto, merecem o título de mestres: homens e mulheres que o Senhor nos faz encontrar como testemunhas no nosso caminho. «Cercados por um tão grande número de testemunhas» tende «os olhos fixos» n’Ele, Jesus, o Mestre, para não vos cansardes perdendo o ânimo (cf. Hb He 12,1-3), mas aprendendo d’Ele a reconhecer os verdadeiros mestres e não os falsos, os mestres de vida e não os de morte.

Um educador, um chefe deve continuamente saber discernir, estar vigilante. «Estai preparados!» é o vosso lema. Como uma sentinela, sabei perscrutar o horizonte para discernir de maneira oportuna as fronteiras sempre novas, para as quais o Espírito do Senhor vos chama. Que projecto de homem e de mulher, de casal e de família um educador é chamado a propor? O que significa empenhar-se de maneira concreta por um mundo mais solidário e mais justo? Como viver inserido harmoniosamente numa sociedade complexa e diversificada, sem perder a capacidade evangélica de ser sal da terra e luz do mundo?

Cada vez com mais frequência se dirigem a vós, meninos e jovens provenientes de famílias e âmbitos distantes da vida cristã, ou pertencentes a outras crenças religiosas, atraídos pela beleza e sabedoria do método do escutismo, aberto ao amor pela natureza e pelos valores humanos, impregnado de religiosidade e de fé em Deus, eficaz no educar para a responsabilidade e a liberdade. Trata-se dum desafio importante, que vos pede que concilieis a clareza e a plenitude da proposta de vida evangélica, com a capacidade de diálogo respeitoso da diversidade das culturas e das histórias pessoais, que hoje se entrelaçam também na Itália.

4. Podeis enfrentar estes desafios com confiança e vencê-los, precisamente partindo da experiência da tradição do escutismo católico, o das duas associações que vos precederam, a ASCI e a AGI, e o que a vossa associação, a AGESCI, está a viver há mais de vinte anos. O encontro do escutismo com a fé católica não colocou em segundo plano, antes, valorizou e pôs ainda mais em evidência a beleza e a importância dos valores humanos, que lhe caracterizam o método educativo, rico de consonâncias e de convergências com os valores evangélicos e com os fundamentos duma antropologia respeitosa do projecto de Deus criador e da dignidade e dos direitos fundamentais da pessoa humana.

Caríssimos chefes educadores da AGESCI, deixai-vos guiar por Aquele que é o único verdadeiro Mestre, um Mestre amoroso e exigente. Não tenhais medo de propor todo o Seu ensinamento, árduo mas que jamais decepciona, assim como não tendes medo de pedir aos vossos jovens que enfrentem empresas empenhativas, as que permitem alcançar os cumes dos montes e ?escobrir as fontes da alegria e do sentido da vida.

O vosso fundador, Baden Powell, gostava de indicar os dois grandes livros que deveis sempre saber ler: o livro da natureza e o livro da Palavra de Deus, a Bíblia. Trata-se de uma indicação segura e fecunda. Amando a natureza, vivendo nela e respeitando-a, aprendei a unir a vossa voz às milhares de vozes do bosque que louvam o Senhor; imersos nela continuai a celebrar os vossos momentos de oração e as vossas liturgias, que permanecerão no coração dos jovens como experiências inesquecíveis. Cultivando a vossa tradição de amor e de estudo da Bíblia, encontrareis veredas e estradas sempre novas para uma catequese original e eficaz, inserida no caminho da catequese da Igreja italiana e caracterizada pela riqueza dos símbolos e das ocasiões próprias do escutismo, segundo as preciosas indicações do vosso «Projecto Unitário de Catequese» e da «Vereda de Fé», subsídios que nestes anos predispusestes oportunamente para o caminho formativo dos vossos jovens, pelos quais todos vós, chefes educadores, sois responsáveis.

5. Caríssimos chefes da AGESCI, desejaria de todo o coração estar presente no meio de vós, na maravilhosa moldura natural dos «Piani di Verteglia», mas as circunstâncias não mo consentiram. Desejo encontrar cada um de vós em Paris para o Dia Mundial da Juventude, onde os Escuteiros poderão compartilhar com muitos outros «as estradas e os pensamentos para o amanhã», um amanhã de esperança e de paz, no novo milénio que verá como protagonistas também vós e os jovens a vós confiados.

