Discursos João Paulo II 1998 - Zagrábria, 2 de Outubro de 1998

A vida humana sobre a terra comporta dificuldades de vários tipos: elas não podem decerto ser resolvidas refugiando-se no hedonismo, no consumismo, na droga ou no álcool. Exorto-vos a enfrentar com coragem as adversidades, procurando a sua solução à luz do Evangelho. Sabei redescobrir os recursos da fé, para deles haurir a força dum testemunho corajoso e coerente.

O Servo de Deus Card. Alojzije Stepinac, que amanhã, se Deus quiser, elevarei às honras dos altares, recomendava aos jovens do seu tempo: «Estai atentos a vós próprios e continuai a maturar, porque sem pessoas maduras e sólidas do ponto de vista moral nada se faz. Os maiores patriotas não são aqueles que mais gritam, mas os que cumprem a lei de Deus de maneira mais conscienciosa» (Homilias, Discursos, Mensagens, Zagrábia 1996, pág. 97).

Nunca percais o vosso entusiasmo juvenil, alimentado por uma profunda relação com Deus. A este propósito, o próprio Cardeal Stepinac recomendava aos sacerdotes: «Afastai da nossa juventude, como a peste, qualquer forma de pusilanimidade, porque é indigna dos católicos, os quais se podem orgulhar dum nome tão grande, que é o nome do nosso Deus» (Cartas da Prisão, Zagrábia 1998, pág. 310).

4. Desejei ardentemente realizar esta segunda Visita à Croácia, a fim de poder continuar a peregrinação de fé, de esperança e de paz iniciada em Setembro de 1994. Agora, felizmente, a guerra já acabou. O meu desejo é que nunca mais haja guerra neste nobre País. Possa ele tornar-se, com toda a região, uma moradia de paz: duma paz verdadeira e duradoura, a qual supõe sempre justiça, respeito pelos outros e convivência entre pessoas e culturas diversas.

A Croácia, parte integrante da Europa, virou definitivamente uma página dolorosa da sua história, deixando para trás as terríveis tragédias do século XX, olhando para o novo Milénio com um desejo fervoroso de paz, liberdade, solidariedade e cooperação entre os Povos. Apraz-me citar aqui as palavras pronunciadas pelo meu Predecessor Pio XII, de venerada memória, a 24 de Dezembro de 1939: «Um postulado fundamental duma paz justa e digna de honra é garantir o direito à vida e à independência de todas as Nações, grandes e pequenas, poderosas e frágeis» (AAS, XXXII [1940], pág. 10). São palavras que conservam todo o seu valor também na perspectiva do novo Milénio que já está próximo. Mas são, outrossim, palavras que empenham cada Nação a modelar a própria organização jurídica de acordo com as exigências do Estado de direito, graças ao respeito crescente pelas instâncias radicadas na dignidade inata dos cidadãos que a compõem.

Faço votos por que neste País sejam cada vez mais reconhecidos e aceites os direitos fundamentais da pessoa, iniciando pelo direito à vida, desde a sua concepção até ao seu fim natural. O grau de civilização duma Nação julga-se pela sensibilidade que ela demonstra aos seus membros mais débeis e desventurados e pelo empenho com que promove a sua reabilitação e total inserção na vida social.

5. A Igreja sente-se chamada em causa neste processo de promoção humana. Contudo, ela bem sabe que o seu primeiro e principal dever é contribuir para isto mediante o anúncio do Evangelho e a formação das consciências. No cumprimento desta tarefa ela conta com cada um de vós, caríssimos fiéis que me ouvis: conta com o vosso testemunho e, antes de tudo, com a vossa oração. Com efeito, é na oração que nos abrimos aos horizontes da constante presença salvífica de Deus na vida de cada pessoa e povo. A comunhão com Deus alimenta nas almas a coragem da esperança. Oxalá cada um de vós redescubra os enormes tesouros escondidos na oração pessoal e comunitária!

Formulo sinceros votos por que, tamb ém no futuro, as populações da Croá- cia permaneçam fiéis a Cristo. Esta fidelidade encerra o segredo da verdadeira liberdade: de facto, Cristo «libertounos para que sejamos verdadeiramente livres» (Ga 5,1). E a liberdade, como canta um poeta vosso, «é um dom em que Deus altíssimo nos deu todos os tesouros » (I. Gunduliae, Dubravka).

