Discursos João Paulo II 1998 - Chiávari, 18 de Setembro de 1998

A vossa existência é testemunho do poder do Espírito que age na história e a plasma com a Sua graça. Como é fecundo o vosso habitar nos átrios da casa do Senhor! As paredes que circundam a vossa vida não vos distanciam dos tormentos da humanidade, mas antes imergem- vos neles espiritualmente, para lhes levar o conforto divino, propiciado pela vossa oração. A misteriosa eficácia da vossa intercessão acompanha os passos dos servos do Senhor, que percorrem as vias do mundo anunciando aos homens de todas as culturas e línguas o Reino de Deus. Obrigado, caríssimas Irmãs, pelo decisivo contributo que ofereceis à Igreja!

5. Caríssimos Irmãos e Irmãs! Cada um, segundo a própria vocação, é chamado a cuidar do Povo de Deus. Sede solícitos para com os infelizes, generosos com quem vos estende a mão, magnânimos com todos os que invocam a misericórdia divina, firmes na defesa dos pobres, obedientes à Igreja e aos seus Pastores.

Acompanhe-vos a intercessão da Virgem, que consagrou a inteira existência a Cristo seu Filho e à difusão do Reino de Deus.

A todos a minha afectuosa Bênção.



VISITA PASTORAL ÀS DIOCESES DE CHIÁVARI E BRÉSCIA


SAUDAÇÃO DO PAPA JOÃO PAULO II


ÀS AUTORIDADES E À POPULAÇÃO


NA CHEGADA EM BRÉSCIA


19 de Setembro de 1998





Prezados Irmãos e Irmãs de Bréscia!

1. Eis-me pela segunda vez no coração da vossa Cidade, nesta histórica Praça, que quisestes intitular ao meu venerado predecessor e vosso ilustre concidadão, o Servo de Deus Paulo VI.

Aqui, edifícios prestigiosos – a Catedral, tendo ao lado a antiga catedral românica, e o «Broletto» – evocam o vosso passado nobre e rico de história, mas sobretudo atestam o empenho de colaboração entre sociedade civil e religiosa e indicam, no encontro com Deus e no empenho moral e social, o segredo do caminho de civilização e de bem-estar realizado pela Cidade. Obrigado pelo afecto com que me acolhestes, reafirmando a antiga tradição de fidelidade da população bresciana ao Papa. Agradeço, em particular, ao Senhor Ministro Beniamino Andreatta as gentis expressões que me transmitiu em nome do Governo italiano. Além disso, dirijo o meu grato pensamento ao Senhor Presidente da Câmara Municipal, que se fez intérprete dos sentimentos cordiais e das alegres boas-vindas da inteira população. Saúdo o venerado Pastor da Diocese, D. Bruno Foresti e o seu Auxiliar, e dirijo um deferente pensamento ao Presidente da Região da Lombardia, assim como a todas as Autoridades que com a sua presença honram este encontro.

2. «Brixia Fidelis Fidei et Iustitiae». Este antigo lema sintetiza bem a identidade de Bréscia, que também os seus ilustres monumentos testemunham. Eles constituem o sinal visível dos valores transmitidos pelas gerações passadas e ainda hoje presentes nos corações e na cultura dos seus habitantes, e atestam uma admirável síntese de fé e de ordenada convivência, de amor à própria terra e de solidariedade com todo o ser humano. Nestes valores inspiraram-se os brescianos de ontem; a eles devem continuar a referir-se os de hoje, para assegurarem à sua Cidade um futuro de progresso autêntico.

O meu pensamento dirige-se aos missionários, homens e mulheres de alma grande, que aqui aprenderam a amar a Deus e o próximo e que, fortalecidos por esta experiência, levaram a várias partes do mundo o alegre anúncio do Evangelho, infundindo nova esperança e promovendo condições de vida mais dignas do homem. Penso nos Fundadores de Institutos religiosos e nos numerosos Sacerdotes, que na vossa terra foram zelosas testemunhas de Cristo e verdadeiros mestres de vida. Quereria também recordar com grande admiração todos os pais e mães que na fé profunda e operosa, no amor pela família e no trabalho honesto encontraram o segredo para construir o autêntico progresso da vossa terra. Nem quero esquecer o contributo tanto dos homens de pensamento como dos promotores das numerosas instituições culturais e caritativas que floresceram na terra bresciana, assim como dos artífices do desenvolvimento económico, que caracteriza a vossa Cidade e Província.