Acompanhe-vos sempre Maria, Nossa Senhora dos Escuteiros, Aquela que acreditou de modo pleno na Palavra do Senhor e se pôs prontamente em caminho, para oferecer o seu serviço.

Caro Irmão, a Ti bem como a todos os sacerdotes empenhados na AGESCI, e a todos vós, chefes educadores, e aos vossos jovens, envio com afecto uma especial Bênção Apostólica.

Vaticano, 2 de Agosto de 1997.



JOÃO PAULO II




PALAVRAS DO PAPA JOÃO PAULO II


NO INÍCIO DA CELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA


PARA RECORDAR O 19° ANIVERSÁRIO


DA MORTE DO PAPA PAULO VI


Solenidade da Transfiguração, 6 de Agosto de 1997





Hoje é o aniversário da morte do meu venerado Predecessor, o Servo de Deus Paulo VI, falecido no dia da Festa da Transfiguração do Senhor, 6 de Agosto de 1978.

«Resplandece no seu rosto a gloria do Pai» (Refrão do Salmo responsorial). A hodierna Liturgia convida-nos a contemplar Cristo no evento da Sua gloriosa Transfiguração a fim de que, escutando a Sua palavra, possamos herdar a vida imortal. O inesquecível Pontífice viveu totalmente dedicado à causa do Evangelho. Amou Cristo com todas as forças e viveu pela Igreja, empenhada no fatigoso caminho conciliar. Ofereceu tudo a Deus, em particular nos últimos anos marcados pelos grandes sofrimentos, para que a Igreja fosse renovada pelo vigor do Espírito: «Poderia dizer que sempre a amei (a Igreja) – escrevia na perspectiva do não distante fim – ... que por ela, aliás, me parece ter vivido. Mas, gostaria que a Igreja o soubesse; e que eu tivesse a força de lho dizer, como uma confidência do coração, que somente no extremo momento de vida se tem coragem de fazer» (“Pensieri alla morte”).

Hoje, recolhemos esta confidência com grata veneração. Possa a lembrança deste Pontífice encorajar cada um de nós para um serviço sempre mais generoso à Igreja e ao Evangelho, que ela continua também hoje a anunciar no cumprimento fiel do mandato de Cristo.



PALAVRAS DO PAPA JOÃO PAULO II


NO INÍCIO DA AUDIÊNCIA GERAL


RECORDANDO O XIX ANIVERSÁRIO


DA MORTE DO PAPA PAULO VI


6 de Agosto de 1997



O pensamento dirige-se, hoje, antes de tudo para o meu venerado Predecessor, o Servo de Deus Paulo VI, no décimo nono aniversário da piedosa morte ocorrida em Castel Gandolfo, no dia 6 de Agosto de 1978, Festa da Transfiguração do Senhor.

Recordamo-lo com afecto e com a admiração de sempre, considerando como foi providencial a missão pastoral por ele exercida, nos anos da celebração do Concílio Vaticano II e da sua primeira aplicação. Viveu totalmente dedicado ao serviço da Igreja, que por ele foi amada com todo o seu vigor e pela qual trabalhou sem cessar, até ao fim da sua existência terrena.

Esta manhã, ao celebrar por ele a Santa Missa na capela do Palácio Apostólico de Castel Gandolfo, pedi ao Senhor que o exemplo de um tão fiel servidor de Cristo e da Igreja sirva de encorajamento e de estímulo para todos nós, chamados pela Providência divina a testemunhar o Evangelho no limiar do novo milénio.