6. Até amanhã, junto do Santuário de Marija Bistrica!

Invoco agora a bênção de Deus e a protecção da Bem-aventurada Virgem Maria sobre vós aqui presentes, sobre quantos estão sintonizados connosco através da rádio e da televisão, e sobre todos os habitantes do País. O Senhor vos conceda fé perseverante, concórdia laboriosa, sabedoria de decisões inspiradas no bem comum.

E jamais desapareça dos vossos lábios a linda saudação, com a qual também eu agora me dirijo a vós: louvados sejam Jesus e Maria!



VIAGEM APOSTÓLICA DE JOÃO PAULO II À CROÁCIA



NO ENCONTRO COM OS EXPOENTES


DO MUNDO DA CULTURA EM ZAGRÁBIA




Ilustres Senhores e Senhoras
Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. Sinto-me feliz por ter convosco este encontro, o qual me permite apresentar-vos uma deferente e cordial saudação. O meu pensamento dirige-se, neste momento, também aos vossos colegas, que em todas as partes do País se dedicam ao nobilíssimo afã da busca da verdade nos vários ramos do saber. Também a eles saúdo com profunda cordialidade.

Quis inserir no programa da minha Visita pastoral ao vosso País este breve, mas para mim significativo, encontro convosco, representantes do mundo da cultura e da ciência, para confirmar também desta forma a estima e o apreço que a Igreja nutre pela actividade intelectual como expressão da criatividade do espírito humano. Aproveito de bom grado a ocasião para prestar homenagem à rica tradição cultural, que caracteriza a Nação croata, dando testemunho da sua antiga e profunda sensibilidade pelo bom, verdadeiro e belo.

Quereria aproveitar esta circunstância para reflectir juntamente convosco acerca do contributo específico que os cristãos, como homens de cultura e de ciência, são chamados a dar ao ulterior crescimento dum verdadeiro humanismo na vossa Pátria, no seio da grande família dos Povos. Com efeito, é tarefa do cristão transmitir às várias articulações da vida social, e por conseguinte também ao mundo da cultura, a luz do Evangelho.

De facto, ao longo dos séculos, o cristianismo deu um contributo importante à formação do património cultural do vosso Povo. No limiar do Terceiro Milénio não podem, portanto, faltar novas forças vivas que dêem um renovado impulso à promoção e ao desenvolvimento da herança cultural da Nação, em total fidelidade às suas raízes cristãs.

2. Na Croácia, bem como na Europa e no resto do mundo, está-se a viver um momento de grandes mudanças, que dão lugar a perspectivas estimulantes, mas também apresentam grandes problemas. É preciso saber dar a estas mudan ças uma resposta apropriada, que provenha da consideração da profunda verdade do homem e do necessário respeito dos valores morais inscritos na sua natureza.

Com efeito, não há verdadeiro progresso sem o respeito da dimensão ética da cultura, da investigação científica e de toda a actividade do homem. O hodierno relativismo ético, com o consequente ofuscamento dos valores morais, favorece o surgir de comportamentos lesivos da dignidade da pessoa, e isto transforma-se num sério obstáculo ao desenvolvimento humanístico nos vários âmbitos da existência.

Por outro lado, é evidente que o bem da pessoa, último objectivo de cada empenho cultural e científico, nunca pode estar separado da consideração do bem comum. É-me grato recordar, a este propósito, a inscrição que sobressai na Sala do Grande Conselho de Dubrovnik: «Obliti privatorum, publica curate». Faço votos por que o empenho dos pensadores e dos cientistas, inspirado em valores autênticos, seja compreendido sempre como um serviço generoso e abnegado ao homem e à sociedade, e nunca esteja orientado para fins contrários a este objectivo supremo.

3. Tendo a cultura, como seu fim último, o serviço ao verdadeiro bem da pessoa, não deve causar admiração o facto de a sociedade, ao perseguir o seu desenvolvimento, ter ao seu lado a Igreja. De facto, também ela tem como destinatário da sua solicitude pastoral «o homem considerado na sua unidade e na sua totalidade, o homem, corpo e alma, coração e consciência, pensamento e vontade» (Gaudium et spes GS 3). O ponto de encontro da Igreja com o mundo da ciência e da cultura é o serviço ao homem.

É um encontro que, de facto, ao longo dos séculos se revelou particularmente fecundo. O Evangelho, com o seu tesouro de luminosas verdades sobre vários aspectos da existência, enriqueceu de modo significativo as respostas elaboradas pela razão, garantindo a sua maior correspondência às expectativas profundas do coração do homem.

