AUDIÊNCIAS 1999 - AUDIÊNCIA


JOÃO PAULO II

AUDIÊNCIA

Preparemo-nos para viver com fervor os

dias mais importantes para a nossa fé

Quarta-feira 31 de Março de 1999




Caríssimos Irmãos e Irmãs:

1. No domingo passado, Domingo de Ramos, entrámos na semana chamada «santa», pois nela comemoramos os eventos centrais da nossa redenção. O cerne desta semana é o Tríduo da Paixão e da Ressurreição do Senhor que, como se lê no Missal Romano, «resplandece no ápice do ano litúrgico, porque a obra da redenção humana e da perfeita glorificação de Deus foi realizada por Cristo, de modo especial mediante o mistério pascal, com o qual, ao morrer, destruiu a nossa morte e, ao ressuscitar, nos deu de novo a vida» (Normas Gerais, 18). Na história da humanidade nada aconteceu de mais significativo e de maior valor. No termo da Quaresma, preparamo-nos assim para viver com fervor os dias mais importantes para a nossa fé, intensificamos o nosso empenho em seguir, com sempre maior fidelidade, Cristo, Redentor do homem.

2. A Semana Santa leva-nos a meditar sobre o sentido da Cruz, na qual «a revelação do amor misericordioso atinge o seu ponto culminante» (cf. Dives in misericordia DM 8). De maneira muito particular, estimula-nos a essa reflexão o tema deste terceiro ano de imediata preparação para o Grande Jubileu do Ano 2000, dedicado ao Pai. Ele salvou-nos com a Sua infinita misericórdia. Para redimir a humanidade deu livremente o Seu Filho Unigénito. Como não agradecer-Lhe? A história é iluminada e guiada pelo evento incomparável da redenção: Deus, rico em misericórdia, derramou em cada ser humano a Sua bondade infinita, por meio do sacrifício de Cristo. Como manifestar de modo adequado o nosso reconhecimento? A liturgia destes dias, se por um lado nos faz elevar ao Senhor, vencedor da morte, um hino de acção de graças, pede-nos, ao mesmo tempo, que eliminemos da nossa vida tudo aquilo que nos impede de nos conformar a Ele. Contemplamos Cristo na fé e repercorremos as etapas decisivas da salvação por Ele operada. Reconhecemo-nos pecadores e confessamos a nossa ingratidão, a nossa infidelidade e a nossa indiferença diante do Seu amor. Temos necessidade do Seu perdão, que nos purifique e nos sustente no empenho de conversão interior e de perseverante renovação do espírito.

3. «Tende piedade de mim, ó Deus, segundo a Vossa misericórdia: na Vossa grande bondade, apagai o meu pecado... Lavai-me totalmente das minhas iniquidades, purificai-me dos meus delitos» (Ps 50,1 Ps 50,4). Estas palavras, que proclamámos na Quarta-Feira de Cinzas, acompanharam-nos durante todo o itinerário quaresmal. Elas ressoam no nosso espírito com singular intensidade ao aproximarem-se os dias sagrados, nos quais nos é renovado o dom extraordinário da remissão das culpas, obtido para nós por Jesus na Cruz. Diante do Crucificado, apelo eloquente à misericórdia de Deus, como não se arrepender dos próprios pecados nem se converter ao amor? Como não reparar de maneira concreta as injustiças causadas aos outros e restituir os bens adquiridos de modo desonesto? O perdão exige gestos concretos: o arrependimento só é verdadeiro e eficaz quando se traduz em actos tangíveis de conversão e de justa reparação.

4. «Na Vossa fidelidade, socorrei-me, Senhor!». Assim nos exorta a orar a liturgia hodierna da Quarta-Feira Santa, toda projectada para os eventos salvíficos que comemoraremos nos próximos dias. Ao proclamarmos neste dia o Evangelho de Mateus sobre a Páscoa e sobre a traição de Judas, já pensamos na solene Missa «in Cena Domini» de amanhã à tarde, que recordará a instituição do Sacerdócio e da Eucaristia, assim como o mandamento «novo» do amor fraterno, que nos foi deixado pelo Senhor na vigília da Sua morte.

Essa sugestiva celebração será precedida, amanhã de manhã, da Missa crismal, a que em todas as catedrais do mundo o Bispo preside circundado do seu presbitério. São benzidos os óleos sagrados para o Baptismo, para a Unção dos enfermos e o Crisma. À noite, depois, terminada a Missa «in Cena Domini», haverá o tempo da adoração, como que em resposta ao convite que Jesus dirigiu aos Seus discípulos na dramática noite da Sua agonia: «Ficai aqui e vigiai Comigo» (Mt 26,38).

