Discursos João Paulo II 1999 - LORENZO RUSSO

PAPA JOÃO PAULO II




DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


NO SOLENE ACTO DA INAUGURAÇÃO


DA EXPOSIÇÃO "ROMA-ARMÉNIA"


Quarta-feira, 24 de Março de 1999



1. É para mim uma grande alegria participar nesta solene inauguração da Exposição «Roma-Arménia», promovida pela antiga e gloriosa sede de Echmiadzin e pela Embaixada da Arménia junto da Santa Sé, com a cooperação da Biblioteca Apostólica Vaticana.

Desejo exprimir sentimentos de profunda estima e consideração a Sua Excelência o Senhor Robert Kocharian, Presidente da República da Arménia, que quis estar presente nesta ocasião. Ao agradecer-lhe, Senhor Presidente, as suas amáveis palavras, exprimo a esperança de que a Arménia, no seu difícil caminho rumo a uma merecida prosperidade, experimente uma maior solidariedade internacional e beneficie da guia de homens de Estado iluminados e empenhados no bem comum, de maneira que todos os cidadãos sejam encorajados a desempenhar o próprio papel no desenvolvimento da nação.

Uma razão particular para nos alegrarmos é a presença, nesta ocasião solene e importante, de Sua Santidade Karekin I, Catholicos de todos os Arménios, acompanhado de Sua Beatitude o Patriarca Torkon I, Arcebispo de Jerusalém, e de outros ilustres Prelados, sacerdotes e leigos da Igreja Apostólica da Arménia. Quisestes honrar a Igreja de Roma da maneira mais esplêndida que os cristãos conhecem: através do testemunho da caridade e do santo ósculo da comunhão.

Santidade, aprecio profundamente este gesto delicado que abre um capítulo novo e importante na história da busca comum de uma plena unidade entre os seguidores de Cristo. Não obstante as dificuldades da viagem, vós e os ilustres Hóspedes que vos acompanham, quisestes demonstrar mais uma vez quanto credes na tarefa ecuménica, à qual dedicastes de maneira incansável as vossas energias. Agradeço-vos de novo as palavras de importância histórica, pronunciadas por ocasião da vossa visita a Roma, em Dezembro de 1996, palavras que nos meses sucessivos foram retomadas por Sua Santidade Aram I, Catholicos da Grande Casa da Cilícia. A Sua Santidade Aram I, Catholicos da Grande Casa da Cilícia, envio uma saudação fraterna e invoco sobre o seu ministério as abundantes bênçãos de Deus.

Ensinastes ao vosso povo e à vossa Igreja que a comunhão é um imperativo para os seguidores de Cristo e uma condição essencial «para que o mundo creia» no seu testemunho. Comunhão não significa absorção e perda de identidade. Antes, é uma peregrinação comum rumo ao único Senhor, conservando aquilo que é específico e conseguindo a força e a riqueza que derivam da universalidade. Que o Pai de todas as bênçãos vos conceda, Santidade, muitos anos como Chefe da Igreja arménia, à espera das novas iniciativas que renovarão a esperança de quantos crêem que a Igreja de Cristo é una, que «não pode ser senão una, única e santa» (Discurso ao Pontifício Instituto Oriental, Insegnamenti XVI, 2 [1993], 1458).

Dirijo cordiais saudações ao meu caro Irmão, Sua Beatitude Jean Pierre XVIII Kasparian, Patriarca dos Católicos Arménios, que hoje veio aqui para estar connosco, acompanhado de outros Bispos da sua Igreja. A plena comunhão com a Sé de Pedro, tornando esta Igreja parte integrante da família católica, não a separa do maravilhoso património de vida espiritual e de cultura que tanto honra o povo arménio, e de igual modo a empenha em testemunhar um renovado vigor em nome da unidade.

2. O tema da exposição e deste encontro de eminentes figuras eclesiásticas e civis, em representação do povo arménio, não é um evento ordinário. É, de facto, altamente simbólico: ressalta a abertura, a disponibilidade ao encontro e as conquistas culturais que caracterizaram toda a história do povo arménio.

Apesar da oposição e até mesmo da aberta perseguição, os arménios não se fecharam em si mesmos, mas consideraram vital, não só para a própria sobrevivência mas também para o seu desenvolvimento autêntico, empenhar-se num intercâmbio aberto e inteligente com outros povos. Dos outros, receberam a título de empréstimo elementos de enriquecimento, fundindo-os no crisol da sua inequívoca unicidade. Demonstraram sempre espírito de iniciativa e coragem, sustentados pela força do Evangelho que lhes forjou a história e forneceu um sólido fundamento à sua vida. A diáspora arménia, por mais dolorosa que tenha sido, é um sinal desta vitalidade dinâmica que continua exemplar também hoje.

Quando esta adesão ao Evangelho implicou, como muitas vezes aconteceu, o sacrifício da própria vida por amor da fidelidade à fé cristã, os arménios demonstraram, com o seu martírio, aquele milagre de força que a graça pode realizar em quantos a aceitam. A Igreja universal só pode exprimir constante e profunda gratidão por este sacrifício, que às vezes serviu como escudo de protecção viva ao cristianismo ocidental, poupando a este último perigos que se poderiam ter revelado extremamente graves.