Apesar das incompreensões que se verificaram em certos períodos, a Igreja mostrou-se sempre extremamente sensível aos valores da cultura e da pesquisa. É quanto emerge também da vossa história: quando no século VII os vossos antepassados, ao receberem o baptismo, começaram a fazer parte da Igreja, com este acto introduziram-se também no mundo da cultura ocidental. Desde aquela época registra-se na Croácia um constante progresso cultural e científico, ao qual a própria Igreja dá um contributo determinante. Todos conhecem o grande contributo por ela oferecido à filosofia, à literatura, à música, ao teatro, às ciências, à arte, bem como o mérito que lhe pertence na edificação de escolas de todos os tipos: desde as escolas de base aos templos da ciência universitária. Também no futuro a Igreja deseja perseverar nesta atitude, que considera parte integrante do seu serviço à mensagem evangélica.

Nesta região, onde durante séculos se encontraram diversas visões do mundo, é necessário continuar a empenhar-se juntos pela cultura, sem permitir estéreis contraposições, mas cultivando sentimentos de respeito e de conciliação. Isto não significa, aliás, que se deva por este motivo renunciar à própria identidade e cultura. As raízes, a herança e a identidade de cada Povo, no que têm de autenticamente humano, representam uma riqueza para a comunidade internacional.

4. O clima de liberdade e de democracia, que no início deste decénio se instaurou na Croácia, permite a reinserção das faculdades de teologia nas universidades, o que contribuirá de maneira significativa para promover o diálogo entre cultura, ciência e fé. De facto, as universidades representam a sede privilegiada dum diálogo, cujos benéficos efeitos poderão reflectir-se na formação das novas gerações, orientando as suas opções morais e a inserção activa na sociedade. Possam as vossas escolas, e sobretudo as vossas universidades, ser verdadeiros centros de pensamento, capazes de preparar operadores excelentes nos vários ramos do saber, mas também pessoas profundamente conscientes da grande missão que lhes é confiada: servir o homem.

Um dos frutos da dinâmica relação entre fé e razão será certamente um renovado florescimento ético e espiritual no vosso País, que durante decénios foi submetido às devastações causadas pelo materialismo ateu. Este reflorescimento dos valores constituirá o mais válido baluarte contra os desafios hodiernos do consumismo e do hedonismo. Deste modo, sobre uma sólida plataforma de valores, o homem, a família e a sociedade poderão edificar-se segundo a verdade, abrindo-se à alegria e à esperança, com o olhar voltado para o destino eterno que Deus preparou para cada ser humano. Desta forma, evitar-se-á no futuro o drama da ruptura entre cultura e Evangelho, que devastou a nossa época (cf. Paulo VI, Exort. apost. Evangelii nuntiandi, EN 20).

Uma cultura que recusa Deus não pode definir-se plenamente humana, porque exclui do próprio horizonte Aquele que criou o homem à sua imagem e semelhança, o redimiu por meio de Cristo e o consagrou com a unção do Espírito Santo. Eis o motivo pelo qual o homem, de acordo com todas as suas dimensões, deve ser o centro de qualquer forma de cultura e o ponto de referência de todos os esforços científicos.

5. Deus deu-vos em herança um maravilhoso País, cujo hino nacional inicia com estas palavras: «Nossa bonita Pátria». Como não ver evocado nesta expressão o dever de respeitar a natureza, agindo com sentido de responsabilidade em relação ao espaço vital dado ao homem pela Providência? O mundo constitui o palco no qual cada um é chamado a recitar a própria parte, em louvor e glória de Deus Criador e Salvador.

Sedentos da verdadeira sabedoria, do conhecimento do universo e das normas que o regulam, fascinados pelo verdadeiro, bom e belo, procurai perscrutar a sua Fonte suprema: Deus, origem de toda a verdade, que sabiamente sustém e governa tudo quanto existe. A Palavra de Deus ilumine a vossa exploração das vias que conduzem à verdade. Se nutrirdes um profundo amor por ela, no vosso empenho quotidiano sabereis tornar-vos seus apaixonados investigadores e cooperadores solícitos com quem a procura.

6. Por fim, dirijo uma palavra especial aos homens e mulheres da ciência e da cultura que se professam cristãos: está confiada a eles a tarefa de evangelizar continuamente o âmbito em que trabalham. Por conseguinte, os seus corações devem estar abertos aos impulsos do Espírito Santo, aquele «Espírito da Verdade » que encaminha «para toda a verdade » (cf. Jo Jn 16,13). Esta nobre tarefa requer um constante aprofundamento daquilo que comporta a própria adesão à fé de Cristo, «luz verdadeira, aquela que ilumina todo o homem» (Jn 1,9), «poder e sabedoria de Deus» (1Co 1,24), porque «tudo foi criado por meio d'Ele e para Ele, Ele existe antes de todas as coisas, e tudo n'Ele subsiste» (Col 1,16-17). Que todos se empenhem com orgulho nesta nobre tarefa e se esforcem por lhe corresponder com total generosidade.

