Discursos João Paulo II 1997 - 16 de Outubro de 1997

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO CONGRESSO


CATEQUÉTICO INTERNACIONAL


17 de Outubro de 1997





Senhores Cardeais
Venerados Coirmãos no episcopado e no sacerdócio
Caros Irmãos e Irmãs!

1. É-me grato acolher-vos por ocasião deste Congresso Catequético Internacional, promovido para sublinhar a apresentação da editio typica do Catecismo da Igreja Católica e a renovada edição do Directório Geral para a Catequese. O número dos participantes, a actualidade dos temas postos em debate, a competência dos relatores fazem do encontro um evento de relevo na vida da Igreja.

Apresento a minha afectuosa saudação aos Senhores Cardeais, aos Presidentes das Comissões para a Catequese das Conferências Episcopais, aos Directores dos Departamentos Catequéticos Nacionais, aos Sacerdotes, aos Religiosos, às Religiosas, aos leigos empenhados, que de várias partes do mundo vieram aqui para colocar em comum proveito o fruto da sua experiência e preparação.

De coração agradeço a cada um o precioso serviço que presta à Igreja. De modo particular exprimo a minha gratidão ao Senhor Cardeal Joseph Ratzinger e ao Arcebispo D. Darío Castrillón Hoyos, os quais — com a ajuda dos seus colaboradores das Congregações para a Doutrina da Fé e para o Clero — organizaram e realizaram este importante encontro. Este constitui um sinal eloquente do lugar que ocupa na Igreja o cuidado de anunciar a Palavra de Deus aos homens do nosso tempo de maneira adequada. É a partir dos seus interrogativos que se deve ajudá-los a descobrir, através das palavras humanas, a mensagem de salvação trazida por Jesus Cristo. É este o complexo e delicado trabalho que hoje a Igreja está a realizar, empenhada em impregnar as diferentes culturas com a perene verdade do Evangelho.

2. O lema escolhido para este Congresso Catequético Internacional — «Tradidi vobis quod accepi» (1Co 5,3) — ilustra de maneira eficaz a natureza da fé e a missão evangelizadora da Igreja. A respeito disso, lemos no Catecismo da Igreja Católica: «A fé é um acto pessoal: resposta livre do homem à proposta de Deus que Se revela. Mas não é um acto isolado. Ninguém acredita só, como ninguém vive só. Ninguém se deu a fé a si mesmo, como ninguém a si mesmo deu a vida. Foi de outrem que o crente recebeu a fé; a outrem a deve transmitir. O nosso amor a Jesus (...) impele-nos a falar aos outros, da nossa fé. Cada crente é, assim, um elo na grande cadeia dos crentes. Não posso crer sem ser motivado pela fé dos outros, e pela minha fé contribuo também para guiar os outros na fé» (CIC 166).

Nesta tarefa de transmissão da fé o Catecismo da Igreja Católica propõe-se como instrumento particularmente autorizado. Nestes dias, reflectistes sobre ele para conhecer melhor as suas características e as finalidades. O Catecismo apresenta a Verdade revelada mostrando, à luz do Concílio Vaticano II, como é acreditada, celebrada, vivida e anunciada na Igreja. Bebendo abundantemente no precioso património do passado — sobretudo bíblico, litúrgico, patrístico, conciliar e magisterial — e tirando dele coisas novas e coisas antigas (cf. Mt Mt 13,52), exprime no hoje da nossa sociedade o imutável vigor da Verdade cristã. Torna-se assim eloquente testemunho do grau de conhecimento e de autoconsciência que a Igreja, no seu conjunto, possui em relação ao seu perene depósito de verdade. Como tal, o Catecismo propõe-se qual norma segura para o ensinamento da fé, e ao mesmo tempo como texto de referência, certo e autêntico, para a elaboração dos Catecismos locais.

3. Vigilante na esperança a Igreja, entre a Páscoa e a Parusia, deve cumprir o seu mandato escatológico proclamando o Reino de Deus e recolhendo de todo o universo o bom trigo do Senhor. O que ela deve absolutamente fazer, antes do retorno do Senhor, é proclamar o «evento Cristo», a sua Páscoa de morte e de ressurreição. Ser sacramento primeiro e universal de salvação é a sua missão essencial.

O ministério da Palavra coloca-se assim no centro mesmo da acção apostólica da Igreja, quer quando celebra a Eucaristia ou canta os louvores de Deus, quer quando instrui os fiéis sobre o modo de viver no quotidiano a própria fé. Bem longe de permanecer neutral, a Igreja está ao lado do cristão nos vários momentos da sua vida, a fim de o orientar para opções coerentes com as exigências inscritas na ontologia sobrenatural do seu Baptismo. É graças a esta acção «mistagógica» que a fé, desabrochada no Baptismo, se pode desenvolver e chegar àquela plena maturação, que é própria do cristão adulto e responsável.

