Discursos João Paulo II 1998 - 2 de Fevereiro de 1998

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DA JUNTA


E DO CONSELHO DA ADMINISTRAÇÃO


DA PROVÍNCIA DE ROMA


: 2 de Fevereiro de 1998





Senhor Presidente
Ilustres Membros da Junta
e do Conselho provincial de Roma
Excelentíssimos Senhores e Senhoras!

1. Muito me alegra dar-vos cordiais boas-vindas por ocasião deste nosso tradicional encontro, que me renova a grata oportunidade de vos exprimir estima pelo vosso trabalho e as mais sentidas felicitações para o novo ano, há pouco iniciado.

Apresento a minha deferente saudação a cada um de vós e, em particular, agradeço ao Deputado Giorgio Fregosi as delicadas expressões de bons votos, que teve a amabilidade de me dirigir, fazendo-se intérprete dos sentimentos de todos vós. Da minha parte, desejo retribuir a vossa gentileza desejando para vós, os vossos colaboradores e todos os habitantes da Província de Roma um 1998 rico de serenidade e de frutos de bem, em todos os sectores das vossas actividades.

Acompanho estes sentimentos com a certeza da minha constante recordação na oração. O apóstolo Paulo recomendava ao seu discípulo Timóteo que orasse pelos responsáveis do Estado: «Recomendo-te, pois, antes de tudo, que se façam súplicas, orações, petições e acções de graças por todos os homens, pelos soberanos e por todas as autoridades para que tenhamos vida tranquila e sossegada, com toda a piedade e honestidade». E acrescentava: «Isto é bom e agradável diante de Deus, nosso Senhor, que deseja que todos os homens se salvem e conheçam a verdade» (1Tm 2,1-4). Seguindo estas indicações do Apóstolo das nações, a tradição cristã sempre teve em grande consideração a oração pelos governantes e pelos administradores do Estado, convicta como está da importância, da delicadeza e do valor do serviço que eles prestam à inteira colectividade.

2. No seu discurso de saudação, o Senhor Presidente da Junta provincial referiu-se aos problemas que todos os dias enfrentais e ao empenho com que vos esforçais por responder às exigências dos cidadãos. O progresso do mundo actual e a variedade das necessidades presentes na sociedade poderiam talvez suscitar dentro de vós a impressão de que os meios e os recursos, de que a administração pública dispõe, são inadequados em relação à complexidade e à urgência das expectativas da população. E isto poderia gerar um sentido de frustração.

É preciso reagir e não se deixar vencer por esta tentação. Multiplicai, portanto, os vossos esforços por buscar uma compreensão e uma colaboração cada vez mais amplas entre as várias componentes da sociedade. Os inúmeros desafios da sociedade actual só poderão ser enfrentados e resolvidos de modo adequado com uma leal e generosa atitude de solidariedade entre os cidadãos e as instituições. Nesta vossa tarefa ser-vos-á de grande ajuda a consciência do valor do serviço de vós exigido e a consciência de que os resultados obtidos neste sector, embora limitados diante da amplitude das expectativas e da necessidade de aprofundamentos sempre novos, constituem um bem para todos e favorecem a consecução de uma melhor qualidade de vida.

3. Neste nosso tempo, certamente repleto de contradições mas também caracterizado pela abertura a grandes ideais, o esforço comum deve ser por combater de maneira eficaz a difundida tendência a fechar-se no pequeno horizonte do próprio interesse. Por isso, é necessário concentrar as potencialidades de todos e valorizar cada vez mais as múltiplas realidades locais presentes na circunscrição de Roma. Elas podem oferecer um contributo específico à solução dos numerosos e, por vezes, dramáticos problemas que a Metrópole apresenta. Penso no problema endémico da falta de habitações; na difícil situação de quantos, especialmente jovens, ainda estão em busca de um trabalho; na recta administração dos recursos do território e naqueles sectores da vida social que fazem parte das competências directas da Administração provincial.

Bem sabeis como a Igreja tem a peito favorecer o progresso integral do homem, com todos os meios legítimos, e também com que insistência ela reafirma em todas as circunstâncias a prioridade do bem comum sobre o particular. No esforço concorde pela edificação de um futuro mais humano, com as vossas responsabilidades de administradores públicos, podeis oferecer um contributo qualificado. Não abdiqueis das vossas prerrogativas e dos vossos compromissos.