Confio à protecção da Santíssima Mãe de Deus, que a Igreja invoca como Sede da Sabedoria, quantos procuram com um coração sincero a verdade e sobre todos invoco a Bênção de Deus.



Zagrábia, 3 de Outubro de 1998, XX ano de Pontificado.



VIAGEM APOSTÓLICA DE JOÃO PAULO II À CROÁCIA



NO ENCONTRO COM A CONFERÊNCIA


EPISCOPAL CROATA




Venerados Irmãos no Episcopado!

1. Tenho a alegria de vos encontrar depois da beatificação de Alojzije Stepinac, diligente e corajoso Pastor desta terra, realizada ontem em Marija Bistrica. Apresento uma saudação cordial a cada um de vós e agradeço-vos o intrépido testemunho oferecido com constância perante a Igreja universal e o mundo, de modo especial nos anos da recente tragédia que atingiu esta região.

Por vosso intermédio, desejo fazer chegar o meu pensamento, cordial e afectuoso, aos sacerdotes e diáconos que compartilham convosco as lides apostólicas de cada dia. Com igual intensidade de sentimentos, quero exprimir o meu apreço pelo testemunho evangélico prestado quotidianamente pelos religiosos e religiosas, e por todos os que deram a vida ao serviço de Deus e dos irmãos.

Continuai com coragem o vosso ministério a favor desta porção do Povo de Deus, do qual fostes constituídos sacerdotes, pastores e mestres, em comunh ão com o Sucessor de Pedro. Exorto-vos a continuar na imitação do exemplo de quantos, na esteira do Bom Pastor, ofereceram a própria vida pelo rebanho de Cristo e trabalharam para a edificação da unidade da Igreja, como o Beato Alojzije Stepinac.

2. A comunhão de todos os crentes é a precisa vontade do nosso Redentor. Ela é elemento essencial de toda a actividade apostólica e fundamento de toda a evangelização. Deus vos conceda «ter uns para com os outros os mesmos sentimentos segundo Jesus Cristo, para que, com um só coração e uma só voz» (Rm 15,5-6) Lhe rendais glória, construindo o seu Reino entre o vosso povo. A Igreja que está na Croácia tem necessidade de consolidar a comunhão entre as diversas forças que a compõem, a fim de alcançar os objectivos que a esperam no hodierno clima de liberdade e democracia.

Encorajo as iniciativas destinadas a promover a sincera colaboração entre as várias componentes eclesiais, assim como exorto a todos a intensificarem a disposição espiritual à comunhão e à obediência aos Pastores. Essa atitude beneficiará a inteira Comunidade cristã. A capacidade de interacção recíproca, embora no respeito das legítimas exigências de cada um, não deixará de dar abundantes frutos de fé, esperança e caridade e, ao mesmo tempo, será diante de todos um grande testemunho da unidade em Cristo.

Venerados Irmãos no Episcopado, «a Igreja é formada pelo povo unido ao seu Bispo e pelo rebanho que permanece fiel ao próprio pastor» (S. Cipriano, Epist 66, 8: CSEL 3, 2, 733). Quereria encorajar-vos, portanto, no vosso empenho quotidiano de consolidação da comunhão eclesial a todos os níveis, esforçando-vos por que o clero e os fiéis sejam assíduos na doutrina apostólica e na união fraterna, na fracção do pão e na oração (cf. Act Ac 2,42). Permanecei sempre unidos entre vós, em comunhão com o Bispo de Roma e com os outros membros do Colégio Episcopal, em particular com os da Bósnia-Herzegovina.

3. A tarefa principal que, neste momento histórico, está diante das vossas Igrejas é o renovado anúncio do Evangelho de Cristo em todos os ambientes da sociedade. Trata-se de uma obra que requer a mobilização de todas as forças vivas da Igreja: Bispos, sacerdotes, consagrados e fiéis leigos.

