Discursos João Paulo II 1999 - Quinta-feira, 9 de Dezembro de 1999

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS REPRESENTANTES DA PONTIFÍCIA MISSÃO


PARA A PALESTINA


Sala do Consistório

Quinta-feira, 9 de Dezembro de 1999



Eminência
Dilectos Irmãos Bispos e Sacerdotes
Senhoras e Senhores

1. Com a Liturgia eucarística oficiada hoje de manhã na Basílica de São Pedro e esta vossa audiência com o Sucessor de Pedro, chegam ao fim as solenes celebrações que marcam o cinquentenário da Pontifícia Missão para a Palestina. Estas celebrações, que tiveram início na Cidade de Nova Iorque onde a Missão tem a sua sede central e depois se transferiram para a Terra Santa, a Jordânia e a Líbia, têm assim o seu oportuno encerramento na Cidade em que os Apóstolos Pedro e Paulo prestaram o seu derradeiro e heróico testemunho de Jesus Cristo e da Salvação que Ele obteve para toda a humanidade.

Agradeço ao Cardeal Achille Silvestrini as suas amáveis palavras de saudação pronunciadas em nome da Congregação para as Igrejas Orientais e da Pontifícia Missão para a Palestina. Dirijo uma especial palavra de apreço ao Cardeal John O'Connor, Arcebispo de Nova Iorque, ao Rev.mo Mons. Robert Stern, actual Presidente da Missão Pontifícia, e à comunidade católica nos Estados Unidos da América em geral, que apoia de forma muito generosa a obra da Missão Pontifícia. Tão-pouco posso deixar de expressar a minha gratidão a todos aqueles que se encontram empenhados na Missão, a níveis tanto central como regional, cujos compromissos e esforços lhe consentem ir ao encontro das necessidades das inúmeras populações que ela procura servir.

2. Efectivamente, foram os trágicos sofrimento e destituição dos povos do Médio Oriente no final da segunda guerra mundial que suscitaram no meu predecessor, Papa Pio XII, o desejo de estabelecer uma organização eclesial especificamente para o Médio Oriente. Ele tinha em mente uma agência que prestasse a necessária assistência e apoio às crianças, famílias, feridos, enfermos, idosos e exilados da Terra Santa. Foi com esta finalidade que em 1949 se fundou a Pontifícia Missão para a Palestina; hoje, cinquenta anos mais tarde, a Missão alargou a própria actividade caritativa ao Chipre, Iraque e Síria.

Nos últimos cinquenta anos, o Médio Oriente não cessou de viver momentos de grande tensão e conflito, que não raro terminaram em actos de violência e de guerra aberta. Em tais circunstâncias, a Missão Pontifícia multiplicou os seus esforços destinados a ajudar as populações locais a reedificarem a própria vida: ela está empenhada em projectos de reconstrução e de desenvolvimento, enquanto oferece os serviços médicos que são extremamente necessários e contribui para o restabelecimento das actividades agrícolas, industriais e artesanais. Desta forma, a Missão Pontifícia é uma eloquente expressão daquela "nova cultura de solidariedade e cooperação internacionais" (Incarnationis mysterium, 12), que é tão necessária no mundo contemporâneo e deve constituir uma característica prevalecente do novo milénio. Esta responsabilidade comum pelo bem-estar de todos, especialmente por parte das nações mais ricas e dos sectores privados, é ínsita no significado mais profundo do grande Jubileu, no que estamos prestes a inaugurar (cf. ibid.).

3. Meus queridos amigos, não é em pouca medida que, através de vós e do vosso apoio à Pontifícia Missão para a Palestina, a Igreja consegue estar activa e efectivamente presente na Terra Santa e no Médio Oriente. Rezo para que vós e todas as pessoas associadas à obra da Missão vos renoveis na fé e no amor, enquanto procurais modos sempre melhores de ajudar quem necessita não só de assistência material, mas de forma especial de oportunidades para o desenvolvimento pessoal e social. Este é o modo mais seguro de estabelecer uma paz genuína e duradoura na vida das populações do Médio Oriente.