3. A relação entre a Arménia e Roma é precedente ao advento do cristianismo, mas este tornou-se imediatamente o verdadeiro motivo dessa relação. Durante muitos séculos, livres das incompreensões e das divisões entre o Ocidente e o mundo grego, esta relação distinguiu-se por uma cordial boa vontade. As embaixadas que a Igreja arménia enviava a Roma eram recebidas como afirmação de fé pura e coerente. Em numerosas ocasiões, os Pontífices enviaram como dom objectos litúrgicos aos Catholicos arménios, em sinal de estima fraterna e, hoje, é significativo que a mitra e o pastoral ainda façam parte dos paramentos litúrgicos dos Prelados arménios.

O Reino Arménio da Cilícia foi um ponto de encontro privilegiado para os latinos, os gregos e os sírios: um empenho notável para a fraternidade ecuménica que ali floresceu. A comunhão entre a Igreja arménia naquela região e a Igreja de Roma atingiu uma intensidade jamais vivida noutros casos. O intercâmbio cultural foi fecundo e benéfico, apesar das consideráveis dificuldades. O facto de não se ter conseguido produzir frutos mais duradouros deveu-se em parte à intransigência de alguns que, talvez, não tenham sido capazes de apreciar plenamente o valor de uma oportunidade tão providencial. Da parte de Roma, esta falta de compreensão foi às vezes o resultado de trágicos conflitos internos na Igreja ocidental e do emergir de novos conceitos canónicos e teológicos, que tornaram ainda mais difícil compreender o antigo património espiritual do Oriente. Hoje, tudo isto é para nós motivo de profundo pesar e obriga-nos a não transcurar as oportunidades que o Espírito nos oferece de exortar à comunhão todos os seguidores de Cristo.

4. Os objectos em exposição na Sala Régia, desde o fragmento da Arca de Noé de Echmiadzin até aos achados arqueológicos da antiga Cilícia, não são simples memoriais. São sinais das grandes coisas que Deus fez pelo povo arménio. São um convite a uma mais profunda consciência e estima de si mesmos. Se naqueles tempos longínquos, homens iluminados e corajosos como Nerses Shnorhali e Nerses de Lambron causaram admiração ao mundo, e continuam a fazê-lo ainda hoje, com um admirável equilíbrio entre amor pela própria cultura e abertura às culturas dos outros, o seu exemplo, e depois também o exemplo esplendoroso do Abade Mequitarista de Sebaste, devem ser uma lição e uma inspiração para todos nós.

Antigamente, de maneira santa os arménios demonstraram grande entusiasmo pela unidade da Igreja, mediante o respeito pela dignidade de todos e pelo carácter específico de cada um.

Eles anteciparam os tempos, proclamando valores que não eram plenamente compreendidos. Agora que esses valores se tornaram parte do nosso património universal, não os podemos desprezar: devemos ter a coragem de empreender acções santas que superem os preconceitos e os estereótipos.

Juntos, seguindo os passos de Cristo: seja esta a esperança e a oração de todos os cristãos na vigília do Terceiro Milénio e do XVI centenário do Baptismo da Arménia! Deus abençoe e proteja sempre o vosso povo no mundo inteiro, onde quer que ele dê testemunho da fé e do ensinamento dos Padres! Que do céu, os Santos Mártires e os honrados Pastores da Igreja da Arménia intercedam por nós com Maria, Mãe de amor!



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


A SUA SANTIDADE KAREKIN I


SUPREMO PATRIARCA E CATHOLICOS


DE TODOS OS ARMÉNIOS


25 de Março de 1999

«Bendiz, ó minha alma, o Senhor, e toda a minha vida interior, o Seu Santo nome!» (Ps 103,1).


Sim, bendigo o Senhor que nos dá este momento de graça e de encontro fraterno. É uma grande alegria poder acolhê-lo nestes dias, Santidade, juntamente com Sua Beatitude o Arcebispo Torkom Manoogian e com todas as eminentes personalidades que o acompanham.

Alegro-me pela presença nos Museus Vaticanos de uma extraordinária exposição sobre a história e a cultura arménias. Nela podemos admirar um património impregnado de fé cristã! Graças à fidelidade às suas raízes e à tenacidade nas adversidades, o povo arménio soube fazer dos seus múltiplos sofrimentos uma forma de criatividade e de dinamismo. Segundo a tradição, a Igreja arménia recebeu a fé através dos Apóstolos Tadeu e Bartolomeu. Contudo, foi graças à actividade missionária de São Gregório, o Iluminador, que o Evangelho se difundiu entre o povo em língua arménia no início do século IV. Desde aqueles tempos antigos a fé cristã jamais deixou de iluminar e inspirar o povo arménio nas suas convicções profundas e na sua vida quotidiana.

Os cristãos celebrarão dentro de pouco o grande mistério da paixão, morte e ressurreição de Cristo. «Se morrermos em Cristo, com Ele também havemos de viver, pois sabemos que Cristo, ressuscitado dentre os mortos, já não morre; a morte já não tem domínio sobre Ele» (Rm 6,8-9). Cantaremos e celebraremos o mistério da nossa redenção. A nossa fé em Jesus Cristo é o fundamento da nossa vida, da nossa missão e dos vínculos de comunhão fraterna entre as nossas Igrejas. Com satisfação felicito os progressos realizados na nossa comum busca da unidade em Cristo, o Verbo de Deus que Se fez carne; eles são o fruto das nossas relações ecuménicas e dos nossos diálogos teológicos. As deploráveis divisões do passado não deveriam continuar a influenciar de modo negativo a vida e o testemunho das nossas Igrejas. O Grande Jubileu do Ano 2000 e o décimo sétimo centenário da fundação da Igreja arménia convidam-nos insistentemente a um testemunho comum da nossa fé em Jesus Cristo.

