Discursos João Paulo II 1998 - 21 de Novembro de 1998

3. Este paradoxo afunda as próprias raízes na Bíblia, que elabora uma intensa e poderosa teologia da santidade divina e humana. O Antigo Testamento esclarece que Israel deve ser santo como Deus mesmo é santo (cf. Lv Lv 19,2). Isto significa que Israel devia ser diferente, assim como Deus é infinitamente diverso do mundo, como a própria Bíblia salienta de forma consistente, forjando a sua doutrina da transcendência divina. Contudo, esta diversidade de Israel não é uma diferença gratuita; tão-pouco é introvertida ou defensiva. Assim como Deus pode fazer todas as coisas «boas» (cf. Gn Gn 1,31), precisamente porque Ele está acima de tudo, também Israel deve ser diferente em vista do serviço. Assim como a transcendência infinita de Deus torna possível a comunicação do amor perfeito que culmina no Mistério pascal de Cristo, também a compreensão bíblica da santidade do povo de Deus exige aquela liberdade crítica em relação à cultura e às culturas circunstantes, que torna possível o serviço real e genuíno à família humana.

Aquilo que é verdade sobre Israel no Antigo Testamento não é menos verdade acerca da Igreja no Novo Testamento e, consequentemente, no nosso próprio tempo. A Igreja parece e é diferente de muitas maneiras; contudo, esta diversidade só existe em virtude do diálogo e do serviço - por outras palavras, em vista da evangelização. O Concílio foi por vezes invocado para justificar acções que na realidade vão contra a sua finalidade, uma vez que impedem ou obstam a nova evangelização, promovida pelo mesmo Concílio. O problema da «conformidade ao espírito do mundo» é que a unicidade e a natureza transcendental da Igreja são deturpadas por uma compreensão equivocada segundo a qual o diálogo e o serviço exigem precisamente esta conformidade, quando na realidade requerem o contrário. Esta afirmação genérica tem algumas implicações específicas na vida da Igreja que hoje está na Nova Zelândia.

4. Uma das mais importantes reside no campo da educação católica. Não há dúvida de que as escolas católicas existentes no vosso País têm servido de modo magnífico não só os próprios católicos, mas também a sociedade em geral. Elas permanecem uma das maiores realizações na história da evangelização na vossa terra, e como podemos deixar de agradecer a todas as pessoas - especialmente aos religiosos e às religiosas - que trabalham de forma tão maravilhosa para fazer das vossas escolas o recurso primordial que hoje de facto são? É também verdade que as escolas católicas existem para realizar um específico ideal educativo, em plena concordância com o ensinamento católico e promovendo um aprofundamento da fé e do compromisso da parte de todas as pessoas interessadas. Se elas não fossem diferentes das outras escolas, dificilmente poderiam dar garantias dos recursos que lhes são destinados, dado que não desempenhariam mais o papel que lhes é próprio na vida da Igreja. A educação especificamente religiosa que as escolas católicas oferecem tem necessidade de ser compreensiva, sistemática e profunda, fornecendo um conhecimento sólido acerca da fé católica e uma concepção adequada do ensinamento católico moral e social. Nisto, o Catecismo da Igreja Católica permanece o ponto de referência, não só para os Bispos, primeiros mestres da fé, mas inclusive para os sacerdotes e professores que trabalham com eles. Ao aproximarem os seus estudantes da experiência do amor de Deus, as escolas católicas devem indicar os primeiros passos do caminho vital de oração, da aventura contemplativa que impele rumo à amizade com Cristo, alimenta o amor pela Igreja e inspira a esperança da união perene com Deus.