É precisamente esta a tarefa da catequese. Tarefa não fácil! Devendo tomar em consideração o conjunto da vida do homem — tanto o aspecto profano como o religioso — a catequese deve arraigar- se no inteiro contexto da vida. Por outras palavras, deve ter em consideração não só os catequizandos, a realidade cultural e religiosa, mas também as suas condições sociais, económicas e políticas. É a vida inteira, nos seus aspectos concretos, que deve ser lida e interpretada à luz do Evangelho.

4. Isto supõe a atenta avaliação dos problemas que hoje o crente encontra, justamente desejoso de progredir ainda mais na inteligência da sua fé. Destes problemas certamente fazem parte os grandes interrogativos, que ao homem se apresentam acerca das suas origens, do significado da vida, da felicidade a que aspira, do destino da família humana.

Isto quer dizer que será sempre necessário um dúplice movimento para anunciar aos homens do nosso tempo, a Palavra de Deus, na sua integridade e na sua pureza, de maneira que se lhes torne inteligível e também fascinante. A descoberta do mistério integral da salvação supõe, por um lado, o encontro com o testemunho, oferecido pela comunidade eclesial, de uma vida inspirada no Evangelho. A catequese fala com maior eficácia daquilo que se manifesta realmente na vida concreta da comunidade. O catequista é, por assim dizer, o intérprete da Igreja perante aqueles que por ele são catequizados. Ele lê e ensina a ler os sinais da fé, dos quais o principal é a própria Igreja.

Ao mesmo tempo, o catequista deve saber discernir e valorizar as conexões espirituais já presentes na vida dos homens, segundo o método fecundo do diálogo salvífico. É uma tarefa que se repropõe continuamente: a catequese deve saber recolher os interrogativos que se elevam do coração do homem, a fim de os orientar para as respostas oferecidas pelo Amor, que cria e salva. A meditação orante da Sagrada Escritura, o aprofundamento fiel das «maravilhas de Deus» ao longo de todo o arco da história da salvação, a escuta da Tradição viva da Igreja e a atenção dirigida à história dos homens, ligando-se entre si, podem ajudar os homens a descobrir aquele Deus que já actua no segredo do seu coração e da sua inteligência, para os atrair a Si e os cumular do Seu amor, fazendo-os seus filhos no Filho unigénito.

5. Caros Irmãos e Irmãs, possa este Congresso Catequético Internacional fortalecer a colaboração fecunda do ministério sacerdotal, da vida religiosa e do apostolado dos leigos para um renovado anúncio da Palavra da salvação, missão essencial da Igreja e, ao mesmo tempo, fonte perene da sua alegria ao gerar novos filhos. Com um só coração, todos nós devemos ocupar-nos incansavelmente desta tarefa fundamental que Cristo confiou à sua Igreja: levar ao mundo a Palavra viva, para o libertar do pecado e fazer resplandecer nele as virtudes e as capacidades da vida nova em Cristo.

Com estes votos invoco sobre todos vós a abundância das graças divinas e, em penhor de consolo e conforto, concedo-vos com afecto a minha Bênção.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS ADMINISTRADORES DA


«COVENANT HEALTH SYSTEMS»


DA ARQUIDIOCESE DE BOSTON (E.U.A.)


18 de Outubro de 1997



Senhoras e Senhores

Estou feliz por vos dar as boas-vindas, Administradores da «Covenant Health Systems», dos Estados Unidos da América. O facto de terdes importantes responsabilidades no campo do cuidado médico oferece-me a oportunidade de reafirmar não só a constante e infalível solicitude da Igreja pelos enfermos e pelas pessoas que se encontram em dificuldade, mas também o seu empenhamento na defesa e salvaguarda da dignidade divina de cada pessoa humana, no modo de se tratar e curar os doentes.

Isto verifica-se de modo particular nos hospitais e nos institutos médicos católicos. A identidade católica desses centros consiste sobretudo na qualidade evangélica do amor com que servem os enfermos e nos princípios morais que efectivamente sustentam as suas práticas. Encorajo-vos nos vossos esforços por estardes sempre atentos ao ensinamento da Igreja acerca das problemáticas médico-morais.

A vossa visita a Roma aumente a determinação em respeitar a imagem do Criador em todas as pessoas que beneficiam das vossas capacidades profissionais! Invoco sobre vós as bênçãos divinas de paz e bem-estar!



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MENINOS DA AÇÃO CATÓLICA ITALIANA


18 de Outubro de 1997





Caríssimos meninos e meninas da Acção Católica Italiana!