A Sexta-Feira Santa é dia de grande comoção, no qual a Igreja nos fará escutar a narração da Paixão de Cristo. A «adoração» da Cruz estará no centro da acção litúrgica que naquele dia será ce- lebrada, enquanto a Comunidade eclesial ora intensamente pelas necessidades dos crentes e do mundo inteiro.

Tem lugar, então, uma fase de silêncio profundo. Tudo se calará até à noite do Sábado Santo. No coração das trevas irromperão a alegria e a luz, com os sugestivos ritos da Vigília pascal e o cântico festivo do «Aleluia». Será o encontro, na fé, com Cristo ressuscitado e a alegria pascal prolongar-se-á durante os cinquenta dias sucessivos.

5. Caríssimos Irmãos e Irmãs, disponhamo-nos a reviver estes eventos com íntimo fervor, juntamente com Maria Santíssima, presente no momento da paixão do seu Filho e testemunha da Sua ressurreição. Diz um cântico polaco: «Mãe santíssima, elevamos o nosso brado ao teu Coração traspassado com a espada da dor!». Maria aceite as nossas orações e os sacrifícios daqueles que sofrem; corrobore os nossos propósitos quaresmais e nos acompanhe enquanto seguimos Jesus na hora da provação extrema. Cristo, torturado e crucificado, é fonte de força e sinal de esperança para todos os crentes e para a humanidade inteira.

Saudações

Caríssimos Irmãos e Irmãs!

Saúdo com afecto os peregrinos de língua portuguesa anunciados nesta Audiência: com uma benevolente palavra de bons votos de esperança pascal e de paz, os portugueses da Paróquia de Torres Vedras; sede bem-vindos e a luz da Páscoa ilumine de esperança a vossa vida sob a protecção de Santa Maria. E a todos a minha Bênção!

De todo o coração saúdo os peregri- nos francófonos, sobretudo o Bispo de Tulle, Dom Le Gal, e os seus diocesa- nos, assim como os jovens de Marselha, d'Armentières e de Quebeque. Concedo a todos os fiéis presentes a Bênção Apostólica.

É-me grato apresentar uma especial saudação aos visitantes e peregrinos de língua inglesa, que hoje estão connosco, de maneira especial os provenientes da Inglaterra, Austrália, Japão e Estados Unidos: a graça e a paz desta Semana Santa estejam sempre convosco e com as vossas famílias!

Saúdo com afecto os peregrinos de língua espanhola, em especial os responsáveis da Organização de Cooperação Internacional, assim como os alunos procedentes de Madrid, Nájera, Bullas, San Cugat e Novelda. Saúdo também os demais peregrinos mexicanos e dos outros países latino-americanos. Abençoo-vos a todos de coração.

Dirijo cordiais boas-vindas aos peregrinos provenientes da Lituânia. Louvado seja Jesus Cristo!

Caros Irmãos e Irmãs, agradeço-vos a vossa presença e faço votos por que os momentos da Semana Santa, vividos em Roma, disponham cada coração ao diálogo com Deus, através da reflexão, da penitência e dos gestos de amor para com o próximo. Com estes votos, ao invocar sobre vós, sobre as vossas famílias e a inteira população da vossa Pátria a abundância dos dons celestes, a todos concedo a propiciadora Bênção Apostólica. Boa e Santa Páscoa a todos!

Saúdo cordialmente os peregrinos da Hungria, de Budapeste. Na catequese hodierna meditámos sobre o Tríduo Sagrado e sobre o Mistério pascal. Caríssimos, de coração desejo-vos que comemoreis dignamente a paixão, morte e ressurreição de Nosso Senhor. Com estes sentimentos, concedo a minha Bênção Apostólica a vós e à vossa Pátria. Louvado seja Jesus Cristo!

Saúdo os estudantes e os professores do Ginásio esloveno de Celovec-Klagenfurt, na Áustria. Possa a visita aos monumentos romanos enriquecer a vossa cultura e aprofundar a vossa fé. Com estes votos concedo-vos a minha Bênção Apostólica.

Com muito afecto saúdo os Estudantes do II° e III° Liceu de Espálato, assim como os jovens da Paróquia «Rainha da Paz», em Makarska, e os grupos de peregrinos provenientes de outras localidades croatas. Bem-vindos!

Caríssimos, amanhã à tarde com a Santa Missa «in Cena Domini» inicia a celebração do Sagrado Tríduo Pascal. Ele representa o vértice do Ano litúrgico e, ao mesmo tempo, recorda-nos a imensidade do amor de Deus pelo homem, que se manifestou de modo muito particular na Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo. Sabei redescobrir em plenitude esse amor, testemunhando-o sempre e em toda a parte.

Sobre vós e as vossas famílias invoco a bênção de Deus.

Louvados sejam Jesus e Maria!