Não obstante, a diversidade da escola católica vai além da catequese e da instrução religiosa, até atingir todos os aspectos da educação, transmitindo o verdadeiro humanismo cristão que brota da ciência e do amor de Cristo. Tal educação leva os jovens a apreciarem a maravilha da dignidade humana e do supremo valor da vida do homem. Ajuda-os a compreenderem a verdade, a respeito da qual fiz uma reflexão na minha recente Carta Encíclica Fides et ratio: a fé precisa da razão se não quiser cair na superstição, e a razão tem necessidade da fé se quiser salvar-se da decepção infinita. Isto é assim porque a pessoa humana é criada para uma verdade absoluta e universal - em última análise, a verdade de Deus - uma verdade que se pode conhecer com certeza. Efectivamente, só mediante o conhecimento da verdade o coração humano encontrará paz, e ainda mais nestes tempos profundamente inquietadores, quando os jovens são com frequência orientados para confundir o entretenimento com a alegria e a informação com o saber. Em última análise, a identidade distintamente católica das vossas escolas deve ser visível não só mediante sinais externos, por mais que estes sejam importantes, mas sobretudo pelo bom êxito no seu ensinamento da justiça, da solidariedade e da verdadeira santidade de vida, assente no profundo e permanente amor a Cristo e à sua Igreja.

5. Uma necessária diferença construtiva também pode ser observada no modo como as vocações sacerdotais e religiosas se relacionam na vida e na missão da Igreja; e isto tem importantes implicações para a formação nos seminários. A tendência a obscurecer o fundamento teológico desta diferença pode levar a uma clericalização indevida dos leigos e a uma laicização do clero. Sem dúvida, é possível que o clero se separe de maneira incorrecta e destruidora, conduzindo a um clericalismo que justamente há-de ser rejeitado. Mas agora é óbvio que quando se ignora a diferença essencial entre as vocações sacerdotais e laicais, as vocações para o sacerdócio praticamente desaparecem, e esta decerto não é a vontade de Cristo, nem a obra do Espírito Santo - assim como decerto não era a intenção do Concílio, quando encorajava um maior compromisso dos leigos na vida da Igreja. Em primeiro lugar, aquilo a que o Concílio exortava era um empenho dos leigos no mundo da família, comércio, política, vida intelectual e cultural - que constituem os campos próprios da missão especificamente laical. Portanto, o Concílio pôs em evidência a secularidade essencial da vocação dos leigos (cf. Lumen gentium LG 31 cf. também Evangelii nuntiandi EN 70 Evangelii nuntiandi, 70; e Christifideles laici CL 17). Isto não significa que os leigos não têm um lugar ou tarefa especial a desempenhar na vida da Igreja ad intra: eles têm-no claramente em muitos sectores pastorais, litúrgicos e educativos. Contudo, o foco central da vocação laical deveria ser o compromisso no mundo, enquanto que o sacerdote foi ordenado para ser pastor, mestre e líder de oração e de vida sacramental no seio da Igreja. A sua graça e responsabilidade são sobretudo a acção nos sacramentos, in persona Christi. Mediante vós, transmito calorosas saudações fraternas aos vossos sacerdotes, enquanto os exorto a «reanimar o dom de Deus que foi derramado sobre eles através da imposição das mãos» (cf. 2Tm 1,6), de tal maneira que a passagem para o novo milénio assinale deveras um tempo de graça - uma nova primavera do espírito - tanto para eles como para o povo que estão a servir.

6. A diferença estrutural e construtiva constitui também uma parte da relação entre a Igreja católica e outras Igrejas e Comunidades cristãs. Um falso irenismo pode comprometer a tarefa ecuménica, como foi considerado pelo Concílio Vaticano II, quando reconheceu o impulso dado pelo Espírito Santo à busca da unidade. Naturalmente, é importante salientar aquilo que compartilhamos, mas o verdadeiro diálogo ecuménico - cuja necessidade sublinhei muitas vezes - exige que entremos em diálogo conscientes das diferenças que contam, e preparados para as afirmar e abordar de modo tanto clarividente e caritativo quanto nos for possível. Além disso, uma abordagem superficial só pode conduzir ao oposto daquela que era a intenção do Concílio, pois não consegue levar à unidade duradoura pela qual Cristo orou (cf. Jo Jn 17,11). O maior serviço que os católicos prestam ao diálogo ecuménico é quando permanecem fiéis à sua própria identidade distintiva. Há um paradoxo aqui, e às vezes isto pode exigir opções difíceis, como bem sabeis das vossas recentes experiências, mas não existe outro caminho que leve à unidade, a qual tem as suas raízes na vida da Trindade.