Interceda por nós Maria, Mãe da Igreja, da qual continuamos a falar na catequese odierna.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO ABADE PRESIDENTE DA CONGREGAÇÃO


ITALIANA DA ORDEM CISTERCIENSE


: Ao dilecto Irmão LUIGI ROTTINI
Abade Presidente da Congregação italiana da Ordem Cisterciense

A Congregação Cisterciense de São Bernardo na Itália prepara-se, com alegria, para comemorar o quinto centenário da própria instituição, ocorrida a 23 de Dezembro de 1497, quando o Papa Alexandre VI, com a Constituição Apostólica Plantatus in agro dominico, decidiu com autoridade o seu início. Recordar a união das duas províncias cistercienses da Túscia e da Lombardia na nova Congregação, oferece a ocasião de louvar a Deus pelos favores divinos, concedidos nestes quinhentos anos à Ordem Cisterciense. A circunstância é, além disso, propícia para encorajar os monges a prosseguirem, com renovado empenho, no caminho traçado pelos seus fundadores São Roberto de Molesme, Santo Alberico e Santo Estêvão Harding, fiéis à Regra de São Bento, que lhes fora transmitida pelo grande Abade Bernardo.

A Congregação italiana da Ordem Cisterciense está a celebrar esta jubilosa ocorrência, enquanto a humanidade se prepara para cruzar o limiar do terceiro milénio. Deus entrou no tempo com a Encarnação do Filho unigénito e precisamente a Cristo é dedicado este primeiro ano do triénio de preparação para o Jubileu do Ano 2000. São Bernardo deu grande relevo à pessoa de Cristo, ressaltando a Sua total «kenosi» no mistério da Encarnação. O eterno Filho de Deus veio entre nós, fez-Se obediente até à morte e guia-nos rumo à plenitude da vida eterna, pela via da humilde e constante adesão à vontade do Pai. A esse exemplo procuram permanecer fiéis os crentes e, em particular, aqueles que a Providência divina chama a uma especial missão na Igreja e no mundo, mediante a vida consagrada. Os monges cistercienses, por sua parte, precisamente através da humildade e da obediência conservaram durante os séculos, embora no meio de provas, a unidade da Congregação, com grande vantagem para cada um dos seus membros.

Sinto-me feliz, portanto, de dirigir-lhe, Venerado Irmão, e à inteira Congregação monástica, nesta feliz circunstância, o meu pensamento de bons votos, recordando de modo especial o acolhimento caloroso que me foi reservado, durante a Visita pastoral de 25 de Março de 1979 à Basílica de Santa Cruz em Jerusalém.

Possa o jubileu, que vos aprestais a celebrar, constituir um convite a redescobrir cada vez mais a fundo o vosso carisma peculiar. Nos seus cinco séculos de vida, a Congregação experimentou como a divina Providência soube guiar os monges numa autêntica vida espiritual ou, como disse São Gregório a respeito de São Bento de Núrsia, a «habitar consigo mesmo», atendendo com diligência à própria purificação na ascese penitencial.

Sob o impulso da concepção beneditina da vida, numerosos monges fiéis ao opus Dei e sem «antepor nada ao amor de Cristo» (Regra de São Bento, cap. 4, 21), transcorreram santamente a sua existência em busca de Deus, sustentados pela convicção de que jamais é perdido o tempo que a Ele se doa.

Formulo de coração os mais vivos votos por que possais continuar com renovado fervor e zelo nesta via-mestra, aprovada por séculos de fecundidade espiritual, sem jamais deixar que desânimo ou cansaço diminuam o entusiasmo da vossa adesão ao Evangelho.

A Virgem Maria, à qual São Bernardo se dirigiu com ardentíssimo amor cantando os seus louvores com suma paixão, vos assista e guie os vossos passos. Obtenha Ela de seu Filho novas efusões de dons celestes sobre a vossa Família monástica, de maneira que a Congregação de São Bernardo na Itália seja oásis de evangelização, em vista do Grande Jubileu do Ano 2000.

Com estes votos concedo-lhe, Venerado Irmão, à inteira Comunidade monástica e àqueles que recebem os cuidados pastorais dos monges cistercienses, uma especial Bênção Apostólica.

Vaticano, 13 de Maio de 1997.



JOÃO PAULO II


XII JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE


79ª VIAGEM APOSTÓLICA DE JOÃO PAULO II – PARIS



NA CHEGADA À CAPITAL DA FRANÇA


21 de Agosto de 1997



Senhor Presidente da República

1. O seu acolhimento e as suas palavras sensibilizam-me profundamente, enquanto tenho a alegria de me encontrar mais uma vez na terra de França, por ocasião da XII Jornada Mundial da Juventude. Estou-lhe particularmente reconhecido pelas delicadas atenções que Vossa Excelência me testemunha; e aprecio a presença de numerosas personalidades que se dignaram participar nesta cerimónia.