A Igreja católica e a Igreja arménia desenvolveram profundas relações, sobretudo a partir do Concílio Vaticano II. Felizes encontros tiveram lugar desde aquele memorável dia de 1971, quando o Catholicos Vasken I e o Papa Paulo VI se abraçaram com um gesto repleto de amizade fraterna. Desejo, além disso, agradecer de modo particular a Vossa Santidade aquilo que realizou e continua a fazer, a fim de que se torne efectiva a unidade dos cristãos. Neste espírito que nos anima, é preciso fazer votos por que, onde quer que católicos e arménios vivam juntos, prolonguem estes gestos fraternos, mediante iniciativas constantes nos diversos âmbitos do serviço aos homens. Oxalá não percamos a mínima ocasião para aprofundar e ampliar a nossa colaboração concreta, nesta única missão que Cristo nos confiou!

Santidade, ao alegrar-me intensamente pelo convite a visitar a Arménia, que me foi dirigido também pelo Presidente da República, agradeço-lhe o desejo de me receber como hóspede no seu Patriarcado de Echmiadzin, a fim de fortalecer os nossos vínculos e consolidar a unidade entre os cristãos. Oro ao Senhor para que me permita realizar esta visita. Ao agradecer-lhe ter efectuado esta viagem a Roma, expressão altamente simbólica da fraternidade cristã, desejo-lhe boa saúde, a fim de poder servir durante longo tempo a sua Igreja. Peço ao Espírito Santo que nos assista, para que sejamos sempre servidores dos homens e prossigamos no caminho da unidade, à qual Cristo nos convida. Oro ao Senhor para que abençoe a Igreja arménia, os seus Pastores e fiéis. À Virgem Maria, cujo nome contém todos os mistérios da salvação, como dizia São Gregório, o Iluminador, peço que acompanhe as vossas comunidades com a sua ternura materna. Que o Senhor lhe revele o Seu rosto e o conserve na paz!



DIÁLOGO DO PAPA JOÃO PAULO II


COM OS JOVENS DA DIOCESE DE ROMA


EM PREPARAÇÃO PARA


O XV DIA MUNDIAL DA JUVENTUDE


Quinta-feira, 25 de Março de 1999



P. – Santo Padre, na sua Mensagem para o Dia Mundial da Juventude de 1999, Vossa Santidade convidou-nos, juntamente com a Igreja inteira, «a dirigir- nos para Deus Pai e a escutar, com gratidão e maravilha, a surpreendente revelação de Jesus: "O Pai ama-vos!"», e assegurou-nos: «Jamais se afastará de vós o Seu amor, nunca vacilará a Sua aliança de paz convosco». Estamos certos disto. Entretanto, às vezes, temos dificuldade de entender como o Pai nos ama, quando nos encontramos diante dos sofrimentos e da morte de jovens como nós, quando as catástrofes naturais destroem pessoas inocentes, quando – pior ainda – o homem experimenta a loucura da guerra. De facto, estamos a concluir um século que foi profundamente marcado por guerras e ódios entre povos. Também hoje, em particular precisamente nestas horas, nos territórios da ex-Jugoslávia tão próximos de nós, os ódios e as guerras continuam. Santidade, pode ajudar-nos a compreender como o Pai não cessa de nos amar, mesmo quando nos encontramos com o sofrimento dos justos e dos inocentes, quando tantos dos nossos coetâneos ficam transtornados por fenómenos destruidores, como a toxicomania e quando o homem se suicida por causa dos ódios e das guerras?

R. Caríssimos jovens! Sede bem-vindos ao Vaticano, à Sala Paulo VI. As minhas boas-vindas dirigem-se aos que estão presentes na Sala e àqueles que se encontram fora dela, e estão debaixo da chuva a qual, contudo, não parece muito forte. Eles, entretanto, são mais fortes que a chuva.

O grande problema que me apresentais aprofunda as suas raízes no próprio coração do homem. Sinto ressoar, na pergunta que me foi feita por um vosso representante, a grande objecção que lemos na «Lenda do Grande Inquisidor», de Dostoievski: «Como posso crer em Deus, quando permite a morte de uma criança inocente?». Vemos e constatamos o problema do mal na vida de todos os dias. Os grandes raciocínios a respeito desse problema parecem não convencer imediatamente, sobretudo quando, a nível pessoal, se experimenta a doença, o sofrimento ou se é tocado pela morte de alguma pessoa próxima e querida.

Em todo o caso, não me subtraio ao desafio que esta pergunta contém. Só quereria, em primeiro lugar, dirigir-vos também eu uma pergunta provocatória: perguntais-me como compreender o amor do Pai quando nos encontramos diante do ódio, da divisão, das diversas formas de destruição da personalidade e da guerra. Justamente, há pouco foi recordado o conflito que enche de sangue a Jugoslávia e que causa tanta preocupação pelas vítimas e pelas consequências que dele podem derivar para a Europa e para o mundo inteiro. De coração faço votos por que quanto antes as armas se calem e sejam retomados o diálogo e as negociações, a fim de se chegar finalmente, com o contributo de todos, a uma paz justa e duradoura na inteira Região balcânica.