É precisamente nesta perspectiva que, no decurso da minha primeira visita, eu vos dizia: «Bréscia possui um precioso património espiritual, cultural e social, que deve ser zelosamente conservado e incrementado com vigor, pois ele, assim como no passado, constitui também hoje o pressuposto indispensável para um sábio ordenamento civil e um autêntico desenvolvimento do homem» (Insegnamenti di Giovanni Paolo II, V/3 [1982], 577).

Como sublinha a mencionada inscrição esculpida na fachada da «Loggia», a construção de um futuro de civilização e de progresso requer um dúplice e inseparável empenho de fidelidade: ao Evangelho, raiz preciosa e vital da vossa convivência civil, e à humanidade concreta e palpitante, isto é, ao homem «que pensa, ama, trabalha e espera sempre alguma coisa» (Insegnamenti di Paolo VI, II [1964], 729). Isto comporta o empenho por encarnar na vida pessoal e comunitária os princípios religiosos, antropológicos e éticos que brotam da fé em Jesus Cristo, a contínua vigilância diante das rápidas mudanças e dos desafios inéditos do tempo presente, a coragem de traduzir a inspiração evangélica em obras, iniciativas e instituições capazes de responder às necessidades autênticas da pessoa humana e da sociedade.

3. Nessa tarefa, árdua e exaltante, é para vós mestre o meu venerado Predecessor Paulo VI, a quem vim prestar homenagem na conclusão das celebrações do centenário do nascimento, nesta Cidade à qual ele se sentiu sempre honrado de pertencer «por nascimento e por afecto jamais diminuído», como certa vez teve ocasião de dizer (Insegnamenti di Paolo VI, XV [1977], 1185).

Ele foi guia seguro da barca de Pedro em tempos não fáceis para a Igreja e para a humanidade, animado sempre por um forte e profundo amor a Cristo e pelo desejo ardente de O anunciar aos contemporâneos, com frequência desorientados diante de doutrinas e eventos novos e prementes. A recordação da sua personalidade de homem de Deus, do diálogo e da paz, de pessoa firmemente ancorada na fé da Igreja e sempre atenta às esperanças e aos dramas dos seus irmãos, torna-se sempre mais viva com o passar do tempo e oferece um precioso encorajamento também aos crentes de hoje.

Misteriosos são os elementos que unem a grandeza e a excepcionalidade de uma pessoa às suas raízes e ao talento de um povo, mas parece evidente que a Terra bresciana com a sua fé, cultura, história, angústias e conquistas ofereceu um contributo determinante à sua formação humana e religiosa. Nesta comunidade, da qual conservou sempre no coração a grata recordação e a doce saudade, o jovem Montini encontrou um clima ardente e rico de fermentos novos, assim como válidos mestres que souberam suscitar nele o interesse pelo saber, a atenção aos sinais dos tempos e, sobretudo, a busca da sabedoria que nasce da fé, qualidade preciosa para exercer as graves tarefas para as quais a Providência o haveria de chamar.

4. Testemunha singular do contexto religioso, cultural e social, que tanto influiu na formação do futuro Paulo VI, foi o Servo de Deus José Tovini, que amanhã terei a alegria de proclamar Beato, precisamente aqui em Bréscia, onde ele desenvolveu a sua actividade e testemunhou, com uma vida admirável, as imprevisíveis possibilidades de bem de que é capaz o homem que se deixa atrair por Cristo.

Este leigo, pai de família solícito e profissional rigoroso e atento, morria precisamente no ano em que nascia João Baptista Montini. Ele pediu aos católicos que afirmassem os valores do Evangelho na sociedade, através da criação de obras educativas e sociais, círculos culturais, comités operativos e singulares iniciativas económicas.

Num tempo em que alguns pretendiam confinar a fé dentro das paredes dos edifícios sagrados, José Tovini testemunhou que a adesão a Cristo e a obediência à Igreja, longe de afastarem o crente da história, o impelem a ser fermento de autêntica civilização e de progresso social. Ele foi apóstolo da educação cristã e expoente de relevo daquele movimento católico que marcou fortemente a inteira sociedade italiana no final do século XIX.