Saúdo cordialmente todos os peregrinos de língua italiana. Em particular, desejo dirigir o meu pensamento à equipa ciclística de profissionais «Amore & Vita Fanini Team» e ao grupo de diletantes «Mamma e Michela Fanini». A todos agradeço a grata visita, desejando a cada um que estes dias da Semana Santa sejam ocasião propícia para revigorar a fé e a adesão ao Evangelho.

Dirijo, enfim, o meu cordial pensamento aos Jovens, aos Doentes e aos jovens Casais.

A contemplação da paixão, morte e ressurreição de Jesus, caros jovens, vos torne sempre mais firmes no testemunho cristão.

E vós, queridos doentes, hauri da Cruz de Cristo o sustento quotidiano para superar os momentos de provação e de desconforto.

A vós, prezados jovens esposos, do mistério pascal, que nestes dias contemplamos, venha um encorajamento a fazerdes da vossa família um lugar de amor fiel e fecundo.

A todos a minha bênção.

                                                                                 Abril de 1999

JOÃO PAULO II

AUDIÊNCIA

O Pai: amor exigente

Quarta-feira 7 de Abril de 1999




1. O amor de Deus Pai por nós não nos pode deixar indiferentes, antes, exige que seja retribuído com um empenho constante de amor. Este empenho assume significados sempre mais profundos, quanto mais nos aproximamos de Jesus, que vive plenamente em comunhão com o Pai, fazendo-Se modelo para nós.

No contexto cultural do Antigo Testamento a autoridade do pai é absoluta, e é assumida como termo de confronto para descrever a autoridade de Deus criador, a Quem não é lícito mover contestações. Lê-se em Isaías: «Ai do que diz ao seu pai: "Por que me geraste?" ou à sua mãe: "Por que me deste à luz?". Eis o que diz o Senhor, o Santo de Israel, que te formou: "Pretendeis pedir-Me contas do futuro, dar-Me lições acerca da obra das Minhas mãos",» (45, 10 s.). Um pai tem também a tarefa de guiar o filho, advertindo-o com severidade, se for necessário. O Livro dos Provérbios recorda que isto vale também para Deus: «Porque o Senhor castiga aquele a quem ama, como um pai a um filho querido» (3, 12; cf. Sl Ps 103,13). O profeta Malaquias, por sua vez, atesta o afecto compassivo de Deus para com os Seus filhos (cf. 3, 17), mas trata-se sempre dum amor exigente: «Lembrai-vos da lei de Moisés, Meu servo, a quem Eu prescrevi, no Horeb, ordenações e mandamentos» (3, 22).

2. A lei, que Deus dá ao Seu povo, não é um peso imposto por um senhor tirânico, mas a expressão daquele amor paterno que indica a justa vereda da conduta humana e a condição para herdar as promessas divinas. É este o sentido da injunção do Deuteronómio: «Observarás os mandamentos do Senhor, teu Deus, andando nos Seus caminhos e reverenciando-O. O Senhor, teu Deus, vai conduzir-te a uma terra afortunada» (8, 6-7). Enquanto sanciona a aliança entre Deus e os filhos de Israel, a lei é ditada pelo amor. Mas transgredi-la acarreta consequências, comportando resultados dolorosos, que entretanto são sempre dominados pela lógica do amor, porque constringem o homem a tomar salutar consciência de uma dimensão constitutiva do seu ser. «É ao descobrir a grandeza do amor de Deus que o nosso coração é abalado pelo horror e enormidade do pecado, e começa a ter receio de ofender a Deus pelo pecado e ser separado d'Ele» (Catecismo da Igreja Católica [CIC], 1432).

Se se separa do Criador, o homem precipita necessariamente no mal, na morte, no nada. Ao contrário, a adesão a Deus é fonte de vida e de bênção. É quanto ressalta o mesmo Livro do Deuteronómio: «Vê, ofereço-te hoje, de um lado, a vida e o bem; de outro, a morte e o mal. Recomendo-te hoje que ames o Senhor, teu Deus, que andes nos Seus caminhos, que guardes os Seus preceitos, Suas leis e Seus decretos. Se assim fizeres, viverás, engrandecer-te-ás e serás abençoado pelo Senhor, teu Deus, na terra em que vais entrar para a possuir» (30, 15 s.).

3. Jesus não revoga a Lei nos seus valores fundamentais, mas aperfeiçoa-a, como Ele mesmo diz no sermão da montanha: «Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim revogá-la mas completá-la» (Mt 5,17).

Jesus aponta o coração da Lei no preceito do amor, e desenvolve as suas exigências radicais. Ao ampliar o preceito do Antigo Testamento, Ele ordena que amemos amigos e inimigos, e explica esta extensão do preceito fazendo referência à paternidade de Deus: «Tornar-vos- eis filhos do vosso Pai que está nos Céus; pois Ele faz que o sol se levante sobre os bons e os maus e faz cair a chuva sobre os justos e os pecadores» (Mt 5,43-45 cf. CIC CIC 2784).