1. Bem-vindos à Praça de São Pedro! Quisestes vir visitar o Papa, na conclusão da vossa Assembleia Nacional. Obrigado pela vossa presença, portadora de alegria e de entusiasmo.

Passei no meio de vós para vos saudar e abençoar todos. Sei que vindes de todas as partes da Itália: envio uma saudação também aos vossos familiares, que neste momento estão espiritualmente unidos a nós.

Um agradecimento particular dirige-se ao vosso Presidente nacional, o Advogado Giuseppe Gervásio, ao Assistente-Geral, D. Agostino Superbo, à Responsável e ao Assistente da ACR (Acção Católica dos Jovens) a nível nacional. Eles organizaram esta bonita manifestação e, juntamente com os vossos dois representantes, quiseram exprimir-me os sentimentos de todos.

Saúdo os vossos educadores, generosos colaboradores da maturação humana e cristã, eclesial e missionária dos meninos e dos jovens que a Providência divina dá à Igreja na experiência apostólica da ACR. Saúdo os Sacerdotes assistentes e as Religiosas presentes, formadores de vida evangélica no acompanhamento do caminho de fé, tanto dos meninos como dos educadores.

Dirijo uma cordial saudação também ao Ministro Rosi Bindi, ao Presidente da Câmara Municipal de Roma e ao Presidente da Região do Lácio, agradecendo-lhes a sua presença.

2. Caros meninos, estais a viver este encontro preparado e desde há longo tempo esperado, marcado pela alegria e pela festa. «Juntos há mais festa»: é este o mote que escolhestes e que bem sintentiza a mensagem do vosso encontro nacional. Nele exprimis de maneira visível o caminho da Igreja inteira rumo ao Grande Jubileu do Ano 2000 e antecipais, de algum modo, um seu aspecto significativo, dizendo a todos que a festa só é autêntica se for vivida «juntos».

Trata-se da festa cristã, aquela que nasce sempre do encontro pessoal com Jesus Cristo, acolhido como amigo e Senhor na experiência concreta da Igreja. Fazeis isto nos vossos grupos e nas vossas paróquias.

É Ele, o Senhor Jesus, que cumula o coração de alegria, da Sua alegria plena e duradoura, e permite assim a festa do encontro fraterno e solidário com os outros.

Seguindo Jesus, único e verdadeiro Salvador do mundo, vós, crianças, sois convidadas a crescer no conhecimento e no amor do Pai celeste e a manifestar gestos concretos de amor e de esperança nos sulcos da vida de cada dia. Assim poderá continuar o vosso empenho para tornar possível a paz, a começar pelos lugares onde viveis as vossas jornadas: a casa, a escola, a paróquia, a aldeia, a cidade, a Itália.

Este vosso empenho de paz alarga-se depois aos vossos coetâneos que vivem situações menos favoráveis noutras Nações da Europa e do mundo. Penso, por exemplo, em Sarajevo e na belíssima ponte de amizade que construístes com os meninos e as meninas da Bósnia-Herzegovina.

Na amizade sempre mais intensa com Cristo Jesus, aumentais a comunhão da Igreja e, com os vossos talentos e segundo as vossas preciosas capacidades, pondes- vos ao serviço das comunidades cristãs, para que sejam cada vez mais fiéis ao Evangelho.

3. Meninos e meninas da Acção Católica Italiana, o Papa tem confiança em vós! Eis por que não hesita em proporvos que sigais a Jesus, imitando o exemplo dos Santos. Hoje, a Igreja celebra a festa litúrgica de São Lucas evangelista. Certamente, já conheceis bem o Evangelho e os Actos dos Apóstolos. Aprofundai a palavra de Deus pessoalmente e juntos. Ela ajudar-vos-á a compreender sempre melhor a vossa vocação e a tornar-vos testemunhas intrépidas de Jesus.

Há alguns dias recordámos São Francisco de Assis, Padroeiro da Itália e da Acção Católica Italiana. Que mestre de vida evangélica e que concreto modelo de apóstolo de Cristo é este grande Santo, conhecido e venerado no mundo inteiro!