Enquanto confio à poderosa intercessão de Maria de Nazaré, Mãe do Redentor, as vossas pessoas, a vossa obra, todos os benfeitores da Pontifícia Missão para a Palestina e também as pessoas que esta procura ajudar, concedo cordialmente a minha Bênção apostólica como penhor de graça e paz em nosso Senhor Jesus Cristo.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO BISPO DE MACAU POR OCASIÃO


DA VOLTA DA SOBERANIA CHINESA




Ao Venerado Irmão
D. Domingos Lam Ka Tseung
Bispo de Macau

Passados quase quatrocentos e vinte e quatro anos do dia em que o meu predecessor Gregório XIII erigiu a diocese de Macau, a comunidade diocesana confiada aos cuidados de Vossa Excelência Reverendíssima prepara-se para viver um acontecimento importante da sua história plurissecular, quando, no próximo dia vinte de Dezembro, esse Território voltar para a soberania chinesa.

Criada para prover às necessidades pastorais resultantes da difusão do cristianismo no Extremo Oriente asiático, a diocese de Macau abrangia, nos seus inícios, a China inteira, com outras terras confinantes e ilhas adjacentes. Deste modo, a sua história entrelaçou-se com a história da evangelização de toda a área geográfica circundante, e em particular com a da China, país de antigas tradições filosófico-religiosas. A função de porta da Igreja para a China, que foi atribuída pela Providência Divina à diocese de Macau e realizada durante quatro séculos com maior ou menor sucesso, assumirá novas formas agora que essa comunidade diocesana vai fazer parte a pleno título da Igreja na China: de forma particular, há-de aprofundar a sua vocação missionária no seio do mundo chinês, a fim de se tornar um ponto de referência e de apoio espiritual também para os numerosos irmãos e irmãs na fé que vivem dispersos pelo vasto país que é a China.

A tradição histórico-cultural dessa Igreja Particular é rica de significativos valores. Macau foi não só a porta da evangelização para o continente chinês, mas também um posto avançado de cultura cristã e um lugar de encontro com as culturas do Extremo Oriente: nessa cidade, de facto, com a criação do prestigioso Colégio Universitário de S. Paulo, foi erigida a primeira Universidade de Estudos do Extremo Oriente, já em 1594, isto é, apenas trinta e nove anos depois da primeira vez que os navegadores portugueses desembarcaram em Macau. Assim, ao lado da instrução elementar, que fora imediatamente organizada pela Igreja, começou a surgir também a de grau superior.

Para além do campo cultural, a presença dos católicos distinguiu-se pela sua obra social, como o demonstra - entre outras coisas - a Santa Casa da Misericórdia criada em 1569, que teve uma influência enorme na história humana da população local.

Neste momento importante em que o Território volta a ser parte integrante da China, a Igreja que está em Macau, rica de tradição e dignidade, é chamada a continuar o seu empenho de serviço espiritual, cultural e social.

Na vigília do novo século e no contexto do Ano Santo já iminente, que ela saiba dar impulso ao seu compromisso evangélico, renovando com generosidade e audácia os métodos e as formas tanto do testemunho religioso como do precioso serviço que presta nos sectores educativo, escolástico e assistencial.

Seja uma Igreja profética que anuncia ao homem, seduzido pela avidez dos bens materiais e desorientado nos seus fins, a alta razão da vida moral, a dignidade e a liberdade de toda a pessoa humana, a beleza do Evangelho, a alegria de aderir a Cristo.

Seja uma Igreja fiel ao significado do nome que adorna a cidade: «Macau, Cidade do Nome de Deus». A todos fale, sem medo, do amor do Pai, manifestado em Jesus e concedido pelo Espírito Santo. Conserve alta a sua tradição, testemunhada pelos inumeráveis e esplêndidos edifícios sagrados que ela, ao longo dos séculos, dedicou à Mãe de Deus, a S. José, a S. Tiago, a S. Francisco Xavier.

Mantenha a sua plena comunhão com a Igreja universal e, como no passado, tenha sempre a peito a comunhão com a Igreja de toda a China, à qual desde agora passa a estar ligada por um especial vínculo civil.

Ao formular estes votos, desejo assegurar a minha oração, e a da Igreja inteira, pela comunidade diocesana de Macau e pela família católica mais vasta de toda a China continental.