No decurso dos últimos decénios na vossa Pátria, assim como noutras partes da Europa do Leste, experimentou-se a tragédia provocada pelo materialismo ateu. Hoje, no novo clima democrático, é preciso dar um forte impulso à nova evangelização, a fim de que o homem, a família e a sociedade não sejam seduzidos e caiam na armadilha do consumismo e do hedonismo. É preciso testemunhar e anunciar os valores que tornam a vida autêntica e repleta de alegria, saciando o coração humano e colmando-o de esperança na perspectiva da herança preparada por Deus para os Seus filhos. A Igreja que está na Croácia, portanto, é chamada a redescobrir as próprias raízes religiosas e culturais, a fim de cruzar com serenidade e confiança o limiar do novo Milénio já às portas.

Um ulterior impulso à nova evangelização no clima hodierno virá também do diálogo ecuménico com as outras Igrejas e Comunidades cristãs. Em harmonia com a doutrina do Concílio Vaticano II, não vos canseis de promover com empenho esse diálogo, na esperança de poderdes chegar um dia a dar perante o mundo um comum testemunho de Cristo. Ao mesmo tempo, dai espaço ao diálogo inter-religioso, que tem em vista eliminar as incompreensões inúteis, facilitando o respeito recíproco e a colaboração no serviço ao homem.

Tudo isto deve ser acompanhado de uma intensa oração e de uma participação activa e convicta, a níveis pessoal, familiar e comunitário, na vida sacramental da Igreja, em particular na Eucaristia.

Neste período de grandes mudanças e transformações, a Croácia precisa de homens e mulheres de fé viva, que saibam dar testemunho do amor de Deus pelo homem e mostrar-se disponíveis a pôr as suas energias ao serviço do Evangelho.

A vossa Nação tem necessidade de apóstolos, que se insiram entre o povo para lhe levar a Boa Nova; tem necessidade de almas orantes, que não cessem de cantar os louvores da Santíssima Trindade e elevem súplicas a «Deus, nosso Salvador, o qual quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade » (cf. 1Tm 2,4). A vossa Nação tem, além disso, necessidade de fiéis leigos empenhados no testemunho evangélico no mundo da cultura e da política. Com efeito, compete-lhes a tarefa de introduzir nesses âmbitos o espírito de Cristo em benefício da inteira sociedade.

4. Para dar uma resposta adequada a essas exigências, é preciso dedicar cuidado particular à formação dos sacerdotes, dos consagrados e de todos os que trabalham na vinha do Senhor, assim como é necessária a promoção da pastoral vocacional.

Dos sacerdotes espera-se que sejam autênticas, coerentes e alegres testemunhas de Cristo e do seu Evangelho, em sintonia com os compromissos assumidos no momento da Ordenação. O zelo apostólico e a actividade pastoral devem ser nutridos e sustentados com a oração e o recolhimento, de maneira que cada um possa em primeiro lugar viver tudo o que anuncia com a palavra e celebra todos os dias nos Santos Mistérios e na Liturgia do Louvor. Nesse contexto, o dom de si no celibato será para cada sacerdote testemunho da adesão, sem reservas, ao desígnio do Pai celeste, projecto feito próprio com caridade operosa e em constante comunhão com Cristo Bom Pastor. A espiritualidade enriquecer-se-á graças ao recurso a várias formas de devoção ou de práticas piedosas, como a confissão regular, a meditação, a adoração eucarística, a «Via Sacra», a recitação do S. Rosário.

Missão do Bispo é também sustentar os Religiosos e as Religiosas na sua total dedicação ao Senhor, exortando-os a viver com generosidade o carisma do Instituto de pertença e a trabalhar sempre em comunhão com a Igreja particular e universal.

5. Depois, é necessário encontrar os modos oportunos para ajudar os homens do nosso tempo a compreenderem e a acolherem o grande projecto de Deus sobre o homem. Com efeito, o homem de hoje tem necessidade de conhecer e fazer própria a dignidade que, de maneira gratuita, lhe foi dada por Deus, que o criou à Sua imagem e semelhança (cf. Gn Gn 1,26-27) e o remiu com o sangue de Cristo (cf. Ap Ap 5,9).

Na vossa actividade pastoral a família, «igreja doméstica», tenha um lugar especial, pois «o futuro do mundo e da Igreja passa através da família» (Familiaris consortio FC 75). Ela será capaz de responder aos desafios e às insídias do mundo contemporâneo, na medida em que souber abrir-se a Deus, vivendo e actuando «o mistério da unidade e do amor fecundo entre Cristo e a Igreja» (Lumen gentium LG 11). Uma família, na qual «os pais, pela palavra e pelo exemplo, são para os seus filhos os primeiros arautos da fé» (ibid.), saberá corresponder validamente à missão no mundo contemporâneo, tornando-se lugar de fé e de amor, a exemplo da Sagrada Família de Nazaré.