7. Enfim, todas as nossas reflexões sobre a santidade, a necessidade da separação em vista do serviço e a diversidade em vista do diálogo nos levam a estar cada vez mais conscientes da exigência de um renovado sentido de oração e contemplação. A nova evangelização tem as suas raízes no aprofundamento da vida espiritual, em cujo cerne está a contemplação e a adoração da Santíssima Trindade - o grande mistério de Deus, em Quem a distinção das Pessoas é perfeita união: O Trinitas unitatis! O Unitas trinitatis! Enquanto o Povo de Deus tiver um clarividente sentido do mistério de Deus e da sua Presença salvífica nas questões humanas, sentirá a urgência do mandato cristão de anunciar o Evangelho até aos últimos confins da terra (cf. Mt Mt 28,19). Encorajo-vos a promover um esforço sistemático nas vossas dioceses e paróquias, em vista de abrir novas portas à experiência da oração e contemplação cristãs: todos os baptizados são chamados a ser santos como Deus mesmo é santo. Nisto, as Comunidades contemplativas já existentes na Nova Zelândia podem constituir um exemplo e uma inspiração.

Caríssimos Irmãos Bispos, ao assumirdes todas as inumeráveis responsabilidades do ministério, a vossa confiança deve permanecer sempre no Espírito Santo, que vem auxiliar-nos na nossa debilidade (cf. Rm Rm 8,26). Oxalá o Espírito de Deus desça sobre Aotearoa, a Terra da Longa Nuvem Branca, infundindo as energias de que a Igreja na Nova Zelândia terá necessidade, se quiser celebrar na verdade e com alegria o Grande Jubileu do Ano 2000, cumprindo a sua singular missão de serviço ao povo do vosso País. Enquanto confio a inteira família de Deus que está na Nova Zelândia ao cuidado amoroso de Maria, que subiu ao Céu, concedo de bom grado a vós, aos sacerdotes, aos religiosos e aos fiéis leigos a minha Bênção apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO MOVIMENTO APOSTÓLICO DOS CEGOS


E DO «MENSAGEIRO DE SANTO ANTÓNIO»


21 de Novembro de 1998





Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. Grande é a minha alegria ao acolher-vos e ao dirigir a cada um de vós a minha cordial saudação. Viestes para confirmar a vossa fé. É este, em primeiro lugar, o sentido da peregrinação à Sé de Pedro. Ao mesmo tempo, estais aqui para exprimir «agradecimento» ao Senhor pelas coisas boas que realizou, em vós e convosco, em todos estes anos: cem anos do Mensageiro de Santo António, setenta anos do Movimento Apostólico dos Cegos. A partir de duas experiências muito diferentes da vida da Igreja, podeis confirmar aquela palavra de Jesus: o «pequeno grão de mostarda» tornou-se verdadeiramente uma árvore grande, onde as aves do céu podem refugiar-se (cf. Lc Lc 13,19). Alegro-me convosco e exprimo o meu apreço ao Presidente do MAC, Prof. Francesco Scelzo, e ao Director-Geral da revista, Padre Agostino Varotto.

Além disso, saúdo-vos, queridos meninos e meninas da Escola Elementar «Don Pozzetto» de Novara, da Escola Média «D'Annunzio» de Motta Santa Anastásia (Catânia) e do Liceu Clássico «Stellini» de Údine. Viestes a Roma para receber o prémio «Lívio Tempesta», atribuído a estudantes que se distinguiram no curso do ano por singulares actos de bondade. Congratulo-me convosco e é-me grato acolher um grupo de jovens portadores de deficiência do Instituto «Santa Maria dei colli» de Fraelacco, Údine, aos quais alguns de vós estão ligados por amizade e solidariedade. A todos a expressão do meu afecto e encorajamento.

2. Vós, queridos amigos do Movimento Apostólico dos Cegos, neste ano social recordais as origens da vossa singular comunidade eclesial, quando, em 1928, Maria Motta iniciou na Itália uma união espiritual entre os cegos, segundo o modelo do Apostolado da Oração. Daquela pequenina semente desenvolveu-se uma associação que se difundiu em todo o território nacional e foi aprovada pelo meu venerado Predecessor João XXIII. Em 1968, quando o Servo de Deus Paulo VI publicou a histórica Encíclica Populorum progressio, o MAC respondeu de maneira efectiva, e vós hoje recordais também os trinta anos de cooperação com os Países pobres do Sul do mundo, onde os cegos são mais numerosos e vivem em condições bastante difíceis.