Era natural que um dia os jovens católicos, representando os seus coetâneos de mais de cento e trinta países do mundo, desejassem reunir-se em Paris. Juntamente com eles, agradeço-lhe, Senhor Presidente, assim como às autoridades e aos serviços do Estado, a compreensão manifestada para com eles. Quer pertençam a nações europeias próximas quer a nações de outros continentes, todos se sentem felizes por ser acolhidos pelos franceses de todas as idades e por descobrir o valor das vossas tradições espirituais e culturais, das quais poderão apreciar melhor a importância para a história e para a Igreja, reconhecendo ao mesmo tempo a sua influência ainda hoje.

2. Ao dirigir-me a Vossa Excelência, Senhor Presidente, nas primeiras horas da minha permanência, desejo saudar cordialmente todos os franceses, aos quais faço votos por que experimentem a prosperidade e continuem a pôr ao serviço dos seus irmãos no próprio País, e em todos os continentes, as suas qualidades e ideais.

Numerosos jovens do mundo foram acolhidos nestes últimos dias nas diferentes regiões de França, e agora estão reunidos em Paris. Desejo aqui exprimir toda a gratidão da Igreja pela hospitalidade generosa demonstrada a estes visitantes nos departamentos e agora na Ilha de França. Agradeço de modo particular aos parisienses e aos habitantes da Ilha de França que, embora com alguns incómodos, permitem aos seus hóspedes viver estes dias nas melhores condições possíveis.

3. Numa circunstância tão excepcional, estou feliz por me encontrar com os fiéis de França, conservando a lembrança do acolhimento caloroso que por eles já me foi reservado muitas vezes, e sobretudo em Setembro passado. Juntamente com a Jornada Mundial, dois eventos marcam de modo particular este ano para os católicos franceses: penso em primeiro lugar no centenário da morte de Santa Teresa de Lisieux, exímia figura espiritual conhecida e amada no mundo inteiro, que os jovens de todos os povos justamente têm celebrado; em segundo lugar, amanhã terei a alegria de proclamar Beato Frederico Ozanam, apóstolo duma caridade respeitosa do homem e também analista clarividente dos problemas sociais. Estas duas personalidades diferentes são, entre muitas outras, testemunhas da contribuição fecunda dos católicos de França à Igreja universal.

4. A minha vinda a Paris assinala uma nova etapa numa espécie de vasto itinerário percorrido com os jovens através do mundo desde há doze anos, para um intercâmbio sempre renovado com eles, que vêm revigorar juntos a sua vontade de construir um mundo mais hospitaleiro, um futuro mais pacífico. Muitos deles, na sua região e nas respectivas nações, experimentam os sofrimentos que trazem consigo conflitos fratricidas e o desprezo do ser humano; com muita frequência, enfrentam a precariedade do trabalho e uma pobreza extrema; a sua geração procura com dificuldade não só um mínimo de meios materiais, mas também razões de vida e objectivos que motivem a sua generosidade. Dão-se conta de que não serão felizes se não estiverem bem integrados numa sociedade, na qual a dignidade humana é respeitada e a fraternidade é real. Eles têm aqui uma ocasião privilegiada para porem em comum as suas aspirações e comunicarem, uns aos outros, as riquezas das suas culturas e experiências.

A sua busca tem como impulso interior um interrogativo de ordem espiritual, que os levou a tomar o próprio bordão de peregrino, à imagem daqueles que os precederam atravessando os continentes como artífices de paz, irmãos dos homens e investigadores de Deus.

5. Senhor Presidente, Senhoras e Senhores, obrigado por terdes compreendido a importância desta vasta reunião da esperança na vossa insigne capital. Estou convicto de que os esforços, envidados para receber estes hóspedes tão diversos, produzirão frutos duradouros tanto para eles mesmos como para os vossos compatriotas.

Ao renovar-vos a minha gratidão pessoal, invoco de todo o coração sobre vós e sobre o inteiro povo francês os benefícios das Bênçãos divinas.



