Discursos João Paulo II 1998 - Viena, 21 de Junho de 1998

VIAGEM APOSTÓLICA À ÁUSTRIA


MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS DOENTES DA ÁUSTRIA


: Aos amados irmãos e irmãs
do Hospital Rennweg «Caritas Socialis»
e a quantos vivem e trabalham
no mundo do sofrimento e da dor

1. Em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, que «tomou sobre si as nossas doenças, carregou as nossas dores» (Is 53,4), saúdo-vos com profundo afecto. Durante a minha visita pastoral à Áustria teria faltado uma meta importante, se não fosse possível encontrar-me convosco, doentes e sofredores. Ao dirigir-me a vós com esta Mensagem, aproveito a ocasião para exprimir a quantos trabalham a tempo inteiro ou parcial nos hospitais, nas clínicas, nas casas de repouso e nos hospícios, o meu profundo apreço pela sua dedicação a este serviço que requer tantos sacrifícios. A minha presença e palavra sirvam de apoio para o seu empenho e testemunho.

Hoje, dia em que me é proporcionada a possibilidade de visitar o Hospital «Caritas Socialis», desejo recordar que o encontro com o sofrimento humano encerra em si um feliz anúncio. Com efeito, o «Evangelho do sofrimento» (Carta Apostólica Salvifici doloris, 25), não está escrito só nas Sagradas Escrituras, mas é escrito de novo, dia após dia, em lugares como este.

2. Vivemos numa sociedade na qual se procura cancelar a dor. O sofrimento, a doença e a morte são cancelados da memória pessoal e pública, mesmo se a sua presença acaba depois por se impor de tantas maneiras na imprensa, na televisão e nas conferências. A remoção da morte manifesta-se também no facto de que muitas pessoas doentes morrem nos hospitais ou noutras estruturas, isto é, fora do seu ambiente habitual.

Na realidade, a maior parte das pessoas deseja poder fechar os olhos na própria casa, rodeado pelos familiares e amigos fiéis, mas muitas famílias não se sentem capazes psíquica nem fisicamente de satisfazer este desejo. Além disso, há muitas pessoas sozinhas, que não têm ninguém que as possa assistir no final da sua caminhada terrena. Apesar de morrer «debaixo» de um tecto o seu coração ficou «sem» tecto.

Para ir ao encontro destas situações, foram empreendidas nos anos passados várias iniciativas eclesiais, municipais e privadas, a fim de melhorar quer a assistência a domicílio, quer a hospitalar e médica, e garantir a cura pastoral dos moribundos e a ajuda aos familiares. Uma destas iniciativas importantes é o «Movimento do Hospital», que na sede da Caritas Socialis «Rennweg» realizou uma obra exemplar. Nela, as Irmãs inspiraram- se no projecto da sua fundadora Hildegard Burjan, a qual quis estar presente nos pontos centrais do sofrimento humano como «a anunciadora carismática do amor social».

Quem pode visitar este hospital, não volta para casa desencorajado. Ao contrário, dá-se conta de não ter realizado simplesmente uma visita, mas de ter vivido um encontro. Com a sua existência simples as pessoas doentes, sofredoras e moribundas aqui presentes convidam os visitantes a não esconderem a si mesmos a realidade do sofrimento e da morte.

Elas são encorajadas a dar-se conta dos limites da própria existência e a enfrentá-los abertamente. O hospital faz compreender que morrer significa viver antes da morte, porque também a última etapa da vida terrena pode ser vivida conscientemente e organizada de maneira individual. Longe de ser uma «casa dos moribundos», este lugar torna-se um limiar da esperança, que conduz para além do sofrimento e da morte.