4. A Igreja, «perita em humanidade» (cf. Carta Encíclica Populorum progressio PP 13), acompanha com cordial apreço o vosso serviço quotidiano. No pleno respeito das suas competências específicas, deseja cooperar na construção do bem de todos, oferecendo a própria e efectiva contribuição às instituições estatais, para criar uma sociedade sempre mais fraterna e solidária.

O Grande Jubileu do Ano 2000, que já se aproxima rapidamente e em cuja preparação a cidade e a Província de Roma estão plenamente empenhadas, representa também para o ano que está à nossa frente um campo de fecunda colaboração entre a Diocese de Roma e as instituições estatais. Possa a perspectiva deste evento histórico constituir para todos um premente apelo a redescobrir as profundas raízes espirituais da identidade cultural e social de Roma e da sua Província.




ÀS IRMÃS BRIGIDINAS EM CAPÍTULO GERAL


5 de Fevereiro de 1998





1. Tenho a alegria de dar as minhas cordiais boas-vindas a vós, queridas Irmãs Brigidinas, reunidas nestes dias em Roma para o oitavo Capítulo geral eletivo. Dirijo uma particular saudação à Madre Tekla, eleita novamente Abadessa-Geral, e agradeço-lhe as afectuosas palavras que, em nome de todos, me dirigiu. Ao congratular-me com ela pelo novo mandato que lhe foi conferido pelas Coirmãs, faço votos por que, sob a sua guia, a Ordem prossiga de maneira generosa no serviço a Cristo e à Igreja. O meu cordial pensamento dirige-se, além disso, ao Mons. Mário Russotto, assistente dos Oblatos brigidinos; com ele saúdo os caros sacerdotes e leigos, Oblatos brigidinos, que quiseram unir-se às Irmãs nesta especial circunstância.

2. «Velai, pois, orando continuamente» (Lc 21,36). Respondendo ao convite de Jesus, a vossa Ordem, fundada por Santa Brígida da Suécia, propõe-se antes de tudo viver o carisma do louvor ao Senhor, testemunhando a primazia absoluta de Deus e a Sua ternura para com os homens. A experiência de Deus, amadurecida na contemplação, conduz-vos, além disso, a viver a vossa santificação em comunhão reparadora com o Divino Salvador, que na oração sacerdotal Se consagrou ao Pai pelos irmãos (cf. Jo Jn 17,19). Na vossa Ordem, esse carisma enriquece-se com a dimensão ecuménica, mutuada pelo nobre coração de Brígida, que se sacrificou e se empenhou com todas as forças, para que o retorno do Papa de Avinhão a Roma constituísse a necessária premissa para a pacificação de todos os cristãos.

Ao refundar a Ordem, a Madre Maria Isabel quis repropor a índole reparadora de antiga derivação monástica, adequando-a à situação dos tempos novos. Desse modo, ela imprimiu ao Instituto uma clara orientação para a oração e a reparação com característica ecuménica, em sintonia com a oração de Jesus no Cenáculo: «Que todos sejam um só; como Tu, ó Pai, estás em Mim e Eu em Ti, que também eles estejam em Nós, para que o mundo creia que Tu Me enviaste» (Jn 17,21).

Ao lado do ardente desejo ecuménico, bem claro é um outro aspecto do vosso carisma: o empenho missionário. A exemplo de Santa Brígida, com efeito, viveis o primado do louvor a Deus como contínuo acto de amor para com a humanidade ferida pelo pecado e pelas divisões. Ao acolher com plena disponibilidade o convite que, através dos luminosos testemunhos de Santa Brígida e da Madre Isabel, o Espírito vos dirige no limiar de um novo Milénio, o vosso Capítulo geral é chamado a dar à Ordem novo impulso e renovado entusiasmo, de maneira que seja no mundo contemporâneo uma vanguarda de evangelização e de caridade.

Para esse projecto olham os Centros de espiritualidade e de actividades ecuménicas que, a exemplo daqueles de Farfa e de Lugano, tendes em vista promover no próximo sexénio em Danzigue e em Tallinn. Exorto-vos a prosseguir com coragem nesta benemérita obra de apostolado, para testemunhardes aos homens e às mulheres do nosso tempo as exaltantes possibilidades oferecidas por uma vida vivida na total dedicação a Deus e aos irmãos. As vossas casas sejam escola de oração, sobretudo para os jovens, através da lectio divina e da adoração eucarística, que em diversas das vossas Comunidades se prolonga durante o dia inteiro com grande participação de fiéis leigos. Convido-vos, além disso, a tornar mais consistente a vossa presença nos Países escandinavos, onde o vosso testemunho evangélico de pobreza e de acolhimento é apreciado e produz frutos.