Os nossos contemporâneos têm necessidade de noções claras sobre a natureza e a vocação da família. Não vos canseis, portanto, de fazer conhecer a concepção cristã do matrimónio e da família. À luz da Palavra de Deus, procurai aprofundar as suas tarefas no contexto hodierno. Seja solicitude vossa e dos vossos sacerdotes, coadjuvados por pessoas experimentadas e devidamente preparadas para essa tarefa, promover uma intensa e segura pastoral familiar, na qual tenha o devido espaço a defesa da vida segundo os ensinamentos do Magistério (cf. Familiaris consortio FC 36). Nesse sector, fazei com que os agentes pastorais recebam uma adequada formação, a fim de poderem responder prontamente às expectativas dos noivos e dos esposos. Estai ao lado das famílias em dificuldade, insidiadas na sua natureza de comunidade de amor, de vida e de fé, atormentadas por problemas de natureza social e económica, ou então atingidas pelo sofrimento.

Nem seja esquecido o cuidado pastoral das novas gerações. A elas pertence o futuro, e os jovens bem formados estarão em condições de constituir boas famílias, e as boas famílias serão capazes de educar bem os seus filhos.

A pastoral familiar, com particular referência aos jovens, apresenta-se assim como um programa para a construção do futuro da Igreja e da sociedade civil. A promoção da dignidade da pessoa e da família, do direito à vida, insidiado hoje de modo particular, juntamente com a defesa das camadas sociais mais débeis, devem ter um lugar especial no conjunto das vossas preocupações apostólicas, a fim de «dar uma alma» à Croácia moderna.

Diante da difusão da «cultura da morte », que se manifesta sobretudo na prática do aborto e no crescente favor com que se considera a eutanásia, é preciso propor uma nova «cultura da vida». Nesse sentido, são necessárias iniciativas pastorais, que tenham em vista ajudar os homens e as mulheres do nosso tempo a redescobrirem o profundo significado da vida, não só da vida jovem e sadia, mas também daquela marcada pela doença. A Palavra de Deus, quanto a isto, oferece a resposta verdadeira e definitiva.

Defender a vida faz parte da missão da Igreja. Com efeito, «Deus, infinitamente perfeito e bem-aventurado em Si mesmo, num desígnio de pura bondade, criou livremente o homem para o tornar participante da Sua vida bem-aventurada. Por isso, sempre e em toda a parte, Ele está próximo do homem» (Catecismo da Igreja Católica CEC 1). Tanto hoje como ontem os nossos irmãos e irmãs têm necessidade de conhecer Cristo, o Enviado do Pai, que pôs no coração do homem um germe de vida nova e imortal, a vida dos filhos de Deus. A acção pastoral neste sector deve voltar a chamar a atenção sobre a ordem que Deus imprimiu no homem e na inteira criação.

6. Venerados Irmãos no Episcopado, formulo votos por que as Igrejas a que presidis, sejam sempre guiadas pelo Espírito Santo e actuem sob os Seus impulsos. Juntamente convosco invoco a protecção da Santíssima Mãe de Deus, Rainha da Croácia, e a intercessão de todos os Santos e Beatos desta região.

Acompanho estes sentimentos com uma especial Bênção Apostólica, que de coração concedo a cada um de vós, ao clero, aos religiosos, às religiosas e a todos os fiéis das vossas Dioceses.



Espálato, 4 de Outubro de 1998, XX ano de Pontificado.



VIAGEM APOSTÓLICA DE JOÃO PAULO II À CROÁCIA

DISCURSO DO SANTO PADRE

NO ENCONTRO COM OS CATEQUISTAS


E REPRESENTANTES DOS MOVIMENTOS ECLESIAIS


4 de Outubro de 1998





Caros Irmãos e Irmãs!

1. «Ides receber uma força, a do Espírito Santo, que descerá sobre vós, e sereis Minhas testemunhas» (Ac 1,8). Estas palavras de Cristo, pronunciadas antes do retorno ao Pai, foram escolhidas como lema desta minha Visita pastoral, que está para se concluir. São palavras que ressoam aqui desde os tempos apostólicos. Elas conservam também hoje toda a sua força, graças à acção do Espírito Santo nos corações dos homens e das mulheres desta terra croata.