Envio-lhe, venerado Irmão, a minha afectuosa saudação e a Bênção Apostólica, que estendo ao clero, aos religiosos e religiosas, aos fiéis leigos e a todas as pessoas de boa vontade.

Vaticano, 3 de Dezembro - Festa de S. Francisco Xavier, Padroeiro das Missões - do ano 1999.

PAPA JOÃO PAULO II




MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


PARA A COMUNIDADE CATÓLICA NA CHINA




"E o Verbo fez-Se carne".

Caríssimos Irmãos e Irmãs da Igreja católica na China!

Na vigília do grande Jubileu, no qual recordaremos o bimilenário do nascimento de Cristo, com alegria e grande afecto saúdo todos vós no amor de Deus Pai e na comunhão do Espírito Santo.

Do meu coração de Pastor da Igreja universal estão próximos todos os católicos de origem chinesa, mas neste momento sinto o dever de me dirigir de modo particular aos Pastores e fiéis da China Continental, que ainda não podem manifestar, de maneira plena e visível, a sua comunhão com esta Sé Apostólica.

1. Também vós, Irmãos e Irmãs da Igreja que está na China, juntamente com todos os fiéis que no mundo inteiro se preparam para celebrar o grande Jubileu e o início de um novo milénio, acolhestes o convite do Sucessor de Pedro e Bispo de Roma e ides com fé ao encontro deste evento.

As indicações práticas, que ilustrei na Bula de proclamação Incarnationis mysterium, e as disposições para a obtenção da Indulgência jubilar, que são expostas no relativo Decreto da Penitenciaria Apostólica, serão para todos os católicos norma e guia para uma frutuosa celebração deste providencial ano de graça não só em Roma e na Terra Santa, mas também nas outras circunscrições eclesiásticas.

Para numerosíssimos católicos espalhados pelo mundo não será possível cruzar o limiar da Porta Santa em Roma e venerar os túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo. Mas todos são convidados a descobrir, lá onde vivem, que "passar por aquela porta significa confessar que Jesus Cristo é o Senhor, revigorando a fé n'Ele para viver a vida nova que Ele nos deu. É uma decisão que supõe a liberdade de escolher e ao mesmo tempo a coragem de abandonar alguma coisa, na certeza de adquirir a vida divina (cf. Mt Mt 13,44-46)" (Bula de proclamação Incarnationis mysterium, 8).

2. Os nossos corações dirigem-se para o momento histórico em que, na "plenitude dos tempos" (Ga 4,4), nasceu entre nós o Filho de Deus: um acontecimento que a maioria da humanidade já aceitou como ponto de referência para a cronologia da história. O nascimento de Jesus ocorreu numa província da Palestina, cidade asiática que se encontra na encruzilhada dos grandes intercâmbios culturais entre o Oriente e o Ocidente, ponto de encontro entre a Ásia, a Europa e a África.

Aquele nascimento foi, e ainda hoje é, portador de alegria para todos os homens no "vasto âmbito debaixo do céu", precisamente como em Belém os Anjos proclamaram aos pastores: "Anuncio-vos uma grande alegria, que o será para todo o povo: hoje, na cidade de David nasceu-vos um Salvador, que é o Messias, Senhor" (Lc 2,10-11).

O nome dado ao recém-nascido: Jesus, "Deus dá a salvação", sintetiza a sua missão e é uma promessa para todo o género humano: "Deus deseja que todos os homens se salvem e conheçam a verdade" (1Tm 2,4); "Deus amou de tal modo o mundo que lhe deu o seu Filho único, para que todo o que n'Ele crer tenha a vida eterna" (Jn 3,16).

3. Aquilo que se disse a respeito de Jesus no instante do seu nascimento, Ele começou a realizá-lo durante a sua vida: "Aos pobres anunciou o Evangelho da salvação, a liberdade aos prisioneiros, aos aflitos a alegria" (IV Oração eucarística).

Para actuar o desígnio misericordioso e misterioso de Deus para a salvação dos homens, "entregou-se voluntariamente à morte e, ressurgindo, destruiu a morte e renovou a vida" (Ibid.).