5. Caríssimos brescianos! As luminosas figuras de Paulo VI e de José Tovini, orgulho da vossa Terra, constituem para vós uma herança preciosa, que vos exorto a acolher com renovado amor, para fazerdes também hoje dos valores cristãos o centro propulsor de um original projecto cultural, humano e civil, digno da vocação da vossa Terra.

Caminhai com coragem pelas estradas da verdade e da justiça. Sede sempre confiantes e arrojados na busca e na construção do bem. Cristo, o Redentor do homem, seja a vossa esperança!

E tu, Bréscia, «Fidelis Fidei et Iustitiae », descobre este rico património de ideais que constitui a tua riqueza mais verdadeira, e tornar-te-ás capaz de ser centro vivo de irradiação da nova civilização, a civilização do amor, almejada pelo teu grande filho Paulo VI!

Invocando a protecção de Nossa Senhora das Graças, venerada no Santuário da cidade tão querida ao Papa Paulo VI e aos brescianos, de coração concedo a todos a minha Bênção.



VISITA PASTORAL ÀS DIOCESES DE CHIÁVARI E BRÉSCIA


MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO PRESIDENTE DO INSTITUTO PAULO VI


: Ao Ilustríssimo Senhor Dr. GIUSEPPE CAMADINI
Presidente do Instituto Paulo VI de Bréscia


Por ocasião da minha visita a Bréscia para a conclusão das celebrações centenárias do nascimento do venerado Servo de Deus, Papa Paulo VI, desejo exprimir uma particular palavra de apreço pela obra que o Instituto bresciano, a ele intitulado, realizou nestes vinte anos de intensa actividade.

Com múltiplas iniciativas de carácter científico e divulgador, o Instituto Paulo VI contribuiu de maneira relevante para fazer conhecer, no seu valor e na sua grandeza, a figura do Papa Montini na Itália e no mundo: ilustrou-lhe o verdadeiro pensamento, o profundo amor à Igreja e à humanidade, a paixão pelo anúncio de Cristo ao homem contemporâneo, o contributo para o desenvolvimento do Concílio Ecuménico Vaticano II e a sua actuação, a acentuada sensibilidade pela cultura e pela arte como vias privilegiadas rumo à verdade.

Nesta linha põe-se também a iniciativa – pela qual formulo os melhores votos – do Simpósio sobre Paulo VI e o ecumenismo, programado para a próxima semana.

Enquanto invoco a assistência do Espírito Santo sobre a inteira actividade presente e futura do Instituto, concedo de bom grado uma especial Bênção Apostólica a Vossa Excelência e a todos aqueles que prestam a sua colaboração.



20 de Setembro de 1998.



VISITA PASTORAL ÀS DIOCESES DE CHIÁVARI E BRÉSCIA


DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS REPRESENTANTES DA PASTORAL FAMILIAR E ESCOLAR


Bréscia, 20 de Setembro de 1998





Caríssimos Irmãos e Irmãs
Responsáveis e animadores
da pastoral familiar e escolar!

1. Reveste um significado particular e dá-me grande alegria, na minha breve visita à vossa Igreja, o encontro convosco neste dia em que Bréscia faz memória de Paulo VI no ano centenário do seu nascimento e exulta pela beatificação de José Tovini, ambos filhos insignes desta vossa Terra. Eles possuem uma mensagem a oferecer precisamente acerca dos temas que vos vêem empenhados de modo particular, o da promoção da família e o da educação dos jovens.

O novo Beato fala-nos disto com o exemplo da sua própria vida. Efectivamente, ele foi esposo exemplar, pai de dez filhos, e soube fazer da sua família uma verdadeira «igreja doméstica», rica de oração e de comunhão. Depois, quanto à educação, no seu empenho civil ele distinguiu-se como indefesso animador de iniciativas em benefício de uma escola animada pela verdade cristã.

2. Com outro papel, Paulo VI foi benemérito destas duas nobres causas. Especialmente à família, ele dedicou um espaço privilegiado no seu magistério, quer como Arcebispo de Milão quer como Pastor da Igreja universal. A sua atenção a este tema aprofundava as raízes na experiência de uma família caracterizada por uma grande delicadeza nas relações e uma intensa espiritualidade.