Ao lado dele, que deixou tudo por amor do Senhor, quereria neste dia apresentar-vos outra Santa, que morreu com apenas vinte e quatro anos, exactamente há cem anos: Santa Teresa do Menino Jesus, que amanhã proclamarei Doutora da Igreja. Certamente, a pequenina Teresa teria sido uma óptima menina da ACR! Pelo menos antes de entrar no Carmelo! Era plena de vitalidade, de fé e de entusiasmo por Jesus e pelo Evangelho. Quis ser toda de Deus e escolheu tornar-se religiosa carmelitana. A sua breve existência foi inteiramente consumada pelo amor a Deus e pelo desejo de fazer com que fosse amado pelo mundo inteiro. Teresa deixou-nos como testamento a via simples e segura do amor repleto de confiança em Deus. Ela chamava-lhe a «pequena via», porque está aberta àqueles que, como diz Jesus, sabem fazer-se «pequeninos», isto é, humildes e simples. É, de facto, a via do abandono confiante nas mãos de Deus, contando mais com Ele do que com as próprias forças. Também vós, crianças, desenvolvei a vossa personalidade tornando-vos fortes e maduras, mas fazei com que o vosso coração continue a ser humilde, puro, «pequenino» diante de Deus e sempre pronto a amar os irmãos: só assim se entra no Reino dos céus, onde o maior é o mais pequeno, e o mais importante é o servo de todos.

4. Agora, quereria pedir-vos que manifestásseis publicamente e repetísseis juntos, formando como que um coro, os compromissos da vida cristã e da missão, que assumis cada ano aderindo à ACR.

Queridas crianças, sabeis que com o Baptismo vos tornastes filhos de Deus e pedras vivas da Igreja:

– quereis cultivar na oração e na vida sacramental a intimidade e a amizade com Jesus Cristo?

Vós sabeis que sois chamadas pelo Senhor Jesus a tornar-vos apóstolos de alegria e construtores de esperança na comunidade cristã:

– quereis oferecer a vossa contribuição, pessoal e de grupo, à edificação da Igreja nas comunidades a que pertenceis?

Vós sabeis que sois chamadas, embora na vossa jovem idade, a fazer-vos testemunhas generosas da novidade cristã:

– quereis contagiar, com a alegria do Evangelho e com o amor de Cristo, os vossos coetâneos, os vossos amigos, as vossas famílias, as vossas pequenas e grandes cidades?

5. Queridos meninos e meninas, o Espírito Santo, dom do Pai celeste e de Cristo seu Filho, vos ajude a permanecer fiéis a estes compromissos e a crescer na alegria da amizade cristã, permitindo ao Senhor realizar em vós grandes coisas. Ele quer fazer também de vós um dom para a Igreja e para a humanidade inteira.

Por este motivo, confio-vos a Maria, a doce Menina de Nazaré, a Mãe do Senhor e de todos nós, para que seja Ela a velar todos os dias sobre o vosso caminho, ao longo das estradas da verdade e da paz.

Juntamente com Cristo, com Maria, com os Santos e com a ACR há verdadeiramente mais festa! A todos vós e às vossas famílias, uma especial Bênção.

No termo deste encontro festivo, o Papa pronunciou ainda as seguintes palavras:

Caríssimos adolescentes, enchestes a Praça de São Pedro como raramente o fizestes. Agradeço-vos e desejo-vos um bom domingo!



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PEREGRINOS VINDOS PARA A CERIMÓNIA


DE ATRIBUIÇÃO DO TÍTULO DE DOUTORA


DA IGREJA A SANTA TERESINHA


Segunda-feira, 20 de Outubro de 1997





Caros Irmãos no Episcopado
Queridos amigos!

1. O dia de ontem permitiu-vos participar numa cerimónia rara na vida da Igreja, mas rica de significado: a proclamação de uma Doutora da Igreja. Saúdo cordialmente todos os peregrinos aqui presentes esta manhã, em particular D. Pierre Pican, Bispo de Bayeux e Lisieux, assim como D. Guy Gaucher, seu Auxiliar, e D. Georges Gilson, Arcebispo de Sens e Prelado da Missão da França. Vós quisestes vir escutar aquela que encarna para nós a «pequena via», a via real do amor. Santa Teresa do Menino Jesus e da Santa Face faz parte daquele grupo de Santos, que a Igreja reconhece como mestres de vida espiritual. Como Doutora, Teresa ensina, pois, embora os seus escritos não tenham a mesma natureza dos escritos dos teólogos, são para cada um de nós uma válida ajuda para a compreensão da fé e da vida cristãs.

2. Dirijo-me agora aos representantes da Ordem dos Carmelitas e saúdo-os com muito afecto, pois esta proclamação do Doutoramento a Teresa de Lisieux é para eles, de modo particular, motivo de festa. Saúdo de coração todas as pessoas consagradas e os membros dos movimentos espirituais que se põem sob o patrocínio de Santa Teresa de Lisieux. Encorajo-vos a permanecer fiéis à mensagem que ela dá à Igreja: dá-lhe graças a vós, testemunhas vivas do seu ensinamento. Tende a peito colocar-vos incessantemente na escuta da sua mensagem, e difundi-la à vossa volta, com a palavra e o exemplo.