XII JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE


79ª VIAGEM APOSTÓLICA DE JOÃO PAULO II – PARIS


SAUDAÇÃO DO PAPA AOS MILHARES


DE JOVENS REUNIDOS NO «CAMPO DE MARTE»


Paris, 21 de Agosto de 1997



Jovens do mundo inteiro

O Bispo de Roma saúda-vos e transmite- vos a sua confiança e alegria por se encontrar convosco. Provindes de diferentes países e de todos os continentes. Representais não apenas a juventude francesa e europeia, mas também a da América do Norte, da América Central e do Sul, dos Arquipélagos e das Ilhas do Oceano Atlântico, a juventude de numerosos países africanos, das Ilhas do Oceano Índico, a juventude da Ásia, da Austrália, do Extremo Oriente e de todos os mares que circundam o continente asiático, e a juventude do Pacífico. É uma Jornada da Juventude verdadeiramente mundial! Vós sois a esperança do mundo, vós que aspirais a uma vida cada vez mais bela, fundamentada sobre os valores morais e espirituais que tornam livres e orientam os nossos passos rumo à eternidade.

Vós continuais a história da Jornada Mundial da Juventude. Vale a pena recordá-la. Realizou-se pela primeira vez em Roma, em 1984. A sucessiva teve lugar em Buenos Aires (1987). Em seguida, encontrámo-nos em Santiago de Compostela, na Espanha (1989), e em Czestochowa, na Polónia (1991). Esta última Jornada foi deveras particular, porque pela primeira vez nela participaram jovens provindos da ex-União Soviética: russos, ucranianos, bielo-russos, lituanos, letões, estonianos, representantes do Cazaquistão e das outras Repúblicas da Ásia Central, bem como cristãos do Cáucaso. Nessa ocasião, a dimensão mundial da Jornada da Juventude adquiriu uma nova amplitude. Em 1993 encontrámo-nos em Denver, nos Estados Unidos, e em 1995 em Manila, nas Filipinas, encontro este que contou com a participação mais numerosa, facilitada pela proximidade de grandes metrópoles. O encontro actual realiza-se em Paris. É preciso manter o nível de hospitalidade deste encontro. Dirijo os meus cordiais agradecimentos ao Cardeal Jean-Marie Lustiger, a D. Michel Dubost e aos organizadores deste encontro, particularmente aos jovens das diferentes dioceses francesas que prepararam a vinda dos seus coetâneos. Agradeço a D. Louis-Marie Billé, Presidente da Conferência Episcopal da França, o seu acolhimento, e aos Bispos franceses a hospitalidade das suas dioceses em relação aos hóspedes provenientes do mundo inteiro.

Dirijo uma deferente saudação às personalidades que representam as outras Igrejas cristãs e Comunidades eclesiais, bem como as que representam as Comunidades judaicas e muçulmanas; agradeço vivamente terem desejado participar neste encontro festivo da juventude católica.

Obrigado aos jovens delegados das Filipinas e da França, que vos convidam a formar a grande corrente da fé, da solidariedade, da amizade e da paz entre os países do mundo inteiro.

Vós seguis o exemplo dos jovens que, levando ramos de oliveira, foram ao encontro de Cristo que entrava em Jerusalém. Eles aclamavam a Cristo. Hoje, jovens de todos os continentes, vós reconheceis Cristo, que nos une em um jubiloso intercâmbio e em uma vigorosa solidariedade, e caminhais juntos rumo à felicidade que Ele nos oferece. Como sinal da vossa diversidade de origens e culturas, escolhestes o arco-íris; desta forma, exprimis a vossa acção de graças pelas alianças de Deus com a criação, até à aliança definitiva, selada pelo sangue do Salvador.

Saudação às delegações

Queridos jovens dos vários países de língua portuguesa!

Com grande alegria, dou-vos as boas-vindas!

Muito obrigado por estardes aqui! Peço a Maria Santíssima que obtenha para vós o dom de acolher com prontidão o convite de Cristo a conhecer a Sua morada e a permanecer sempre com Ele, para anunciar o seu Evangelho da esperança ao mundo inteiro.

Queridos jovens, Cristo é a nossa esperança; é a nossa alegria. Durante os próximos dias, abri o vosso coração e a vossa mente a Cristo.

