Discursos João Paulo II 1998 - 18 de Abril de 1998

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À IV SESSÃO PLENÁRIA DA PONTIFÍCIA


ACADEMIA DAS CIÊNCIAS SOCIAIS


23 de Abril de 1998





Estimados Irmãos
no Episcopado e no sacerdócio
Ilustres Senhores!

1. Sinto-me feliz por vos acolher, por ocasião da vossa reunião no Vaticano para a IV Sessão Plenária da Pontifícia Academia das Ciências Sociais, que tem como tema «Democracy – some acute questions».

Dirijo a cada um de vós a minha cordial saudação, e agradeço de maneira particular ao Presidente, Prof. Edmond Malinvaud, as palavras com que se fez intérprete dos sentimentos de todos e ilustrou a finalidade da presente Sessão. Nestes quatro anos de fundação da Academia, nas reuniões plenárias e nos encontros de estudo escolhestes como temas centrais das vossas investigações e confrontos dois temas de importância fundamental para a Doutrina social da Igreja: em primeiro lugar o trabalho e a profissão, e agora a democracia.

Congratulo-me convosco e exprimo a minha profunda gratidão pelo fecundo trabalho que realizastes em tão breve tempo. As actas das sessões plenárias e o volume acerca dos problemas concernentes à democracia, que publicastes e gentilmente me enviastes, não mostram apenas a grande riqueza e variedade de conteúdos, mas perspectivam, ao mesmo tempo, aplicações concretas para tornar o mundo mais humano, unido e justo.

2. Observei com prazer que todas as pesquisas por vós feitas tiveram sempre em conta as orientações fundamentais da doutrina social da Igreja, desde a memorável Encíclica Rerum novarum de Leão XIII até às mais recentes, a Laborem exercens, a Sollicitudo rei socialis e a Centesimus annus.

Os ensinamentos da Igreja acerca das temáticas sociais constituem um corpo doutrinal sempre aberto a novos aprofundamentos e actualizações. Com efeito – como escrevi na Centesimus annus – «a Igreja não tem modelos a propor. Os modelos reais e eficazes poderão nascer apenas no quadro das diversas situações históricas, graças ao esforço dos responsáveis que enfrentam os problemas concretos em todos os seus aspectos sociais, económicos, políticos e culturais que se entrelaçam mutuamente» (n. 43).

A doutrina social da Igreja não é chamada a interessar-se pelos aspectos técnicos das numerosas situações sociais, a fim de delinear as suas próprias soluções. A Igreja anuncia o Evangelho e preocupa-se por que ele possa manifestar-se em toda a sua riqueza e novidade que o caracteriza. A mensagem evangélica deve permear as várias realidades culturais, económicas e políticas. Neste esforço de inculturação e de aprofundamento espiritual, também a Academia para as Ciências Sociais é chamada a oferecer o seu contributo específico. Como peritos das disciplinas sociais e como cristãos, sois chamados a desempenhar um papel de mediação e de diálogo entre fé e ciência, entre ideais e realidades concretas; um papel que, por vezes, pertence também aos pioneiros, porque vos é pedido que indiqueis novas pistas e soluções para resolver de maneira mais equitativa os delicados problemas do mundo actual.

3. O vosso Presidente, Prof. Malinvaud, ressaltou há pouco que nesta quarta Sessão Plenária a vossa intenção é estudar o complexo tema da democracia, que articulastes de acordo com as três grandes perspectivas de investigação: a relação entre democracia e valores; o papel da sociedade civil na democracia; a relação entre democracia e as instâncias supranacionais e internacionais.

São assuntos que esperam um aprofundamento e orientações idóneas que guiem os pesquisadores, os governantes e as nações nesta passagem milenária do século XX para o XXI. Como é significativo este tempo que nos prepara para o grande Jubileu do Ano 2000, do qual esperamos para a Igreja e para o mundo uma forte mensagem de reconciliação e de paz!

Ilustres e queridos Académicos, oxalá o Espírito do Senhor Ressuscitado vos acompanhe neste itinerário de análise e de pesquisa. Acompanho-vos com viva participação e, em penhor da minha proximidade aos vossos trabalhos, concedo-vos de coração, a vós Membros da Pontifícia Academia para as Ciências Sociais, uma particular Bênção Apostólica, que faço extensiva aos peritos por vós convidados, aos colaboradores e a todos os vossos entes queridos.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À COMUNIDADE DO SEMINÁRIO ARQUIEPISCOPAL


DE FLORENÇA


30 de Abril de 1998





Senhor Cardeal
Caríssimos Superiores e Alunos
do Seminário Arquiepiscopal de Florença!