Com Jesus verifica-se uma grande diferença de qualidade: Ele sintetiza a Lei e os Profetas numa única norma, tanto simples na sua formulação quanto difícil na actuação: «Tudo o que quiserdes que os homens vos façam, fazei-o também a eles» (cf. Mt Mt 7,12). Esta é até mesmo apresentada como a via a ser percorrida para sermos perfeitos como o Pai celeste (cf. Mt Mt 5,48). Quem age assim, dá aos homens testemunho para que seja glorificado o Pai, que está nos Céus (cf. Mt Mt 5,16), e dispõe-se a receber o Reino que Ele preparou para os justos, segundo as palavras de Cristo no juízo final: «Vinde, benditos de Meu Pai, recebei em herança o Reino que vos está preparado desde a criação do mundo» (Mt 25,34).

4. Enquanto anuncia o amor do Pai, Jesus jamais cessa de recordar que se trata dum amor empenhativo. Este traço do rosto de Deus emerge de toda a vida de Jesus. O seu «alimento» é justa- mente fazer a vontade d'Aquele que O enviou (cf. Jo Jn 4,34). Precisamente porque Ele procura não a própria vontade, mas a do Pai que O enviou ao mundo, o Seu juízo é justo (cf. Jo Jn 5,30). Por isso o Pai dá testemunho d'Ele (cf. Jo Jn 5,37) e de igual modo também as Escrituras (cf. Jo Jn 5,39). Sobretudo as obras que realiza em nome do Pai, garantem que é enviado por Ele (cf. Jo Jn 5,36 Jn 10,25 Jn 10,37-38). Entre elas, a mais alta é a de oferecer a própria vida, como o Pai Lhe ordenou: este dom de Si é até mesmo a razão por que o Pai O ama (cf. Jo Jn 10,17-18) e é o sinal de que Ele ama o Pai (cf. Jo Jn 14,31). Se a lei do Deuteronómio já era caminho e garantia de vida, a lei do Novo Testamento é-o de modo inédito e paradoxal, exprimindo-se no man- damento de amar os irmãos até dar a vida por eles (cf. Jo Jn 15,12-13).

O «mandamento novo» do amor, como recorda São João Crisóstomo, tem a sua razão última no amor divino: «Não podeis chamar vosso pai a Deus de toda a bondade, se conservais um coração cruel e desumano; nesse caso, de facto, já não tendes em vós a marca da bondade do Pai celeste» (Hom. in illud «Angusta est porta»: B). Nesta perspectiva existe contemporaneamente continuidade e superação: a Lei transforma-se e aprofunda-se como Lei do amor, a única que convém ao rosto paterno de Deus.

Saudações

Caríssimos Irmãos e Irmãs de língua portuguesa!

Saúdo e desejo a todos felicidades, paz e graça no Senhor. Saúdo em particular os grupos de portugueses de um agrupamento de escuteiros da Paróquia de S. Mamede, e os paroquianos de Gafanha da Nazaré, ambos de Lisboa: sede bem-vindos e sede felizes. Que a luz de Cristo ressuscitado anime sempre a vossa fé, esperança e caridade, numa vida digna, cristã e repleta de alegrias. E dou-vos de coração, extensiva aos vossos familiares e pessoas amigas, a minha Bênção.

Acolho com prazer os francófonos. Saúdo os peregrinos da diocese de Tulle, vindos com o seu Bispo, D. Le Gal, os da Alsácia e da Bretanha, assim como os numerosos jovens, sobretudo os de Molenbeck, que vieram aprofundar o diálogo islâmico-cristão, e os do colégio Les Maristes de Bourg-de-Péage, cujo fundador será por mim canonizado. Que o Senhor Ressuscitado seja para cada um alegria e luz no caminho! A todos concedo do íntimo do coração a Bênção Apostólica.

Apresento especial saudação aos recém-ordenados Diáconos do Pontifício Colégio Irlandês e do Pontifício Colégio Sueco: Deus vos fortaleça e guie no vosso ministério de graça e esperança. Sobre todos os peregrinos e visitantes de língua inglesa, de modo especial os da Inglaterra, Irlanda, Escócia, Canadá e Estados Unidos da América, invoco a alegria e a paz do Salvador Ressuscitado.

Saúdo com afecto os peregrinos de língua espanhola, em especial as participantes no IV Curso de Colaboradoras do «Regnum Christi» e a Confraria da Virgem de «la Soterraña», de Olmedo, que celebra o 75º aniversário da coroação da imagem, assim como os seminaristas de Barcelona e Barbastro e os alunos do Colégio de São Luís dos Franceses, de Madrid. De coração abençoo todos vós, convidando-vos a descobrir as exigências do amor de Deus Pai.