3. A maior parte das pessoas doentes, quando conhecem o resultado das análises e a diagnose adversa, vive no receio do progresso da doença. Aos sofrimentos momentâneos junta-se o medo do ulterior pioramento, e desta maneira muitos perdem o sentido da sua vida. Receiam ter que enfrentar um caminho assinalado por dores insuportáveis. O futuro carregado de angústias agrava a qualidade da vida. Quem teve uma longa vida cheia de satisfações, talvez possa esperar a morte com uma certa tranquilidade e aceitar morrer «repleto de dias» (Gn 25,8). Mas para a maior parte das pessoas a morte chega demasiado cedo. Muitos dos nossos contemporâneos, até bastante idosos, desejam uma morte rápida e indolor, outros pedem um pouco de tempo para se despedirem. Mas o receio, os interrogativos, as dúvidas e os desejos estão sempre presentes na última fase da vida. Também os cristãos não são poupados do medo da morte, que é o inimigo derradeiro, como diz a Sagrada Escritura (cf. 1Co 15,26 Ap 20,14).

4. O fim da vida apresenta grandes interrogativos ao homem: como será a minha morte? Estarei só ou terei ao meu lado as pessoas queridas? Que me espera depois da morte? Serei acolhido pela misericórdia divina?

Enfrentar estas interrogações com delicadeza e sensibilidade – eis a tarefa de quantos trabalham nos hospitais e casas de saúde. É importante falar do sofrimento e da morte duma maneira que atenue o medo. De facto, morrer também faz parte da vida. Na nossa época há urgente necessidade de pessoas que despertem de novo esta consciência. Enquanto na Idade Média era conhecida «a arte de morrer», hoje hesita-se, também entre os cristãos, em falar da morte e em preparar-se para a enfrentar de modo adequado. Prefere-se imergir-se no presente, procurando distrair-se com o trabalho, a busca da afirmação profissional, os divertimentos. Apesar disso, ou talvez precisamente por causa da hodierna corrida ao consumismo, entre os contemporâneos está a aumentar a sede de transcendência. Mesmo que os conceitos concretos duma vida no outro mundo possam ser muito vagos, é enorme o número das pessoas convencidas de que a vida continua depois da morte.

5. A morte esconde também ao cristão a visão directa do que há-de vir, mas o crente pode confiar na palavra do Senhor: «Eu vivo e vós vivereis» (Jn 14,19). As palavras de Jesus e o testemunho dos Apóstolos ilustram-nos com uma linguagem sugestiva o novo mundo da ressurreição e exprimem a esperança: «assim estaremos para sempre com o Senhor» (1Th 4,17). Para facilitar aos doentes terminais e aos moribundos a aceitação desta mensagem, é necessário que todos quantos se aproximam deles, mostrem com o seu comportamento que tomam a sério as palavras do Evangelho. O cuidado e a assistência das pessoas próximas da morte fazem parte das mais significativas manifestações da credibilidade eclesial. Os que na última etapa da vida se sentem apoiados por pessoas sinceramente crentes, podem confiar com mais facilidade que Cristo os espera deveras na nova vida depois da morte. A dor e o sofrimento do presente podem desta forma ser iluminados pelo feliz anúncio: «Agora subsistem estas três coisas: a fé, a esperança e a caridade, mas a maior delas é a caridade» (1Co 13,13). Porque o amor é mais forte que a morte (cf. Ct Ct 8,6).

6. Assim como a consciência de ser amado faz diminuir o receio do sofrimento, também o respeito da dignidade do doente o ajuda nesta difícil e pesada etapa da sua vida a descobrir um tesouro de potencial maturação humana e cristã. No passado, o homem sabia que o sofrimento era parte da vida e aceitava-o. Hoje, pelo contrário, ele tende mais para evitar o sofrimento, como demonstram os numerosos remédios sedativos que se encontram à venda. Mesmo reconhecendo a função útil que eles desempenham em muitos casos, é preciso contudo ressaltar que a eliminação prematura do sofrimento pode impedir o confronto com ele e a aquisição, por seu intermédio, duma grande maturidade humana. Mas neste caminho de crescimento é fundamental o acompanhamento por parte de pessoas peritas em humanidade. Para ajudar o próximo de maneira concreta é preciso o respeito do seu sofrimento específico, no reconhecimento da dignidade que ele conserva, apesar da devastação que a doença por vezes traz consigo.

7. Desta convicção surgiu a Obra do Hospital, cuja acção se inspira nesta finalidade: respeitar a dignidade dos idosos, doentes e moribundos, ajudando-os a compreender o próprio sofrimento como um processo de maturação e de aperfeiçoamento da própria vida. Deste modo, o que afirmei na Encíclica Redemptor hominis, isto é, que o homem é o caminho da Igreja (cf. n. 5), encontra uma sua actuação na Obra do Hospital. O objectivo não são as modernas técnicas da medicina, mas o homem na sua dignidade inalienável.