4. Santa Brígida renove em vós a especial atenção à sua Terra e o ardente desejo de anunciar o Evangelho aos filhos daquelas amadas Nações. A vossa caridade, que já produziu promissores frutos na Índia e no México, abrace generosamente outras realidades dos Países em vias de desenvolvimento e, sem vos deterdes diante das inevitáveis dificuldades, torne também ali presente, com as palavras e as obras, a luz do Evangelho, fonte inexaurível de civilização e de promoção humana.

Em todos os lugares as vossas comunidades sejam, para quantos delas se aproximarem, estímulo a viverem a unidade da Igreja que, «chamada a anunciar e a instaurar em todas as nações o Reino de Cristo e de Deus... deste Reino constitui na terra o germe e o início» (Lumen gentium LG 5).

Eis um empenho a ressaltar nas iniciativas ecuménicas e, de modo especial, nas actividades que, com o apropriado Comité de católicos e luteranos, estais a programar em vista do já próximo Jubileu do Ano 2000. Possam as vossas orações e a vossa constante solicitude ecuménica fazer progredir o caminho rumo à plena unidade de todos os cristãos.

Com estes votos, confiando cada um de vós à celeste protecção da Mãe de Deus e de Santa Brígida, concedo de coração a todos uma especial Bênção Apostólica.




AO PRIMEIRO EMBAIXADOR DE ANGOLA


JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO


DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Sábado, 7 de Fevereiro de 1998





Senhor Embaixador

A sua presença, hoje aqui, representa o coroamento das relações diplomáticas entre esta Sede Apostólica e o seu País, instituídas no dia 8 de Julho de 1997. É, pois, com muito prazer que recebo as Cartas Credenciais que o designam como primeiro Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República de Angola junto da Santa Sé. Agradeço-lhe as amáveis palavras e delicados sentimentos que me manifestou e, em particular, os deferentes cumprimentos e votos que me transmitiu da parte de Sua Excelência o Presidente da República José Eduardo dos Santos, que quis evidenciar o dia e acto da constituição das nossas relações diplomáticas com a sua aprazível visita aqui ao Vaticano. Peço a Vossa Excelência que exprima as minhas venturosas saudações ao Senhor Presidente, juntamente com a certeza das minhas preces pela reconciliação e prosperidade do seu povo.

Estabelecendo já em Roma a residência do seu Representante, as autoridades angolanas deram provas da importância que atribuem à consolidação daqueles vínculos com o Sucessor de Pedro que a fé e a história têm vindo a forjar na alma das sucessivas gerações dos povos residentes nos territórios que hoje são Angola. Tendo eles abraçado o Evangelho de Jesus Cristo como resposta cabal aos seus anseios de salvação, por vezes sentiam-se defraudados em suas expectativas devido a limitações e misérias humanas ou a vicissitudes e contratempos da história. Ora, quando queriam testemunhar a homenagem da sua jubilosa gratidão pela fé recebida ou então quando precisavam de achar remédio para as carências pastorais ou mesmo agravos de que eram vítimas, pensavam em Roma, segundo as palavras do Senhor Embaixador, que, nesta linha, pôde interpretar a sua presença aqui como a realização de um sonho com cinco séculos. Ao dar-lhe, pois, as minhas cordiais boas-vindas a este acto de apresentação, quero assegurar-lhe a minha estima no desempenho da elevada missão que o seu Governo lhe confiou, assim como reiterar, perante Vossa Excelência, o profundo afecto que sinto por todos os filhos do seu País.

Pude, durante a minha Visita Pastoral a Angola no mês de Junho de 1992, sentir pessoalmente a calorosa adesão e amizade que os angolanos nutrem pelo Sucessor de Pedro e admirar os profundos sentimentos religiosos que brotavam dos seus corações num clamor de paz e de justiça. A feliz recordação que conservo daqueles dias tornou-se oração durante os dolorosos acontecimentos que, nos últimos meses daquele mesmo ano de 1992, abalaram a vida social e política do país, recaindo na armadilha da violência que haveria de perdurar até ao mês de Novembro de 1994, quando Angola, pelos Acordos de Lusaca e consequente formação do Governo de Unidade e Reconciliação Nacional e com a presença de todos os deputados na Assembleia Nacional, retomou o caminho do pluralismo político e da democratização da vida social.