«Realmente o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão» (Lc 24,34). Com estas palavras do Evangelho segundo São Lucas saúdo todos os peregrinos belgas e holandeses. Faço votos por que o vosso coração seja ardente enquanto escutais a Palavra do Ressuscitado e que reconheçais o Senhor na fracção do Pão. De coração concedo a Bênção Apostólica. Louvado seja Jesus Cristo!

Dirijo cordiais boas-vindas aos membros do coral de «Krinichka» de Minsk. Caríssimos, agradeço-vos a visita e de bom grado invoco sobre vós e os vossos entes queridos copiosas bênçãos do céu.

Com afecto me dirijo aos peregrinos vindos da Lituânia. Caríssimos Irmãos e Irmãs, apresento as minhas felicitações pascais a todos vós e aos vossos entes queridos: Boa Páscoa! Cristo Ressuscitado cumule os vossos corações do Seu amor e da Sua alegria! A todos aqui presentes e ao inteiro povo lituano concedo a minha Bênção Apostólica. Louvado seja Jesus Cristo!

Saúdo cordialmente o grupo de universitários eslovacos, presentes na Audiência.

Caríssimos estudantes, estamos na Oitava de Páscoa, na qual recordamos com participação mais intensa o mistério da ressurreição de Cristo, a sua vitória sobre o pecado e sobre a morte. Cristo ressuscitado está presente entre nós e impele-nos a já não viver para nós mesmos, mas para Ele, que morreu e ressuscitou por nós (cf. 2Co 5,15).

Com os votos por que vivais plenamente o Mistério da Páscoa, concedo de coração a minha Bênção a vós, aos vossos entes queridos e à inteira Eslováquia. Louvado seja Jesus Cristo!

Bem-vindos, seminaristas de Liubliana e Maribor, na Eslovénia, que quisestes enriquecer o mistério pascal com a visita ao túmulo de São Pedro e aos outros monumentos cristãos de Roma. Com o desejo de que o Redentor Ressuscitado seja o vosso guia no caminho do sacerdócio, concedo-vos a minha Bênção Apostólica.

Dirijo cordiais boas-vindas aos peregrinos de língua italiana, em particular aos seminaristas da Arquidiocese de Catânia e aos diáconos da Companhia de Jesus, vindos aqui com os seus Superiores e familiares. Juntamente com eles saúdo os jovens presentes, de modo especial os numerosos grupos de meninos e meninas que neste ano fazem a sua «Profissão de fé». Eles provêm de diversos Decanados, Paróquias e Oratórios da Lombardia. Caríssimos, sede sempre fiéis ao vosso Baptismo: vivei plenamente a vossa consagração baptismal e sede testemunhas de Cristo morto e ressuscitado por nós.

Dirijo um pensamento afectuoso também a vós, queridos doentes. A Luz da Páscoa vos ilumine e vos sustente no vosso sofrimento.

E vós, prezados jovens esposos, procurai haurir do mistério pascal a coragem para serdes protagonistas na Igreja e na sociedade, contribuindo, com o vosso amor fiel e fecundo, para a construção da civilização do amor. Com estes votos, abençoo todos vós de coração.



JOÃO PAULO II

AUDIÊNCIA

Quarta-feira 14 de Abril de 1999

Dar testemunho de Deus Pai é a resposta cristã ao ateísmo



Queridos irmãos e irmãs,

1. A orientação religiosa do homem brota do seu próprio carácter de criatura, que o impele a desejar ardentemente a Deus, pelo Qual foi criado à Sua imagem e semelhança (cf. Gn Gn 2,17). O Vaticano II ensinou que «a razão mais sublime da dignidade do homem consiste na sua vocação à união com Deus. É desde o começo da sua existência que o homem é convidado a dialogar com Deus: pois, se existe, é só porque criado por Deus por amor, é por Ele por amor constantemente conservado; nem pode viver plenamente segundo a verdade, se não reconhecer livremente esse amor e se entregar ao seu Criador» (Gaudium et spes, GS 19).

A via que conduz os seres humanos ao conhecimento de Deus Pai é Jesus Cristo, o Verbo que Se fez carne, que veio a nós pelo poder do Espírito Santo. Como sublinhei nas catequeses precedentes, esse conhecimento é autêntico e completo, se não se reduz só a uma aquisição do intelecto, mas envolve de modo vital a inteira pessoa humana. Esta deve oferecer ao Pai uma resposta de fé e de amor, na consciência de que, antes de nos conhecermos, já fomos por nossa vez conhecidos e amados por Ele (cf. Gl Ga 4,9 1Co 13,12 1Jn 4,19).