A disposição a aceitar as limitações impostas pelo nascimento e pela morte, aprendendo a dizer «sim» à crescente passividade do declínio, não implica alienação. Ao contrário, é a assunção da própria humanidade na sua verdade plena, com as riquezas próprias de cada fase das suas vicissitudes terrenas. Também na fragilidade dos últimos momentos a vida humana nunca perde o seu «sentido», nem é «inútil». Precisamente das pessoas muito doentes e moribundas brota uma lição fundamental para a nossa sociedade, tentada pelos mitos modernos, tais como o vitalismo, o eficientismo e o consumismo. Elas recordam-nos que ninguém pode determinar que a vida de outro homem tem valor ou não, nem sequer se pode decidir da própria vida. Dom de Deus, a vida é um bem do qual só Ele pode formular o juízo definitivo.

8. Nesta perspectiva, a escolha do homicídio activo de um ser humano constitui sempre um arbítrio, mesmo quando se pretende apresentá-la como um gesto de solidariedade e de compreensão. O doente espera de quem o assiste uma ajuda a viver até ao fundo a própria vicissitude e a concluí-la, quando Deus quiser, de maneira digna. Quer o prolongamento artificial da vida humana quer a aceleração da morte, apesar de nascerem de princípios diferentes, escondem um mesmo pressuposto: a convicção de que a vida e a morte são realidades confiadas à livre disponibilidade humana. É necessário superar esta falsa visão, recuperando a noção da vida como dom a ser gerido responsavelmente, sob a protecção de Deus. Disto surge o empenho de acompanhamento humano e cristão dos moribundos, do modo como nos esforçamos por colocá-lo em prática no Hospital. Partindo de diversas posições, os médicos, os enfermeiros, os pastores, as religiosas, os familiares e os amigos esforçam-se por tornar os doentes e os moribundos capazes de organizar pessoalmente a última etapa da sua vida, de acordo com as possibilidades das suas forças físicas e psíquicas. Isto constitui um empenho de grande valor humano e cristão, orientado a fazer descobrir Deus como Aquele «que ama a vida» (cf. Sb Sg 11,26) e a captar, para além do sofrimento e da morte, o feliz anúncio: «Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância» (Jn 10,10).

9. Este rosto de Deus amante da vida e do homem, encontramo-lo sobretudo em Jesus de Nazaré. Uma das ilustrações mais sugestivas deste Evangelho é a parábola do Bom Samaritano. O sofredor na beira da estrada suscita a compaixão do Samaritano: «aproximou-se, ligou-lhe as feridas, deitando nelas azeite e vinho, colocou-o sobre a sua própria montada, levou-o para uma estalagem e cuidou dele» (Lc 10,34). Com a estalagem do Bom Samaritano está relacionada a iniciativa cristã do Hospício. Precisamente ao longo das veredas medievais do peregrino, os hospícios ofereciam refrigério e repouso a quantos estavam a caminho. Para os cansados e exaustos eles representavam socorro imediato e alívio, e para os doentes e moribundos tornavam-se lugares de assistência física e espiritual. Até aos nossos dias a Obra do Hospital conserva este património. Assim como o Bom Samaritano se aproximou do homem sofredor, também se recomenda a quantos acompanham os moribundos que se aproximem para ouvir os desejos, as necessidades e as solicitudes dos doentes. Esta sensibilidade pode originar numerosas iniciativas espirituais, como ouvir a Palavra de Deus e a oração em conjunto, e humanas, como a conversação, a presença silenciosa mas repleta de afecto, as numerosas atenções que fazem sentir o calor do amor. Como o Bom Samaritano deitou azeite e vinho nas feridas do sofredor, também a Igreja não deve privar, quem o deseja, do sacramento da Unção dos enfermos. Oferecer com fervor este sinal permanente do amor divino faz parte dos deveres da verdadeira cura das almas. À assistência paliativa é necessário um elemento espiritual, que dê ao moribundo a sensação de um «pallium», isto é, de um «manto» sob o qual se pode refugiar no momento extremo.