Este caminho é difícil e cheio de obstáculos; mas a cultura da violência deve dar lugar à cultura da paz. Só uma vontade sincera de se chegar a uma reconciliação efectiva pode permitir superar as resistências e fazer com que se anteponha o bem comum aos interesses particulares. Deus abençoa os esforços corajosos de líderes clarividentes na sua busca do melhor bem da Nação. Neste sentido, junto a minha voz àquelas que se erguem de todos os lados a pedir que se concretize o mais rapidamente possível o tão desejado encontro directo entre o Senhor José Eduardo dos Santos e o Senhor Jonas Malheiro Savimbi, que – como todos esperam – fará crescer o clima de confiança e de estima recíproca, que muito contribuirá ao processo de normalização nacional e na região.

Os angolanos não vão deixar que a guerra continue a hipotecar o seu futuro, sob as formas de medo, suspeita e divisão. Na minha Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 1997, disse que «não se pode ficar prisioneiros do passado; os indivíduos e os povos têm necessidade de "purificação da memória", a fim de que os males de ontem não voltem a repetir-se. Não se trata de esquecer o sucedido, mas de o reler com sentimentos novos, aprendendo precisamente das experiências sofridas que só o amor constrói, enquanto o ódio produz devastação e ruínas» (n° 3). Ao falar de sentimentos novos, pensava concretamente na oferta do perdão. O perdão e a reconciliação são os caminhos que permitem consolidar os vínculos de solidariedade das pessoas e dos povos. Desta solidariedade nascerá a paz verdadeira e duradoura por que todos suspiram.

Outro sentimento é o diálogo como opção de crescimento pessoal e comunitário. Todos devem favorecer o diálogo, tanto na vida pública como nos diversos sectores da vida social; isto permitirá a cada pessoa, a cada grupo ser reconhecido na sua diversidade e, ao mesmo tempo, sentir-se chamado a servir a sua pátria. A existência de grupos diferentes no seio da nação constitui simultaneamente um desafio e uma oportunidade, sobretudo para os líderes políticos e os legisladores. As autoridades civis têm necessidade de estar conscientes das reivindicações legítimas dos vários grupos, correspondendo-lhes de maneira apropriada.

Posso assegurar-lhe, Senhor Embaixador, que a Igreja e a Santa Sé querem colaborar com a Nação e os governantes angolanos, do mesmo modo que o Governo e a Nação desejam colaborar com a Igreja. O carácter desta cooperação foi claramente definido pelo Concílio Vaticano II, na Constituição Pastoral Gaudium et spes, sobre a Igreja no mundo contemporâneo: «A comunidade política e a Igreja (...), embora por títulos diversos, servem a vocação pessoal e social dos mesmos homens. E tanto mais eficazmente exercitarão este serviço para bem de todos, quanto melhor cultivarem entre si uma sã cooperação, tendo igualmente em conta as circunstâncias de lugar e de tempo» (n° 76). O homem, na sua dimensão existencial transcendental, é um lugar de encontro da Igreja e da comunidade política.

Consciente desta sua missão em favor do homem, a Igreja não pretende interferir na orientação concreta da vida político-social da nação, mas deseja, no âmbito do seu mandato, indicar aquelas motivações que recebe do Evangelho e da fé; motivações essas que ajudam a unir os corações e as mentes na construção duma sociedade sã, forte e tolerante, capaz de resolver os conflitos por meio do diálogo, duma sociedade angolana aberta ao homem e, nas relações internacionais, aberta à África e ao mundo. A Igreja apoiará todo o esforço e iniciativa cujo objectivo seja o bem comum de todos.

Senhor Embaixador, a sua presença aqui confirma que a República de Angola iniciou realmente uma nova era. Estou persuadido de que, como resultado da missão que hoje Vossa Excelência assume, os vínculos de amizade e cooperação entre a sua Nação e a Santa Sé hão-de crescer e consolidar-se. Garanto-lhe que os vários Organismos e Dicastérios da Cúria Romana estarão sempre prontos a assisti-lo no cumprimento dos seus deveres. Ao renovar os meus votos pelo bom êxito da sua missão, invoco as bênçãos do Altíssimo sobre Vossa Excelência, sua distinta família e directos colaboradores na Embaixada, sobre o Governo e o querido povo de Angola.