Infelizmente, este vínculo íntimo e vital com Deus, prejudicado pela culpa dos nossos primeiros pais desde o início da história, é vivido pelo homem de modo frágil e contraditório, insidiado pela dúvida e muitas vezes rompido pelo pecado. A época contemporânea conheceu depois formas particularmente devastadoras de ateísmo «teórico» e «prático» (cf. Carta Encíclica Fides et ratio FR 46-47). Revela-se sobretudo violento o secularismo com a sua indiferença em relação às questões últimas e à fé: de facto, ele exprime um modelo de homem totalmente separado da referência ao Transcendente. O ateísmo «prático» é assim uma triste e concreta realidade. Se é verdade que ele se manifesta sobretudo nas civilizações mais avançadas económica e tecnicamente, os seus efeitos estendem-se também àquelas situações e culturas que estão a empreender um processo de desenvolvimento.

2. É preciso deixar-se guiar pela Palavra de Deus, para ler esta situação do mundo contemporâneo e responder às graves questões que ela apresenta.

Partindo da Sagrada Escritura, notar- se-á imediatamente que ela não menciona o ateísmo «teórico», enquanto se preocupa em repelir o ateísmo «prático». O Salmista diz que é louco quem pensa que «Deus não existe» (14, 1), e assim se comporta: «Corruptas e abomináveis as suas acções: Não há quem faça o bem» (ibid.). Noutro Salmo é censurado o «ímpio insolente que despreza o Senhor», dizendo: «Deus não nos castigará! Deus não existe» (10, 4).

Em vez de ateísmo, a Bíblia fala de impiedade e idolatria. Ímpio e idólatra é aquele que ao verdadeiro Deus prefere uma série de produtos humanos, falsamente considerados divinos, vivos e actuantes. À impotência dos ídolos, e paralelamente daqueles que os fabricam, são dedicadas longas reprimendas proféticas. Ao vazio e à inaptidão dos ídolos fabricados pelo homem, elas contrapõem com veemência dialéctica o poder do Deus criador que realiza prodígios (cf. Is Is 44,9-20 Jr 10,1-16).

Esta doutrina atinge o seu desenvolvimento mais amplo no Livro da Sabedoria (cf. capp. 13-15), onde se apresenta a via, que depois será evocada por São Paulo (cf. Rm Rm 1,18-23), do conhecimento de Deus a partir das coisas criadas. Ser «ateu» significa, então, não conhecer a verdadeira natureza da realidade criada, mas torná-la absoluta e, por isso mesmo, «idolatrá-la», em vez de a considerar como vestígio do Criador e via que a Ele conduz.

3. O ateísmo pode até tornar-se uma forma de ideologia intolerante, como a história demonstra. Os dois últimos séculos conheceram correntes de ateísmo teórico que negaram Deus, em nome de uma pretensa autonomia absoluta do homem, da natureza ou da ciência. É quanto ressalta o Catecismo da Igreja Católica [C.I.C.]: «Muitas vezes, o ateísmo funda-se num conceito falso da liberdade humana, levado até à recusa de qualquer dependência em relação a Deus» (n. 2126).

Este ateísmo sistemático impôs-se durante várias décadas, oferecendo a ilusão de que, eliminando Deus, o homem haveria de ser mais livre tanto psicológica como socialmente. As principais objecções feitas sobretudo em relação a Deus Pai, apresentam-se em torno da ideia de que a religião constituiria para os homens um valor de tipo compensativo. Removida a imagem do pai terreno, o homem adulto projectaria em Deus a exigência de um pai amplificado do qual, por sua vez, se deve libertar porque impediria o processo de maturação dos seres humanos.

Diante de formas de ateísmo e das suas motivações ideológicas, qual é a atitude da Igreja? A Igreja não despreza o estudo sério das componentes psicológicas e sociológicas do fenómeno religioso, mas rejeita com firmeza a interpretação da religiosidade como projecção da psique humana ou resultado de condições sociológicas. Com efeito, a autêntica experiência religiosa não é expressão de infantilismo, mas atitude amadurecida e nobre de acolhimento de Deus, que responde à exigência de significado global e empenha de modo responsável em prol duma sociedade melhor.

4. O Concílio reconheceu que, na génese do ateísmo, puderam contribuir os crentes que nem sempre manifestaram de maneira adequada o rosto de Deus (cf. GS GS 19 CIC 2125).