Assim como o sofrimento do homem ferido suscitou a compaixão do Samaritano, também o encontro com o mundo do sofrimento no Hospital possa fazer brotar, em todos os que assistem um doente na última etapa da sua vida, os sentimentos calorosos e delicados da verdadeira caridade cristã. Só os que sabem chorar podem enxugar as lágrimas do próximo. Um papel especial nesta casa é desempenhado pelas Irmãs da Caritas Socialis, às quais a Fundadora dirigia as seguintes palavras: «Na pessoa do doente podemos curar sempre o nosso Salvador sofredor, unindo-nos a Ele» (Hildegard Burjan, Cartas, 31). Aqui ecoa o feliz anúncio: «Sempre que fizestes isto a um destes Meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes» (Mt 25,40).

10. A quantos se prodigalizam incansavelmente no Movimento do Hospital manifesto o meu mais sentido apreço. Ele torna-se extensivo a todos os que prestam serviço nos hospitais e nas casas de saúde, bem como aos que não abandonam os seus familiares gravemente doentes e moribundos. Agradeço de modo particular aos doentes e moribundos que nos servem de exemplo, a fim de compreendermos melhor o Evangelho do sofrimento. Credo in vitam. Creio na vida. A palavra de Cristo sustenta-nos quando o nosso coração se perturba perante o último desafio que deve ser enfrentado nesta terra: «não se turve o vosso coração... Na casa de Meu Pai há muitas moradas» (Jn 14,1 s.).

Abençoo-vos de todo o coração.



VIAGEM APOSTÓLICA À ÁUSTRIA


DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


NA CERIMÓNIA DE DESPEDIDA


Viena, 21 de Junho de 1998

: Senhor Presidente
Caros Irmãos no Episcopado
Senhoras e Senhores!

1. A minha terceira visita pastoral a esta bonita terra austríaca está para terminar. Chegou a hora da despedida. Com comovida gratidão repercorro com a memória os dias passados no meio de vós. Vim como peregrino na fé, colaborador da vossa alegria e cooperador da verdade. Gratificado de muitos modos e levando dentro de mim tantas lindas impressões, retorno agora à minha sede episcopal de Roma.

2. O momento da despedida ofereceme a possibilidade de dizer a todos um sincero: «Obrigado! Deus vos recompense ». O meu agradecimento destina-se antes de tudo a Deus, dador de todo o bem, pelos dias passados convosco, pelo intenso encontro espiritual, as celebrações litúrgicas e os momentos de reflexão comum para um novo despertar da Igreja na Áustria.

Dirijo um agradecimento especial aos meus amados Irmãos no Episcopado, que nestes tempos muito difíceis não cessam de se dedicar com todas as suas forças ao serviço da unidade, na verdade e no amor. O convite para esta visita pastoral e o encontro com a Conferência Episcopal, que pude experimentar nos dias passados, foram para mim motivo de consolação e encorajamento, porque me asseguram que os Bispos, em comunhão entre si e com o Sucessor de Pedro, estão firmemente decididos a construir com os sacerdotes, diáconos, religiosos e fiéis leigos o futuro da Igreja na Áustria.

O meu profundo agradecimento dirige-se ainda à Vossa Excelência, Senhor Presidente Federal, e extensivamente às Autoridades Públicas e a todos os habitantes, homens e mulheres, deste amado País. Também desta vez me destes hospitalidade de modo deveras generoso. Não posso deixar de mencionar ainda os numerosos voluntários que, durante muitas semanas, se prodigalizaram com grande entusiasmo a fim de garantir a esta visita um desenvolvimento sem dificuldades, trabalhando até mais do que de costume.

Agora merecem ser recordados com grande reconhecimento aqueles que contribuíram em silêncio para o bom êxito da minha visita: o serviço de ordem e segurança, o do Pronto Socorro e os numerosos homens e mulheres que trabalharam no anonimato.

