Discursos João Paulo II 1998 - 5 de Novembro de 1998

PALAVRAS DO PAPA JOÃO PAULO II


NO FINAL DA RECITAÇÃO DO SANTO ROSÁRIO






Dirijo a minha cordial saudação a todos vós, que participastes neste momento de oração mariana, e faço-a extensiva a quantos se uniram a nós mediante a rádio e a televisão.

Em particular, é-me grato acolher nesta noite o numeroso grupo de pessoas, sobretudo religiosas mas também leigos que, por turnos, recitam todos os dias o Rosário na Capela da Rádio Vaticano, de onde é transmitido ao mundo inteiro. A cada um de vós, caríssimos Irmãos e Irmãs, dirigem-se o meu «obrigado» sincero e a minha bênção, assim como aos membros do coro «Jubilate Deo», que acompanha o Rosário do primeiro sábado do mês e recorda os seus vinte anos de actividade.

Saúdo, além disso, os fiéis das paróquias «Visitação de Maria Santíssima» em Gardolo (Trento), «São Nicolau de Bari» em Ponzano Romano (Roma), «São Nicolau» em Roccagiovine (Roma), «São Pedro» em Sezze (Latina) e do Santuário «Nossa Senhora de Fátima» em Trani (Bari), assim como o grupo de oração «Padre Pio», de Bevagna (Perúsia).

Nossa Senhora obtenha para todos a abundância de graças. Primeiro sábado do mês: a recitação do Rosário



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL


DA BULGÁRIA POR OCASIÃO DA VISITA


«AD LIMINA APOSTOLORUM»


7 de Novembro de 1998



Dilectos Irmãos no Episcopado

1. É com imensa alegria que, pela segunda vez desde as transformações que se verificaram no vosso País e em todo o Leste da Europa, vos recebo em Roma aonde viestes realizar a visita ad Limina, expressando assim de maneira tangível a vossa comunhão com o Sucessor de Pedro. Agradeço ao vosso Presidente as palavras que acaba de me dirigir.

Durante os últimos anos, empenhastes-vos em oferecer às vossas comunidades estruturas materiais e pastorais necessárias para o bem dos fiéis e da Igreja inteira. Dou-vos graças por este compromisso e pelos vossos numerosos esforços que, estou certo disto, começam a produzir fruto e darão ainda maiores resultados no futuro. Lá onde se manifesta e renasce a presença cristã, graças à indispensável liberdade das pessoas e dos povos, afirma-se a esperança dos fiéis, que se sentem cada vez mais motivados a edificar dia após dia a comunidade eclesial e, ao mesmo tempo, a participar na vida social, animados como são pela graça do Espírito Santo. Realizar a vocação baptismal na vida pessoal e familiar

2. Por vosso intermédio, desejo encorajar os sacerdotes, os religiosos e os leigos, a fim de que não cessem de se prodigalizar ao serviço do Evangelho. Sinto-me feliz pelo crescimento do número de fiéis, sinal da vitalidade das vossas comunidades. Para serem testemunhas de Cristo na sua vida quotidiana, eles sentem a necessidade de se aproximar dos sacramentos com maior frequência e de participar mais activamente na liturgia dominical. Nesta relação de intimidade com Cristo, eles hão-de encontrar a força e a audácia para realizar a própria vocação baptismal na sua vida pessoal, familiar e social. Em particular, é importante que eles sejam auxiliados a enfrentar os problemas que se apresentam na sociedade civil e em ordem a oferecer a própria contribuição para a reconstrução moral da sociedade, assinalada pela era das ideologias totalitárias, das quais as consciências ainda hoje carregam o peso, bem como para a gestão da res publica, num espírito de colaboração fraterna com os seus concidadãos. Um estudo sério da doutrina social da Igreja ser-lhes-á uma preciosa ajuda.

3. Enquanto me alegro convosco pelos primeiros frutos das vossas decisões pastorais, dou graças também pelos pastores e fiéis que, durante a provação e a noite da perseguição, bem como através de longos sofrimentos, conservaram a fé e combateram o bom combate. Possam o seu testemunho e a oferenda que fizeram da própria vida no martírio ser sementes da Boa Nova e de exemplos para os nossos contemporâneos! Uma destas testemunhas, que constitui um símbolo para todos, é o bispo mártir Eugénio Bossilkov, que tive a alegria de proclamar Beato no dia 15 do passado mês de Março. Numa carta redigida entre o fim de 1948 e o início de 1949, ele escrevia: «Os vestígios do nosso sangue abrirão o caminho para um futuro maravilhoso; e ainda que nós não o vejamos, outros hão-de colher aquilo que nós plantámos no meio dos sofrimentos». É nas mãos dos pastores e dos fiéis da Bulgária que volto a depor este tesouro, para que eles o conservem e o apresentem ao povo como uma vereda de liberdade e de vida.