3. Para o nosso tempo, Teresa é uma testemunha eficaz e próxima de uma experiência de fé em Deus fiel e misericordioso, em Deus justo mediante o Seu próprio amor. Ela vivia profundamente a sua pertença à Igreja, Corpo de Cristo. Creio que os jovens encontrem efectivamente nela uma inspiradora para os guiar na fé e na vida eclesial, numa época em que o caminho pode ser dificultado por provas e dúvidas. Teresa conheceu muitos tipos de provas, mas foi-lhe concedido permanecer fiel e confiante, e disto dá testemunho. Teresa sustém os seus irmãos e as suas irmãs ao longo de todos os caminhos do mundo.

4. Teresa, na sua simplicidade, é modelo de vida oferecida ao Senhor, desde os gestos mais pequenos. De facto, escrevia: «Quero santificar as pulsações do meu coração, os pensamentos, as acções mais simples, unindo-os aos Seus méritos infinitos» (Oração n. 10). Foi com tais disposições de espírito que certo dia se dirigiu ao seu Mestre e Senhor, dizendo: «Peço-Vos que sejais a minha santidade» (Oferta ao Amor misericordioso, Oração n. 6).

Da união com Cristo derivam os frutos de caridade que devemos deixar maturar também em nós. Teresa tinha compreendido bem que precisamente aqui está a origem do amor aberto aos outros: «Quando sou caridosa, é só Jesus que age em mim; quanto mais estou unida a Ele, tanto mais amo todas as minhas Irmãs» (Manuscrito C, 12 v). Nas dificuldades que a vida quotidiana necessariamente apresenta, ela jamais procurava fazer valer os seus direitos, mas estava sempre pronta a ceder diante de uma Coirmã, mesmo que interiormente custasse muito. Eis uma atitude que, em cada época da vida da Igreja, deve ser imitada pelos baptizados de qualquer idade e condição. Só a virtude da humildade, que Teresa pediu a Cristo com insistência, torna possível uma autêntica atenção para com os outros.

5. Unida a Cristo e dedicada aos outros, Teresa sente-se inclinada naturalmente a estender o seu amor ao mundo inteiro. O meu predecessor, o Papa Pio XI, ressaltou este aspecto da sua doutrina espiritual ao proclamá-la, em 1927, «Padroeira das Missões». Partindo do amor que a une a Cristo, começa a identificar-se com o Bem-amado do Cântico dos Cânticos: «Leva-me atrás de ti» (Ct 1,4). Depois compreende que, com ela, o Senhor atrai a multidão dos homens, visto que a sua alma tem um intenso amor por eles. «Todas as almas que ela ama são atraídas a segui-l'O» (Manuscrito C, 34 r). Com uma maravilhosa audácia e fineza espiritual, Teresa apropria-se das palavras de Jesus depois da Ceia, para dizer que também ela começa a fazer parte do grande movimento, pelo qual o Senhor atrai todos os homens e os conduz ao Pai: «As Vossas palavras, ó Jesus, são portanto minhas e posso servir-me delas para atrair sobre as almas, que estão unidas a mim, os favores do Pai celeste » (Manuscrito C, 34 v).

6. Caros Irmãos, queridos amigos, compete-vos viver todos os dias esta doutrina oferecida agora publicamente à Igreja inteira. Tende a peito fazê-la vossa e fazê-la conhecer melhor. Como a Escritura Sagrada — que Teresa citava com predilecção — esta nunca é muito difícil de desencorajar, nem muito fácil de ser exaurida: «Não é nem fechada a ponto de ser desencorajadora, nem acessível a ponto de se tornar banal. Quanto mais se a frequenta, tanto menos se a deixa, quanto mais se a medita, tanto mais é amada» (S. Gregório Magno, Moralia in Job, XX, 1, 1).

Ao desejar-vos muitas descobertas e alegrias na escola de Santa Teresa do Menino Jesus e da Santa Face, Doutora da Igreja universal, concedo-vos de todo o coração a Bênção Apostólica, que faço extensiva a todos os que representais e que vos acompanham espiritualmente.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO PRIOR-GERAL DA ORDEM HOSPITALEIRA


DE SÃO JOÃO DE DEUS NO PRIMEIRO CENTENÁRIO


DO NASCIMENTO DE SÃO RICARDO PAMPURI






Ao Reverendíssimo FR. PASCUAL PILES FERRANDO
Prior-Geral da Ordem Hospitaleira de São João de Deus

1. No centenário do nascimento de São Ricardo Pampuri, desejo dar graças ao Senhor por este Santo que honra essa Família religiosa. A presença das suas Relíquias no hospital dos Fatebenefratelli, na Ilha Tiberina, constitui a ocasião oportuna para repropor, a quantos trabalham no âmbito dessa estrutura hospitalar, o testemunho eloquente da sua vida, inteiramente impregnada do programa ascético do «ama nesciri et pro nihilo reputari». Tive a alegria de proclamar Beato em 1981, e Santo em 1989, esta límpida figura de homem do nosso tempo. Nele refulgem os traços da espiritualidade laical delineada pelo Concílio Ecuménico Vaticano II.