O caminho destes decénios permitiu ao Movimento Apostólico dos Cegos compreender sempre melhor qual é o carisma específico a ele confiado na Igreja, um carisma que se compõe de dois elementos. O primeiro é a partilha entre cegos e aqueles que vêem, como fruto maduro da solidariedade na reciprocidade. O segundo é a opção pelos pobres, opção que, de vários modos e formas, é própria da Igreja inteira e que vós contribuís para realizar, sobretudo na promoção humana de pessoas que a deficiência ameaça penalizar e marginalizar.

Sobretudo depois do Concílio Vaticano II, o vosso Movimento abriu-se generosamente ao empenho de promoção humana, tanto na Itália como nos Países mais pobres. Precisamente aquele do chamado «terceiro mundo» foi o primeiro sector de actividade que tomou forma no interior da associação, e congratulo-me convosco pela obra realizada nestes trinta anos de cooperação com centenas de missionários e agentes nos campos da saúde, da instrução e da integração social. A atenção aos últimos mais distantes estimulou e fez crescer o trabalho no território nacional, a favor dos anciãos cegos, das pessoas plurideficientes, dos estudantes cegos, de pais e filhos que vivem o problema da cegueira. Tudo isto difunde a cultura do acolhimento, ajudando inúmeras pessoas e tantas famílias.

Caríssimos, continuai com constante confiança o vosso caminho, conscientes do facto que o futuro da humanidade está na partilha. Obrigado pelo vosso testemunho!

3. Dirijo-me agora a vós, que formais a família do «Mensageiro de Santo António» e celebrais os cem anos de fundação da vossa revista, difundida no mundo inteiro, e da qual foi colaborador sábio e perspicaz o meu venerado Predecessor João Paulo I.

Desde o seu início, no longínquo ano de 1898, ela quis sempre proclamar as maravilhas do Senhor, à imitação de Santo António que, na esteira do Seráfico Pai São Francisco de Assis, soube dizer as palavras do Evangelho, fazendo de toda a sua vida uma Boa Notícia. A referência a Santo António determinou também o estilo da mensagem. Com efeito, era necessário apresentá-la com uma linguagem fascinante e, ao mesmo tempo, com o testemunho de uma caridade operosa. Compreende-se, então, porque em torno do jornal nasceu, imediatamente, e cresceu de modo sempre mais generoso, uma cadeia de solidariedade e de ajuda fraterna aos mais pobres e aos mais necessitados, os quais, como dizia o Santo de Pádua, preferem a acção à palavra, o testemunho à explicação (cf. Sermões II, 100).

Eis a origem daquela obra tão preciosa denominada o «Pão dos pobres», iniciativa que jamais diminuiu nem sequer nos anos mais difíceis, marcados por miséria e pobreza, como os das duas guerras mundiais. Com o passar do tempo, ela alargou-se amplamente na hodierna Caritas antoniana, que trabalha de maneira eficaz em todos os continentes, fazendo sentir aos menos afortunados o bálsamo da solicitude fraterna.

O facto de vos encontrardes aqui exprime a vontade de renovardes o empenho prometido no início da vossa obra, desde o primeiro editorial: o de defender os interesses da Igreja. Mas o que significa isto senão - como diria o apóstolo Paulo - ser capaz de propor de modo persuasivo a sã doutrina do Evangelho? Eis aquilo que quis ser o «Mensageiro de Santo António» ao longo da sua rica história, sustentado pelo espírito franciscano dos Frades Menores Conventuais, que o quiseram como instrumento de evangelização, de caridade e de coordenação entre os devotos do Santo de Pádua. As oito línguas em que é impresso, os cento e sessenta Países do mundo que alcança, estão a testemunhá-lo. Agora, este empenho assume uma urgência nova. No moderno «areópago» dos mass media sois chamados a «dar razão da esperança que está em vós» (cf. 1P 3,15). Defender os interesses da Igreja é, hoje mais do que nunca, defender o homem.