A beatificação de D. Eugénio Bossilkov foi justamente uma experiência para as vossas comunidades; a elevação de um dos seus filhos à glória dos altares constitui para a Igreja local um reconhecimento da sua própria fidelidade a Cristo e à Sé de Pedro. Os santos e os confessores da fé ensinam-nos que o caminho rumo à vitória de Deus na vida do homem é constituída pela disposição a colaborar com a Sua graça, pois é Deus que «dá o crescimento» (1Co 3,7). Esta colaboração, que é precisamente o progresso da vida espiritual, constitui um elemento essencial da vida crist ã, no momento em que nos preparamos para entrar no grande Jubileu. A conversão pessoal e o retorno a Deus são condições indispensáveis para a transformação dos corações e dos relacionamentos interpessoais e sociais, a fim de se instaurar uma era de justiça e de paz. «Tudo deverá apontar para o objectivo prioritário do Jubileu que é o revigoramento da fé e do testemunho dos cristãos. É necessário, por conseguinte, suscitar em cada fiel um verdadeiro anseio de santidade, um forte desejo de conversão e renovamento pessoal num clima de oração cada vez mais intensa e de solidário acolhimento do próximo, especialmente do mais necessitado » (Carta Apostólica Tertio millennio adveniente, TMA 42). Formulo votos por que, graças ao compromisso de todos os homens de boa vontade, o terceiro milénio seja o milénio da liberdade na verdade, porque somente a verdade nos torna genuinamente livres e nos permite empreender o caminho da felicidade à qual aspiramos. «Verdade e liberdade, com efeito, caminham juntas ou juntas miseravelmente perecem», como recordei há pouco tempo na Encíclica Fides et ratio (n. 90). Cristo Senhor é o caminho; ele cura as nossas chagas interiores e exteriores, restabelecendo em nós a imagem divina, que obscurecemos mediante o pecado.

4. Entre as missões primordiais da comunidade eclesial, encontra-se a atenção que se deve prestar à família. O matrimónio é a instituição básica da sociedade e da Igreja. É importante fazer descobrir às jovens gerações a alegria que há em construir uma relação duradoura com uma pessoa, graças ao compromisso na fidelidade que consolida o amor e permite aos cônjuges desenvolver- se. O dom de si ao outro no matrimónio dispõe também cada um a entregar a própria vida sem hesitações, numa atitude responsável, realizando desta forma a missão recebida do Criador: acolher com alegria e respeito cada vida nova, educando os filhos a fim de que se tornem cristãos adultos capazes de participar na vida do próprio país. É indispensável que a educação dos filhos se fundamente no ensinamento de uma hierarquia de valores deveras autêntica, não determinada por modas ou pelo mero interesse pessoal.

A sociedade evoluirá pouco a pouco, graças à profunda transformação das famílias, chamadas a viver e a transmitir os valores morais e espirituais aos jovens. Nos últimos decénios, todos foram testemunhas das funestas consequências da falta de respeito pela vida humana. O vosso povo experimentou na própria carne esta verdade: para que uma sociedade nova possa edificar-se, a pedra angular deverá ser o respeito da vida, de toda a vida, especialmente daquela que é indefesa. De igual modo na situação actual, o vosso País é chamado a resistir, mediante um salutar impulso moral, à atracção indiscriminada da sociedade do consumo, do relativismo moral, do egoísmo, da apatia e da falta de respeito pela vida; da parte dos cristãos, estas atitudes devem ceder o lugar a um progresso deliberado no caminho da santidade e a um compromisso cada vez mais solidário no que diz respeito aos próprios irmãos. Todos os homens de boa vontade hão-de recordar-se de que a pessoa humana é o cerne da vida social e deve ser respeitada na sua dignidade fundamental. A luta pela liberdade genuína passa através da salvaguarda de todo o ser humano, de forma particular dos mais pequeninos e dos mais pobres.