AOS PARTICIPANTES


NA SEMANA DIOCESANA DA FAMÍLIA


Sábado, 7 de Fevereiro de 1998





1. «Anunciaram-lhe a palavra do Senhor, assim como aos que estavam na sua casa» (Ac 16,32).

Caríssimas famílias de Roma, este versículo dos Actos dos Apóstolos serve de moldura para o hodierno encontro de fé e oração que, no âmbito da Missão da cidade, conclui a Semana diocesana dedicada à Vida e à Família. Saúdo o Senhor Cardeal-Vigário Camillo Ruini, a quem agradeço as amáveis palavras que me dirigiu. Com ele saúdo D. Franciso Gil Hellín, Secretário do Pontifício Conselho para a Família, o Deputado Carlo Casini, Presidente nacional do Movimento pela Vida, o Mons. Luigi Moretti, Responsável diocesano do Centro pastoral para a Família, e o Mons. Renzo Bonetti, Director nacional do Departamento de pastoral familiar da Conferência Episcopal Italiana.

O meu pensamento dirige-se neste momento a todas as famílias da diocese, sobretudo àquelas que se sentem particularmente provadas: sirva de encorajamento para elas a constante atenção do Papa e da inteira Igreja local. Desejo repetir a cada um as palavras que, depois da libertação prodigiosa, São Paulo e o seu companheiro de prisão Silas, foram dirigidas ao carcereiro tomado de sobressalto, que perguntava o que era necessário para ser salvo: «Acredita no Senhor Jesus e serás salvo tu e os teus» (Ac 16,31). Acolher a presença de Cristo na família: este é o convite que ressoa nesta noite.

Queridas famílias de Roma, não tenhais medo de abrir a porta de casa a Jesus Cristo. O Seu projecto divino enriquece a família, liberta-a de toda a escravidão e condu-la à plena realização da vocação que lhe é própria.

2. Nos numerosos encontros que pude ter com os jovens na Itália e no mundo inteiro, recolho o testemunho de um desejo crescente de construir famílias em que se vivam os autênticos valores do amor, do respeito pela vida, da abertura aos outros e da solidariedade. Como não ver nestas aspirações a implícita contestação dos comportamentos permissivos, a que hoje a sociedade procura abaixar-se?

Queridas famílias cristãs, olhai para a necessidade de amor, de doação e de abertura à vida, presente no coração dos vossos filhos, desorientados por modelos de uniões desastrosas. Os filhos aprendem a amar o próprio esposo ou a própria esposa, olhando para o exemplo dos pais. Não vos contenteis com viver no vosso interior o Evangelho da família, mas anunciai-o e testemunhai-o a todos aqueles com quem vos encontrais no vosso caminho e em todos os âmbitos da vida pública e social.

Não estais sozinhos nesta arrojada, embora conatural, tarefa de testemunho. O Espírito Santo está convosco; habita em vós em virtude dos sacramentos do Baptismo, da Confirmação e do Matrimónio! Ele sustentar-vos-á no cumprimento da vossa missão!

3. Esta nossa cidade de Roma, bem como a Itália inteira, tem grande necessidade de uma nova e orgânica política em favor da família para poder enfrentar, com esperança de sucesso, os desafios gravíssimos que estão diante de nós, a começar pelo da diminuição da natalidade.

É ilusório julgar poder construir o bem-estar através de uma mentalidade egoísta que, de vários modos, nega espaço e acolhimento às novas gerações. Tal como se demonstra irracional a tentativa de equiparar outros modelos de convivência à família fundada sobre o matrimónio. Tudo isto conduz inevitavelmente ao declínio de uma civilização, sob o aspecto tanto moral e espiritual como social e económico.

Portanto peço-vos, famílias de Roma, bem como a todas as famílias da Itália, que unais os vossos esforços também através da acção do Fórum das famílias, para fazer valer a subjectividade social da família e obter assim aquelas transformações culturais e legislativas que podem fazer justiça às famílias e assegurar o verdadeiro bem da sociedade. Neste empenho a Igreja está ao vosso lado e não vos deixará sozinhas.