1. Acolhi com muito gosto o vosso pedido de encontrar o Papa. Sei que ele corresponde a um desejo profundo, do qual se fez intérprete o vosso Arcebispo, o venerado e caro Irmão Cardeal Silvano Piovanelli, a quem saúdo cordialmente e agradeço. Enquanto o escutava, retornavam à minha mente as imagens da vossa casa de formação, que o Senhor me deu a alegria de visitar, em Outubro de 1986, por ocasião da minha peregrinação apostólica à Diocese e à cidade de Florença.

Vós, hoje, viestes como que retribuir aquela minha visita, para testemunhardes que o Seminário é vivo e operante. Sei, com efeito, caros Superiores e Alunos, aos quais se dirigem as minhas mais afectuosas boas-vindas, que a vossa Comunidade é formada por componentes de diferentes Dioceses. Dela fazem parte seminaristas de Florença, São Miniato, Volterra, Massa Marítima, Piombino, sem esquecer os jovens provenientes da Polónia e do Querala (Índia). Sois, portanto, uma Comunidade que, nalguma medida, se pode dizer legitimamente internacional.

Não foi uma específica circunstância que vos trouxe aqui hoje. Entretanto, que momento podia ser mais adequado do que este, na imediata proximidade do domingo chamado do «Bom Pastor»? Precisamente neste domingo, o quarto de Páscoa, celebra-se o Dia Mundial de Oração pelas Vocações. O contexto litúrgico e eclesial oferece ao nosso encontro um pano de fundo mais do que nunca significativo, e convida-nos a sentir-nos unidos, em comunhão de oração e de intentos, com todas as comunidades vocacionais espalhadas pelo mundo, em particular com aquelas em que, precisamente neste período do ano, acontecem as Ordenações sacerdotais.

2. A Igreja inteira é, na realidade, «comunidade vocacional»: com efeito, ela existe enquanto é chamada e enviada pelo Senhor para evangelizar as gentes e fazer crescer no meio delas o Reino de Deus. A alma desse dinamismo espiritual, em virtude do qual cada baptizado é convidado a descobrir o dom de Deus e a pô-lo ao serviço da comum edificação, é o Espírito Santo. Ressaltei esta singular realidade na apropriada Mensagem, por ocasião do trigésimo quinto Dia Mundial de Oração pelas Vocações.

O Espírito é como o vento que sopra a vela da grande barca da Igreja. Esta, todavia, considerando bem, vale-se de outras inúmeras pequenas velas que são os corações de casa um dos baptizados. Cada um, caríssimos, é convidado a içar a própria vela e a desfraldá-la com coragem, para permitir ao Espírito agir com toda a Sua força santificadora. Consentindo ao Espírito agir na própria história pessoal, oferece-se também o melhor contributo à missão da Igreja.

Não tenhais medo, caríssimos seminaristas, de desfraldar a vossa vela ao sopro do Espírito! Deixai que a Sua força da verdade e do amor anime cada dimensão da vossa jovem existência: o vosso empenho espiritual, as intenções profundas da vossa consciência, o aprofundamento do estudo teológico e as experiências de serviço pastoral, os sentimentos e os afectos, a vossa própria corporeidade. Todo o vosso ser é chamado a responder ao Pai pelo Filho no Espírito, para que a vossa pessoa inteira se torne sinal e instrumento de Cristo, Bom Pastor.

3. Vós, caríssimos, estais a prepararvos para vos tornar, na Igreja e para a Igreja, «representação sacramental de Jesus Cristo Cabeça e Pastor» (Pastor dabo vobis, 15), a fim de proclamardes de maneira autorizada a sua Palavra e repetirdes os Seus gestos de perdão e de salvação, sobretudo com o Baptismo, a Penitência e a Eucaristia, e de exercerdes a Sua amorosa solicitude, até ao dom total de vós mesmos pelo rebanho (cf. ibid.). Esta expressão «representação sacramental» é bastante forte e eloquente, e pede que seja meditada profundamente, e sobretudo interiorizada no recolhimento da oração.

Com efeito, quem poderia considerar-se à altura dessa dignidade? Vêm à mente as palavras da Carta aos Hebreus: «E ninguém usurpe para si esta honra, somente a tome o que é chamado por Deus» (5, 4). Trata-se de acolher este dom imerecido com a humilde e corajosa disponibilidade de Maria, que diz ao Anjo: «Como será isso?» e, depois de ter escutado a sua palavra iluminadora, se oferece a si mesma sem reservas: «Eis-me, faça-se em mim segundo a tua palavra» (cf. Lc Lc 1,34-38).