Sem dúvida, entre os vossos compatriotas casados, alguns encontram dificuldades na vida conjugal e familiar. Enquanto rezo por estas famílias provadas, convido-as a reavivar o ardor do seu compromisso inicial: a fidelidade, aceite não como um ónus mas como uma opção jovial, permitirá superar os temores e as incompreensões que ao longo dos dias se puderam instalar nas relações, para ser a fonte de um desenvolvimento genuíno e de uma profunda experiência de felicidade. Como pastores, com a ajuda do clero e dos catequistas, compete-vos sustentar os pais e intensificar a catequese dos jovens, bem como dar continuidade à prática de uma preparação apropriada para o matrimónio. A descoberta do mistério cristão e da verdade sobre o amor humano ajudará os jovens no seu crescimento espiritual e humano.

5. Para enfrentar eficazmente as realidades pastorais tal como se apresentam no vosso País, é importante que os sacerdotes, não obstante a sobrecarga de trabalho que às vezes devem enfrentar, intensifiquem os seus esforços em vista do anúncio do Evangelho e da iniciação nos sacramentos. Ao cuidarem da grei confiada à sua solicitude, eles terão também a peito a continuação da colaboração com os leigos que, em virtude do seu Baptismo, têm um papel específico e activo na missão da Igreja. Graças à sua disponibilidade generosa e à competência que eles possuem nos diversos sectores, poderão oferecer uma contribuição inestimável sob a guia dos seus bispos.

Entre as vossas inquietações há o nú- mero insuficiente de sacerdotes. Encorajo-vos a desenvolver cada vez mais a pastoral das vocações nas escolas, na catequese e nas famílias, a fim de que os jovens possam escutar a chamada de Deus. O testemunho do clero é essencial para suscitar nos jovens o desejo de se empenharem na via do sacerdócio. Através do exemplo da sua vida alegre, da direcção espiritual e de outras iniciativas apropriadas, os sacerdotes saberão suscitar nos jovens o desejo de se tornarem disponíveis para fazer, segundo a vontade de Deus, uma opção corajosa no seguimento de Cristo (cf. Directório para o ministério e a vida dos sacerdotes, n. 32a). Este período de discernimento inicial deve prolongar-se numa séria preparação para o ministério sacerdotal, mediante um aprofundado ensino filosófico e teológico, a fim de se poder responder aos numerosos interrogativos dos homens do nosso tempo. «Ensinem-se as disciplinas filosóficas de forma que, antes de mais, se ajude os alunos a adquirir um sólido e coerente conhecimento do homem, do mundo e de Deus, apoiados num património filosófico perenemente estável, tendo em conta as investigações filosóficas da nossa progressiva época» (Concílio Ecuménico Vaticano II, Decreto sobre a formação sacerdotal Optatam totius OT 15); da mesma forma, acrescenta o Concílio, «as disciplinas teológicas devem ser ensinadas à luz da fé e sob a orientação do Magistério da Igreja» (Ibid., n. 16). Efectivamente, é graças a sacerdotes bem formados que a Igreja poderá anunciar o Evangelho a todas as culturas.

6. Vós provindes de uma terra onde desde há séculos as tradições do Ocidente e do Oriente se encontram no comum louvor ao Senhor. Entretanto, todos vós nascestes da evangelização levada a cabo pela grandiosa obra dos santos Cirilo e Metódio que, com o seu extraordinário carisma, levaram ao povo búlgaro a Boa Nova e ao mesmo tempo a sua cultura particular. Esta complementaridade das Tradições oriental e latina, que experimentais pessoalmente no seio da vossa Conferência Episcopal, representa um vigoroso convite à unidade dos dois pulmões da Europa.

Se tal unidade constitui um dever para todos os filhos da Igreja católica, ela é um compromisso inelutável para todos aqueles que acreditam em Cristo. Como salientei na Exortação Apostólica Tertio millennio adveniente, o grande Jubileu é «a ocasião propícia para uma frutuosa colaboração, visando colocar em comum as muitas coisas que nos unem e que são seguramente mais do que aquelas que nos dividem» (n. 16). Por conseguinte, exorto-vos a buscar os meios que vos hão-de permitir consolidar os vínculos entre as diferentes Confissões cristãs, em particular na comunhão com os nossos irmãos ortodoxos. A partilha dos dons e dos nossos patrimónios culturais e espirituais só pode enriquecer-nos mutuamente, a fim de se redescobrirem as profundas raízes cristãs que pertencem à história do vosso País e do inteiro continente.