Vós sois parte integrante da Igreja, que deseja revelar-vos o caminho da salvação e a vereda da felicidade.

Convido-vos a deixar-vos guiar pelo Senhor e a percorrer o caminho juntamente com Ele. No decurso desta semana, desejo-vos jornadas de graça e de paz.



XII JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE


79ª VIAGEM APOSTÓLICA DE JOÃO PAULO II – PARIS


MEDITAÇÃO DO SANTO PADRE


NO ENCONTRO COM OS JOVENS


Paris, 21 de Agosto de 1997



Queridos Jovens

1. Acabámos de escutar o Evangelho do lava-pés. Mediante este gesto de amor, na noite de Quinta-Feira Santa, o Senhor ajuda-nos a compreender o sentido da Paixão e da Ressurreição. O tempo que juntos viveremos está relacionado com a Semana Santa e, em particular, com os três dias que nos recordam o mistério da paixão, da morte e da ressurreição de Cristo. Isto está relacionado também com o processo de iniciação cristã e do catecumenato, ou seja, da preparação dos adultos para o baptismo, que na Igreja primitiva possuía um valor fundamental. A liturgia da Quaresma assinala as etapas da preparação dos catecúmenos para o Baptismo, celebrado durante a Vigília pascal. No decurso dos próximos dias, acompanhemos Cristo nas últimas etapas da Sua vida terrestre e contemplemos os grandiosos aspectos do mistério pascal, para afirmarmos a fé do nosso Baptismo; manifestemos todo o nosso amor ao Senhor, como Pedro o fez, dizendo- Lhe por três vezes à margem do lago, depois da Ressurreição: «Tu sabes que Te amo!» (cf. Jo Jn 21,4-23).

Na Quinta-Feira Santa, mediante a instituição da Eucaristia e do sacerdócio, bem como através do lava-pés, Jesus demonstrou claramente aos Apóstolos congregados o sentido da sua Paixão e da sua Morte. Também os introduziu no mistério da nova Páscoa e da Ressurreição. No dia da Sua condenação e da sua Crucifixão por amor dos homens, entregou a própria vida ao Pai, para a salvação do mundo. Na manhã de Páscoa, as santas mulheres e em seguida Pedro e João, encontraram o túmulo vazio. O Senhor ressuscitado apareceu a Maria Madalena, aos discípulos de Emaús e aos Apóstolos. A morte não teve a última palavra. Jesus saiu vitorioso do túmulo. Depois de se terem retirado no Cenáculo, os Apóstolos receberam o Espírito Santo, que lhes concedeu a força de serem missionários da Boa Nova.

2. O lava-pés, manifestação do amor perfeito, constitui o sinal de reconhecimento dos discípulos. «Vós deveis fazer a mesma coisa que Eu fiz» (Jn 13,15). Jesus, Mestre e Senhor, deixa o Seu lugar à mesa para tomar o do servo. Inverte as funções, manifestando a novidade radical da vida cristã. Demonstra humildemente que amar com palavras e actos consiste antes de mais em servir os próprios irmãos. Quem não aceita esta condição, não pode ser discípulo. Pelo contrário, quem serve recebe a promessa da salvação eterna.

Desde o nosso Baptismo, renascemos para a vida nova. A existência cristã exige que progridamos ao longo do caminho do amor. A lei de Cristo é a lei do amor. Transformando o mundo à maneira de um fermento, essa desarma os violentos e cede o lugar deles aos mais fracos e aos pequeninos, chamados a anunciar o Evangelho. Mediante a recepção do Espírito, o discípulo de Cristo é impelido a pôr-se ao serviço dos seus irmãos na Igreja, na família, na vida profissional, nas numerosas associações e na vida pública, a nível tanto nacional como internacional. Este processo é, de alguma forma, a continuação do baptismo e da confirmação. Servir é o caminho da felicidade e da santidade: assim, a nossa vida torna-se um caminho de amor rumo a Deus e aos nossos irmãos.