Antes da sua Ascensão e do seu retorno ao Pai, ordenou aos discípulos, isto é, à Igreja nascente: "Ide, pois, ensinai todas as nações, baptizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo" (Mt 28,19).

Obedientes ao Senhor e impelidos pelo Espírito Santo, os discípulos cumpriram o mandato de Jesus, levando a Boa Nova ao Oriente e ao Ocidente, ao Norte e ao Sul.

4. Enquanto recorda o ingresso de Jesus na história, o Jubileu celebra também a sua presença progressiva entre os povos.

Como bem sabeis, caríssimos Irmãos e Irmãs, segundo os planos misteriosos da Providência divina o Evangelho da salvação foi anunciado muito cedo também no vosso País: com efeito, já nos séculos V e VI alguns grupos de monges da Síria, atravessando a Ásia Central, levaram o nome de Jesus aos vossos antepassados. Ainda hoje, um famoso marco na capital Chang'an (Xi'an) sintetiza muito bem, a partir do ano 635, aquele momento histórico que assinalou o ingresso oficial da "Religião luminosa" na China.

Depois de alguns séculos, aquele anúncio debilitou-se. Porém, o facto de o Evangelho de Jesus ter sido pregado aos vossos antepassados num período histórico em que uma boa parte da Europa e do resto do mundo ainda não conhecia nada a respeito disso, não pode deixar de ser para vós um motivo de gratidão a Deus e de intensa alegria.

5. A mensagem evangélica, que foi proclamada naqueles inícios remotos, não perdeu a própria actualidade e convida-vos e estimula-vos a anunciá-lo àqueles que ainda não o receberam.

A vida dos discípulos de Jesus, tanto de outrora como de hoje, na China como noutras partes, deve inspirar-se na "Boa Nova", e a autêntica realização do Evangelho na vossa vida será um luminoso testemunho de Cristo no vosso ambiente. Portanto, todos vós, Irmãos e Irmãs, sois chamados a anunciar o Evangelho da salvação ao Povo chinês de hoje, com renovado vigor.

Compreendo que não vos sentis à altura de tão grande e importante missão, mas sabeis que podeis contar com a força vitoriosa de Cristo (cf. Jo Jn 16,33), que vos assegura a sua presença e ajuda. Sob a guia dos vossos Pastores e em comunhão com eles, vós caros sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos, elaborareis planos pastorais actualizados, dando amplo e prioritário relevo a tudo aquilo que concerne ao anúncio de Jesus e da sua palavra de vida, e prestando particular atenção ao mundo juvenil.

Neste contexto, a celebração do Jubileu será uma ocasião para recordar os afãs apostólicos, os sofrimentos, as lágrimas e a efusão de sangue, que acompanharam o caminho da Igreja entre os homens de todos os tempos. Também entre vós, o sangue dos vossos mártires foi semente de uma multidão de autênticos discípulos de Jesus. O meu coração pulsa de admiração e de reconhecimento ao Senhor pelo generoso testemunho oferecido por uma plêiade de Bispos, sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos. Parece que nalgumas regiões o tempo da provação ainda não terminou!

6. Ao preparar-vos para a celebração do grande Jubileu, recordai que na tradição bíblica esse momento sempre trouxe consigo a obrigação do perdão mútuo das dívidas, da reparação das injustiças cometidas e da reconciliação com o próximo.

Também a vós foi anunciada a "grande alegria preparada para todos os povos": o amor e a misericórdia do Pai, a Redenção realizada em Cristo. Na medida em que vós mesmos estiverdes disponíveis a aceitar esse anúncio jubiloso, podereis transmiti-lo com a vossa vida a todos os homens e mulheres que estiverem ao vosso lado. E o meu desejo mais ardente é de que acolhais as sugestões interiores do Espírito Santo, perdoando-vos uns aos outros tudo aquilo que deve ser perdoado, aproximando-vos de forma mútua, aceitando-vos reciprocamente, superando as barreiras para irdes além de tudo aquilo que vos pode dividir.

Não esqueçais as palavras de Jesus durante a última Ceia: "É por isto que todos saberão que sois Meus discípulos: se vos amardes uns aos outros" (Jn 13,35).