Por minha vez, digo-vos: por que perguntar onde está o amor de Deus e não pôr em evidência, antes, as responsabilidades que derivam do pecado dos homens? Por que, afinal, deveríamos considerar Deus culpado quando, ao contrário, responsáveis sãos os homens livres nas suas decisões?

O pecado não é uma teoria abstracta; antes, as suas consequências podem ser verificadas. O mal, a respeito do qual me pedis explicação, encontra na sua base o pecado e a rejeição de viver segundo os ensinamentos de Deus. Ele lacera a existência e leva-a à rejeição do bem. Fechamo-nos então na inveja, no ciúme e no egoísmo, sem nos darmos conta de que tais comportamentos conduzem à solidão e tiram o sentido autêntico da vida.

Apesar de tudo isto, estai certos disto: o amor do Pai jamais diminui, porque Deus mesmo quis compartilhar connosco o sofrimento e a morte. E isto devemos recordar neste período da Quaresma e durante a Semana Santa. E aquilo que por Ele foi vivido, foi também salvo e remido. A força do amor venceu o mal, como o apóstolo Paulo ressalta com plena convicção: «Quem poderá separar-nos do amor de Cristo? A tribulação, a angústia, a perseguição, a fome, a nudez, o perigo ou a espada?... Mas em tudo isto, somos nós mais que vencedores por Aquele que nos amou» (Rm 8,35-37). Eis, então, a via a seguir para vencer o mal: crescer no amor do Pai, que Se nos revelou em Jesus Cristo.

P. – Santo Padre, na sua Mensagem há um forte convite à conversão e a aproximar-nos do sacramento da Confissão. Perguntamos-lhe: de onde deve partir o desejo de nos convertermos? Muitas vezes nos dizem que devemos converter-nos, mas às vezes não sentimos nem vemos a sua necessidade: sabe explicar-nos o porquê? Além disso, pedimos-lhe uma palavra sobre o sacramento da Confissão, porque nem sempre é fácil ver nele o lugar onde se realiza o caminho de retorno ao Pai, de Quem nos afastamos com o pecado.

R. É verdade, hoje em geral a necessidade da conversão não é percebida como outrora. Na realidade, porém, pôr-se em discussão é uma das exigências fundamentais para alcançar uma personalidade adulta e amadurecida.

Só graças a um constante processo de conversão e de renovação, o homem avança no fadigoso caminho do conhecimento de si mesmo, do domínio da própria vontade e da capacidade de evitar o mal e fazer o bem.

A vida, podemos assim dizer, é uma mudança contínua. Vós viveis esta experiência em primeira pessoa. Não é porventura verdadeiro que, quando amais uma pessoa, fazeis tudo para obter o seu amor? Não acontece, talvez, que conseguis mudar a vós mesmos também naquelas expressões e comportamentos que jamais tínheis pensado poder modificar? Se na base não houver um acto de amor, é impossível compreender a necessidade da mudança.

O mesmo se verifica na vida do espírito, de modo especial graças ao sacramento da Reconciliação, que se coloca precisamente neste horizonte. Ela é, de facto, o sinal eficaz da misericórdia de Deus que vem ao encontro de todos, do amor do Pai que, apesar do afastamento do filho e da dispersão dos seus bens, está disposto a acolhê-lo de braços abertos, recomeçando tudo de novo. Na Confissão, vivemos em primeira pessoa a essência do amor de Deus: Ele vem ao nosso encontro do modo que Lhe é mais propício, o da absolvição e da misericórdia.

Com isto, não quero dizer que a via da conversão seja fácil. Cada um sabe quanto é difícil reconhecer os próprios erros. Com efeito, está-se pronto a procurar inúmeros motivos para não os admitir. Deste modo, porém, não se expe- rimenta a graça de Deus, o Seu amor que transforma e torna concreto aquilo que aparentemente parece impossível de se obter.

Sem a graça de Deus, como se pode entrar no mais profundo de si mesmo e compreender a necessidade de se converter? É a graça que transforma o coração, permitindo que se sinta próximo e concreto o amor do Pai. Não esqueçais, depois, que ninguém é capaz de perdoar os outros, se antes não fizer a própria experiência de ser perdoado. A Confissão mostra-se desse modo como a via-mestra para nos tornarmos verdadeiramente livres, experimentando a compreensão de Cristo, o perdão da Igreja e a reconciliação com os nossos irmãos.

P. – Vossa Santidade recorda-nos as palavras da primeira Carta de João: «Quem não ama a seu irmão, ao qual vê, como pode amar a Deus, que não vê?». Por outras palavras, Vossa Santidade faz-nos compreender que do amor do Pai devem nascer em nós gestos de amor, de perdão, de paz e de solidariedade para com os irmãos. Sobre essa necessidade de amar e de perdoar, concordamos plenamente com Vossa Santidade e empenhar-nos-emos em fazê-lo, sobretudo como sinal da nossa conversão, passando pela Porta Santa do Ano 2000. Alguns dentre nós, porém, sentem dificuldade de ver como a Igreja sabe amar e perdoar. Pode Vossa Santidade, testemunha do perdão, que soube perdoar também a quem fisicamente lhe fez mal, e teve a coragem de pedir perdão pelos pecados da Igreja, iluminar-nos sobre este tema tão importante?