Ao lavar os pés aos discípulos, Jesus antecipa a humilhação da morte na Cruz, mediante a qual há-de servir o mundo de maneira absoluta. Ele demonstra que o Seu triunfo e a Sua glória passam através do sacrifício e do serviço: este é o caminho de todo o cristão. Não há maior amor que dar livremente a própria vida pelos amigos (cf. Jo Jn 15,13), pois o amor salva o mundo, constrói a sociedade e prepara a eternidade. Assim, sereis os profetas de um mundo novo. O amor e o serviço sejam as regras primordiais da vossa vida! No sacrifício de vós mesmos, havereis de descobrir o que recebestes e, por vossa vez, recebereis a dádiva de Deus.

3. Estimados jovens, como membros da Igreja, compete-vos dar continuidade ao gesto do Senhor: o lava-pés prefigura todas as obras de amor e de misericórdia que os discípulos de Cristo realizarão ao longo de toda a história, para fazer com que aumente a comunhão entre os homens. Hoje, também vós sois chamados a comprometer-vos neste sentido: aceitando seguir Cristo, vós anunciais que o caminho do amor perfeito passa através do dom total e constante de vós mesmos. Quando os homens sofrem, quando são humilhados pela miséria ou pela injustiça e são espezinhados nos seus direitos, apressai-vos em servi-los; a Igreja convida todos os seus filhos a empenharem-se a fim de que cada pessoa possa, antes de tudo, viver e ser reconhecida na sua dignidade originária de filho de Deus. Cada vez que servimos os nossos irmãos, não nos afastamos de Deus; muito pelo contrário, encontramo-Lo no nosso caminho e servimo-Lo. «Aquilo que fizestes ao mais pequenino dos meus irmãos, foi a Mim mesmo que o fizestes» (cf. Mt Mt 25,40). Desta forma, damos glória ao Senhor, nosso Criador e Salvador, fazemos crescer o Reino de Deus no mundo e contribuímos para o progresso da humanidade.

A fim de evocar esta missão essencial dos cristãos para com cada homem, particularmente para com os mais pobres, eu quis rezar no Trocadéro, no santuário dos direitos humanos, desde o início da Jornada Mundial da Juventude. Hoje rezemos juntos, de maneira especial pelos jovens que não dispõem da possibilidade nem dos meios para viver dignamente e receber a educação necessária para o seu crescimento humano e espiritual, devido à miséria, à guerra ou à enfermidade. Estejam certos do afecto e do apoio da Igreja!

4. Quem ama não faz cálculos, não busca vantagens. Age secreta e gratuitamente em benefício dos seus irmãos, sabendo que cada homem, quem quer que seja, tem um valor infinito. Em Cristo, não há pessoas inferiores ou superiores. Não existem senão os membros de um único corpo, que querem a felicidade uns dos outros e desejam construir um mundo hospitaleiro para todos. Mediante gestos de solicitude e através da nossa participação activa na vida social, testemunhamos perante o nosso próximo que desejamos ajudá-lo a tornar-se ele mesmo e a dar o melhor de si próprio, para a sua promoção pessoal e para o bem de toda a comunidade humana. A fraternidade exclui a vontade da potência e o serviço elimina a tentação ao poder.

Prezados jovens, trazeis em vós mesmos capacidades extraordinárias de dom, de amor e de solidariedade. O Senhor quer reavivar esta imensa generosidade que anima o vosso coração. Convido- vos a ir beber na fonte da vida que é Cristo, a fim de inventardes todos os dias os meios para servir os vossos irmãos no seio da sociedade em que vos compete assumir as vossas responsabilidades de homens e de fiéis. A humanidade tem necessidade de vós nos campos sociais, científicos e técnicos. Procurai aperfeiçoar incessantemente as vossas qualificações profissionais, a fim de exercerdes a vossa profissão com competência e, ao mesmo tempo, não negligencieis o aprofundamento da vossa fé, que há-de iluminar todas as decisões que tereis de tomar em vista do bem dos irmãos, na vossa vida pessoal e no vosso trabalho. Enquanto quereis ser reconhecidos pelas vossas qualidades profissionais, como não havereis também o desejo de crescer na vida interior, manancial de todo o dinamismo humano?