3. Com a minha visita, quis manifestar à República austríaca e à Igreja deste País a minha estima e o meu apreço, indicando ao mesmo tempo algumas perspectivas para o caminho futuro. Enquanto em Salisburgo nos dedicámos ao tema da missão, em Sankt Pölten reflectimos sobre a questão das vocações. Enfim, na vossa terra foi-me permitido incluir os nomes de três Servos de Deus no livro dos Beatos. No decurso da sugestiva celebração na «Heldenplatz» pude constatar, mais uma vez, que «o heroísmo da Igreja» é a sua santidade. Os «heróis da Igreja» não são necessariamente aqueles que escreveram páginas significativas da história universal, segundo os critérios humanos, mas mulheres e homens que talvez diante dos olhos de muitos pareceram pequenos, mas que, na realidade, são grandes aos olhos de Deus. Nas listas dos poderosos procuramo-los em vão, mas no Livro da vida os seus nomes permanecem inscritos com letras maiúsculas.

4. As biografias dos Beatos e dos Santos são documentos críveis, que também as pessoas de hoje podem ler e compreender. Diante da abertura histórica e geográfica do vosso país, esta reflexão é de particular significado. Os alicerces da Áustria foram construídos pelos mártires e confessores na época da queda do Império romano. Depois chegaram aqui os monges irlandeses e os missionários escoceses do Ocidente cristão. Os Santos Cirilo e Metódio, apóstolos dos Eslavos, estenderam a sua obra evangelizadora até às terras próximas de Viena. Portanto, era oportuno que durante a minha visita ao vosso país e ao lugar onde o Danúbio une o Ocidente ao Oriente – dois mundos que antes eram separados – eu falasse também da futura Europa. Após a «revolução de veludo» e a queda da cortina de ferro, a Europa foi-nos restituída.

Este dom é um desafio e um empenho. A Europa precisa de uma feição espiritual. Com todos os programas políticos e os planos económicos que actualmente ocupam os debates, não se deve esquecer que a Europa é muito grata ao cristianismo. Mas, também o cristianismo tem muitos motivos para agradecer à Europa. De facto, daqui ele foi levado a tantas outras partes do mundo. Também hoje a Europa não pode nem deve esquecer a sua responsabilidade espiritual. Por isto é necessário o retorno às origens cristãs. Eis o desafio que os cristãos deverão enfrentar na futura Europa.

5. Sintetizo todos os pensamentos e sentimentos que neste momento ocupam o meu íntimo, numa expressão de agradecimento que me vem do coração: «Obrigado! Deus vos recompense». Com os votos a todos: que Deus vos abençoe.

As boas intenções na reflexão e programa ção: Deus as abençoe!

As boas palavras nos encontros e diálogos: Deus as abençoe!

O empenho em realizar as ideias e os propósitos: Deus o abençoe!

Deus abençoe todo o bem no vosso País.

Abençoe o bem que a Igreja realiza na Áustria.

Deus abençoe todos vós e cada um individualmente.

«Obrigado! Deus vos recompense».



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DO INSTITUTO CENTRAL


DOS BANCOS DE CRÉDITO COOPERATIVO DA ITÁLIA


Sexta-feira, 26 de Junho de 1998





Senhor Presidente
Ilustres Senhoras e Senhores

1. Estou feliz por dar as cordiais boas-vindas a todos vós. Saúdo e agradeço particularmente ao Senhor Presidente as amáveis palavras que, também em nome dos participantes, me acaba de dirigir. Saúdo com sentimentos de estima os componentes do Conselho de Administração, os membros do Colégio Sindical e os Dirigentes do Instituto Central dos Bancos de Crédito Cooperativo, aqui presentes.

Mediante esta visita, desejais reconfirmar a vossa adesão aos princípios que a doutrina social da Igreja pôs em realce acerca da cooperação e das leis que regulam a actividade económica e produtiva. Destas orientações hauriram a mãos-cheias gerações de empresários que, enquanto promoviam o progresso económico, jamais perderam de vista a busca da solidariedade e da tutela dos direitos das camadas humanas mais frágeis.