Caríssimos, o seminário é o tempo providencial oferecido aos chamados para renovarem, dia após dia, este «sim» ao Pai mediante o Filho no Espírito. A partir deste «sim» o ministério sacerdotal pode tornar-se, nas modalidades concretas do seu histórico desfraldar-se, um «Amém» a Deus e à Igreja, configurado ao «Amém» salvífico do Bom Pastor, que oferece a vida pelas Suas ovelhas (cf. 2Co 1,20). Por isto rezo por vós e convosco.

Por isso invoco a solícita intercessão da Rainha dos Apóstolos, enquanto de coração concedo a cada um de vós uma especial Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS CONSELHOS NACIONAIS DOS CONSULTORES


DO TRABALHO DA ITÁLIA, ESPANHA E POLÓNIA


30 de Abril de 1998





Ilustres Senhoras e Senhores!

1. Tenho a alegria de me encontrar convosco, acolhendo com ânimo grato um vosso desejo manifestado já há algum tempo. Vós representais, de modo altamente qualificado, a categoria profissional dos Consultores do Trabalho, tal como ela se exprime a nível institucional na Itália, Espanha e Polónia, ou seja, nos três Conselhos nacionais das respectivas Ordens.

Agradeço à Senhora Gabriella Perini as amáveis expressões que me dirigiu em nome de todos vós. Antes de mais, quereria exprimir a minha satisfação pela ligação que soubestes criar entre as respectivas organizações nacionais, mediante vínculos que estão em primeiro lugar baseados na comunhão de interesses e de problemas profissionais, mas que são revigorados e corroborados também pelo conceito do homem e da sociedade, inspirado na mensagem cristã e na doutrina social da Igreja.

A ocasião é, portanto, oportuna para evocar alguns conteúdos gerais desse conceito, na persuasão de que isto não deixará de ser útil para os vossos específicos objectivos.

2. Do ponto de vista da ética social, o interesse saliente da vossa profissão é dado pelo facto que ela se ocupa do próprio trabalho, ou melhor, das relações de trabalho, a fim de tutelar a sua rectidão e a segurança nas suas várias fases, para salvaguardar a dignidade da pessoa e da família e no respeito das legítimas razões da empresa.

Eu quis dedicar a Mensagem para o Dia Mundial da Paz deste ano, quinquagésimo aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem, ao tema da justiça. Não há dúvida que promover relações de trabalho realmente dignas da pessoa humana significa actuar para consolidar a justiça, pondo assim as premissas para uma paz autêntica e duradoura.

Nessa perspectiva, as exigências a que sois chamados a responder são múltiplas. Primeira entre todas, evidentemente, a de favorecer o trabalho e combater o desemprego. Esta última é, em todo o caso, um mal e, quando atinge certos níveis, pode tornar-se uma verdadeira calamidade social, ainda mais dolorosa se se consideram as consequências nefastas que comporta para as famílias e para os jovens.

A alta taxa de desempregados traz consigo sérios riscos de exploração. Por isso, é necessário vigiar atentamente sobre a equidade do salário e sobre as condições de trabalho, para que sejam garantidos os direitos à saúde, ao repouso e à previdência.

E que dizer, depois, do trabalho que a mãe desenvolve na família? Não se deveria talvez trabalhar com mais atenção por uma legítima reavaliação social das tarefas maternais? De coração faço votos por que se detenha a considerar estas exigências manifestadas por várias partes, avaliando de maneira concreta a fadiga unida às ocupações domésticas e a necessidade que os filhos têm de cuidado, de amor e de afecto, por parte dos pais e de modo especial da mãe.

3. Ilustres Senhores e Senhoras, obrigado pelo vosso empenho e pelos justos esforços que fazeis para tutelar os direitos dos trabalhadores. Todos sabem que um cuidadoso serviço às legítimas exigências de quantos estão unidos pela mesma profissão, não pode deixar de considerar as limitações impostas pela situação económica geral do País. Penso, neste momento, naquilo que a Itália, a Espanha e a Polónia estão a realizar para favorecer o almejado crescimento na liberdade e na solidariedade.

Penso também em cada iniciativa que tem em vista apressar a construção duma Europa, por sua vez, mais libre e solidária. Possa o vosso empenho ser váli- do estímulo à harmonização dos ordenamentos jurídicos dos vossos respectivos Países no sector do trabalho. Isto contribuirá de maneira eficaz para fazer progredir os povos do Continente em direcção daquela recíproca integração, que não pode deixar de ser vantajosa para todos.

A este desejo uno os meus bons votos para vós e para as vossas famílias, enquanto de coração vos abençoo.