No termo da vossa visita, peço-vos que transmitais os sentimentos afectuosos do Papa aos vossos sacerdotes, religiosos e religiosas, bem como aos queridos fiéis leigos da Bulgária, assegurando-lhes a minha oração. Confio à intercessão materna da Virgem Maria as provações e as esperanças da Igreja católica que está na Bulgária. A vós, queridos Irmãos no Episcopado, a todos aqueles de quem sois os Pastores, concedo do íntimo do coração a Bênção apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR GUILLERMO LEÓN ESCOBAR-HERRÁN


NOVO EMBAIXADOR DA COLÔMBIA JUNTO DA SANTA SÉ


Sábado, 7 de Novembro de 1998





Senhor Embaixador

1. Ao aceitar as Cartas Credenciais mediante as quais Vossa Excelência é acreditado como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República da Colômbia junto da Santa Sé, é de bom grado que, em primeiro lugar, lhe apresento as minhas cordiais boas-vindas e lhe agradeço as amáveis palavras que quis dirigir-me, bem como a deferente saudação do Senhor Presidente da República, Senhor Doutor Andrés Pastrana Arango, a quem retribuo sinceramente reconhecido, formulando os meus melhores votos para ele e toda a querida Nação colombiana.

2. Este acto, Senhor Embaixador, assinala o início do excelso e nobre cargo de representar o seu País junto da Santa Sé e oferece a oportunidade de reflectir sobre a grande responsabilidade que assume, e acerca da importância da função que desempenha. De facto, a missão diplomática por si mesma tende para o diálogo, para a busca de caminhos que levem ao entendimento recíproco e à cooperação entre os povos.

A persistência de numerosos conflitos que hoje afligem a humanidade, com as suas consequências devastadoras e dramáticas, torna cada vez mais insuportável a ideia de uma humanidade que ainda não é capaz de superar as suas divergências através do diálogo e da conciliação. A isto junta-se também a convicção de que a paz não significa apenas o silêncio das armas, mas que é preciso afundar nas raízes que fazem da força e do interesse egoísta a razão suprema do comportamento humano. Por este motivo, o serviço à paz converte-se, na realidade, num compromisso em favor da justiça.

Por sua vez, a justiça nunca é completa nem duradoura sem a promoção da dignidade das pessoas e dos povos, e o respeito rigoroso dos direitos inalienáveis que daí derivam.

São estes os valores que presidem à actividade da Santa Sé no concerto das relações internacionais, as quais não pretendem ter outra força a não ser as suas próprias convicções, nem outro interesse senão o de conduzir os homens à plena realização da sua excelsa vocação de filhos de Deus, no cumprimento da sua missão de tornar presente a mensagem de Cristo. Por conseguinte, é nestes termos que ela se relaciona com os seus interlocutores, ressaltando a dimensão ética dos fenómenos sociais e políticos de cada momento, e contribuindo desta forma, a partir da raiz mesma dos problemas, para a sua resolução prática.

3. O mundo deste final de século vive mais do que nunca o impacto do processo de globalização: multiplica-se a comunicação, aumenta o intercâmbio e as fronteiras outrora robustas parece que se desmoronam ao sopro do progresso tecnológico. É uma situação rica de possibilidades inéditas, mas também de grandes desafios, que requerem cada vez mais uma grande responsabilidade e um profundo sentido ético da parte daqueles que têm o dever de tomar decisões que podem comprometer o destino da sociedade humana.

Isto verifica-se de maneira clara no âmbito da economia, no qual uma série de factores e actores se entrelaçam em estreita interdependência, tanto dentro de cada nação como a nível internacional, a ponto de ser impensável chegar à solução de determinadas situações de dificuldade sem a solidariedade decidida e concertada de todo o país, e a cooperação da comunidade internacional. A respeito disto desejo recordar que «a opção de investir num lugar em vez de outro, neste sector produtivo e não naquele é sempre uma escolha moral e cultural» (Centesimus annus CA 36). Com efeito, o respeito da pessoa humana e o seu direito fundamental de levar uma vida digna deve prevalecer sobre os interesses de acumular benefícios ou manter posições de privilégio.