A Igreja de Bréscia não podia deixar de ser assinalada por estas duas figuras. Justamente, portanto, ela hoje recorda-as com legítimo orgulho e deixa-se inspirar por elas a fim de dar novo impulso à acção pastoral, sobretudo no campo da família e da escola.

E como deixar de salientar, a começar pela família, que estamos diante de um tema de importância fundamental e decisiva? Trata-se de uma consciência que nos colma de responsabilidade, de modo especial se se considera que hoje precisamente a família, no contexto de uma rápida transformação dos costumes e de um difundido relativismo ético, se torna objecto de impulsos eversivos que debilitam os seus próprios fundamentos.

Nesta situação, a Igreja sente o dever de fazer referência aos elementos basilares da ética matrimonial e familiar, e fá-lo não com a pretensão de impor uma «sua» disciplina, mas com a convicção de repropor às consciências uma verdade que todos podem reconhecer no íntimo de si mesmos.

Queremos meditar brevemente sobre esta verdade, que o Beato Tovini viveu com exemplaridade e o Servo de Deus Paulo VI ilustrou de maneira autorizada, para dar testemunho da mesma com ardor de palavras e de obras sempre maior.

3. Hoje é mais necessário do que nunca recuperar o sentido do matrimónio como pacto de amor, com que um homem e uma mulher se unem publicamente e para sempre, em ordem à sua recíproca completação e a um responsável serviço à vida. Como tal, este está inscrito no desígnio de Deus desde as origens. É precisamente a este seu carácter originário que Jesus faz apelo, reagindo ao permissivismo que se tinha afirmado na própria lei mosaica. Com efeito, interrogado acerca da liceidade do divórcio, Ele dá esta solene resposta: «Desde o início da criação, Deus fê-los homem e mulher. Por isso, o homem deixará pai e mãe, e os dois serão uma só carne. Portanto, eles já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, o homem não o deve separar » (Mc 10,6-8).

Sem dúvida, esta palavra do Senhor é muito exigente. Todavia, como negar que é aquela que melhor exprime o profundo sentido do autêntico amor conjugal? Enquanto autêntico, tal amor não pode reduzir-se a uma opção «temporária», deixada à mercê das circunstâncias ou, pior ainda, dos humores. Depois, enquanto conjugal, ele investe a inteira existência dos cônjuges, respeitando e integrando a sua específica masculinidade e feminilidade.

Além disso, a palavra de Jesus revela-se exigente mas verdadeira, se a considerarmos sob o ponto de vista dos filhos, cujos direitos somente ela é capaz de tutelar plenamente, favorecendo o seu amadurecimento psíquico-físico em um clima harmónico e sereno.

Por isso, é importante educar as jovens gerações para viverem o amor de maneira autenticamente humana. Então, também na sua dimensão sexual, ele torna-se para os crentes um elemento daquele «culto espiritual» (cf. Rm Rm 12,1) a que se referia São Paulo no trecho que acaba de ser proclamado. Caríssimos Irmãos e Irmãs, temos que fazer descobrir a beleza do matrimónio vivido segundo o desígnio de Deus e devemos prodigalizar-nos a fim de que o valor desta instituição, que é fundamental e irrenunciável para a convivência humana, se reafirme tanto nas consciências ?como na cultura e na própria legislação.

4. Igualmente urgente é ajudar os cônjuges a compreenderam o nexo que existe entre o recíproco doar-se e o serviço à vida: nexo que pertence à profunda lógica do amor, na sua dúplice dimensão unitiva e procriativa, inscrita na mesma estrutura biológica e psicológica do homem e da mulher. Voltando a evocar hoje Paulo VI, como deixar de recordar, a propósito deste tema tão delicado e controverso, o ensinamento luminoso que há trinta anos ele ofereceu na Encíclica Humanae vitae? Nesta, em primeira instância a sua intenção não era de «proibir» algo, mas de exaltar a sublime missão que faz dos esposos os colaboradores de Deus no dom da existência a novas criaturas. A tarefa de dar a vida é altíssima, e deve ser exercida com generosidade e, ao mesmo tempo, como sublinha a Encíclica, com aquele sentido de responsabilidade que consente, e por vezes poderia impor, um intervalo entre os nascimentos, em conformidade com critérios de prudente avalia- ção do bem dos cônjuges, da família e da prole. Todavia, esta responsabilidade escolhida, enquanto não torna ilícitas as relações entre os esposos nos períodos naturalmente infecundos, contudo não legitima a separação artificial do significado unitivo do procriativo, dado que no acto conjugal ambos são ínsitos, segundo específicas leis biológicas. O domínio do homem sobre o próprio corpo e, em particular, sobre as próprias faculdades generativas enquanto tais – recorda com vigor Paulo VI – não é ilimitado!