Em continuidade ideal com o ministério que os filhos do Pobrezinho de Assis exercem com generosidade na Basílica do Santo de Pádua, prossegui, na esteira de quantos vos precederam, a proclamar o Evangelho da vida com o jornal e com os livros. Ao homem, que às vezes já não é capaz de responder de maneira adequada ao «pedido de sentido», oferecei uma palavra iluminadora, rica de esperança; favorecei um discernimento que leve sabedoria à quotidianidade da existência e conduza a escolher o bem e a rejeitar o mal. A graça do Senhor vos ajude nisto e vos sustente.

4. Caríssimos Irmãos e Irmãs que viestes encontrar-me, a todos renovo o agradecimento mais cordial.

Acompanhe-vos e proteja-vos a Virgem Maria, que hoje contemplamos no mistério da sua apresentação no templo.

De todo o coração abençoo-vos, a vós e aos vossos entes queridos, às vossas actividades e aos projectos de bem, que generosamente realizais ao serviço da Igreja e dos pobres. Ajudar a missão de caridade no mundo



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


POR OCASIÃO DA 52ª ASSEMBLEIA DA FEDERAÇÃO


DOS INSTITUTOS DE ACTIVIDADES EDUCATIVAS (FIDAE)


24 de Novembro de 1998





Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. É-me grato dirigir uma cordial saudação a todos vós que, por ocasião da quinquagésima segunda Assembleia nacional da Federação dos Institutos de Actividades Educativas (FIDAE), estais reunidos em Roma em representação das escolas católicas primárias e secundárias, presentes em todo o território italiano.

O vosso encontro constitui mais uma etapa no caminho que, desde há anos, estais a empreender ao serviço dos valores humanos e cristãos e da autêntica liberdade de educação na escola e na sociedade italiana. Vós tendes em vista confirmar, no contexto do sistema público integrado da instrução, a identidade originária da escola católica e a sua plena inserção na missão evangelizadora da Igreja.

Em vós saúdo a obra atenta e qualificada de milhares de professores, religiosos e leigos, que colaboram com as famílias na formação integral das novas gerações. Agradeço-vos o quotidiano empenho e a paixão com que vos pondes ao serviço dos meninos e dos jovens, não obstante as dificuldades e os problemas ligados ao hodierno contexto sócio-cultural e às vastas transformações verificadas na realidade escolar. O meu afectuoso pensamento dirige-se, em particular, aos alunos dos vossos Institutos, aos quais desejo que possam viver intensamente este período fundamental da vida, para serem protagonistas competentes e corajosos da sociedade de amanhã.

2. Não raro a educação sofre hoje a influência de «formas de racionalidade », não orientadas «para a contempla ção da verdade e a busca do fim último e do sentido da vida» (Fides et ratio FR 47), com o risco que daí resulta de causar trágicas consequências em quantos desabrocham para a vida. A escola católica tem diante de si um grande desafio, ao qual ela deverá responder com um projecto educativo fortemente caracterizado em sentido cristão, procurando depois pô-lo em prática em plena colaboração com a família, objecto primário de qualquer projecto educativo. Tendo como base sobretudo a competência e o testemunho, a escola católica propõe oferecer aos jovens uma formação de qualidade, que se apoia na aquisição dos conhecimentos necessários e no apreço de quanto o homem realizou ao longo da história, mas sobretudo na amadurecida e convicta adesão aos grandes valores da tradição italiana e da fé cristã.

3. Toda a escola é chamada a ser laboratório de cultura, experiência de comunhão e treinamento de diálogo. Essas finalidades encontram um terreno particularmente favorável nos Institutos católicos: ao basearem a sua acção pedagógica no espírito de caridade e de liberdade, próprio de toda a comunidade inspirada no Evangelho, eles colocam-se na hodierna sociedade multiética como um lugar significativo de promoção humana e de diálogo, entre as diferentes religiões e culturas.

As novas fronteiras da escola e a sua abertura ao diálogo cultural requerem, contudo, de quem trabalha no âmbito das estruturas escolares católicas, um constante cuidado da própria e específica identidade pedagógica e ideal, que permanece a principal garantia de um original serviço a crentes e não-crentes.