5. O amor e o serviço dão sentido à nossa vida, tornando-a bela, pois sabemos porque e por quem nos empenhamos. É em nome de Cristo que foi o primeiro a amar-nos e a servir-nos. O que há de mais importante do que estarmos consciente do facto que somos amados Como deixar de responder com júbilo à expectativa do Senhor? O amor é o testemunho por excelência que abre à esperança. O serviço aos irmãos transfigura a existência; manifesta que a esperança e a vida fraterna são mais vigorosas que toda a tentação ao desespero. O amor pode triunfar em todas as circunstâncias.

Desconcertado pelo gesto humilde de Jesus, Pedro diz-Lhe: «Senhor, Tu vais lavar-me os pés?», «Tu nunca vais lavar-me os pés!» (Jn 13,6 Jn 13,8). Assim como ele, também nós precisamos de algum tempo para compreender o mistério da salvação e às vezes recusamo-nos a percorrer o caminho estreito do amor. Só quem se deixa amar pode, por sua vez, amar. Pedro permitiu que o Senhor lhe lavasse os pés. Deixou-se amar e só então compreendeu. Queridos jovens, fazei a experiência do amor de Cristo: tomareis consciência daquilo que Ele fez por vós e então havereis de compreender. Somente quem vive em intimidade com o seu Mestre pode imitá-Lo. Quem se nutre do Corpo de Cristo encontra a força do gesto fraterno. Assim, entre Cristo e o Seu discípulo entretece-se um relacionamento de proximidade e união, que transforma profundamente o ser, para dele fazer um servo. Estimados jovens, chegais a perguntar-vos como servir a Cristo. No lava-pés, encontrais a via real para alcançar Cristo, imitando-O e descobrindo-O nos vossos irmãos.

6. Mediante o vosso apostolado, propondes aos vossos irmãos o Evangelho da caridade. Lá onde o testemunho da palavra é difícil ou impossível, em um mundo que não o aceita, através da vossa atitude tornais presente Cristo servo, pois a vossa acção está em consonância com o ensinamento d’Aquele a Quem vós anunciais. Trata-se de uma forma eminente de profissão da fé, que foi praticada com humildade e perseverança pelos santos. É um modo de significar que é possível sacrificar tudo à verdade do Evangelho e ao amor dos próprios irmãos, como Cristo o fez. Ao conformarmos a nossa vida com a Sua, vivendo como Ele no amor, adquirimos a verdadeira liberdade para respondermos à nossa vocação. Isto às vezes pode exigir o heroísmo moral, que consiste em empenhar-se com coragem no seguimento de Cristo, com a certeza de que o Mestre nos indica o caminho da felicidade. É somente em nome de Cristo que se pode ir até ao extremo do amor, no dom e no desapego.

Caríssimos jovens, a Igreja tem confiança em vós. Conta convosco para serdes testemunhas do Ressuscitado durante a vossa vida inteira. Agora ireis aos lugares onde se hão-de realizar as diversas vigílias. Festivamente ou em meditação, dirigi o vosso olhar para Cristo, a fim de penetrardes no sentido da mensagem divina e encontrardes a força para a missão que o Senhor vos confia no mundo, quer esta seja num compromisso de leigo, quer na vida consagrada. Vivendo assim a vossa existência quotidiana, com lucidez e esperança, mas sem tristeza nem desencorajamento, partilhando as vossas experiências, haveis de perceber a presença de Deus, que vos acompanha com docilidade. À luz da vida dos santos e de outras testemunhas do Evangelho, ajudai-vos uns aos outros a confirmar a própria fé e a ser os apóstolos do ano 2000, recordando ao mundo que o Senhor nos convida à Sua alegria e que a verdadeira felicidade consiste em dar-se por amor dos irmãos! Oferecei a vossa contribuição à vida da Igreja, que tem necessidade da vossa juventude e do vosso dinamismo.

No termo do encontro o Papa despediu- se dos jovens proferindo estas palavras:

Agora sabe-se por que o engenheiro Eiffel construiu esta torre. Para ter aqui, à volta dela, um grande encontro da juventude: o Dia mundial, que acabámos de inaugurar e que continuará amanhã e depois de amanhã, até domingo. Então, até à vista, até logo! Uma sugestão para esta noite: bom sono a todos!




Discursos João Paulo II 1997