R. Também esta vossa terceira pergunta encontra resposta na luz do amor. Quereria dizer-vos, com grande sinceridade, que a última palavra pronunciada por quem verdadeiramente ama é o perdão. O perdão é o sinal mais alto da capacidade de amar à maneira de Deus, o Qual nos ama e, por isso, constantemente nos perdoa. Em vista do Jubileu, já iminente, ocasião propícia para o pedido de perdão e de indulgência, eu quis que a Igreja fosse a primeira, fortalecida pelo ensinamento do Senhor Jesus, a renovar aquele caminho de conversão perene que lhe pertence, até ao dia em que se apresentar diante do Senhor.

Por esta razão escrevi que, no limiar do Terceiro Milénio, a comunidade eclesial deve assumir «com mais viva consciência o peso do pecado dos seus filhos» (Tertio millennio adveniente, TMA 33). O caminho em direcção à Porta Santa é uma verdadeira peregrinação para quem quer mudar a própria vida e converter-se ao Senhor com todo o coração. Ultrapassando aquela Porta, não se deve esquecer do significado que ela possui.

A Porta Santa indica o ingresso na vida nova que Cristo nos oferece. E a vida, vós bem o sabeis, não é uma teoria, mas a realidade concreta de todos os dias.

A vida é um conjunto de gestos, de palavras, de comportamentos e pensamentos que nos envolvem e nos fazem reconhecer por aquilo que somos.

Caros jovens e moças da Diocese de Roma, agradeço-vos a promessa que me fazeis de vos empenhar constantemente em querer ser, também vós, sinais vivos de reconciliação e de perdão.

Muitas são as ocasiões que, sobretudo na vossa idade, vos são oferecidas para dar testemunho de amizade sincera e abnegada. Multiplicai estas ocasiões e crescerá em vós a alegria, dom da presença de Cristo; alegria que sois chamados a comunicar a todos os que vos conhecem e a compartilhar com eles. É Jesus o único Salvador do mundo; é Ele a Vida que dá sentido autêntico à existência de cada homem e de cada mulher.

Caros jovens, jamais vos canseis de fazer perguntas com legítima curiosidade e vontade de aprender. É justo que na vossa idade, enquanto vos apresentais ao mundo, sejais tomados pelo desejo de conhecer coisas sempre novas e interessantes. Conservai este desejo de entender a vida; amai a vida, dom e missão que Deus vos confia para cooperardes com Ele na salvação do mundo.



Palavras no Final do Encontro

Caríssimos!

1. No termo deste encontro, que já se tornou a anual reunião com os jovens da Diocese de Roma, desejo agradecer- vos a tão numerosa e calorosa •participação.

Agradeço ao vosso representante, que me saudou no início, e aos amigos que me apresentaram – em nome de todos vós – perguntas essenciais para se poder dizer «creio»: isto é, creio que o Pai me ama! E agradeço ainda àqueles que, de vários modos, contribuíram para dar vida a esta tarde de festa e de reflexão. Um pensamento de particular gratidão dirige-se à Senhora Caterina Muntoni pelo eficaz testemunho de perdão que há pouco escutámos. Asseguro-lhe a nossa proximidade e a oração pelo seu irmão cruelmente assassinado, enquanto pedimos ao Senhor o dom de numerosas vocações sacerdotais para a Igreja: pessoas que, como o Padre Graziano, saibam consumir-se com grande generosidade pela causa do Evangelho e pelo serviço dos irmãos.

2. Antes de nos dirigirmos ao Pai com a oração que Jesus nos ensinou, desejo recordar-vos um encontro e uma tarefa importantes.

Provavelmente já entendestes a que encontro me refiro: trata-se do XV Dia Mundial da Juventude, que se realizará aqui em Roma de 15 a 20 de Agosto do Ano 2000 e terá por tema: «O Verbo fez-Se carne e veio habitar no meio de nós» (Jn 1,14).

Ninguém falte a este encontro que, desde já, consideramos um «tempo de graça» para os jovens. Tempo de graça para vós e para todos os vossos coetâneos, que hospedareis nas vossas casas, paróquias, escolas, institutos religiosos, acampamentos e de muitos outros modos que a fantasia há-de sugerir. Tempo de graça para a Igreja de Roma: ela receberá um grande benefício espiritual e pastoral da presença de numerosos jovens e moças, que aqui virão para compartilhar e testemunhar a fé, no início do novo milénio.

Confio-vos uma dúplice tarefa: por um lado, a de convidardes a participar no Dia Mundial também aqueles jovens vossos amigos que, talvez, são indiferentes à fé mas que, precisamente porque são jovens, estão em busca da verdade e do bem. O jubileu dos jovens será também para eles uma ocasião de graça e provavelmente, como já aconteceu para outros em análogas ocasiões, um momento de aproximação de Cristo e da sua Igreja. Confio-vos estes vossos coetâneos.