Numa sociedade, que parece às vezes pouco sensível aos valores espirituais e, com frequência, se ilude de construir o bem-estar e a felicidade do homem só mediante a ciência e a tecnologia, a escola católica é chamada a formar a mente e o coração das novas gerações, inspirando-se no modelo de humanidade proposto por Cristo. Os alunos serão ajudados, pelo testemunho coerente dos professores e dos pais, a empreenderem a grande aventura da vida em companhia de Jesus Redentor, verdadeiro Amigo, com o Qual se pode contar.

4. Ao promover o respeito pelas consciências, a paixão pela verdade, o amor pela liberdade no contexto de um serviço competente, a escola católica oferece uma preciosa oportunidade aos pais, que podem escolher o modelo de educação mais adequado para os seus filhos. Isto constitui segura garantia da validade daquele sistema público integrado da instrução, que é condição indispensável para que a Instituição escolar seja instrumento moderno e eficaz de formação e factor de progresso para a inteira sociedade.

Formulo votos por que a vossa Assembleia, ao aprofundar essas temáticas, contribua para uma renovada qualidade do serviço escolar e para um maior apreço do valor da escola livre, para o crescimento cultural e o desenvolvimento democrático da sociedade italiana. Com esses bons votos, confio a vossa missão educativa e os trabalhos do vosso encontro à materna protecção de Maria, Sede da Sabedoria, e, enquanto invoco sobre os alunos, as famílias, os educadores e os responsáveis da escola católica a luz e a força do Espírito da verdade, de coração concedo a todos uma especial Bênção Apostólica.

Vaticano, 24 de Novembro de 1998.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DA ASSOCIAÇÃO PRO PETRI SEDE


DA BÉLGICA, PAÍSES BAIXOS E LUXEMBURGO


28 de Novembro de 1998





Mons. Capelão-Geral
Caros membros da Associação Pro Petri Sede!

1. Fiéis a um costume já bem consolidado, viestes aqui para encontrar o Sucessor de Pedro, a fim de lhe entregardes o fruto da colecta por vós organizada no Benelux. Estou-vos grato por este gesto que muito me sensibiliza, pois ele traduz a vossa adesão à pessoa e à missão do Papa! À vossa generosa oferenda, unistes um livro de arte muito bonito e também uma colecção do jornal que apresenta as actividades da vossa associação.

Conheceis os conselhos dados por São Paulo aos cristãos de Corinto: «Dê cada um segundo o impulso do seu coração [...] pois Deus ama o que dá com alegria» (2Co 9,7). É-me grato constatar o vosso desejo de viver segundo as palavras do Apóstolo. O sentido da partilha entre irmãos é um testemunho importante a oferecer aos homens, para que todos desenvolvam o seu sentido de solidariedade.

2. Como indica o nome da vossa associação, tendes a peito trabalhar para ajudar a «Sé de Pedro », a fim de que ela cumpra a sua missão de caridade no mundo. Ao afirmardes a vossa vontade de sustentar a Sé de Pedro, participais na solicitude da Igreja por aqueles que têm necessidade da nossa ajuda e aderis mais fortemente à pessoa de Cristo. Que a fé em Cristo e o desejo de contribuir para estabelecer o seu Reino fortaleçam a vossa obra e façam de vós homens e mulheres de acção e de contemplação!

3. Caros amigos de Pro Petri Sede, estai certos da oração do Sucessor de Pedro. Que esta permanência em Roma vos permita retornar ao vosso País mais firmes na fé, na esperança e no amor! Pudestes mais uma vez constatar a universalidade da Igreja, ser sensíveis ao caminho de milhares de peregrinos que vêm aqui para orar no lugar em que o Apóstolo Pedro deu o supremo testemunho de Cristo, seu Mestre e Senhor. Oferecestes ao seu Sucessor o testemunho da vossa generosidade. Que o Senhor vos conserve todos os dias! Ao confiar à intercessão de Nossa Senhora cada um de vós, as vossas famílias e todos aqueles que, na Bélgica, nos Países Baixos e no Luxemburgo, ofereceram o seu contributo à vossa colecta, concedo-vos de todo o coração a Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À CONFEDERAÇÃO INTERNACIONAL


DO CRÉDITO POPULAR


Sábado, 28 de Novembro de 1998





Caros amigos

Acolho-vos com alegria, a vós que representais a Confederação Internacional do Crédito Popular. Agradeço ao vosso Presidente, Senhor Giovanni De Censi, as suas cordiais palavras.