                                                                                     Maio de 1998

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS CAPELÃES UNIVERSITÁRIOS, POR OCASIÃO


DO 50° ANIVERSÁRIO DA CAPELA


DA UNIVERSIDADE DE ROMA "LA SAPIENZA"


: 1° de Maio de 1998



Caríssimos Capelães universitários!

1. Tenho a alegria de vos acolher nesta especial Audiência, que se realiza por ocasião do Congresso promovido para celebrar o quinquagésimo aniversário da Capela da Universidade «La Sapienza». Vós representais aqui muitas e ilustres Universidades de vários Países da Europa. Desejo exprimir-vos o meu apreço pela generosa disponibilidade com que correspondestes ao convite da Congregação para a Educação Católica e dos Pontifícios Conselhos para os Leigos e para a Cultura, consentindo realizar com a vossa participação este encontro de notável relevância pastoral.

Agradeço ao Senhor Cardeal Pio Laghi o cordial discurso com que se fez intérprete dos vossos sentimentos. Com ele saúdo também os outros Senhores Cardeais, que honram este encontro com a sua presença. Uma palavra de especial aprovação merecem também o Conselho das Conferências Episcopais da Europa, a Comissão diocesana para a pastoral universitária do Vicariato de Roma e o Magnífico Reitor da Universidade «La Sapienza», pelo seu solícito contributo à realização da iniciativa.

O tema escolhido para os vossos trabalhos oferece a oportunidade de verificar e aprofundar as indicações pastorais sugeridas no documento «Presença da Igreja na Universidade e na cultura universitária», e de as contextualizar à luz do caminho da nova evangelização, que se está a desenvolver na Europa após a Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos, que foi celebrado em 1991.

2. Como eu já recordava aos Bispos europeus alguns anos antes, «a Europa para a qual somos enviados sofreu tantas e tais transformações culturais, políticas, sociais e económicas, que põe o problema da evangelização em termos totalmente novos. Poderíamos também dizer que a Europa, do modo como se configurou em seguida às complexas vicissitudes do último século, pôs o desafio mais radical que a história jamais conheceu ao cristianismo e à Igreja, mas ao mesmo tempo abre hoje novas possibilidades criativas de anúncio e de encarnação do Evangelho» (Discurso ao Conselho das Conferências Episcopais Europeias, 11 de Outubro de 1985, n. 1: Insegnamenti, VIII, 2 [1985], 910-911; L'Osserv. Rom. 20/10/85, pág. Rm 1). O nosso tempo, tão rico de meios nos Países de alto desenvolvimento tecnológico, descobre-se dramaticamente pobre de finalidades. O homem de hoje, privado de referências objectivas de valor e agredido por um difundido cepticismo sobre os fundamentos mesmos do saber e da ética, cede muitas vezes a horizontes restritos e abordagens temporâneas.

Neste clima relativista, sobre uma cultura que exalta de modo absoluto o indivíduo e não o dispõe para a solidariedade, pesa o perigo de a liberdade se transformar em arbítrio dos mais fortes contra os mais fracos, contradizendo-se a si mesma. Isto vai contra as relações pessoais, empobrece e deforma a convivência social, e torna o saber sub-jugado ao domínio do pensamento instrumental.

3. A pastoral universitária, cujo coração pulsante é a Capelania, tem a tarefa de tornar a traçar, com tensão confiante e paciente, as coordenadas dentro das quais é possível inscrever o Evangelho, indicando sem incertezas ao âmago da desorientação contemporânea a eclipse do sentido de Deus. Com efeito, como ensina o Concílio Vaticano II, a criatura «sem o Criador não subsiste» (Gaudium et spes GS 36).

Sem uma compartilhada referência aos valores objectivos, também a convergência cultural sobre a dignidade da pessoa e sobre o valor da vida – embora seja tão difundida – corre o perigo de permanecer irrelevante. A verdade cristã é atraente e persuasiva precisamente quando sabe imprimir fortes orientações à existência humana, anunciando de maneira convincente Cristo, que toma pela mão o viandante incerto e duvidoso, para lhe mostrar a direcção e a meta. Diz Jesus: «Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida» (Jn 14,6).

A fé cristã, dom gratuito de Deus, é portanto escolha motivada e racional: confronta-se seriamente com as exigências autênticas da alma humana; ama a reflexão atenta e não teme o crivo severo de um aprofundado exame crítico. É neste contexto que se insere de maneira muito feliz a celebração do quinquagésimo aniversário da Capela da Universidade «La Sapienza». Dom não isento de intuição profética do meu venerado predecessor Pio XII, ela constitui para a comunidade universitária de Roma uma presença de alto perfil pastoral e cultural.