4. Os desequilíbrios sociais e a desmedida diferença na distribuição dos recursos materiais desencadeiam por vezes processos de conflito e de violência. Mas esta também pode ter outras raízes e, em qualquer caso, provoca por si mesma novas situações de instabilidade e de injustiça, criando desta forma um círculo nefasto que atormenta completamente a vida dos cidadãos e impede o seu progresso harmónico e integral. Por isto, deve-se apreciar o sério empenho do seu governo por estabelecer a paz num clima de reconciliação nacional, empreendido com decisão e amplitude de horizontes. Neste sentido, por fidelidade e coerência ao Evangelho da vida, a Igreja não pode deixar de reprovar qualquer forma de atentado contra a integridade e a liberdade das pessoas, qualquer acção terrorista cometida contra pessoas inocentes e até mesmo contra aqueles que tem como única missão servir a comunidade através do ministério pastoral.

Também neste aspecto tão doloroso a arte do diálogo, a primazia do Estado de Direito, a busca sincera do bem comum e o respeito dos direitos inalienáveis da pessoa, são garantia de um êxito satisfatório e duradouro.

5. Um factor de importância fundamental para a estabilidade e o crescimento da inteira sociedade é a atenção que se deve dar à família. Esta célula básica da vida de todo o país necessita do apoio e da colaboração das autoridades públicas, seguindo uma correcta aplicação do princípio de subsidiariedade, a fim de que a família possa alcançar os seus próprios fins. Devem ser criadas as condições propícias para que a família se possa estabelecer, manter-se de maneira estável em condições dignas, acolher sem receio o dom da vida e exercer o direito fundamental de educar de modo conveniente os filhos. Este direito dos pais de escolher o modelo de educação para os seus filhos deve ser tutelado e favorecido por uma justa cooperação do Estado, garantindo desta forma o seu exercício efectivo.

Os lamentáveis casos de abandono infantil, de dependência da droga por parte de crianças e adolescentes, de prostituição infantil e outras situações dramáticas que afectam a juventude, têm muitas vezes a sua raiz numa vida familiar lacerada ou corrompida por diversas circunstâncias. Senhor Embaixador, eis por que devem ser apreciadas todas as iniciativas que o seu Governo realiza neste delicado âmbito, esperando que se continue por esse caminho, como o meio mais apropriado para alcançar um progresso social constante e esperançoso nesse querido País.

6. É agradável verificar que as boas relações entre a Colômbia e a Santa Sé favorecem uma colaboração franca, dentro dos respectivos âmbitos de compet ência, para servir melhor as pessoas e a sociedade. Mas para além das meras relações formais, no seu discurso Vossa Excelência referiu-se ao afecto desta Sé Apostólica pelo povo colombiano. É sem dúvida um sentimento que existe desde há muito tempo, devido às raízes profundamente cristãs da sua Nação, e que foi confirmado pela visita do meu venerado predecessor Paulo VI, cujo 30° anivers ário se celebrou neste ano.

Recordo pessoalmente com profunda gratidão a viagem que realizei à Colômbia em 1986. Aquelas inesquecíveis jornadas mostraram o autêntico rosto da sociedade colombiana, a fé sólida do seu povo, a solidariedade recíproca, o seu profundo sentido da hospitalidade, a sua capacidade de partilhar e trabalhar unidos, a alegria perante a vida. Tudo isto constitui um rico património espiritual e cultural que permite ter fundadas esperanças num futuro melhor.

7. Senhor Embaixador, no momento em que lhe peço para se fazer intérprete destes sentimentos e esperanças perante o seu Governo e o querido povo colombiano, exprimo-lhe os meus melhores votos de um frutuoso exercício da alta missão que lhe foi confiada. Em penhor dos favores divinos que o ajudem no desempenho das suas funções, e invocando a materna protecção da Virgem Maria, Nossa Senhora de Chiquinquirá, concedo-lhe de coração a Bênção Apostólica, que de bom grado faço extensiva à sua distinta família e aos seus colaboradores, bem como a todos os cidadãos da sua querida Nação.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


NA III SESSÃO PÚBLICA DAS PONTIFÍCIAS ACADEMIAS


7 de Novembro de 1998





Senhores Cardeais
Senhores Embaixadores
Ilustres Académicos Pontifícios
Caríssimos Irmãos e Irmãs!