Confio-vos, além disso, a tarefa de acolherdes com generosidade aquele que vier de longe. Conheço tudo o que estão a fazer a Diocese de Roma e o Comité Italiano para o Dia Mundial da Juventude, sob a guia do Pontifício Conselho para os Leigos, e alegro-me com eles pelo bom trabalho iniciado. Mas esta obra precisa da colaboração e do entusiasmo de todos: sacerdotes, religiosos e religiosas, adultos e jovens das comunidades paroquiais, dos institutos religiosos, das capelanias universitárias, dos movimentos e das associações da Diocese. Faço votos por que muitas famílias abram as portas das casas aos jovens do mundo, para fazer com que eles conheçam o coração dos romanos, que é grande. Estou convicto de que os jovens romanos não serão inferiores aos jovens franceses de Paris, aos filipinos, aos americanos de Denver, a todos os outros; também em relação aos jovens polacos de Czêstochowa. A palavra Roma, lida ao contrário, pronuncia-se «Amor». Possam todos experimentar este «Amor» romano!

3. A fim de vos preparardes para acolher estes vossos coetâneos, que chegarão de tantas Nações do mundo, procurai vós mesmos redescobrir os inúmeros lugares de santidade e de espiritualidade cristã que Roma conserva. Deste modo sereis capazes de acompanhar os amigos que chegarem e, juntamente com eles, aprofundareis a fé, transmitida nos séculos por gerações de crentes que, às vezes, a defenderam e testemunharam à custa do próprio sangue. É a fé de ontem, de hoje e de sempre, que avançará, também graças a vós, no novo milénio.

Hoje, tendes uma feliz simultaneidade, porque a Jornada dos jovens romanos coincide com a Solenidade da Anunciação do Senhor. Quero dizer-vos que esta Solenidade, este mistério, abriu o horizonte para a humanidade inteira, porque com a Anunciação Deus mesmo comunicou a Sua vinda, a vinda de Seu Filho, a Sua entrada na história do homem, e assim a Anunciação nos recorda esta grande abertura de horizontes na história do próprio destino da humanidade. É um bem, portanto, que esta Solenidade tenha coincidido com a vossa reunião romana.

Ainda uma palavra, a última. Por um motivo preciso recitamos o «Angelus» três vezes ao dia. Não é apenas uma tradição, mas é deveras uma prática profundamente arraigada. Recitamos o «Angelus» três vezes ao dia para recordar o horizonte que nos foi aberto pela Anunciação: «Angelus Domini nuntiavit Mariae, et Verbum caro factum est»; recitamo-lo para nos recordar em que perspectiva vivemos. Uma perspectiva criada pelo próprio Deus, na qual entra o Filho de Deus que Se fez homem. Ele, verdadeiramente, é fonte de grande confiança. E vós jovens deveis ser confiantes. Por isto, também vos digo: procurai recitar, quando for possível, o «Angelus Domini».



DISCURSO DO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL


DA UCRÂNIA POR OCASIÃO DA VISITA


"AD LIMINA APOSTOLORUM"


: Quinta-feira, 25 de Março de 1999
: Estimados Irmãos no Episcopado!

1. Apresento a todos as minhas cordiais boas-vindas, por ocasião da vossa primeira visita ad limina Apostolorum como Pastores das Comunidades católicas de rito latino da Ucrânia, e saúdo-vos com as palavras do Apóstolo: «Que a graça e a paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo estejam convosco» (Ep 1,2).

Já no final dum século que viveu acontecimentos dolorosos que atingiram Dioceses a vós confiadas, a Providência quis finalmente fazer descer sobre as vossas comunidades o bálsamo dum consolador renascimento. Seja louvado Deus que, na sua bondade, vos permitiu ver, antes do findar do milénio, o regresso à vossa Terra do fundamental valor da liberdade, consentindo que vos dediqueis com todas as energias ao ser- viço duma messe prometedora.

Na história da vossa Conferência Episcopal este é o primeiro encontro formal com o Sucessor de Pedro e com a Cúria Romana, no contexto da tradicional forma de contacto que é constituída pela visita ad Limina. Agradeço ao Presidente da Conferência Episcopal, D. Marian Jaworski, as palavras de fé e de comunhão que, em nome de todos vós, houve por bem dirigir-me. Garanto a cada um a minha constante oração pelo intenso ministério que desempenhais ao serviço das Igrejas confiadas aos vossos cuidados pastorais.

Considerando a difícil herança do passado recente, como não manifestar admiração pelas maravilhas realizadas nestes últimos oito anos pelo Senhor através do sacrifício, dedicação e zelo pastoral tanto vossos, como dos Bispos, sacerdotes, religiosos e religiosas e dos numerosos leigos que, juntamente convosco e sob a vossa orientação, apoiaram o renascimento das Dioceses? O testemunho de tantos heróis da fé que sofreram perseguições e a coragem de inúmeros pais que, com tenacidade, transmitiram aos filhos o amor ao Evangelho não foram vãos. Confirma-o o providencial reflorescimento das vossas comunidades.

2. Em tempos relativamente breves, sem dúvida também graças à solidariedade de Dioceses irmãs, conseguistes reconstruir uma Igreja que tinha sido reduzida em ruínas. Conhecendo quais eram as condições de outrora e olhando para a realidade de hoje, brota espontaneamente do coração a necessidade de dar graças a Deus por quanto Ele fez. Ao mesmo tempo, é necessário reconhecer o mérito dos numerosos sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos que se tornaram válidos instrumentos do desígnio de salvação.