4. O meu pensamento dirige-se agora a todas as Capelanias actuantes nas Universidades europeias, que por longa tradição oferecem às respectivas comunidades universitárias momentos de reflexão religiosa e fermentos de animação cultural cristã. A vossa presença, caros Capelães e agentes pastorais, é testemunho vivo de uma tradição sapiente que sabe dar respostas concretas às exigências da hora presente. Exorto-vos, portanto, a prosseguir o vosso empenho, intensificando a dedicação apostólica que vos caracteriza. A Capela universitária é lugar do espírito, onde se detêm em oração e encontram alimento e orientação os que crêem em Cristo, que vivem com modalidades diversas a experiência do estudo académico; é lugar onde se exercitam as virtudes cristãs, onde cresce e se desenvolve com coerência a vida baptismal; é casa acolhedora e aberta, para todos aqueles que, escutando o Mestre interior, se fazem pesquisadores da verdade e servem o homem na dedicação diuturna a um saber, não satisfeito de horizontes estreitos e pragmáticos. No contexto da modernidade declinante, ela não pode deixar de ser centro vivo e propulsivo de animação cristã da cultura, no diálogo respeitoso e franco, na proposta clara e motivada (cf. 1P 3,15), no testemunho que interroga e convence.

Nesta perspectiva se revela de grande importância a actividade das Capelanias universitárias, para sensibilizar e preparar o mundo universitário, em particular dos jovens, para o Grande Jubileu. Para o ano 2000 estão programados um encontro mundial dos professores universitários e o Dia Mundial da Juventude. São dois encontros muito importantes, para os quais é necessário criar uma colaboração mais estreita entre as Capelanias universitárias a nível nacional e europeu, a fim de favorecer uma preparação específica e uma participação mais qualificada do mundo universitário.

5. A Capela universitária apresenta-se, portanto, como uma estrutura pastoralmente idónea para responder ao pedido de salvação, que pulsa no coração do homem e se manifesta, embora seja de formas às vezes contraditórias, também no nosso tempo, em particular na vida dos jovens.

Os novos perfis da pastoral universitária constituem a modalidade específica, com que a Igreja quer inserir-se, de maneira sempre mais eficaz, competente e respeitosa, nos lugares onde maturam as opções de pensamento, dos quais dependerão muitos comportamentos pessoais e sociais das gerações vindouras.

A obra de evangelização das Capelanias universitárias quer ajudar o homem de hoje – sobretudo as novas gerações – a desmascarar o carácter ilusório de muitos sucedâneos culturais, a superar a sugestão ressurgente das figuras mudas dos ídolos, numa recuperação de liberdade interior, que abre ao serviço do Deus vivo e verdadeiro (cf. 1Th 1,9).

Em diálogo intenso com as diversas componentes da Universidade e perita no cuidado espiritual personalizado, a Capelania responde assim à exigência de animar, na vertente tanto académica como das comunidades cristãs, o empenho da busca de Deus e o testemunho da fé.

Estou persuadido de que os contributos de ilustres relatores e o intercâmbio de experiências entre as diversas Capelanias oferecerão um válido impulso à pastoral universitária e darão vida a uma mais incisiva obra de evangelização neste importante sector da sociedade europeia.

Com estes votos, renovo a todos vós a minha cordial saudação e concedo-vos de bom grado, como penhor de serviço frutuoso, uma particular Bênção Apostólica, que faço extensiva aos vossos Colaboradores e a quantos animam com empenho as vossas Capelanias.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À PEREGRIINAÇÃO DO COLÉGIO "BALLERINI"


DE SEREGNO (MILÃO)


: 2 de Maio de 1998





Caríssimos educadores e alunos
do Colégio Ballerini!

1. É-me grato acolher-vos na singular circunstância do centenário do vosso Colégio e apresentar as minhas cordiais boas-vindas a todos vós. Saúdo, antes de tudo, o Reitor, Mons. Luigi Schiatti, os diversos colaboradores e educadores, que prodigalizam com generosidade as suas energias na animação cristã da benemérita Instituição. Saúdo-vos depois com afecto, caros jovens e rapazes, que em grande número viestes hoje aqui, juntamente com os vossos familiares. A cada um o meu mais vivo agradecimento por esta visita, que se insere na peregrinação que estais a fazer aos lugares de Roma sagrados à nossa fé. Faço votos por que retorneis a casa enriquecidos de frutos espirituais e de santos propósitos para a vossa vida pessoal e a do próprio Colégio.