4. Caríssimas famílias de Roma, contemplando o modelo da Sagrada Família de Nazaré, recitaremos juntos a oração do Rosário. Confiemos à intercessão de Maria e do seu esposo José todas as famílias da nossa cidade e, sobretudo, as que vivem em situações difíceis. Confiemos-lhes os jovens que se preparam para o matrimónio através daquele período de graça, que é o noivado. Confiemos também quantos são responsáveis pela promoção de políticas familiares mais justas e construtivas. O Senhor abençoe todas as famílias e as torne um lugar privilegiado de encontro com Ele, para o anúncio autêntico do Seu amor.

Maria, Rainha da Família, com coração materno proteja todos vós e vos obtenha de Deus abundantes consolações.




NA CONCLUSÃO DO SEGUNDO ENCONTRO


DO COMITÉ CENTRAL PARA


O GRANDE JUBILEU DO ANO 2000


12 de Fevereiro de 1998





Senhores Cardeais
Venerados Irmãos no Episcopado
Caríssimos Sacerdotes e Fiéis Leigos!

1. É-me grato acolher-vos na conclusão do segundo Encontro do Comité Central com os Delegados para o Jubileu, aqui vindos por encargo dos respectivos Episcopados.

Saúdo, antes de tudo, o Senhor Cardeal Roger Etchegaray, Presidente do Comité Central, os Cardeais Membros do Conselho de Presidência, D. Crescenzio Sepe, novo Secretário-Geral, os Membros do mesmo Comité Central e os Delegados das Conferências Episcopais. Apresento especiais boas-vindas aos Delegados Fraternos das Igrejas e Comunidades eclesiais não católicas. A todos se dirige a expressão do meu apreço pela activa participação!

Esta vossa reunião reveste importância particular pela possibilidade que oferece de focalizar os planos pastorais em vista da celebração jubilar, esboçando o seu Calendário e predispondo um plano concreto para o acolhimento dos peregrinos. Desejo congratular-me convosco pela generosidade com que trabalhais neste período que precede o Jubileu, oferecendo contributos preciosos e esclarecidos, que têm em vista tornar os actos celebrativos do ano jubilar mais significativos e mais profícuos espiritualmente.

2. O caminho rumo a essa meta histórica já está a tornar-se mais veloz, porque mais próximo é o momento da abertura da Porta Santa, que para a Igreja inteira dará início a um Ano de graça e de reconciliação.

Portanto, é louvável o esforço que está a ser feito para a organização exterior, mas este deve ser acompanhado daquele que visa a preparação interior, que dispõe o coração ao acolhimento dos dons do Senhor. Trata-se, antes de tudo, de redescobrir o sentido de Deus, e de Lhe reconhecer o senhorio sobre a criação e a história. Derivará daqui a revisão a que cada um há-de submeter, com sincera convicção e amor, os próprios pensamentos e as próprias opções, no desejo de tender à plenitude da caridade sobrenatural.

3. A comemoração do milénio do nascimento de Cristo leva-nos de novo ao centro do mistério da Redenção: «Apparuit gratia Dei et Salvatoris nostri, Iesu Christi» (Tt 2,1). É Deus que chama todos os homens, sem excluir ninguém, a participar dos frutos da obra de salvação, que se realiza e se difunde sobre a terra sob a acção misteriosa do Espírito Santo. O Grande Jubileu convida-nos a reviver este momento de graça, na consciência de que ao dom da salvação deve corresponder a conversão do coração, graças à qual a pessoa se reconcilia com o Pai e reentra na comunhão do Seu amor.

A conversão, porém, não seria autêntica, se não levasse também à reconciliação com os irmãos, que são filhos do mesmo Pai. Esta é a dimensão social da reencontrada amizade com Deus: ela inclui os membros da própria família, estende-se ao ambiente de trabalho e permeia a inteira comunidade civil. Enquanto nos acolhe com o Seu perdão, o Senhor confia-nos a missão de sermos fermento de paz e de unidade em todo o ambiente que nos circunda.

4. A redescoberta desta riqueza de graça, que nos é oferecida em Cristo, e o seu acolhimento na própria vida re- querem um adequado itinerário de preparação espiritual: e nós estamos a procurar actuá-lo nestes anos, dos quais conheceis bem o programa que sugeri à Igreja inteira. Quis convidar cada cristão a reavivar antes de tudo a fé no mistério de Deus-Trindade e a aprofundar o mistério de Cristo Salvador.