Nesta perspectiva, está precisamente no testemunho do verdadeiro rosto de Deus Pai a resposta mais convincente ao ateísmo. Obviamente, isto não exclui mas exige também a correcta apresentação dos motivos de ordem racional que levam ao reconhecimento de Deus. Infelizmente, essas razões são muitas vezes ofuscadas pelos condicionamentos devidos ao pecado e por múltiplas circunstâncias culturais. É então o anúncio do Evangelho, corroborado pelo testemunho de uma caridade inteligente (cf. GS GS 21), a via mais eficaz para que os homens possam divisar a bondade de Deus e, de maneira progressiva, reconhecer o Seu rosto misericordioso.

Saudações

Amados peregrinos do Brasil e de Portugal e outros mais que aqui se encontrem de língua portuguesa, sede bem-vindos! A ressurreição de Cristo abriu a estrada para além da morte; temos a estrada desimpedida até ao Céu. Que nada vos impeça de viver e crescer na amizade do Pai celeste, e testemunhar a todos a Sua bondade e misericórdia! Sobre vós e vossas famílias, desça a sua Bênção generosa.

Saúdo, por fim, com cordialidade os Jovens, os Doentes e os jovens Casais.

O Senhor ressuscitado suscite em cada um de vós, caros jovens, a alegria de O seguir com coragem e entusiasmo; proporcione conforto e consolo a vós, queridos doentes, para poderdes compreender que os sofrimentos, acolhidos com amor, estendem a graça do sacrifício pascal à humanidade inteira; e conceda a vós, prezados jovens esposos, acolher e promover sempre a vida, dom precioso do Seu infinito amor.

De bom grado concedo a todos a minha Bênção.



JOÃO PAULO II

AUDIÊNCIA

Quarta-feira 21 de Abril de 1999


Testemunhar Deus Pai no diálogo com todos os homens religiosos

Caríssimos Irmãos e Irmãs:


1. «Há um só Deus e Pai de todos, que está acima de todos, actua por meio de todos e Se encontra em todos» (Ep 4,6).

À luz destas palavras da Carta do Apóstolo Paulo aos cristãos de Éfeso, queremos neste dia reflectir sobre o modo de testemunhar Deus Pai em diálogo com todos os homens religiosos.

Nesta nossa reflexão teremos dois pontos de referência: o Concílio Vaticano II, com a Declaração Nostra aetate sobre «As relações da Igreja com as religiões não cristãs», e a meta já próxima do Grande Jubileu.

A Declaração Nostra aetate lançou as bases de um novo estilo, o do diálogo, na relação da Igreja com as várias religiões.

Por sua parte, o Grande Jubileu do Ano 2000 representa uma ocasião privilegiada para testemunhar este estilo. Na Tertio millennio adveniente convidei a aprofundar, precisamente no presente ano dedicado ao Pai, o diálogo com as grandes religiões, também mediante encontros em lugares significativos (cf. nn. 52-53).

2. Na Sagrada Escritura o tema do Deus único em relação à universalidade dos povos que procuram a salvação, vai- se desenvolvendo progressivamente até ao ápice da plena revelação em Cristo. O Deus de Israel, expresso com o Tetragrama sagrado, é o Deus dos patriarcas, o Deus que apareceu a Moisés na sarça ardente (cf. Êx Ex 3) para libertar Israel e o tornar o povo da aliança. No Livro de Josué é narrada a opção feita pelo Senhor em Siquém, onde a grande assembleia do povo escolhe o Deus, que Se mostrou benévolo e providente para com ele, e abandona todos os outros deuses (cf. cap. 24).

Esta escolha, na consciência religiosa do Antigo Testamento, torna-se sempre mais definida no sentido dum monoteísmo rigoroso e universalista. Se o Senhor Deus de Israel não é um Deus entre tantos, mas o único Deus verdadeiro, daí resulta que por Ele devem ser salvos todos os povos «até aos confins da terra» (Is 49,6). A vontade salvífica universal transforma a história humana numa grande peregrinação de povos rumo a um único centro, Jerusalém, porém sem que as diversidades étnico-culturais sejam anuladas (cf. Ap Ap 7,9). O profeta Isaías exprime de maneira sugestiva esta perspectiva, através de um caminho que une o Egipto à Assíria, ressaltando que a bênção divina irmana Israel, o povo do Egipto e o da Assíria (cf. Is Is 19,23-25). Cada povo, conservando plenamente a própria identidade, é chamado a converter-se sempre mais ao Deus único, que Se revelou a Israel.

3. Esta inspiração «universalista», presente no Antigo Testamento, desenvolve- se ulteriormente no Novo, o qual nos revela que Deus «quer que todos os ho- mens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade» (1Tm 2,4). A convicção, de que Deus está efectivamente a preparar todos os homens para a salvação, serve de fundamento para o diálogo dos cristãos com os homens religiosos de crenças diferentes. O Concílio delineou assim a atitude da Igreja a respeito das religiões não cristãs: «A Igreja católica olha com sincero respeito esses modos de agir e viver, esses preceitos e doutrinas que, embora se afastem em muitos pontos daqueles que ela própria segue e propõe, todavia reflectem não raramente um raio da verdade que ilumina todos os homens. No entanto ela anuncia, e tem mesmo obrigação de anunciar incessantemente Cristo, "caminho, verdade e vida" (Jn 14,6), em quem os homens encontram a plenitude da vida religiosa e no qual Deus reconciliou Consigo todas as coisas» (Ne 2).