A sua existência terrena, contida no arco de apenas 33 anos, mostra como em breve tempo este jovem religioso soube alcançar o ápice da santidade. Nos primeiros anos de vida em Trivolzio e Torrino, durante os estudos secundários e universitários em Milão e Pavia, na frente ítalo-austríaca durante a primeira guerra mundial, e depois em Morimondo, como médico municipal, deixou em toda a parte vestígios de piedade e de amor pelos pobres. Sustentado pelo exemplo dos seus entes queridos e pelo convívio com piedosos e zelosos sacerdotes, empenhou-se em múltiplos campos de apostolado: foi sócio assíduo e generoso do Círculo Universitário e das Conferências de São Vicente de Paulo, presidente da Associação juvenil da Acção Católica, Terciário franciscano e animador incansável de iniciativas de formação espiritual e de caridade. Com a idade de 30 anos, entrou na Ordem dos Fatebenefratelli, de cujo carisma se tornou um dos intérpretes mais significativos.

2. «Bom Mestre, que devo fazer para alcançar a vida eterna?» (Mc 10,17). Parece ser esta a pergunta que atravessa os pensamentos deste jovem, sempre em busca da perfeição cristã. «Falta-te apenas uma coisa: Vai, vende tudo o que tens, dá o dinheiro aos pobres e segue- Me» (Mc 10,21). Ao convite do Senhor ele, dotado de fé e caridade profunda, respondeu com alegria, doando-se completamente a Cristo pobre, humilde e casto e entrando na Ordem dos Fatebenefratelli. Vítima de uma doença contraída em zona de guerra, ao abraçar o carisma de São João de Deus, conseguiu dar plenitude ao seu desejo de anunciar e testemunhar aos doentes o Evangelho de Cristo crucificado e ressuscitado.

Como o divino Mestre, sentiu a urgência do «deserto» e da oração (cf. Mc Mc 1,35) para depois poder servir os irmãos, especialmente os doentes e os sofredores. «Tenho necessidade de me recolher um pouco em mim mesmo na presença do Senhor, para que a minha alma não se torne insensível nem se perca em estéreis e prejudiciais preocupações externas», escrevia numa sua carta. Essa necessidade levava-o a viver constantemente unido ao Senhor, a deter-se por longo tempo diante do tabernáculo e a nutrir uma terna devoção pela Virgem. Na escola do Evangelho, tornou-se para quantos o conheceram e, sobretudo, para os seus assistidos um sinal vivo da misericórdia de Deus, sempre disponível a ver nos doentes o Cristo que sofre, a ajoelhar-se na soleira das casas onde reinava a dor e a partir apressado sem esperar nenhuma recompensa.

Tendo escolhido cumprir profundamente a vontade do Pai, à imitação do seu Senhor, viveu como acto supremo de obediência e de amor também a doença e a morte.

3. Como não acolher a mensagem contida no maravilhoso caminho de santidade de São Ricardo Pampuri, que essas celebrações centenárias repropõem de modo eloquente?

Aos Coirmãos da Ordem à qual pertencia, chamados a servir Cristo nos doentes, o testemunho deste jovem médico- cirurgião indica que a união com Deus deve alimentar constantemente a vida religiosa e a actividade apostólica. Aos leigos que trabalham nas estruturas hospitalares, São Ricardo Pampuri, médico apaixonado pela sua missão entre os doentes, propõe que amem a própria profissão e a vivam como vocação. Ele, que no cuidado dos que sofriam jamais separou ciência e fé, empenho civil e espírito apostólico, convida todos os agentes de saúde a terem sempre em conta a dignidade da pessoa humana, para exercerem o «dever quotidiano» com o espírito do bom Samaritano. O testemunho que deu na doença, que o levou à morte, encoraja todos os que sofrem a não perderem a confiança em Deus; antes, exorta-os a acolher também na prova o projecto de amor do Senhor.

Enquanto invoco a especial protecção de São Ricardo Pampuri, oro para que as celebrações jubilares do seu nascimento e o inteiro programa espiritual e cultural preparado para essa festividade, constituam para todos uma ocasião de renovado empenho na vida cristã, nas relações interpessoais e no serviço aos doentes.