Com alegria tomei conhecimento de que quereis oferecer, como dom mais precioso para a celebração do grande Jubileu, a unidade entre vós e com o Sucessor de Pedro. Esse propósito não pode deixar de ser fruto do Espírito, que conduz a sua Igreja pelos árduos caminhos da reconciliação e da unidade.

7. "Um sinal da misericórdia de Deus, particularmente necessário hoje, é o da caridade, que abre os nossos olhos às carências daqueles que vivem pobres e marginalizados" (Bula de proclamação Incarnationis mysterium, 12).

Entre os compromissos práticos, que tornarão evidente o vosso esforço de conversão e de renovação espiritual, deverá estar incluída a caridade para com os irmãos na forma tradicional da obra de misericórdia corporal e espiritual. Esta solidariedade concreta será a vossa contribuição discreta mas eficaz, também para o bem do vosso Povo. Deste modo, dareis um testemunho eloquente do nome cristão, que tendes com coragem e orgulho: como bons chineses e cristãos autênticos, amai o vosso País e a Igreja local e universal.

8. O Jubileu do Ano 2000 será uma grande oração de louvor e de acção de graças, sobretudo pelo dom da Encarnação do Filho de Deus e da Redenção por Ele realizada.

Será louvor e agradecimento pelo dom da Igreja, fundada por Cristo como "sacramento, ou sinal, e o instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano" (Concílio Ecuménico Vaticano II, Lumen gentium LG 1).

"A gratidão alargar-se-á aos frutos de santidade, amadurecidos na vida de tantos homens e mulheres que, em cada geração e época da história, souberam acolher sem reservas o dom da Redenção" (Carta Tertio millennio adveniente, TMA 32).

9. Unidos na verdade e na caridade de Cristo, em comunhão com a Igreja universal e com aquele que foi chamado por Jesus a ser Sucessor de Pedro e penhor de unidade, cruzai o limiar do novo milénio, confiantes de que o único Deus e Pai de todo o género humano abençoa e abençoará os vossos passos e os de todo o vosso Povo. Sede fermento de bem a favor do vosso Povo, não obstante a exiguidade do vosso número. Sede sinal e sacramento da salvação prometida por Deus a todos os homens, convidando os que estão ao vosso lado a escutarem e a acreditarem na Boa Nova do grande Jubileu: "Nasceu-vos o Salvador!".

Maria, Mãe do Redentor, auxílio dos cristãos e Rainha da China, vos proteja e vos sustente no cumprimento da vossa vocação e na actuação dos propósitos que nascerem no coração sempre mais atento e generoso.

10. A esta altura, o meu olhar alarga-se de novo, para abarcar também todos os católicos chineses que vivem fora da China Continental. A eles dirige-se a minha saudação afectuosa juntamente com os votos sinceros por que, durante o Ano jubilar, se sintam revigorados "com a certeza de levarem ao mundo a luz verdadeira, Cristo Senhor" (Bula de proclamação Incarnationis mysterium, 2). Eles serão luz e fermento lá onde a Providência os colocar, e cultivarão a unidade espiritual com todos os seus irmãos e irmãs da grande família chinesa.

"A graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus Pai e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós. Amém". Com estes votos abençoo todos de coração!

Vaticano, 8 de Dezembro de 1999, solenidade da Imaculada Conceição da Bem-Aventurada Virgem Maria.

PAPA JOÃO PAULO II




DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À CONFERÊNCIA EPISCOPAL DA REPÚBLICA DOMINICANA


POR OCASIÃO DA VISITA "AD LIMINA APOSTOLORUM"


Sábado, 11 de Dezembro de 1999



Queridos Irmãos no Episcopado!

1. É-me grato receber-vos hoje, por ocasião da visita "ad Limina", na qual tivestes ocasião, mais uma vez, de peregrinar aos túmulos dos apóstolos Pedro e Paulo, e de expressar a vossa comunhão com o Bispo de Roma e com a Igreja universal. Tudo isto é uma ajuda para viver de maneira renovada a vossa missão de guiar a comunidade eclesial da República Dominicana, que tive a alegria de visitar três vezes e da qual conservo tantas e gratas recordações.