Prossegui este caminho a exemplo de Olga, de Vladimiro e de Izjaslao-Demetrio, que nas margens do Dniepr receberam o lavacro baptismal. Sede sempre animados pelo profundo anseio apostólico e missionário. Que as vossas comunidades sejam vivas e fervorosas, unidas aos Pastores e propensas à evangelização. Desta forma, podereis olhar para o futuro com confiança e desempenhar cada vez melhor a vossa missão na querida terra da Ucrânia. O campo da acção pastoral é amplo e vós já empreendestes iniciativas úteis, tanto para o aprofundamento da fé, quanto para um testemunho evangélico mais incisivo na sociedade.

3. Superando numerosas dificuldades, ao longo destes anos a vossa primeira preocupação foi dotar as comunidades de estruturas operativas e de indispensáveis edifícios sagrados para as reuniões dos crentes e as celebrações litúrgicas. Muitas igrejas paroquiais e capelas foram reabertas ao culto, enquanto actualmente estão activos três seminários juntamente com um Instituto de catequese.

Agora a vossa atenção deslocou-se para as exigências da nova evangelização, a fim de apoiar os fiéis no aprofundamento da fé e propor também às novas gerações a vivificante palavra do Evangelho. Para esta finalidade é indispensável a catequese, adaptada às exigências do nosso tempo. Dando continuidade ao que o Concílio Vaticano II iniciou, encorajo-vos a pôr em prática aquela sadia renovação de métodos que, deixando inalterada a substância da mensagem de Cristo, adeque a sua apresentação às sensibilidades dos tempos novos. Nisto ser-vos-á de grande ajuda o «Catecismo da Igreja Católica», recentemente publicado.

Cada baptizado e, na realidade, todas as pessoas de boa vontade, possuem o direito de receber da Igreja um ensinamento e uma formação que lhes permitam alcançar o verdadeiro conhecimento de Cristo. Dando prioridade à catequese em relação às outras iniciativas talvez mais espectaculares, a comunidade eclesial encontra o autêntico meio de consolidação da própria vida interna e de incisiva aproximação ao mundo externo (cf. Exort. Apost. Catechesi tradendae CTR 15). Um orgânico programa catequético constitui a resposta adequada aos desafios desta nossa época, incluindo a emergente no preocupante fenómeno da proliferação das seitas.

O gradual incremento do clero local, diocesano e religioso, formado teologica e pastoralmente graças à obra de pessoas especializadas nas várias disciplinas sagradas, consentirá qualificar melhor a organização da pastoral e desenvolver a evangelização e a catequese, sobretudo em relação aos jovens e às famílias. Entre outras, como não ver a importância fundamental que neste processo tem o contributo de pessoas consagradas e de leigos cheios de boa vontade e preparados no conhecimento da mensagem cristã?

4. Isto leva ao argumento sobre a necessidade de reforçar a pastoral das vocações, sobretudo das sacerdotais e religiosas. O seminário e, em geral, as várias estruturas de formação para o ministério sagrado ou para a vida consagrada constituem a «menina dos olhos» do Bispo. A tais instituições ele deve destinar o melhor dos recursos da Comunidade, visto que a dimensão vocacional é conatural e essencial à vida da Igreja.

Cada vocação é dom de Deus que «nos escolheu em Cristo antes de criar o mundo, para que sejamos santos e sem defeito diante d'Ele, no amor. Ele nos predestinou para sermos Seus filhos adoptivos por meio de Jesus Cristo» (Ep 1,4-5). A própria Igreja, por sua constituição originária, é «vocação», gera e educa vocações destinadas a promover o crescimento do Reino de Deus no mundo (cf. Apostolicam actuositatem AA 3). Daqui surge espontânea a exigência de sensibilizar o povo cristão, para que se empenhe generosamente e com todos os meios espirituais e materiais ao serviço das vocações. São precisos sacerdotes santos e pessoas consagradas para o grande campo da evangelização.

É também indispensável a obra das famílias. Com efeito, quanto mais as famílias cristãs e as comunidades eclesiais souberem ser firmes nos valores evangélicos, assíduas na oração e na vida sacramental, abertas à chamada do Senhor, fortes no sacrifício e na doação incondicionada, tanto mais poderão sentir a urgência de agir concretamente para apoiar todos os que Deus convida para um especial vínculo consigo e para um particular serviço na Igreja (cf Exort. apost. Pastores dabo vobis PDV 41).

5. Este natural processo de crescimento, com o passar do tempo, fará aparecer cada vez melhor a identidade «católica» das vossas Igrejas, ao serviço de todos, no respeito da identidade religiosa e nacional das várias componentes étnicas do vosso País, sem contudo perder as próprias conotações qualificantes.

Na vossa terra, mostrais a riqueza da Igreja católica na variedade das suas expressões rituais: a tradição bizantina e a latina, com o contributo limitado da arménia, confluem no único cântico de louvor que incessantemente a Esposa peregrinante na terra eleva rumo ao Esposo celeste. Esta pluriformidade na unidade é motivo de orgulho para a Igreja, que se é peculiar da comunidade cristã, constitui outrossim uma referência ideal para a sociedade civil, também ela chamada a construir a comunhão no respeito e na atenção por todas as suas diversas componentes culturais. Se o respeito de cada identidade é pedido pe- la justiça, ele é ainda mais postulado pela caridade que, para o cristão, é lei suprema.