Só assim o povo de Deus, peregrinante sobre a terra, poderá reencontrar e reanimar o entusiasmo da fé; cada cristão poderá saborear a experiência do encontro com Cristo Mestre e Pastor, Sacerdote e Guia de toda a consciência. Isto disporá os crentes a receberem o dom de um renovado Pentecostes, para entrarem no terceiro milénio animados por mais ardente desejo de redescobrir a sempre actual verdade de que Deus Pai, por meio do Filho encarnado, não só fala ao homem, mas o procura e o ama.

5. Importante é a tarefa que vos foi confiada. Em cada uma das vossas Nações já está presente uma expectativa. Nascem curiosidades e esperanças, insta sobretudo o desejo de uma autêntica paz interior, iluminada pela verdade do Evangelho. Por isso, a todos devem chegar as palavras da esperança: «Vinde a Mim, todos vós que estais cansados e oprimidos e aliviar-vos-ei» (Mt 11,28). Fazei-vos, então, promotores assíduos de iniciativas aptas a transmitir às populações das vossas terras, cristãs ou não, a mensagem do Grande Jubileu.

Fazei com que sejam conhecidos e aplicados os planos pastorais que se referem aos Sacramentos, à Palavra de Deus, à animação da vida litúrgica, à oração, ao fundamental tema do diálogo ecuménico, aos encontros com os não-cristãos. Fazei afluir as informações, comunicai as notícias, mantende vivo o diálogo com as vossas Comunidades, considerando as expectativas de toda a população. Fazei com que a passagem para o terceiro milénio seja para todos um momento de renovação e graça.

6. Como já se sabe, o Jubileu do Ano 2000 diferencia-se dos outros Jubileus, porque se celebrará contemporaneamente em Roma, na Terra Santa e em cada uma das Igrejas locais.

A celebração de cada Jubileu implica também o conceito de «peregrinação», manifestação religiosa antiquíssima e presente quase em todos os povos e religiões, com finalidade sobretudo penitencial. A peregrinação reflecte o destino último do homem. O cristão sabe que a terra não é a sua derradeira morada, porque ele está a caminho rumo a uma meta que constitui a sua verdadeira pátria. Por este motivo, a peregrinação a Roma, à Terra Santa e aos lugares sagrados indicados nas Dioceses, põe em evidência o facto de toda a nossa vida constituir uma peregrinação rumo a Deus.

Para que produza fruto, a peregrinação exige que se garantam momentos fortes de oração, significativos actos de penitência e conversão, gestos de caridade fraterna, capazes de ser compreendidos como uma viva demonstração do amor de Deus. Neste espírito, o Jubileu será a ocasião para que se ampliem os espaços da caridade de cada Igreja particular, de cada associação, de cada grupo eclesial. O sinal concreto da caridade indicará que o itinerário da almejada renovação já realizou passos autênticos, prenunciadores de paz e de fraternidade universal.

Compete a vós o empenho de dar vida com inteligência a oportunas iniciativas neste sentido. Cabe à Igreja de Roma a tarefa de vos acolher aqui, de braços abertos, com coração grande, com amizade efectiva e generosa. A sede de Pedro, que «preside à comunhão da caridade», quer estar presente e viva nesta competição de solidariedade, que empenha todas as Igrejas espalhadas pelo mundo. É preciso hoje testemunhar uma peculiar sensibilidade pela justiça e promoção do desenvolvimento social. Todos nós estamos convictos de que é imperioso procurar de novo, e é possível encontrar, vias de superação das tensões fora da lógica dos conflitos, e que se podem fazer projectos capazes de resolver a grave situação económica em que se debatem não poucos Estados, libertando inteiras populações de condições de servidão e miséria desumanas.

7. O Jubileu é um providencial evento eclesial. Porém, não tem por fim a si mesmo, mas constitui um meio – na solene celebração comemorativa da Encarnação do Filho de Deus, nossa salvação – para estimular os cristãos à conversão e à renovação interior. Corroborados na fé, eles poderão anunciar a mensagem evangélica com renovado impulso, indicando no seu acolhimento o caminho para chegar à edificação de um mundo mais humano, porque mais cristão.

Confio à Virgem santa o vosso zeloso serviço de preparação do grande evento eclesial, com os votos por que ele produza abundantes frutos em benefício da Igreja e do mundo inteiro.