2. Comemorais cem anos de actividade do vosso Instituto. Lançando um olhar para o século transcorrido, ficamos quase desorientados diante das complexas vicissitudes que o caracterizaram. Pois bem, embora entre tantas vicissitudes, o Colégio Ballerini, com continuidade surpreendente, manteve firme e sólida a própria fisionomia de séria e exigente estrutura formativa humana e cristã, seguindo a orientação impressa pelo Fundador, Padre Angelo Longoni, eminente figura do clero milanês dos anos entre os séculos XIX e XX.

Ao longo deste arco de tempo, o Colégio permaneceu um centro de autêntica promoção cultural e religiosa, não só para a cidade de Seregno mas para o inteiro território limítrofe. São muitos, de facto, os alunos ilustres por méritos culturais, sociais e eclesiais, que nele se formaram seguindo aquela que gostais de definir «a pedagogia do coração e da fé».

Enquanto damos graças ao Senhor pelo bem realizado, não podemos deixar de observar que as vicissitudes atravessadas pelo vosso Colégio nos fazem reflectir como na realidade, com o passar dos anos, o bem semeado embora entre dificuldades e fadigas, produz o seu fruto. E isto torna-se um convite a empenhar-se cada vez mais na construção duma sociedade civil bem estruturada, promovendo os valores evangélicos com coragem, tenacidade e confiança. Os votos que neste dia exprimo a todos vós, caros educadores e alunos, são por que, conscientes da importância duma formação inspirada num autêntico humanismo cristão, persevereis nas vossas respectivas tarefas, tendo sempre vivo o ardor apostólico que caracterizou o vosso inesquecível Fundador e os seus colaboradores.

3. Quereria dirigir uma palavra particularmente a vós, caríssimos jovens e rapazes, que sois a parte preponderante do Colégio e constituís a sua esperança para o futuro. Tende sempre diante do vosso olhar o rosto luminoso de Cristo, que vos chama a ser autenticamente livres e protagonistas da vossa existência. A Sua paixão, morte e ressurreição são um eloquente apelo a enfrentar, com maturidade consciente, os obstáculos e os desafios da vida, bem sabendo, como nos recordou a Liturgia no decurso da Vigília pascal, que o Senhor ressuscitado é «Rei eterno que venceu as trevas do mundo». Só Ele é a Verdade, o Caminho e a Vida.

O ser humano, embora com as admiráveis capacidades que distinguem a sua inteligência, só consegue tartamudear quando se trata de definir o sentido último da existência e o fim autêntico do viver e do morrer. A investigação científica e filosófica, se for desenvolvida de modo honesto e aberta à verdade, conduz como que naturalmente a abrir o coração ao mistério de Deus transcendente, descobrindo assim finalmente respostas apropriadas. Cristo vem ao encontro da nossa sede de infinito com a Sua palavra de salvação. Ele encarnou-Se para iluminar a nossa existência.

Caros pais e prezados educadores, com o vosso exemplo ajudai os vossos filhos e alunos a percorrer o caminho que leva a Cristo, luz do mundo. E vós, queridos jovens e rapazes, de todas as idades e de todas as classes, sede reconhecidos pelo facto de viverdes num ambiente onde é mais fácil conhecer e amar Jesus e no qual vos preparais para ser mensageiros do seu Evangelho, lá aonde vos conduzem as vicissitudes da vida. Jesus caminha convosco: desejo de coração que sintais sempre a alegria e o consolo da Sua presença luminosa e corroborante.

4. Caríssimos, iniciámos há pouco o mês de Maio, mês dedicado tradicionalmente a Nossa Senhora. Este é também o período conclusivo para a actividade na escola. Confio cada um de vós a Maria Santíssima. Monsenhor Paolo Angelo Ballerini foi ternamente devoto da Virgem Santa, aprendendo d'Ela a cultivar um constante anélito espiritual e um intenso empenho de estudo, que o conduziram a conjugar de maneira singular a bondade com o saber. Seja assim também para vós, caríssimos! Olhai, como ele, para Maria; invocai-a com filial confiança; imitai-a com fiel docilidade. A Mãe de Deus reine sempre na vossa vida e no vosso Colégio.