Nos anos passados, alguns opuseram o diálogo com os homens religiosos ao anúncio, dever primário da missão salvífica da Igreja. Na realidade, o diálogo inter-religioso é parte integrante da missão evangelizadora da Igreja (cf. Catecismo da Igreja Católica CEC 856). Como várias vezes afirmei, ele é fundamental para a Igreja, exprime a sua missão salvífica, é um diálogo de salvação (cf. Insegnamenti VII/1 [1984], PP 595-599). No diálogo inter-religioso não se trata, por isso, de abdicar ao anúncio, mas de responder a um apelo divino para que o intercâmbio e a partilha conduzam a um mútuo testemunho da própria visão religiosa, a um aprofundado conhecimento das respectivas convicções e a um entendimento sobre alguns valores fundamentais.

4. O apelo à comum «paternidade» de Deus não resultará então um vago apelo universalista, mas será vivido pelos cristãos na plena consciência daquele diálogo salvífico, que passa através da mediação de Jesus e da obra do seu Espírito. Deste modo, por exemplo, ao haurirmos de religiões como a muçulmana a poderosa afirmação do Absoluto, pessoal e transcendente respeito ao cosmos e ao homem, podemos, da nossa parte, oferecer o testemunho de Deus no íntimo da Sua vida trinitária, esclarecendo que a trindade das Pessoas não atenua mas qualifica a própria unidade divina.

De igual modo, dos itinerários religiosos que levam a conceber a realidade última em sentido monístico, como uma «Unidade» indiferenciada na qual tudo se resolve, o cristianismo recebe o apelo a respeitar o sentido mais profundo do mistério divino, para além de todas as palavras e conceitos humanos. Contudo, ele não hesita em testemunhar a transcendência pessoal de Deus, enquanto anuncia a Sua paternidade universal e amorosa, que se manifesta plenamente no mistério do Filho crucificado e ressuscitado.

Possa o Grande Jubileu constituir uma ocasião preciosa para todos os homens religiosos se conhecerem mais, a fim de que se estimem e se amem num diálogo que constitua para todos um encontro de salvação.

Apelo do Santo Padre

Nos dias gozosos do tempo pascal, infelizmente continua o sofrimento de numerosos povos do mundo.

Além do drama que se prolonga no Kossovo, hoje desejo recordar as inumeráveis «guerras esquecidas» que ensanguentam a África. De Angola aos Grandes Lagos, do Congo-Brazzaville a Serra Leoa, da Guiné-Bissau à República Democrática do Congo, do Corno da África ao Sudão, é uma longa e amarga sequela de conflitos internos e interestaduais, que atingem sobretudo as populações inocentes e abalam a vida das comunidades católicas. De modo particular, a notícia do aprisionamento de Sua Ex.cia D. Augustin Misago, Bispo de Gikongoro, em Ruanda, suscitou dor e tristeza.

Cristo ressuscitado não cessa de repetir aos nossos irmãos, tão arduamente provados: «A paz esteja convosco!» (cf. Jo Jn 20,19). Possa a sua voz divina ser escutada por aqueles que resistem com tenacidade à recepção da sua mensagem de vida! Oxalá Ele alumie a cegueira de quantos se obstinam em percorrer as sendas tortuosas do ódio e da violência, convencendo-os a optar definitivamente por um diálogo sincero e paciente, que leve a soluções benéficas para todos!

Na certeza de que o poder da Ressurreição é mais forte do que o mal, imploramos ao Vencedor do pecado e da morte a fim de que a aspiração de uma África pacificada e fraterna se torne sem demora uma realidade consoladora.

Acompanhei com interesse as notícias acerca da sorte do grupo de pessoas raptadas no passado dia 12 de Abril, enquanto viajavam de avião de Bucaramanga a Bogotá, e que ainda estão retidas contra a própria vontade no Norte da Colômbia. Desejo dirigir o meu veemente apelo aos raptadores a fim de que renunciem à sua acção injusta em relação a essas pessoas, cujos direitos são gravemente violados, e lhes devolvam a liberdade. Assim, favorecer-se-á o processo de reconciliação em que se encontra comprometida toda essa amada Nação, por cujo bom êxito rezo constantemente ao Deus da paz.





AUDIÊNCIAS 1999 - AUDIÊNCIA