Possam aqueles que visitam as Relíquias de São Ricardo Pampuri, com a radicalidade e generosidade por ele testemunhadas até à morte, seguir o exemplo de São João de Deus, Fundador dessa Ordem Hospitaleira.

Com estes bons votos, concedo-lhe, bem como aos Coirmãos, às Religiosas colaboradoras, aos Agentes de saúde e aos doentes uma especial Bênção Apostólica.

Vaticano, 22 de Outubro de 1997.

JOÃO PAULO II




DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL


DA INGLATERRA E DO PAÍS DE GALES


EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM»




Eminência
Queridos Irmãos Bispos

1. É no amor do Senhor Jesus que vos dou as boas-vindas — Bispos da Inglaterra e do País de Gales — por ocasião da vossa visita ad limina Apostolorum, e faço extensivas as minhas cordiais saudações aos sacerdotes, diáconos, religiosos e fiéis leigos das Igrejas particulares a que presidis no amor. Neste ano celebra-se o 1.400° aniversário da chegada à Bretanha de Santo Agostinho, o Apóstolo dos Ingleses, cuja obra no meio dos anglo-saxões lançou o fundamento para o sucessivo crescimento do Cristianismo na vossa terra. O nosso presente encontro está ligado de maneira muito real àqueles eventos que ocorreram há 14 séculos. Os vínculos de comunhão eclesial, que naquela época foram entretecidos entre a Sé Apostólica e essa parte da Igreja universal confiada ao vosso cuidado, sobreviveram às vicissitudes da história e são vivamente expressos e renovados mediante a vossa visita, que tem um dos seus momentos de maior relevância na vossa profissão de fé junto dos túmulos dos Príncipes dos Apóstolos, Pedro e Paulo. Viestes para «visitar Pedro» (cf. Gl Ga 1,18) na pessoa do seu Sucessor na Sé de Roma, «a maior e mais antiga Igreja» (Santo Ireneu, Adv. Haer., III.3.2). Desta forma, a vossa visita dá testemunho do singular ministério de unidade, que o Bispo de Roma desempenha em benefício de toda a grei de Cristo (cf. Jo Jn 21,15-17), evocando também a comum responsabilidade que nós, Bispos, temos «por todas as Igrejas» (2Co 11,28).

A imagem da primeira Comunidade cristã, como é descrita no Actos dos Apóstolos — «era perseverante em ouvir o ensinamento dos Apóstolos, na comunhão fraterna, na fracção do pão e nas orações» (2, 42) — constitui uma recordação de que a Igreja é uma amorosa comunhão de crentes congregados à volta dos Apóstolos e dos seus Sucessores, e está constantemente a formar-se numa unidade de fé, disciplina e vida, no poder do Espírito Santo. O Senhor confiou ao Colégio Episcopal de maneira particular a tarefa de edificar a koinonia e, por conseguinte, jamais devemos cessar de encorajar o Povo de Deus a ter «um só coração e uma só alma» (Ac 4,32). É importante que aos olhos da Igreja e do mundo nós, Pastores, nos mostremos «reunidos pelos vínculos da unidade, da caridade e da paz» (Lumen gentium LG 22), conduzindo os fiéis a uma união cada vez maior com Deus Trindade (cf. 1Jn 1,3) e à comunhão recíproca no Corpo de Cristo (cf. 1Co 10,16). Num espírito de confiança evangélica, devemos esforçar-nos por tornar a nossa comunhão cada vez mais profunda e cordial.

2. A aproximação do Grande Jubileu constitui um premente convite aos Pastores da Igreja a guiarem as comunidades que lhes são confiadas, numa peregrinação espiritual rumo ao cerne mesmo do Evangelho. O nosso caminho rumo ao Ano 2000 deveria adquirir a forma de uma busca genuína de conversão e de reconciliação, purificando-nos dos erros do passado e das instâncias de infidelidade, de incoerência e de atraso na acção (cf. Tertio millennio adveniente, TMA 33). Certamente, não basta fazer declarações públicas de arrependimento pelos erros cometidos no passado. Devemos recordar-nos — a nós mesmos e aos fiéis — da natureza radicalmente pessoal do arrependimento e da conversão exigida. A alegria do Jubileu é «de modo particular a alegria pela remissão das culpas, a alegria da conversão» (Ibid., 32). Neste sentido, constitui uma ocasião para ajudar os fiéis a recuperarem o verdadeiro «sentido do pecado» (cf. 1Jn 1,18), levando a um renovado apreço da beleza e do júbilo do Sacramento da Penitência (cf. Pastores dabo vobis PDV 48). Só haverá uma renovação da prática sacramental se existir um interesse determinado pelo Sacramento da Reconciliação na pregação, na catequese, nos programas e nos projectos pastorais das dioceses. O melhor catequista da Reconciliação é o sacerdote que recorre regularmente a este Sacramento. Os sacerdotes, que se dedicam ao ministério da reconciliação, sabem que se trata de uma tarefa exigente e com frequência exaustiva, e contudo de «um dos mais belos e consoladores ministérios » da sua vida (Reconciliatio et paenitentia RP 29). Por outro lado, num certo sentido os fiéis têm o direito de dispor de horários estabelecidos para a confissão na própria paróquia e de encontrar os seus sacerdotes sempre prontos a receber as pessoas que estiverem em busca da confissão.