5. Este ensinamento espera válidos arautos que saibam propor toda a sua riqueza antropológica aos homens e às mulheres de hoje. Os Pastores não temam seguir o fúlgido exemplo de Paulo VI, imitando a sua coragem de ir contra a corrente. Depois, os leigos olhem para tantos modelos de santidade nos quais se podem inspirar. Especialmente para vós, habitantes de Bréscia, a hodierna beatificação de José Tovini constitui um estímulo a um compromisso ainda maior, e de resto em linha com toda a vossa tradição. Com efeito, vós compreendestes bem que o projecto de Deus sobre o matrimónio não pode ser apenas proclamado, mas deve ser transformado em um concreto projecto educativo para os jovens, os noivos, os próprios esposos e as famílias. Portanto, valorizai e desenvolvei as melhores experiências da vossa tradição pastoral! Foi uma perspicaz intuição aquela que levou a fundar o benemérito Instituto «Profamilia», para dar consistência a um itinerário formativo que começasse na adolescência e chegasse até à família na sua maturidade.

Revelou-se incisiva e fecunda também a presença das «Equipes Notre-Dame» e do Movimento «Famiglie Nuove». Depois, devem ser elogiados os serviços prestados pelos Consultores de inspiração cristã e pelo Centro diocesano de conselhos para o casal e a família, bem como o papel desempenhado por Associações de pais comprometidos na educação e na escola, e a disponibilidade de vários Institutos religiosos a assumirem responsabilidades diante de situações familiares problemáticas. É promissora a constituição do «Foro provincial das Associações familiares», cuja finalidade é alimentar e manifestar a subjectividade social e política da própria família. E como esquecer a efectiva solidariedade expressa por multíplices Associações de famílias a respeito de núcleos familiares em dificuldade pela presença de graves enfermidades, deficiências e obstáculos sociais?

6. Muitos são os recursos de que dispõem a Igreja e a sociedade de Bréscia! Este empenho em prol da família será mais eficaz se puder obter vantagem da estreita colaboração entre todas as agências educativas inspiradas nos autênticos valores humanos e cristãos. Falta tempo para iniciar aqui um discurso específico sobre o papel da escola. Deixando-o à vossa sensibilidade, já atenta e laboriosa neste sector, limito-me a recordar a importância da colaboração entre a escola e a família, num momento histórico em que a fragmentação da cultura e a variedade das mensagens transmitidas pelos mass media tornam a família cada vez mais sozinha e ímpar em relação à sua tarefa educativa.

Este é um tema que chama em causa todos os tipos de escola, a começar pela estatal, na medida em que está bem ancorada sobre os valores morais inscritos no coração de cada homem e em grande parte evidenciados pela Carta constitucional que gere a vida do povo italiano. Ao mesmo tempo, precisamente a urgência da colaboração entre a escola e a família supõe que às famílias seja reconhecida de modo concreto, também com subsídios oportunos, a possibilidade de escolher a orientação educativa e o género de escola mais apropriada para o crescimento dos seus filhos. O empenhamento que o Beato José Tovini despendeu pela promoção cristã da escola estatal e a afirmação daquela católica é um testemunho que conserva toda a sua actualidade. Basta recordar a fundação, por ele levada a cabo, da revista «Scuola italiana moderna», que em mais de um século de vida – por obra da benemérita Editora «La Scuola» – auxiliou e ainda ajuda muitos professores da escola elementar na sua tarefa educativa.