A instituição por vós representada haure inspiração precisamente do fecundo magistério eclesial, constituindo uma das suas mais significativas realizações concretas. Efectivamente, a forma da cooperação e da tradição de solidariedade no âmbito do crédito bancário, bem arraigada na sociedade italiana há mais de um século, constitui uma estimuladora experiência de participação e, ao mesmo tempo, um instrumento eficaz para a consecução de um nível mais elevado de justiça. No respeito pelas exigências empresariais, a vossa actividade procura promover uma democracia económica concreta, com a oferta de um crédito à medida do homem.

2. É conhecida a vivacidade com que os católicos na Itália, desde o último venténio de Oitocentos, se interessaram de maneira concreta pelo problema de prover às necessidades dos estratos mais frágeis da sociedade, criando uma rede de Caixas Rurais ao serviço das comunidades locais, com a finalidade de defender a economia familiar, de pôr termo ao flagelo da usura e de apoiar as pequenas e médias actividades empresariais. A este propósito, o meu venerado Predecessor, Papa Leão XIII, encorajou fortemente a associação católica na Encíclica Rerum novarum, auspiciando que mediante tais instituições cada um possa obter «o maior aumento possível de bem-estar físico, económico e moral» (n. 42).

Como deixar de recordar aqui, entre outros, o sacerdote da Romanha Pe. Luigi Cerruti que, através da difusão dos Institutos de Crédito Cooperativo, permitiu que muitas pessoas e actividades produtoras nascessem e se desenvolvessem, em benefício do inteiro tecido social? O seu exemplo foi de estímulo válido para outras iniciativas análogas. Com efeito, a associação dos trabalhadores em estruturas de cooperação, embora nasça da necessidade de combater os efeitos negativos de uma sociedade industrial e económica orientada de forma preeminente para o lucro, teve sempre também o objectivo de manifestar uma exigência de unidade e solidariedade. Adverte-se a necessidade de ir além das meras dimensões económicas da actividade humana e além do conflito entre as severas leis do capital e as imprescindíveis exigências de salvaguarda da dignidade da pessoa humana. Estes valores devem ser também tutelados contra um «mercado» que pode incorrer sempre no perigo de esquecer que «os bens da criação são destinados a todos: aquilo que a indústria humana produz [...] com a contribuição do trabalho, deve servir igualmente para o bem de todos» (Sollicitudo rei socialis SRS 39).

3. A cooperação, compreendida desta forma, supõe a valorização do papel de cada um na comunidade, salvaguardando os interesses legítimos da pessoa. Nesta perspectiva, renovo os bons votos formulados na Encíclica Laborem exercens, por que os organismos sociais intermediários possam continuar a gozar «de uma efectiva autonomia em relação aos Poderes públicos e procurar conseguir os seus objectivos específicos mantendo entre si relações de leal colaboração recíproca, subordinadamente às exigências do bem comum e, ainda, apresentar-se sob a forma e com a substância de uma comunidade viva; quer dizer, de molde a que neles os respectivos membros sejam considerados e tratados como pessoas e estimulados a tomar parte activa na sua vida» (cf. n. 14).

A estrutura mesma dos Bancos de Crédito Cooperativo, que se funda em sociedades e não em capitais, deixa entender que o objectivo primordial não é o lucro, mas a satisfação de exigências de utilidade social. Depois, a radicação difundida no território permite aos sócios conhecerem as recíprocas possibilidades e capacidades, e também intervirem de modo eficaz no âmbito da realidade local. Assim, presta-se um serviço significativo à harmonia e ao bem-estar de toda a sociedade, que pode valer-se de qualidades e recursos pessoais, de outra forma destinadas a ser descuidadas.

Ilustres Senhoras e Senhores! Enquanto faço votos por que a intensa acção social dos cerca de 600 Institutos que aderem ao I.C.C.R.E.A. continue a inspirar-se nos mananciais do ensinamento social da Igreja para um sempre profícuo serviço ao homem e à sociedade, invoco a assistência divina sobre vós e as vossas iniciativas benéficas, em penhor da qual concedo a todos a minha Bênção.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO FÓRUM DAS ASSOCIAÇÕES


FAMILIARES CATÓLICAS DA ITÁLIA


27 de Junho de 1998





Venerados Irmãos no Episcopado
e queridos representantes do Fórum
das Associações Familiares!