3. A paróquia permanece o lugar em que normalmente os fiéis se reúnem como uma única família para ouvir a palavra salvífica de Deus, para celebrar os sacramentos com dignidade e reverência, e para ser inspirados e revigorados na sua missão de consagrar o mundo na santidade, na justiça e na paz. A paróquia torna presente o mistério da Igreja como uma comunidade orgânica em que «o pároco — que representa o Bispo diocesano — é o vínculo hierárquico com toda a Igreja particular» (Christifideles laici CL 26). Outras instituições, organizações e associações são sinais de vitalidade, instrumentos de evangelização e fermento de vida cristã, enquanto contribuem para a edificação da comunidade local na unidade da fé e da vida eclesial. Cada comunidade em que os fiéis se congregam para receber o alimento espiritual e trabalhar no serviço eclesial, deve estar plenamente aberta à «unidade do Espírito no vínculo da paz» (Ep 4,3) — unidade que exige uma conexão orgânica com a Igreja particular, garantindo o carácter eclesial de tal comunidade e pondo em prática os seus carismas.

Os pastores têm o dever de promover «os carismas, os ministérios, as várias formas de participação do Povo de Deus, embora sem decair num democratismo e num sociologismo, que não reflectem a visão católica da Igreja e o autêntico espírito do Vaticano II» (Tertio millennio adveniente, TMA 36). No documento The Sign We Give («O sinal que nós damos»), aprovado pela vossa Conferência Episcopal em 1995, reconheceis a necessidade de fortalecer «o ministério de colaboração» entre os Bispos, os sacerdotes, os religiosos e os leigos, de forma que uma comunhão genuína na missão seja cada vez mais evidente na vida diocesana e paroquial. Trabalhar em conjunto, num autêntico «anúncio do Evangelho» (Ph 1,5), exige muito mais do que uma distribuição das tarefas orientada segundo a necessidade prática. Tal trabalho tem o seu fundamento nos Sacramentos da iniciação cristã (cf. Christifideles laici CL 23) e requer uma consciência dos diferentes dons que o Espírito confia ao inteiro Corpo de Cristo (cf. 1Co 12,4-13). Precisamente por este motivo, exige também uma clarividência teológica e prática no que concerne à especificidade do sacerdócio ministerial. Não é porventura verdade que, quanto mais se aprofunda o sentido de vocação dos leigos, tanto mais eles reconhecem a consagração sacramental do sacerdote e o papel específico deste na promoção «do sacerdócio baptismal de todo o Povo de Deus, conduzindo- o à sua plena actuação eclesial» (Pastores dabo vobis PDV 17)?

4. Os sacerdotes constituem a grande obra do vosso ministério episcopal. Em cada aspecto e fase das suas vidas sacerdotais, devem ser o sujeito da vossa oração e o objecto da vossa amorosa solicitude. Desde a vossa última visita ad Limina, completou-se a visita canónica aos seminários da Inglaterra e do País de Gales, confirmando que actualmente, talvez mais do que no passado, os candidatos precisam de ser orientados nas áreas do desenvolvimento humano e da formação, de maneira especial no que se refere aos relacionamentos interpessoais em geral, à castidade, ao celibato e a toda a gama de atitudes e qualidades que os hão-de levar a tornar-se seres humanos amadurecidos e equilibrados, dotados nas relações com os outros e psicologicamente preparados para as exigências da vida e do trabalho sacerdotais. Eles têm necessidade de uma formação humana, espiritual, académica e pastoral profundamente assimilada, se quiserem preparar-se para o sacerdócio em conformidade com o espírito de Cristo e da Igreja. É significativo que a vossa Conferência Episcopal esteja a rever a Carta para a formação sacerdotal, uma revisão que há-de levar em consideração a Exortação Apostólica pós-sinodal Pastores dabo vobis e os principais Documentos da Santa Sé, no seu desejo de apresentar a compreensão da Igreja acerca do ministério sagrado como uma configuração sacramental com Jesus Cristo, tornando os sacerdotes capazes de agir in persona Christi Capitis e no nome da Igreja.


Discursos João Paulo II 1997 - 16 de Outubro de 1997