A difícil situação religiosa específica do vosso País não vos desencoraje na busca constante de vias de diálogo, de compreensão recíproca e, na medida do possível e oportunamente, de modos concretos de colaboração. Ser-vos-á de ajuda uma atenta e corajosa tensão missionária, que se empenhe a fim de que sejam abatidas as barreiras criadas pela desoladora opressão de setenta anos de ateísmo militante. Quantos concidadãos vossos têm fome e sede de Deus! É preciso ajudá-los a redescobrir as suas raízes cristãs, aproximando-se deles como verdadeiros apóstolos, para que ninguém os engane com filosofias vazias ou malogros vãos (cf. Cl Col 2,8).

6. Tende uma particular solicitude pelas jovens gerações. A busca do diálogo oriente todos os vossos passos. Cada esforço deve ser posto em prática, a todos os níveis e competências da vida eclesial, a fim de mostrar nos factos como a diversidade está chamada a confluir na harmonia e na unidade. Nem poderia haver um autêntico testemunho ecuménico, a não ser mostrando com os factos como a Igreja católica sabe encontrar no seu interior a força e a coerência dum empenho concorde. Para que isto se verifique, o empenho primordial deve ser o conhecimento recíproco e a convivência, valorizando qualquer ocasião concreta de encontro, de forma que os Pastores saibam ser para a própria grei modelo de acolhimento e de benevolência para com todos.

O Senhor é o único que conhece os ritmos e os tempos deste caminho. Mas nós temos a tarefa da oração fervorosa e de uma firme vontade de encontro. Com efeito, o Espírito interpela em profundidade os fiéis católicos e, enquanto os exorta a entrar naquele que se poderia chamar o «diálogo da conversão», predispõe-nos para «relações fraternas que sejam algo diverso do mero entendimento cordial ou de uma convivência simplesmente exterior. Os laços da Koinonia fraterna hão-de ser tecidos diante de Deus e em Cristo Jesus» (Carta enc. Ut unum sint UUS 82).

7. Venerados Irmãos, «o ecumenismo não é apenas uma questão interna das Comunidades cristãs, mas diz respeito ao amor que Deus, em Cristo Jesus, destina ao conjunto da humanidade; e obstaculizar este amor é uma ofensa a Ele e ao seu desígnio de reunir todos em Cristo» (Ibid., 99).

Esta é uma dimensão do ecumenismo que se mostra particularmente actual, se se observa como são necessários a pregação e o testemunho dos seguidores de Cristo no contexto da sociedade ucraniana! Requerem-no as famílias, tão frágeis na unidade e no respeito da vida; têm necessidade disto os mais débeis, sobretudo as crianças que não raramente são abandonadas; exige-o a sociedade que tende ao perseguimento dum bem comum que evite os privilégios de poucos e a marginalização dos mais débeis; procuram-no os jovens, que desejam esperanças novas e ideais concretos pelos quais se empenharem na vida. Como não ver, na vossa obra pastoral, um contributo essencial para a edificação e o crescimento da inteira sociedade ucraniana? No que diz respeito à Igreja católica, o empenho ecuménico é uma das prioridades das quais ela não pode e não quer prescindir.

Nesta tarefa, as vossas Comunidades diocesanas não se sintam sozinhas ou desiguais ao enfrentar os desafios que se vos apresentam. O espírito de comunhão que une estreitamente as Igrejas particulares espalhadas pelo mundo não deixará de vos fazer sentir o conforto concreto da caridade fraterna. Exorto as Comunidades eclesiais do Ocidente a não faltarem ao dever de partilhar convosco, se por acaso for possível, projectos de serviço, contribuindo para a realização de quanto as vossas Dioceses empreendem a favor do povo. Aliás, tenho a certeza de que os vossos irmãos do Ocidente não assumirão nos territórios de presença comum, atitudes que possam parecer desrespeitadoras dos cansativos esforços por vós empreendidos com tanto mais mérito quanto mais precárias são as vossas disponibilidades (cf. Carta Apost. Orientale lumen, 23).

Caríssimos Irmãos no Episcopado! Enquanto juntamente convosco elevo o hino de bênção a Deus que nos escolheu antes da criação do mundo para sermos santos e imaculados perante Ele na caridade (cf Ep 1,4), formulo de todo o coração os votos de que a celebração do próximo Grande Jubileu do Ano 2000, rumo ao qual todos estamos a caminho, seja ocasião de renovado arrebatamento de conversão e de empenho por cada cristão que vive na vossa terra. Ele seja também motivo de um mais profundo e generoso empenho no âmbito da fraterna colaboração entre todas as Igrejas que estão na Ucrânia, de modo que chegue depressa o dia em que os discípulos do Divino Mestre dêem em plena comunhão o seu testemunho Àquele que era, que é e que há-de vir.

Com estes votos, enquanto invoco a orante Nossa Senhora de Vladimir, «que constantemente acompanhou a peregrinação de fé dos povos da antiga "Rus"» (Carta enc. Redemptoris Mater RMA 33) a fim de que obtenha para as vossas Igrejas uma renovada efusão de graças, concedo de todo o coração a vós, aos vossos sacerdotes, aos consagrados e consagradas e a todos os fiéis confiados à vossa solicitude uma especial Bênção apostólica.




Discursos João Paulo II 1999 - LORENZO RUSSO