Com estes votos, concedo-vos de bom grado a propiciadora Bênção Apostólica, que faço extensiva a todas as pessoas que vos são queridas.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II

A UM CONGRESSO PROMOVIDO

PELA COMISSÃO EPISCOPAL


PARA OS PROBLEMAS SOCIAIS


E O TRABALHO DA CEI








Ao Venerado Irmão FERNANDO CHARRIER
Bispo de Alexandria Presidente da Comissão Episcopal
para os Problemas sociais e o Trabalho
da Conferência Episcopal Italiana

1. Tenho a alegria de dirigir a minha saudação de bons votos aos participantes no Congresso nacional sobre «A questão do trabalho hoje. Novas fronteiras da evangelização», que se realizará em Roma nos próximos dias. Em particular, desejo saudar com afecto o Cardeal Camillo Ruini, Presidente da Conferência Episcopal Italiana, e Vossa Excelência, venerado Irmão, que se fez promotor da providencial iniciativa. O meu pensamento dirige-se, além disso, aos numerosos agentes pastorais das Dioceses e aos representantes das agregações laicais que, com a sua presença, testemunham de modo eloquente a atenção da Igreja que está na Itália ao mundo do trabalho e a sua vontade de estar na história com amor, levando a todos o anúncio de salvação do Ressuscitado.

A inserção da celebração do Congresso no segundo ano de preparação imediata para o Grande Jubileu do Ano 2000, dedicado à reflexão sobre a presença do Espírito Santo na Comunidade cristã e no mundo, sublinha o desejo dos organizadores de porem o Congresso sob a guia d'Aquele que conduz à verdade total (cf. Jo Jn 16,13), para acolher os numerosos desafios e as exigências de justiça e de solidariedade presentes no mundo do trabalho.

2. O actual contexto sociocultural notavelmente mudado apresenta, de maneira nova, a questão do trabalho. Como não pôr em relevo a precária situação de quantos não conseguem encontrar uma ocupação de trabalho, os dramas de tantas famílias atingidas pelo desemprego e a preocupante condição dos jovens em busca de um primeiro emprego e de um trabalho digno? Que dizer, depois, daqueles, especialmente mulheres, menores e imigrados aos quais, constringidos a um trabalho clandestino, faltam as mais elementares garantias jurídicas e económicas?

A nova situação, que privilegia de facto as empresas e o sector terciário, põe em evidência além disso as dificuldades em que se debatem os trabalhadores do mundo rural e artesanal, outrora estrutura fundamental da economia italiana e hoje em grave crise. Como ignorar o pedido, apresentado com crescente insistência por estas categorias, de lhes ser reconhecido um papel socioeconómico adequado?

Não menos digna de consideração é a óptica instrumental e utilitarista segundo a qual, muitas vezes, somos movidos a enfrentar os problemas do trabalho, com a consequente e difundida queda dos valores da solidariedade e do respeito pela pessoa. Sintomas reveladores desse posicionamento são, entre outras coisas, as carentes condições de segurança nos lugares de trabalho e a busca de lucro, a qualquer custo.

Se, depois, alargamos a reflexão a dimensões mundiais, não podemos deixar de sublinhar, nos Países que se encaminham para a chamada terceira fase da industrialização, o fenómeno sempre mais marcado da globalização da economia e da finança. Ele apresenta a exigência de soluções que sejam capazes de garantir a irrenunciável perspectiva do bem comum.

À mundialização da economia está ligado, também em Nações desenvolvidas como a Itália, o perigo da exclusão de algumas áreas geográficas dos projectos de desenvolvimento, com consequências que penalizam os jovens e quantos se encontram despreparados para enfrentar as rápidas inovações tecnológicas. Isto gera um inquietante sentido de insegurança e de mal-estar, sobretudo nas camadas mais débeis da população.

Apesar disto, no mundo do trabalho não faltam promissores fermentos de esperança. Está a emergir nele uma nova cultura que, em consonância com a doutrina social da Igreja, considera como factor decisivo da produção «o próprio homem, isto é, a sua capacidade de conhecimento que se revela no saber científico, a sua capacidade de organização solidária, a sua capacidade de intuir e satisfazer a necessidade do outro» (Carta Enc. Centesimus annus CA 32).

Está-se a tomar consciência, além disso, do facto que é possível estender o bem-estar social e económico ao planeta inteiro, oferecendo a todos os povos a oportunidade de realizar o próprio e autêntico desenvolvimento.

3. As inéditas fronteiras da questão do trabalho empenham os cristãos e os homens de boa vontade em reconstruir o sentido da actividade humana nas suas dimensões pessoais, familiares e comunitárias, superando as recorrentes tentações do egoísmo, do corporativismo e da supremacia do mais forte.

Nesse empenho, que requer a cooperação de todos, aos crentes é pedido que ofereçam um seu contributo peculiar: chamados a ser no mundo sinais autênticos do amor de Deus, eles não podem deixar de sentir a necessidade de ultrapassar os âmbitos restritos do próprio grupo ou do próprio País, respondendo à globalização dos sistemas económicos com a globalização do empenho de solidariedade para com as gerações presentes e futuras.