7. Portanto, coragem, Igreja de Bréscia! Coragem, estimados agentes da família e da escola! O vosso compromisso tornou-se hoje mais difícil, mas permanece exaltante e urgente. Vós sois chamados a oferecer um contributo à construção de personalidades sadias, motivadas, ricas de interioridade e capazes de comunhão. As famílias em dificuldade, às quais se deve dedicar o interesse afectuoso e prático da inteira comunidade eclesial, têm o direito de confiar na vossa intervenção. Com a vossa ajuda, muitos homens e mulheres, inúmeros jovens e tantas famílias poderão reencontrar o dom da fé e com este a alegria da vida.

Nossa Senhora das Graças, tão querida à espiritualidade dos habitantes de Bréscia, vos obtenha o auxílio divino necessário para esta obra. A memória de Paulo VI e o exemplo do Beato José Tovini infundam impulso nos vossos propósitos.

Com afecto, abençoo todos vós.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO CAPÍTULO GERAL


DOS MISSIONÁRIOS OBLATOS DE MARIA IMACULADA


24 de Setembro de 1998





1. Sinto-me feliz por vos receber, no momento em que concluístes o vosso XXXIII Capítulo Geral, cujo tema central foi «A evangelização dos pobres no limiar do Terceiro Milénio». Saúdo o Padre Wilhelm Steckling, novo Superior-Geral, assim como o seu Conselho, chamados a guiar juntos os Missionários Oblatos de Maria Imaculada nesta nova etapa, a fim de consolidar a sua unidade, desenvolver continuamente o seu carácter pastoral e participar de maneira cada vez mais eficaz na missão da Igreja.

Juntamente convosco agradeço ao Senhor a obra realizada pelos religiosos oblatos. Com a vossa presença em todos os Continentes e sobretudo nas terras distantes, relacionais-vos com homens e mulheres de culturas e tradições diferentes; é o sinal da universalidade da Igreja e da atenção que ela dedica a todos os povos. A fim de estardes próximos dos homens, em particular dos mais pobres, cujo número não pára de aumentar, desejastes reorganizar a vossa presença nas diferentes províncias, a fim de enviar novas comunidades para a Ásia, América Latina, África e também para o grande Norte canadiano. Tendes de igual modo a preocupação dos novos espaços da missão, de maneira especial dos meios de comunicação social e do diálogo confiante com os homens de hoje, a fim de fundar uma sociedade cada vez mais fraterna e uma era de justiça e paz. Fizestes esforços corajosos para enfrentar as necessidades pastorais, apostólicas e missionárias novas e urgentes, bem como a necessária inculturação, processo paciente que, enquanto requer a aceitação dos povos, «não pode comprometer de modo algum a especificidade e a integridade da fé cristã» (Redemptoris missio RMi 52). A Igreja aprecia a vossa disponibilidade e preocupação em responder à chamada do Senhor aonde sois enviados, pondo-vos ao serviço das Igrejas locais, apesar dos meios limitados e do número decrescente de membros no vosso Instituto. Tenho a certeza de que o impulso missionário da vossa Assembleia Geral produzirá numerosos frutos e um novo vigor para o vosso Instituto.

2. Sabeis que o anúncio do Evangelho pode haurir força, coragem e esperança na vida de oração, sobretudo na invocação, na qual Deus concede numerosas graças espirituais, na Liturgia das Horas, oração que associa cada uma das pessoas ao louvor da Igreja universal e, por conseguinte, à sua missão, como também na meditação das Escrituras e na Eucaristia, na qual Cristo Se manifesta aos Seus discípulos e Se oferece sob forma de alimento para o caminho apostólico. A disciplina quotidiana, a oblação pessoal a Deus e a vida em comunidade são testemunhos autênticos duma caridade intensa e forma primordial do anúncio do Evangelho. É uma maneira de imitar Cristo, que permite dizer: «Vinde ver» (Jn 1,39), e de predispor o coração dos homens ao acolhimento da palavra de Deus com benevolência. De facto, pelo amor que sentirem uns para com os outros, os fiéis do Senhor serão reconhecidos pelos seus contemporâneos e manifestarão o rosto do Ressuscitado (cf. 1Jn 4,11). No mundo actual, mais do que nunca, os sacerdotes e os religiosos devem viver em intimidade com o seu Mestre e esforçar-se por se tornar santos, de acordo com a vossa regra, a fim de estar disponíveis para as intuições do Espírito Santo e melhor responder às exigências do mundo. A vida de oração não afasta dos homens mas, ao contrário, ajuda a compreender mais profundamente as suas necessidades essenciais que só Cristo nos pode revelar, Ele que Se fez homem para estar com os Seus irmãos e salvar toda a humanidade.