1. Sinto muita alegria ao saudar-vos com as palavras da Familiaris consortio: «Família, torna-te aquilo que és!» (n. 17). Elas indicam de modo eficaz o objectivo pelo qual despendeis com generosidade as vossas inteligências e as energias.

Saúdo D. Giuseppe Anfossi e agradeço-lhe ter-se feito intérprete dos vossos sentimentos, ilustrando as finalidades do Fórum das Associações Familiares Católicas da Itália, das quais constituís uma importante representação. Um agradecimento sentido a todos vós por esta visita, com a qual quereis renovar a vossa adesão ao Sucessor de Pedro.

Sei que trabalhais sem vos cansardes, com as 38 Associações e os Comités regionais que aderem ao Fórum, para que as famílias italianas exprimam e desenvolvam plenamente, também nos planos cultural, social e político, a sua identidade e a sua missão. Para esta finalidade pusestes muito oportunamente na base do vosso Estatuto a Carta dos direitos da família, e no decorrer de poucos anos a vossa Associação soube conquistar ampla estima e consideração, tornando-se porta-voz pontual e corajoso das necessidades e das legítimas instâncias de milhões de famílias italianas e interlocutor sério e crível das várias forças sociais e políticas. A Igreja vê em vós uma grande esperança para o presente e para o futuro das famílias na Itália.

2. A situação da Itália, e de tantas outras partes do mundo, é caracterizada por desafios radicais, que devem ser enfrentados com coragem e unidade de propósitos. A família constitui também hoje o recurso mais precioso e mais importante de que dispõe a Nação italiana, a mim tão cara. A grandíssima maioria dos italianos crê profundamente na família e nos seus valores e esta confiança é compartilhada pelas jovens gerações. É incalculável o contributo que as famílias dão à vida social, ocupando-se de graves dificuldades, tais como o difundido desemprego juvenil e as carências do sistema previdencial e sanitário.

Entretanto, a família é muito pouco ajudada, devido à debilidade e ao carácter aleatório das políticas familiares, que com muita frequência não a sustentam de modo adequado, nem económica nem socialmente. É necessário recordar aqui a clara norma da Constituição italiana, que afirma: «A República facilita, com medidas económicas e outras providências, a formação da família e o cumprimento das tarefas relativas». A forte diminuição da natalidade que há muitos anos aflige o povo italiano, e está a começar a ter efeitos deletérios sobre a vida social, deveria fazer reflectir sobre quanto a ausência de uma efectiva política em prol da família é contrária aos verdadeiros interesses da Nação.

Mas, ainda mais preocupante é o ataque directo à instituição familiar que se está a desenvolver, tanto a nível cultural como nos âmbitos político, legislativo e administrativo. Ele ignora ou distorce o significado da norma constitucional, com a qual a República italiana «reconhece os direitos da família como sociedade natural fundada no matrimónio» (art. 29). Com efeito, é clara a tendência a equiparar à família outras e bem diversas formas de convivência, prescindindo de considerações fundamentais de ordem ética e antropológica. E são de igual modo explícitas e actuais as tentativas de dar dignidade de lei a formas de procriação, que prescindem do vínculo conjugal e não tutelam suficientemente os embriões. Além disso, permanece em toda a sua trágica gravidade a ferida à consciência moral e jurídica, constituída pela lei sobre o aborto voluntário.

3. Precisamente a radicalidade dos desafios em curso exalta a importância e a função do Fórum das Associações Familiares. Graças a ele múltiplas realidades associativas, cada uma com a sua específica vocação e tradição, podem colaborar de maneira eficaz para a defesa e a promoção da família.

Ao haurirdes a linfa vital da espiritualidade familiar e ao inserirdes no concreto das situações as orientações que provêm da doutrina social cristã, vós sois chamados a um empenho que, antes de tudo, é de ordem moral e cultural, para ajudar os homens e as mulheres do nosso tempo a compreenderem de modo mais profundo e a viverem, com impulso e estilo renovados, a grande tradição cristã e civil da Itália, centralizada no significado e no valor da família. Seria errado considerar a progressiva dissolução da família como um fenómeno inevitável, que quase automaticamente acompanha o desenvolvimento económico e tecnológico. Ao contrário, o destino da família está confiado, antes de tudo, à consciência e ao empenho responsável de cada um, às convicções e aos valores que vivem dentro de nós. É preciso, pois, dirigir-se sempre, com confiança suplicante Àquele que pode mudar os corações e as mentes dos homens.