O Espírito, que convida o homem a colaborar de maneira responsável na humanização do mundo e a construir relações de fraternidade, lealdade e justiça, pede aos cristãos que se empenhem na promoção, entre as diversas partes, do diálogo e da disponibilidade necessários para realizar o bem comum, enfrentando com coragem sobretudo os problemas dos mais débeis e dos mais pobres. À cultura da conquista e da concorrência sem regras, que parece caracterizar o mercado internacional, eles devem opor opções concretas aptas para promover um sistema político e social, fundado sobre o reconhecimento da dignidade de cada pessoa e sobre o respeito do ambiente.

O vosso Congresso não deixará de reflectir sobre estes argumentos de grande importância social e pastoral. De coração faço votos por que ele possa oferecer um contributo significativo à renovação do mundo do trabalho, na linha da realização de «uma sociedade do trabalho livre, da empresa e da participação» (Ibid., 35), escrevendo ao mesmo tempo um capítulo importante do projecto da Igreja na Itália, que tem em vista transformar profundamente, graças ao anúncio e ao testemunho do Evangelho, a inteira sociedade.

4. Com efeito, o Espírito que «é também para a nossa época o agente principal da nova evangelização» (Carta Apost. Tertio millennio adveniente, TMA 45), impele os cristãos a anunciarem o Evangelho no mundo do trabalho e da economia. Esse empenho faz parte da missão do Povo de Deus e do seu estar ao serviço de cada homem e do homem todo. A crescente consciência de que «não há verdadeira solução para a questão social fora do Evangelho e que, por outro lado, as coisas novas podem encontrar neste o seu espaço de verdade e a devida avaliação moral» (Carta Enc. Centesimus annus CA 5) interpela com força a Comunidade cristã a ser sinal autêntico de esperança, para oferecer ao homem de hoje «motivações sólidas e profundas para o empenho quotidiano na transformação da realidade, a fim de a tornar conforme ao projecto de Deus» (Carta Apost. Tertio millennio adveniente, TMA 46).

A solução dos múltiplos problemas do homem não pode acontecer senão com a redescoberta dos valores espirituais. Não basta dar respostas concretas a interrogativos económicos e materiais; é necessário suscitar e cultivar uma autêntica espiritualidade do trabalho, que ajude os homens a aproximarem-se de Deus, Criador e Redentor, a participarem nos Seus planos salvíficos em relação ao homem e ao mundo e a aprofundarem na sua vida a amizade com Cristo (cf. Carta Enc. Laborem exercens, 24).

5. Em sintonia com a experiência de Maria e dos Apóstolos no Cenáculo, que este tempo pascal oferece à nossa consideração, o crente é chamado a orientar a oração «para os destinos salvíficos, para os quais o Espírito Santo abre os corações com a Sua acção, ao longo de toda a história do homem sobre a terra» (Carta Enc. Dominum et vivificantem DEV 66). Alimentando a própria fé no encontro com o Senhor, ele esforçar-se- á por despertar a esperança no coração dos homens e dos responsáveis das instituições, para que ponham todo o cuidado em promover e defender a dignidade da pessoa.

A questão do trabalho constitui, hoje, um grande desafio para a Comunidade cristã, e de modo particular para os fiéis leigos, estimulados ao dever fundamental de «animar, com espírito cristão, as realidades temporais e testemunhar, nesse campo, que são operadores de paz e de justiça» (Carta Enc . Sollicitudo rei socialis SRS 47), pondo em prática medidas inspiradas na solidariedade e no amor preferencial pelos pobres.

Possa este vosso Congresso, aproveitando os sinais positivos presentes na realidade italiana, individualizar novas vias de evangelização do mundo do trabalho e oferecer indicações e apoios oportunos para resolver os numerosos problemas abertos.

Estou certo de que, ao serem delineados acontecimentos capazes de mudar o rosto da Europa, desenhando novos cenários sociais e económicos, o empenho dos católicos da Itália suscitará nos responsáveis da administração pública opções corajosas, para construírem uma sociedade mais livre, democrática e justa, a nível nacional e planetário.

Com estes bons votos, invocando a protecção da Mãe do Redentor sobre Vossa Excelência, venerado Irmão no Episcopado, sobre os participantes no Congresso e sobre quantos se esforçam de maneira activa para a humanização do trabalho, com afecto concedo a todos uma especial Bênção Apostólica, propiciadora da graça e da paz do Salvador.



Vaticano, 6 de Maio de 1998.





Discursos João Paulo II 1998 - 18 de Abril de 1998