Vim aqui a Salona, depois de ter elevado à honra dos altares ontem, no Santuário de Marija Bistrica, o mártir Alojzije Stepinac. Com esta Viagem apostólica, quis unir idealmente entre si os lugares da fé e da devoção do vosso Povo, na recordação do testemunho que ele deu a Cristo desde os primeiros séculos até aos nossos dias.

Encontramo-nos sob o olhar de Nossa Senhora da Ilha, sob o olhar de Nossa Senhora do grande Voto baptismal croata, junto do Proto-santuário mariano das terras croatas. Estamos reunidos no lugar que conserva importantes memórias da fé que remontam à história longínqua do vosso Povo. Este lugar ocupa um posto singular no vosso passado, católicos croatas, e da Nação croata. Está aqui a fonte da vossa identidade: encontram-se aqui as vossas profundas raízes cristãs. Este é o lugar que testemunha a fidelidade dos católicos da região a Cristo e à Igreja.

2. Agradeço cordialmente ao querido Arcebispo Metropolitano, D. Ante Juriae, as amáveis palavras de boas-vindas. Saúdo os Senhores Cardeais Franjo Kuhariae e Vinko Puljic com os outros Irmãos no Episcopado, o clero, os religiosos e as religiosas, os professores, os representantes das Associações e Movimentos eclesiais, e sobretudo os jovens, que vejo aqui presentes em grande número.

Caríssimos, desejo dirigir-vos uma palavra de esperança, convidando-vos a permanecer abertos, na Igreja, aos impulsos do Espírito Santo, para dardes um eficaz testemunho de Cristo, cada um no próprio âmbito de vida e de trabalho. «Vós tendes a unção do Santo e sabeis todas as coisas... conheceis a verdade » (1Jn 2,20-21).

Um exemplo extraordinário de testemunho cristão foi oferecido pelo Beato Alojzije Stepinac. Ele cumpriu a missão de evangelizador sobretudo sofrendo pela Igreja, e selou a sua mensagem de fé com a morte. Preferiu o cárcere à liberdade, para defender a liberdade da Igreja e a sua unidade. Não teve medo das cadeias, para que não fosse acorrentada a palavra do Evangelho.

3. Queridos representantes das Associações e Movimentos eclesiais, os fiéis leigos têm um lugar próprio na Igreja. Em virtude do Baptismo recebido, eles são chamados a participar na única e universal missão da Igreja (cf. Lumen gentium Apostolicam actuositatem AA 3), cada um segundo os dons recebidos. Por isso, é preciso promover um sadio pluralismo de formas associativas, rejeitando exclusivismos, para dar espaço aos carismas que o Espírito Santo não cessa de difundir na Igreja, para a construção do Reino de Deus e para o bem da humanidade.

A Igreja que está na Croácia deposita grandes esperanças em vós. «Não extingais o Espírito» (cf. 1Th 5,19). O carisma recebido foi-vos dado em benefício de todos, a fim de que tudo se desenrole como num organismo vivo e são (cf. 1Co 12,12-27 Rm 12,4-5). «Possuímos dons diferentes, consoante a graça que nos foi concedida» (Rm 12,6).

Tarefa particular dos Movimentos e das Associações eclesiais dos leigos é oferecer promoção e apoio à comunhão eclesial sob a guia do Bispo, «princípio e fundamento visível da unidade na sua respectiva Igreja» (Lumen gentium LG 23) Não existe a comunhão eclesial sem a comunhão com o Bispo: Episcopo attendite, ut et Deus vobis attendat» (Santo Inácio de Antioquia, Carta a Policarpo, 6, 1: Funk 1, 250).

4. Queridos Professores, a vós é confiada a esplêndida missão de formar os jovens, tornando-vos para eles exemplos e guias. Sabeis que todo o projecto educativo deve ser rico de valores espirituais, humanos e culturais, para poder alcançar a finalidade que lhe é própria. Como eu disse recentemente, «a escola não pode limitar-se a oferecer aos jovens algumas noções nos diversos ramos do saber; deve também ajudá-los a buscar, na justa direcção, o sentido da vida» (Angelus de 13 de Setembro de 1998).

Investir na formação das novas gerações significa investir no futuro da Igreja e da Nação. Sem uma boa formação das novas gerações não se podem ter perspectivas tranquilizadoras para o futuro da Igreja local nem da Nação. A forma e a orientação que o futuro há-de tomar, depende em grande parte de vós, educadores. O Concílio Vaticano II afirma: «o destino futuro da humanidade está nas mãos daqueles que souberem dar às gerações vindouras razões de viver e de esperar» (Gaudium et spes GS 31).