E devo dizer-vos que há um grande interesse pelo Jubileu, não só entre os Bispos do mundo inteiro, mas também entre os homens políticos. A data do Ano 2000 cria uma atitude, uma abertura. Podemos dizer que é a memória cristã dos povos e do mundo, que se abre e se manifesta. Quereria concluir este encontro recitando convosco o «Angelus Domini», porque esta é a oração da Encarnação.

Com afecto e reconhecimento, concedo-vos a Bênção Apostólica.



MENSAGEM DO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO XXI ENCONTRO


DE ESPIRITUALIDADE PARA OS BISPOS


PROMOVIDO PELO MOVIMENTO DOS FOCOLARINOS








Senhores Cardeais
Venerados Irmãos no Episcopado!

1. É-me grato dirigir-vos uma afectuosa e fraterna saudação, por ocasião do Encontro espiritual, que vos vê reunidos de várias partes do mundo, a fim de aprofundardes o vínculo de comunhão eclesial entre vós e com o Sucessor de Pedro, e de reflectirdes, no confronto entre as respectivas experiências pastorais, sobre alguns aspectos particulares da espiritualidade do Movimento dos Focolarinos da Unidade.

Este vosso encontro anual oferece-me a grata oportunidade para fazer chegar a cada um dos participantes a certeza da minha proximidade espiritual e da minha lembrança na oração, a fim de que o próprio Cristo – que, como ressalta a Carta aos Hebreus, é «o Pastor supremo das ovelhas» (He 13,20) – assista com a Sua graça os intensos trabalhos destes dias e vos acompanhe no vosso quotidiano ministério episcopal.

2. Este vosso Encontro insere-se no contexto do caminho de preparação para o Grande Jubileu do Ano 2000. Já nos inserimos decididamente no segundo ano de preparação imediata para o Jubileu, no qual a Igreja é chamada a reflectir, de modo particular, sobre o Espírito Santo e a Sua presença santificadora no seio da Comunidade dos discípulos de Cristo.

Como recordei na Carta Apostólica Tertio millennio adveniente, o próprio Espírito, que suscita na Igreja a multiplicidade dos carismas e dos ministérios, sustenta com a força divina que Lhe é própria a íntima conexão dos vários membros e anima a comunhão do inteiro Corpo de Cristo. «A unidade do Corpo de Cristo está fundada sobre a acção do Espírito, é garantida pelo ministério apostólico e sustentada pelo mútuo amor (cf. 1Co 13,1-8)» (n. TMA 47). As aprofundadas reflexões da vossa Reunião, enriquecidas também pelo amplo intercâmbio de experiências pastorais, constituem uma preciosa ocasião para captar, de modo mais intenso e vital, o sentido da colegialidade efectiva e afectiva e da comunhão eclesial, vivida de maneira concreta no serviço apostólico a vós confiado.

3. O tema escolhido para o Encontro deste ano – «Rumo à unidade das nações e dos povos» – põe-se na esteira dos ensinamentos do Concílio Vaticano II, que reservou grande atenção à missão universal da Igreja, aberta aos vastos horizontes do mundo actual, para o qual é chamada a ser «sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano» (Lumen gentium LG 1). A própria diversidade das zonas de onde provindes e nas quais fostes chamados a servir o Evangelho, põe em clara evidência a «catolicidade» da Igreja, a qual, formada por pessoas de várias nações, constitui o único Povo de Deus, remido por Cristo e animado pelo Espírito.

No caminho rumo à plena unidade dos cristãos para a qual, não obstante as inúmeras tensões e dificuldades, se orienta a história guiada pela Providência divina, os sucessores dos Apóstolos são chamados a oferecer um próprio e peculiar contributo, através do tríplice ofício de ensinar, governar e santificar a porção do rebanho de Cristo a eles confiada.

4. Caros e venerados Irmãos! No vosso serviço de animação vos sirva de guia e apoio a materna intercessão da Virgem Maria. Como bem ressalta o ícone de Maria no Cenáculo com Pedro e os outros Apóstolos, reunidos à espera do Espírito Santo (cf. Act Ac 1,12), a tarefa apostólica e a missão da Mãe de Deus estão intimamente unidas e são complementares. O ideal de santidade, para a qual tende a inteira missão da Igreja, de facto já está preformado e prefigurado em Maria.


Discursos João Paulo II 1998 - 2 de Fevereiro de 1998