1. Esta terceira Sessão pública das Pontifícias Academias, convocada para pôr em relevo o seu contributo ao humanismo cristão, no alvorecer do Terceiro Milénio, oferece-me a ocasião para me encontrar de novo convosco. De coração agradeço a todos vós aqui presentes. Saúdo o Senhor Cardeal Paul Poupard, Presidente do Conselho de Coordenação entre as Pontifícias Academias, e agradeço-lhe as gentis expressões que, em nome de todos, acabou de me dirigir.

Saúdo também os Senhores Cardeais, os venerados Irmãos no Episcopado, os Senhores Embaixadores presentes, os sacerdotes, os consagrados e as consagradas e os ilustres membros das Pontifícias Academias. Saúdo, por fim, o Prof. Bruno Cagli, Presidente da Academia Nacional de Santa Cecília e, de coração, agradeço aos componentes do Coro juvenil da mesma Academia, dirigidos pelo Maestro Martino Faggiani, que tornam ainda mais solene este encontro, com a sua magistral execução de famosos trechos musicais, inspirados no amor do povo cristão para com Maria Santíssima.

2. É, de facto, à Virgem Maria que esta solene Sessão é consagrada: Maria, Ícone e Modelo da humanidade remida por Cristo.

A atenção a Ela dirigida alimentou-se também com os contributos teológicos, oferecidos pelos ilustres relatores sobre os vários aspectos do seu papel na história da salvação. Com efeito, a reflexão sobre o homem, a qual se desenvolveu nas várias culturas ao longo do curso dos séculos, hauriu um extraordinário incremento do confronto com o mistério de Jesus, Verbo de Deus que Se fez carne no seio de Maria. No novo horizonte cognoscitivo que a Revelação abriu, perfila-se o papel eminente da Virgem Mãe de Deus.

Na carta aos Gálatas, São Paulo escreve: «Ao chegar a plenitude dos tempos, Deus enviou o Seu Filho, nascido de mulher, nascido sujeito à Lei, para resgatar os que se encontravam sob o jugo da Lei e para que recebêssemos a adopção de filhos» (Ga 4,4-5). As palavras do Apóstolo conduzem-nos ao coração mesmo da história: na «plenitude dos tempos», o Filho de Deus nasceu de uma mulher, Maria de Nazaré, partícipe de modo singular no mistério do Verbo, tendo dado à luz no tempo o Filho gerado pelo Pai desde a eternidade.

Maria é filha do povo eleito, e por isso mesmo filha da sua cultura, enriquecida pelo encontro milenário com a Palavra de Deus: é a Mulher que participa de maneira activa no primeiro milagre de Jesus em Caná, manifestando a Sua glória (cf. Jo Jn 2,1-12) e está presente no Gólgota para ser indicada como Mãe do discípulo amado e nossa Mãe.

Os Evangelhos e a Tradição cristã ensinam-nos a reconhecer n'Ela a «sede» em que se realizou historicamente a Encarnação. Desde há dois mil anos, a vida de Jesus e o anúncio da Boa Nova da salvação têm uma dimensão extraordinariamente mariana. A Virgem Mãe está próxima do coração dos homens de todos os tempos e culturas, como testemunham as obras-primas do génio humano, que floresceram em cada época da história.

3. A Virgem é apresentada pelo Novo Testamento como uma mulher extraordinária na simplicidade da sua existência. Os Padres da Igreja, mestres de espiritualidade cristã, deram voz à fé da comunidade dos crentes, pondo em evidência as verdades que se referem à excepcional especificidade de Maria. Ela é a Theotokos, a Deipara, a Mãe de Deus, que a Igreja honra com um «culto especial » (Lumen gentium LG 66).

No limiar do Grande Jubileu do Ano 2000, é-me grato recordar o imenso tesouro de amor, de devoção e de arte testemunhado, no arco de dois milénios, pelas Igrejas do Oriente. Elas honram Maria Santíssima, a Theotokos, também com outros esplêndidos títulos como Panaghia, a Toda Santa; Hiperagionorma, Santa acima de qualquer limite; Platythera, imensa; Odigitria, aquela que indica o caminho; Eleousa, aquela que está repleta de ternura misericordiosa. A tradição mariana oriental contempla, venera e canta os louvores da Virgem, cujos ícones recordam a todos que a Mãe de Deus é a excelsa imagem da humanidade remida por Cristo. As Igrejas do Oriente oferecem-nos, portanto, no seu riquíssimo património mariano não só um caminho ecuménico, mas também um modelo de humanismo cristão.