Desde a sua fundação, a vossa organização esforça-se, em particular, por sustentar as pequenas e médias empresas, ajudando assim agências locais que desempenham um papel primordial no desenvolvimento económico e demográfico duma região e dum país. Na difícil situação presente, desejais participar na luta contra o desemprego, para que todos possam ter um trabalho e, portanto, prover às suas necessidades e às da sua família.

Os princípios cooperativos que promoveis, reflectem alguns dos ensinamentos fundamentais da doutrina social que a Igreja convida a respeitar a dignidade dos trabalhadores. Cada empresa torna-se assim uma verdadeira comunidade humana, onde todos os membros são colaboradores a pleno título e protagonistas responsáveis, em vista da construção duma sociedade mais justa e solidária. A origem da vossa estrutura recorda que se pode associar um sistema bancário competitivo a opções mutualistas ao serviço das pessoas e do bem comum.

Desde há diversos decénios, a Confederação Internacional do Crédito Popular prossegue a sua acção, no respeito pelos valores espirituais e morais fundamentais. Possa ela manter sempre este espírito de serviço, para que os nossos contemporâneos tenham esperança quanto ao futuro!

Ao apresentar-vos os meus votos cordiais por um frutuoso prosseguimento do vosso trabalho, invoco sobre vós e os vossos entes queridos as Bênçãos de Deus Omnipotente.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NA CONFERÊNCIA


DA UNIÃO INTERPARLAMENTAR


30 de Novembro de 1998





Senhor Presidente do Conselho
da União Interparlamentar
Senhores!

É com alegria e reconhecimento que vos acolho aqui por ocasião da Conferência que estais a realizar em Roma, tendo apreciado o espírito que anima o vosso encontro e as informações que me transmitistes sobre os vossos trabalhos.

Em 1996, por ocasião da Reunião de Cúpula dos Chefes de Estado e dos Governos sobre a alimentação, organizada pela FAO, os membros da União Interparlamentar assumiram o compromisso solene de promover os objectivos dessa Reunião e, em particular, de fazer com que, até o ano 2015, se chegue a diminuir o número das pessoas que sofrem por causa da subalimentação. Além disso, ressaltaram a necessidade de aplicar um ordenamento jurídico de referência, a fim de orientar um desenvolvimento da agricultura mundial que respeite o meio ambiente. Agora, no limiar do terceiro milénio, reunistes-vos para continuar o vosso exame das questões concernentes à segurança alimentar e analisar os obstáculos e os desafios que se apresentam a respeito disso.

A ordem do dia dos vossos trabalhos articula-se em três temas concretos, que são fundamentais se se quiser realmente pôr em prática os compromissos assumidos na Reunião de Cúpula de 1996: como chegar a níveis estáveis de segurança alimentar que possam acompanhar o aumento da procura, e como fazer com que os diversos factores económicos, tais como a produção, a distribuição, o comércio internacional, a pesquisa científica, os investimentos financeiros, se organizem em função daquele objectivo que a segurança alimentar é para todos? Como manter uma base adequada de recursos comuns (biodiversidade, terras, pesca, águas e florestas) e como promover o desenvolvimento harmonioso do capital humano, tecnológico e financeiro? Quais poderiam ser as acções parlamentares necessárias para oferecer soluções, por um lado, aos problemas imediatos da segurança alimentar e, por outro, às causas mais profundas da pobreza?

Trata-se de um programa real, pois reconhece a interacção de tantos elementos políticos, sociais e económicos no desenvolvimento e na eventual solução do problema da segurança alimentar; mas é também um programa ambicioso e generoso, porque reconhece a capacidade do homem de encontrar uma solução a tantos problemas, e porque faz firmemente apelo à vossa acção, assim como à dos vossos colegas, para alcançar objectivos tão nobres.

Não posso deixar de me alegrar com essas iniciativas e nutro a firme esperança de que produzirão numerosos frutos sob a forma de propostas e de acções concretas. A hierarquia da Igreja católica não tem a missão de fornecer soluções técnicas específicas; entretanto, ela tem a tarefa incessante de sustentar os homens e as mulheres de boa vontade que buscam estas soluções, pondo livremente em jogo todos os recursos humanos e assumindo as responsabilidades que o seu papel na sociedade exige. A Igreja, por sua vez, esforça-se por promover o diálogo e a cooperação, a fim de que todos os protagonistas da vida social, incentivando-se reciprocamente e considerando com serenidade os diversos pontos de vista, encontrem as vias que conduzem a soluções rápidas e eficazes.