Agradeço cordialmente ao Senhor Cardeal Nicolás de Jesus López Rodríguez, Arcebispo de Santo Domingo e Presidente da Conferência do Episcopado Dominicano, as amáveis palavras que me dirigiu em nome de todos, para me expressar o vosso afecto, fazendo-me ao mesmo tempo partícipe das preocupações e esperança da Igreja no vosso País e pondo em relevo também os anelos e as inquietudes que vos animam neste encontro.

Ao regressardes às vossas dioceses, levai a saudação afectuosa do Papa aos sacerdotes, religiosos, religiosas e fiéis leigos, os quais tenho presentes na minha oração para que cresçam cada vez mais a sua fé em Cristo e o seu compromisso com a nova evangelização.

2. A Igreja na vossa Nação viveu momentos importantes nos últimos anos, nos quais foram criadas duas novas dioceses, Porto da Prata e S. Pedro de Macorís, e se celebrou o I Concílio Dominicano, que contribuiu de maneira notável para fazer crescer entre vós, Bispos, a comunhão e a participação na solicitude pastoral. Esta e outras iniciativas, como o Plano Nacional de Pastoral, são um sinal de unidade e, ao mesmo tempo, uma exigência nas circunstâncias actuais em que parece cada vez mais necessário unir, no respeito da identidade diocesana, "forças e vontades para promover o bem comum do conjunto das Igrejas e de cada uma delas" (Christus Dominus CD 36).

No esforço por revitalizar a vida cristã no vosso povo, não se pode esquecer o papel decisivo dos sacerdotes, vossos colaboradores no anúncio do Evangelho, que exercem o seu ministério com dedicação e generosidade, às vezes em circunstâncias nada fáceis. Com eles deveis ter uma constante solicitude e proximidade, sobretudo respeito por aqueles que se encontram sozinhos ou necessitados, com a finalidade de que todos levem uma vida digna e santa, conforme a própria vocação, e dêem testemunho de que são homens de Deus, consagrados plenamente ao serviço do Evangelho, sem se deixar arrastar pela sedução do mundo (cf. Ef Ep 4,22).

Juntamente com isto, não deixa de ser premente a pastoral vocacional, por mais que seja consolador o crescimento de vocações ao sacerdócio e à vida consagrada nos últimos anos, porque a comunidade eclesial sofre escassez de sacerdotes. É uma pastoral que sempre deve estar apoiada, de maneira particular, no próprio exemplo dos sacerdotes e na sua capacidade de entusiasmar os jovens com a total entrega a Cristo e ao Evangelho, assim como no cultivo, já nas famílias, da atitude de generosidade e perseverança diante da chamada do Senhor.

3. Uma menção especial merece a Vida consagrada, da qual as vossas dioceses recebem não só a riqueza dos carismas dos respectivos Institutos, mas também uma ajuda inestimável, que em muitos casos é vital, ao estarem comprometidos nos diversos sectores da pastoral educativa, da saúde e social segundo a própria identidade. A respeito disso, quero recordar mais uma vez como a história da evangelização da América está entretecida com o testemunho de tantas pessoas consagradas, anunciando o Evangelho e defendendo os direitos dos indígenas para que se sentissem plenamente filhos de Deus. Contudo, o contributo da Vida consagrada à edificação da Igreja não deve ser medido apenas pelas suas actividades ou pela sua eficácia externa. Por isso também a vida contemplativa, juntamente com as demais formas de consagração, deve ser cada vez mais estimada, promovida e bem acolhida pelos Bispos, sacerdotes e fiéis diocesanos, a fim de que "se integrem plenamente na Igreja particular à qual pertencem, e fomentem a comunhão e a mútua colaboração" (Ecclesia in America ).

4. Nos Relatórios quinquenais ressaltastes a necessidade de ter leigos adultos bem formados, que sejam autênticas testemunhas do Evangelho. Com efeito, na vossa Nação, que actualmente está a atravessar um período de renovação e de profundas transformações que afectam diversos sectores da sociedade, é premente poder contar com o testemunho e a actuação de leigos bem formados e dispostos a intervir nos campos que lhes são mais próprios, como o da família, do trabalho, da cultura ou da política.