4. Quanto ao Ocidente, a teologia, a espiritualidade e a arte, para honrar a Mãe de Deus e pôr em relevo a sua maternidade espiritual universal, vão buscar inspiração nos mistérios da Santíssima Trindade e do Verbo encarnado. A sua união a Cristo é o arquétipo da união da Igreja e de cada um dos cristãos ao Redentor. Ao reflectirem sobre ela, os discípulos do Senhor compreenderam imediatamente que Maria Santíssima é a primeira dentre os remidos, imagem perfeita da redenção. O Beato João Duns Escoto, cantor da Imaculada Conceição, escreveu a esse respeito: «Se portanto Cristo nos reconciliou com Deus da maneira mais perfeita, mereceu que fosse removido de alguém este gravíssimo castigo. Isto não pôde ser senão a favor da sua Mãe» (Ordinatio III, d. 3, q. 1). Alegro-me por que a Pontifícia Academia Mariana Internacional e o Pontifício Ateneu «Antonianum» tenham instituído uma cátedra de estudos mariológicos, intitulados a este grande teólogo.

Na esteira da Exortação Apostólica Marialis cultus do meu venerado Predecessor, o Servo de Deus Paulo VI, eu quis reafirmar na Encíclica Redemptoris Mater o vínculo essencial que intercorre entre Maria e a Igreja, ressaltando a sua missão no interior da comunidade dos crentes. Na Exortação Apostólica Mulieris dignitatem recordei, depois, como Maria ilumina e enriquece o humanismo cristão que no Evangelho se inspira, porque, além dos vários aspectos da «humanidade nova» que n'Ela se realizou, põe em relevo a dignidade e o «génio» da mulher. Escolhida por Deus para a actuação do Seu desígnio de salvação, Maria ajuda-nos a entender a missão da mulher na vida da Igreja e no anúncio do Evangelho.

5. Caríssimos Irmãos e Irmãs, acolhendo a proposta do Conselho de Coordenação entre as Pontifícias Academias, é-me grato agora entregar o prémio das Pontifícias Academias à Doutora Deyanira Flores González, da Costa Rica, pelo seu trabalho em Mariologia, intitulado: «La Virgen Maria al pie de la cruz (Jn 19,25-27) en Ruperto de Deutz», apresentado pela Pontifícia Faculdade Teológica «Marianum». De bom grado ofereço também, como sinal de apreço, uma medalha do Pontificado, a dois recém-licenciados: a Doutora Marielle Lamy, francesa, pela sua tese: «Le culte marial entre doctrine et dévotion: étapes et enjeux de la controverse de l'Immaculée Conception au Moyen Age (XIIe - XVe siècles)», apresentada na Universidade de Paris X Nanterre, e o Padre Johannes Schneider, franciscano austríaco, pela sua tese: «Virgo Ecclesia facta: la presenza di Maria nel Crocifisso di San Damiano e nell'Officium Passionis di San Francesco d'Assisi», apresentada no Pontifício Ateneu «Antonianum» de Roma.

Como se sabe, o Prémio das Pontifícias Academias, instituído há dois anos, quer encorajar jovens universitários, artistas e instituições a contribuírem para o desenvolvimento das ciências religiosas, do humanismo cristão e das suas expressões artísticas. Em particular, exprimo os meus votos por que um renovado empenho dos estudiosos nas pesquisas de Mariologia possa pôr em relevo os traços do humanismo fecundado pelo Espírito da graça, do qual Maria Santíssima é Modelo e Ícone.

Com estes sentimentos, de coração concedo-vos, bem como às vossas famílias e a quantos vos são queridos, uma especial Bênção apostólica.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II

POR OCASIÃO DA 45ª ASSEMBLEIA GERAL

EXTRAORDINÁRIA DA CONFERÊNCIA


EPISCOPAL ITALIANA






Caríssimos Bispos italianos!

1. «A graça do Senhor Jesus seja convosco. Eu amo-vos todos em Cristo Jesus» (1Co 16,23-24).

É-me caro saudar cada um de vós com estas palavras do apóstolo Paulo. Saúdo, em particular, o Cardeal Presidente Camillo Ruini, os três Vice-Presidentes e o Secretário-Geral, D. Ennio Antonelli, agradecendo-lhes o empenho e a perspicácia com que trabalharam ao serviço da vossa Conferência.