Uma visão adequada da economia internacional deve permitir satisfazer, sempre e sem excepções, o direito à nutrição de todos e de cada um dos habitantes da terra, segundo os termos definidos pelos vários instrumentos internacionais. As diversas circunstâncias que acompanham as catástrofes naturais, os conflitos internacionais ou civis, jamais devem ser pretextos para não respeitar essa obrigação, que concerne não só às organizações internacionais e aos Governos dos Países que vivem uma situação de urgência alimentar, mas também e de modo particular aos Estados que, pela misericórdia de Deus, são depositários de abundantes riquezas e recursos materiais.

A segurança alimentar permanente e universal depende de um grande número de decisões políticas e económicas que, na maior parte dos casos, escapam completamente àqueles que sofrem por causa da fome, e que ao contrário estão com frequência ligadas a outras decisões políticas tomadas no interior de alguns Estados, em função de elementos de poderes nacionais ou sectoriais. Uma solidariedade internacional bem entendida, ao contrário, deve fazer com que todas as decisões nacionais e internacionais possam ter em conta os interesses dos Países e as necessidades externas, evitando transformar-se num obstáculo ao desenvolvimento dos outros e oferecendo sempre um contributo ao progresso mundial, sobretudo dos Países em vias de desenvolvimento.

Como não mencionar, neste contexto, o problema da dívida externa dos Países mais pobres e o das dificuldades que muitos outros Países em vias de desenvolvimento experimentam a acederem ao crédito, em condições que mantenham e favoreçam um desenvolvimento humano e social equilibrado? O vosso programa de trabalho menciona as questões financeiras e o problema da dívida como condições da segurança alimentar. Que Deus ilumine os homens políticos dos Países mais desenvolvidos, a fim de encontrarem os meios para se responsabilizarem, com generosidade, pelos custos dos programas internacionais de redução ou de anulação pura e simples da pesada carga, que oprime as populações menos afortunadas de tantas regiões do mundo!

No momento da publicação da Declaração da Reunião de Cúpula de Roma em 1996 e do Plano de Acção que a acompanhava, a Comunidade internacional assumiu, unanimemente, uma sé- rie de compromissos em todos os âmbitos da economia nacional e internacional, aptos para alcançar os seus objectivos. No curso dos dois anos que se seguiram à Declaração da Reunião de Cúpula mundial sobre a Alimentação, muitos outros empenhamentos foram assumidos e projectos internacionais elaborados, a fim de eliminar a pobreza extrema e de fazer frente, de modo adequado, aos ónus financeiros que pesam sobre os mais pobres. É evidente que as declarações políticas internacionais, assim como os instrumentos jurídicos multilaterais, não terão efeito se não forem sustentados por uma legislação nacional eficaz e pela vontade política de as pôr em prática.

Por esta razão, o vosso diálogo e o vosso intercâmbio de experiência como representantes do poder legislativo de tantas nações e regiões do mundo, são um confortante sinal de esperança. O conhecimento e a compreensão das realidades de outros Países ou regiões do mundo não podem senão oferecer um contributo à mundialização da solidariedade. Ao mesmo tempo, com a ajuda de Deus Omnipotente, o vosso encontro poderá ser um meio suplementar para favorecer uma mudança nas motivações mais profundas com base nas decisões políticas, de maneira que, em vez de se deixar guiar por um estilo de vida hedonista e por uma sede egoísta e desmedida de consumo, os corações dos homens e das mulheres se orientem sempre segundo uma clara percepção das suas responsabilidades sociais, também para com os seus irmãos e irmãs mais pobres, que vivem nas regiões mais distantes e esquecidas da terra.

Ao pedir ao Espírito Santo que vos guie nas tarefas que desenvolveis ao serviço dos homens, concedo-vos de todo o coração a Bênção Apostólica, que faço extensiva a todos os vossos entes queridos.




Discursos João Paulo II 1998 - 21 de Novembro de 1998