Mas justamente vós dedicais uma atenção não menor às leis e às instituições, nas quais se exprimem e pelas quais são sustentadas, ou então prejudicadas, a cultura e as convicções morais de um povo. Caríssimos Irmãos e Irm ãs, continuai e intensificai a vossa acção, em todas as sedes e a todos os níveis, para que sejam reconhecidos em concreto aqueles direitos que à família pertencem de modo nativo. Ao fazerdes assim, pondes em prática o princípio segundo o qual as famílias «devem ser as primeiras a esforçar-se, a fim de que as leis e as instituições não só não ofendam, mas sustentem e defendam de maneira positiva os direitos e os deveres da família», crescendo assim na consciência de serem protagonistas da «política familiar » (cf. Familiaris consortio FC 44).

4. Na vossa obra a favor da família, caros representantes do Fórum, tendes o pleno apoio da comunidade eclesial e dos seus Pastores, bem cônscios de que a família é «a primeira e vital célula da sociedade» e «o santuário doméstico da Igreja» (Apostolicam actuositatem AA 11) e, em particular, que «hoje em torno da família e da vida se desenvolve a luta fundamental da dignidade do homem» (Discurso de 3 de Outubro de 1997 ao Congresso Teológico-Pastoral do Rio de Janeiro, n. 3).

A Igreja não pode subtrair-se a este desafio, pois o homem, na plena verdade da sua existência, «é o primeiro caminho que a Igreja deve percorrer no cumprimento da sua missão» (Redemptor hominis RH 14). Compete-lhe, portanto, como escreveu o meu Predecessor João XXIII, de venerada memória, «o direito e o dever não só de tutelar os princípios da ordem ética e religiosa, mas também de intervir de maneira autorizada na esfera da ordem temporal, quando se trata de julgar a respeito da aplicação desses princípios aos casos concretos» (Mater et magistra MM 220).

O testemunho da comunidade cristã em favor da família exprime-se, além disso, de maneira significativa através daqueles meios de comunicação social que sabem intervir com clareza no debate cultural e político, propondo e motivando ideias e posições genuinamente conformes à natureza e às tarefas da instituição familiar.

5. São depois evidentes, neste campo, as responsabilidades dos homens políticos. Compete-lhes promover uma legislação e sustentar uma acção de governo, que respeitem os critérios éticos fundamentais (cf. Evangelium vitae EV 71-73), sem ceder àquele relativismo que, com o pretexto de defender a liberdade e a democracia, na realidade acaba por as privar da sua base sólida (cf. Centesimus annus CA 46 Veritatis splendor, 99; Evangelium vitae EV 70). Em nenhum caso, portanto, o legislador que queira actuar em sintonia com a recta consciência moral poderá contribuir para a criação de leis, que contrastem com os direitos essenciais da família fundada sobre o matrimónio.

Parece indispensável, neste campo, um amplo e tenaz empenho de sensibilização e esclarecimento. Portanto, dedicais-vos oportunamente a esta não fácil mas profética tarefa, a fim de que os homens e as forças políticas saibam convergir para aquilo que é conforme à dignidade das pessoas e ao bem comum da sociedade humana, superando posições partidárias ou vínculos de outra natureza.

Caros representantes do Fórum das Associações Familiares, enquanto mais uma vez vos agradeço o trabalho que realizais com tanta paixão e coragem, imploro para vós e para todos os vossos associados os dons do conselho e da fortaleza, para prosseguirdes e desenvolverdes a obra que tão bem empreendestes. A Virgem Santíssima, Mãe da Esperança, vos ampare e vos ajude. Da minha parte, acompanho-vos com a minha oração e, em penhor do meu afecto, concedo-vos de coração uma especial Bênção Apostólica, propiciadora da protecção e do conforto do Senhor.




Discursos João Paulo II 1998 - Viena, 21 de Junho de 1998