3. Assim como fazem numerosos Institutos, tendes o cuidado de associar os leigos nas vossas acções e no vosso próprio caminho espiritual. As colaborações generosas deles são muito importantes para a missão e oferecem a cada um a possibilidade de progredir na vida espiritual, segundo a proposta original de Eugénio de Mazenod, «caracterizada por um grau heróico de fé, esperança e caridade apostólica», como recordei por ocasião da sua canonização. Continuai a inspirar-vos na sua espiritualidade e no seu zelo missionário, a fim de levardes o Evangelho até aos extremos confins da terra!

4. Interrogais-vos acerca da diminuição dos membros do vosso Instituto. É um sofrimento e uma prova que não deve absolutamente fazer diminuir o zelo missionário dos Oblatos. Pelo contrário, constitua isto uma ocasião para aumentar os esforços, a fim de propor o vosso ideal aos jovens de todos os continentes, muitos dos quais são generosos e sentem o desejo de servir Cristo e o seu Evangelho!

Ao confiar-vos à intercessão da Virgem Imaculada e de Santo Eugénio de Mazenod, concedo-vos a Bênção Apostólica, bem como a todos os membros do vosso Instituto e a quantos vos sustentam.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


ÀS ABADESSAS CISTERCIENSES REUNIDAS


PARA A SUA II ASSEMBLEIA


25 de Setembro de 1998





Queridas Irmãs Abadessas
da Ordem Cisterciense!

1. Sinto particular alegria em me dirigir a vós neste dia, por ocasião da vossa segunda assembleia, com a qual se conclui uma etapa fundamental do caminho percorrido pela Ordem Cisterciense, ao tornar o ramo feminino plenamente partícipe nas estruturas de responsabilidade e de comunhão da própria Ordem.

Na carta enviada ao Abade-Geral, Rev.do Pe. Mauro Esteva, por ocasião do último Capítulo Geral, eu fazia votos por que as vossas decisões valorizassem o contributo das Monjas na realização da missão dos Cistercienses na Igreja e no mundo (cf. L'Osserv. Rom. Setembro , pág. Rm 25). Alegro-me ao constatar que esse objectivo felizmente se realizou.

Foi um caminho prudente, precedido por uma profunda reflexão e confortado também pelas palavras que escrevi na Carta Apostólica sobre a dignidade e vocação da mulher, publicada por ocasião do Ano Mariano de 1998. De facto, fiz notar naquele documento que «a dignidade da mulher e a sua vocação - objecto constante de reflexão humana e cristã - têm assumido, em anos recentes, um relevo todo especial» (Mulieris dignitatem MD 1).

2. Desde há algum tempo a vossa Ordem empreendeu um itinerário orientado para delinear melhor as características da própria fisionomia e identidade jurídica, também mediante a participação das Monjas nas suas estruturas de responsabilidade e de comunhão. Inseriu-se neste caminho também a delicada questão da cooperação das Monjas no exercício do poder de governo no âmbito da própria Ordem.

Este percurso baseava as suas motivações na «accomodata renovatio» da vida religiosa, querida pelo Concílio Vaticano II no decreto Perfectae caritatis (cf. n. 1). Apesar de considerar a renovação e a adaptação das estruturas como dois aspectos inseparáveis da mesma realidade, a Ordem Cisterciense atribuiu à renovação uma primazia e uma função inspiradora e directiva da adaptação, preocupando-se de que fosse sempre animada por uma real renovação espiritual.

O empenho de retorno às origens, solicitado pelo Concílio Vaticano II (cf. Ibid., n. 2), sustentou a vossa Ordem no aprofundamento da própria identidade, levando-a a uma sincera conversão do coração e da mente. Este exame minucioso permitiu-vos sucessivamente encontrar soluções novas, capazes de exprimir de maneira mais adequada a presença das Monjas no interior da vossa Ordem e a participação mais directa na sua vida e nas suas realidades.