Os jovens têm necessidade do testemunho de um amor que sabe sacrificar-se e de uma paciência que sabe esperar com confiança. Os vossos argumentos mais fortes sejam precisamente o amor e a paciência. Inspire-vos sempre a divina pedagogia de Cristo Jesus, que no Evangelho Se fez nosso Mestre.

Ao exortar-vos a dar o melhor de vós mesmos no cumprimento do vosso dever, não posso deixar de exprimir os bons votos por que a sociedade saiba valorizar o vosso empenho profissional, reconhecendo-o de modo adequado. Por parte da Igreja, quereria exprimir-vos profundo apreço pelo vosso precioso serviço num sector tão delicado e determinante como é o da formação de quem inicia a vida.

5. É justo dirigir uma palavra específica a vós, caríssimos catequistas e professores de religião. Sois chamados, nas escolas e nas paróquias, a ajudar as jovens gerações a conhecer Cristo, para poderem segui-l'O e testemunhá-l'O. Sois chamados a ajudar os jovens a inserirem-se na Igreja e na sociedade, superando, à luz do Evangelho, as dificuldades que encontram na maturação humana e espiritual.

Ao propor aos jovens razões de vida e de esperança, o catequista é chamado a oferecer-lhes um mais profundo e claro conhecimento de Deus e da história da salvação, culminada na morte e ressurreição de Jesus Cristo. O fulcro da inteira actividade do catequista ou do professor de religião é constituído pelo anúncio da Palavra de Deus, com a finalidade de suscitar a fé e de a fazer maturar. A catequese e a hora de religião devem ser ocasião de um testemunho que estabeleça, entre o professor e o aluno, um contacto verdadeiro e profundo, capaz de alimentar a fé.

6. Resta-me dizer ainda uma palavra, a última, mas talvez a mais importante. É dirigida a vós, caríssimos jovens. É uma palavra breve, mas essencial. Ei-la: Jesus Cristo é «o caminho, a verdade e a vida» (Jn 14,6). Ele não desilude ninguém e é o melhor amigo dos jovens. Deixai-vos conquistar por Ele (cf. Fl Ph 3,12), para poderdes ser protagonistas de uma vida verdadeiramente significativa, protagonistas de uma grande e esplêndida aventura, tecida de amor para com Deus e o próximo (cf. Mt 22,37-40). Nas vossas mãos está o futuro: o vosso, mas também o da Igreja e da Pátria. Amanhã devereis enfrentar graves responsabilidades. Estareis à altura das vossas futuras tarefas, se vos preparardes agora de maneira adequada, com a ajuda das vossas famílias, da Igreja e dos institutos de formação.

Sabei encontrar o vosso lugar na Igreja e na sociedade, assumindo com generosidade os encargos que agora vos são confiados, na família e fora dela. É o modo mais fácil para vos preparardes para as tarefas de amanhã. Jamais esqueçais que todo o delineamento da própria vida que não estiver de acordo com o desígnio de Deus sobre o homem, antes ou depois está destinado ao malogro. Com efeito, somente com Deus e em Deus o homem pode realizar-se completamente e alcançar a plenitude, para a qual tende desde as profundezas do coração.

Um vosso poeta escreveu: «Felix, qui semper vitae bene computat usum» (M. Maruliae, Carmen de doctrina Domini nostri Iesu Christi pendentis in Cruce, v. 77). Decisivo é escolher os verdadeiros valores e não os efémeros, a verdade autêntica e não as semi-verdades ou as pseudoverdades. Desconfiai daquele que vos promete soluções fáceis. Sem sacrifício não se constrói nada de grande.

7. É o momento da despedida. Uma última saudação a todos, em particular a vós, habitantes de Salona: sede orgulhosos dos tesouros de fé que a história vos confiou. Conservai-os com zelo.

Quereria despedir-me de vós recordando-vos as palavras do Beato Alojzije Stepinac: «Não sereis dignos dos nomes dos vossos antepassados, se consentirdes em estar separados da rocha, sobre a qual Cristo construiu a Igreja» (Testamento de 1957).

Confio todos vós Àquela que, segundo a carne, foi a Mãe do Verbo que Se fez homem para a nossa salvação. Nossa Senhora da Ilha, deste seu Proto-santuário na terra croata, vele sobre vós, as vossas famílias e a vossa Pátria, e vos sustente no testemunho de Cristo, no novo Milénio já às portas!

A todos a minha Bênção!

Louvados sejam Jesus e Maria!




Discursos João Paulo II 1998 - Zagrábria, 2 de Outubro de 1998