Mas isto requer, antes de tudo, uma formação contínua e sistemática, que os torne conscientes da sua dignidade de baptizados e do compromisso que isto comporta, assim como um conhecimento sólido da doutrina da Igreja e do seu Magistério. De facto, só com princípios éticos sólidos se pode ser promotores dos valores morais, precisamente numa sociedade em que há uma elevada percentagem de população que vive em condições de extrema pobreza, um alto índice de desemprego sobretudo juvenil, um incremento da violência e da corrupção quase como um sistema de vida, factores todos eles que repercutem directamente na degradação moral e em fenómenos como as mães solteiras ou o trabalho e a exploração dos menores.

5. Dentre os grandes desafios que se apresentam na vossa sociedade, deve-se destacar o enfraquecimento da instituição familiar, que dá lugar à diminuição dos matrimónios religiosos e o consequente aumento dos matrimónios civis, os numerosos divórcios, assim como a difusão do aborto e de uma mentalidade contraceptiva. Sem se reduzir a costumes às vezes difundidos, esta situação requer uma resposta vigorosa que se há-de concretizar sobretudo numa acção catequética e educativa mais incisiva e constante, que faça arraigar profundamente o ideal cristão de comunhão conjugal fiel e indissolúvel, verdadeiro caminho de santidade e aberta à procriação. Nela, os pais são os primeiros responsáveis pela educação dos filhos, aos quais, como "igreja doméstica", transmitem também o grande dom da fé.

Neste contexto, é preciso recordar também a necessidade de respeitar a dignidade inalienável da mulher à qual se reconhece, além disso, um papel insubstituível, tanto no âmbito do lar, como no da Igreja e da sociedade. Com efeito, é triste observar como "a mulher ainda é objecto de discriminações" (ibid., 45), sobretudo quando é vítima frequente de abusos sexuais e da prepotência masculina. Por isso, é necessário sensibilizar as instituições públicas a fim de que se "ajude ainda mais a vida familiar baseada sobre o matrimónio, proteja ainda mais a maternidade e tenha mais respeito pela dignidade de todas as mulheres" (Ibid.).

6. A situação familiar tem uma influência determinante no estilo de vida dos jovens, comprometendo assim o futuro da Igreja e da sociedade. Muitos deles nasceram de situações irregulares e cresceram sem conhecer a figura paterna, que lhes causa graves problemas de educação que se repercutem na sua maturidade pessoal. Eles têm, pois, necessidade de um apoio especial que os ajude na busca de um sentido da vida e faça nascer neles horizontes de esperança, que lhes permitam superar as suas experiências de frustração e resgatar-se das suas sequelas, como são o ressentimento e a delinquência. Esta é uma tarefa de todos e na qual devem estar comprometidos também, em primeira pessoa, os próprios jovens, fazendo-se apóstolos dos seus coetâneos mais necessitados.

Por isso é imprescindível promover uma pastoral juvenil que abranja todos os sectores da juventude, sem discriminação alguma, a fim de se acompanhar as novas gerações para o encontro com Cristo vivo, no qual se funda a verdadeira esperança de um futuro de maior comunhão e solidariedade. Mais do que acções isoladas, deve-se buscar um processo de formação "constante e dinâmico, adequado para encontrar o seu lugar na Igreja e no mundo" (ibid., 47) e, portanto, com o convite a serem corajosos, fiéis aos seus compromissos, testemunhas da sua fé e protagonistas no anúncio do Evangelho.

7. No âmbito do vosso País constatais também que "a ruptura entre Evangelho e cultura é sem dúvida alguma o drama da nossa época" (Evangelii nuntiandi EN 20) e que certas ideologias ou correntes de pensamento, dum ou doutro modo, negam Deus ou propugnam um afastamento d'Ele, relativizam os valores morais e, em todo o caso, tendem a criar um abismo insuperável entre a dimensão religiosa e os outros aspectos da vida humana. Por isso, na sua acção evangelizadora, a Igreja sente o dever premente, não só de defender a verdade sobre o homem, a sua supremacia sobre a sociedade e a sua abertura à transcendência, mas também de falar e ensinar de forma que "o Evangelho seja anunciado na linguagem e cultura de quantos o ouvem" (Ecclesia in America ). Ao mesmo tempo, nesta tarefa deve-se evitar o perigo de que um excessivo apego a certas culturas e tradições termine por relativizar ou esvaziar o anúncio cristão do seu sentido. Com efeito, "é preciso não esquecer que só o mistério pascal de Cristo, suprema manifestação de Deus infinito na finitude da história, poderá ser válido ponto de referência para toda a humanidade peregrina à procura da unidade autêntica e da verdadeira paz" (Ibid., 70).