3. O caminho percorrido insere-se neste sulco, encontrando o próprio fundamento na Declaração do Capítulo Geral da Ordem, realizado nos anos 1968-1969, sobre os elementos principais da vida cisterciense hodierna. A assembleia fraterna realizada naqueles anos afirmou que «as Monjas cistercienses não constituem uma "segunda Ordem" paralela à "primeira", a dos Monges, mas pertencem completamente à mesma Ordem Cisterciense (...) Portanto, não há dúvida que deve ser promovida, mesmo com prudência, mas constante e eficazmente, a participação das Monjas nas decisões que dizem respeito não só à sua vida, mas também à sua Congregação ou a toda a Ordem» (n. 78).

Este mesmo documento fundamental da vossa Família exprime de modo claro quais são as fontes da vossa vida: o Evangelho e o Magistério da Igreja, a tradição monástica, a Regra de São Bento, as tradições cistercienses, a participação activa na vida da Igreja e da sociedade, a acção e a inspiração do Espírito Santo (cf. nn. 3-10).

No cumprimento destas decisões, «com prudência, mas constantemente», a vossa Ordem deu os primeiros passos. No arco de trinta anos, graças também à colaboração da Commissio pro monialibus e ao serviço discreto mas eficaz da Cúria Geral, os Cistercienses promoveram «eficazmente» a participação do ramo feminino nas estruturas de responsabilidade e de comunhão.

4. Com a participação das Monjas no Conselho do Abade-Geral, no Sínodo da Ordem, no único Capítulo Geral, bem como em qualquer outra forma de colaboração e de serviço no âmbito da vossa Família, a dignidade da mulher e as manifestações do «génio feminino» encontram hoje na Ordem Cisterciense a possibilidade de serem reconhecidas e valorizadas e de produzirem frutos, para a glória de Deus e o comum benefício da Igreja e da humanidade, sobretudo no contexto hodierno.

Queridas Irmãs de clausura, com razão se pode aplicar a vós quanto afirmou o Concílio Vaticano II ao dirigir-se às mulheres: «Mas a hora vem, a hora chegou, em que a vocação da mulher se realiza em plenitude, a hora em que a mulher adquire na sociedade uma influência, um alcance, um poder jamais conseguidos até aqui. É por isso que, neste momento em que a humanidade sofre uma tão profunda transformação, as mulheres impregnadas do espírito do Evangelho podem tanto para ajudar a humanidade a não decair» (Mensagem às Mulheres).

Enquanto a Ordem Cisterciense, juntamente com toda a Igreja, se prepara para cruzar o limiar do Terceiro Milénio, as oportunidades que hoje vos são reconhecidas e confiadas, queridas Irmãs, iniciam realmente uma nova era, na qual podeis desempenhar um papel de protagonistas da vida e da história da vossa Família religiosa, que neste ano celebra o nono centenário da fundação do mosteiro de Cîteaux, no qual tem a sua origem.

Como os vossos Padres, os fundadores do Novum Monasterium, dos quais sois discípulas e herdeiras, também vós, queridas Irmãs, não receeis empreender este caminho de empenho e colaboração, a fim de viverdes em plenitude a vossa vocação. Continuai a procurar constante e unicamente a vontade de Deus, que vos chamou e colocou na escola do Seu serviço, a escola do amor.

Inspirai-vos nas fontes próprias da vossa Comunidade religiosa, deixando-vos guiar sempre pelo Espírito de Deus na realização da vossa participação nas estruturas de responsabilidade e de comunhão da Ordem.

5. Ao formular fervorosos votos por que o caminho percorrido na valorização da dignidade da mulher e do «génio feminino» prossiga com confiança segundo o espírito de Cristo, dirijo o meu pensamento à Bem-aventurada Virgem Maria. Ela é a Mulher por excelência, chamada pelo Pai a participar no Seu desígnio salvífico, cooperando de maneira muito singular na obra da redenção.

A Ela, ternamente celebrada por São Bernardo, confio-vos a vós aqui presentes, as vossas Irmãs e toda a Ordem Cisterciense, que é sua desde o princípio. Com estes sentimentos, concedo cordialmente a todos uma especial Bênção Apostólica.




Discursos João Paulo II 1998 - Chiávari, 18 de Setembro de 1998