Considerai-me espiritualmente presente nesta Assembleia Geral, que é tempo de graça para viver de modo mais intenso a comunhão episcopal e a comum solicitude para com a Igreja de Deus que está na Itália. A todos vós exprimo pessoal gratidão pela participação no vigésimo aniversário da minha eleição à Sé de Pedro e no quadragésimo de Episcopado.

2. Conheço o zelo com que guiais a preparação das vossas dioceses para o grande Jubileu, já muito próximo. A educação dos jovens na fé, tema principal da vossa Assembleia, enquadra-se bem neste percurso, antes, é-lhe parte essencial, não só porque um evento de especial relevo do Ano Santo será o Dia Mundial da Juventude, mas também e sobretudo porque o objectivo fundamental do Jubileu é revigorar e relançar, em vista do novo Milénio, o anúncio e o testemunho da fé em Jesus Cristo, único Salvador do mundo, e esta missão é confiada de modo peculiar aos jovens, que deverão forjar o rosto cristão da futura civilização.

Com a Encíclica Fides et ratio, eu quis chamar a aprofundar o íntimo vínculo que une a revelação do mistério de Deus com a inteligência do homem. Deste vínculo podem receber impulso também o projecto cultural da Igreja italiana e todas as iniciativas de comunicação social, em cujo desenvolvimento estais justamente empenhados. Pode assim ser oferecida às jovens gerações um caminho para saírem do âmbito muito estreito da própria subjectividade, reencontrando um comum horizonte de verdade e de valores compartilhados, pelos quais trabalhar juntos.

3. Na vossa Assembleia ocupar-vos-eis, além disso, da promoção do apoio económico à Igreja. Desejo agradecer-vos publicamente a generosidade com que ides em ajuda de tantas Igrejas irmãs e nações menos afortunadas, naquele espírito de solidariedade planetária que é próprio da comunhão eclesial.

Alegro-me convosco pelo novo Estatuto da vossa Conferência, voltado para sustentar de maneira sempre mais eficaz o afecto colegial e o comum trabalho pastoral. É esta também a finalidade da Carta Apostólica em forma de "Motu proprio" Apostolos suos, com a qual eu quis determinar melhor a natureza teológica e jurídica das Conferências dos Bispos. Teremos a oportunidade de reflectir juntos, de modo mais amplo, sobre a nossa missão como Bispos no alvorecer do Terceiro Milénio, na próxima Assembleia ordinária do Sínodo dos Bispos.

4. Caros Irmãos no Episcopado, conheço bem e compartilho profundamente a solicitude, sugerida pelo amor, com que seguis as vicissitudes da dilecta nação italiana. Penso, em particular, na família fundada sobre o matrimónio, que constitui também hoje o recurso mais precioso e mais importante de que a Itália dispõe e que, no entanto, foi até agora bem pouco ajudada por causa da debilidade das políticas familiares, e que, antes, está submetida a múltiplos ataques, no plano cultural e também na vertente política, legislativa e administrativa.

Penso na defesa e promoção da vida humana, desde a concepção até ao seu termo natural. Penso na escola, que deve reencontrar as suas mais nobres finalidades educativas, num quadro de efectiva liberdade e paridade como acontece noutros Países europeus. Penso nas possibilidades de trabalho e de desenvolvimento, que devem ser incrementadas numa lógica de solidariedade e de valoriza ção dos múltiplos temas sociais, para enfrentar o desemprego e a pobreza que, em muitas regiões da Itália, afligem amplas camadas da população.

5. Diante destes e doutros problemas convido-vos, caríssimos Irmãos, a jamais abdicar da missão que nos foi confiada, a não ceder a conformismos nem a modas transitórias, a reagir a toda a errónea separação entre a fé, a cultura e a vida, pessoal e social.

Actuando em profunda comunhão entre nós e com as nossas Igrejas, e procedendo sempre com amor e confiança, poderemos ajudar a Itália a não perder a sua alma profunda e a fazer frutificar a sua insigne herança de fé e de cultura, que é um bem precioso também para a Europa e para o mundo.

Uno-me a vós na grande oração pela Itália, que agora tomou novo impulso a partir do Santuário de Loreto, e concedo com afecto a Bênção Apostólica a vós, caros Irmãos no Episcopado, e às Igrejas confiadas ao vosso cuidado pastoral.

Vaticano, 9 de Novembro de 1998.




Discursos João Paulo II 1998 - 5 de Novembro de 1998