8. Já muito próximos da abertura da Porta Santa, que dará início ao Grande Jubileu, exorto-vos, queridos Irmãos Bispos, juntamente com toda a Igreja que peregrina na República Dominicana, a fazer com que este Ano da Graça signifique um forte impulso de renovação espiritual tanto pessoal como comunitária. Formulo votos, além disso, por que a experiência do I Concílio Dominicano, com as suas disposições e normativas pastorais, seja para todas e cada uma das vossas dioceses, uma ocasião de revigorar a fé, avivar a esperança e difundir a caridade sem limites.

Todos estes desejos e projectos pastorais, coloco-os aos pés de Nossa Senhora da Altagraça, Padroeira da República Dominicana, para que com o seu amor materno acompanhe e proteja sempre todos os seus filhos e filhas num ambiente de solidariedade e convivência fraterna, ao mesmo tempo que vos concedo com afecto a Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


NA CERIMÓNIA DE CONCLUSÃO


DOS TRABALHOS DE RESTAURAÇÃO


DA CAPELA SISTINA


Sábado, 11 de Dezembro de 1999



1. "Do mesmo modo vós também, como pedras vivas, entrai na construção dum templo espiritual" (1P 2,5).

A esta imagem bíblica do mistério da Igreja seria difícil encontrar um comentário mais eloquente do que esta Capela Sistina, da qual hoje podemos gozar o seu total esplendor, graças à restauração há pouco concluída. Unem-se à nossa alegria os fiéis de todas as partes do mundo, aos quais este lugar é querido não só pelas obras de arte que conserva, mas também pelo papel que desempenha na vida da Igreja. Com efeito, realiza-se aqui recordo isto com emoção a eleição do Sucessor de Pedro.

Há cinco anos, a 8 de Abril de 1994, pude indicar nas cores originais finalmente reencontradas as obras de Miguel Ângelo que, sem dúvida, dão tonalidade a esta sala e, num certo sentido, a absorvem, tamanha é a sua grandeza. Elas elevam-se até ao último horizonte da teologia cristã, indicando o alfa e o ómega, o início e o juízo, o mistério da criação e o da história, fazendo convergir tudo para Cristo salvador e juiz do mundo.

Mas hoje o nosso olhar é convidado a deter-se no mais humilde mas muito significativo ciclo parietal, que deu o primeiro rosto à Capela querida por Sisto IV. Nestes afrescos colaboraram grandes artistas florentinos e úmbrios, tais como Perugino, Botticelli, Pinturicchio, Ghirlandaio, Rosselli e Signorelli. Eles inspiraram-se num precioso desenho, compondo uma obra unitária, que se integra bem no conjunto arquitectónico e pictórico que se foi formando gradualmente, tornando-se um elemento de particular eficácia evocativa.

Sinto-me feliz por podê-la restituir hoje a uma renovada fruição estética. Agradeço profundamente ao Senhor Cardeal Edmund Casimir Szoka, Presidente da Pontifícia Comissão para o Estado da Cidade do Vaticano, ao Dr. Francesco Buranelli com todos os Responsáveis pela Direcção Geral dos Monumentos, Museus e Galerias Pontifícias, aos operários e a todos os que, de várias formas, se tornaram beneméritos desta ulterior recuperação artística.

2. Percorrendo com o olhar a dupla série de pinturas parietais não é difícil captar a sua simetria, aliás evidenciada pelos "títulos" que têm na parte superior. Dum lado sobressai a figura de Moisés, do outro domina Cristo. O percurso iconográfico é uma espécie de lectio divina na qual, ainda antes dos episódios bíblicos individualmente, emerge a unidade das Escrituras, do Antigo e do Novo Testamento, na linha histórico-salvífica que dos acontecimentos do êxodo leva à plenitude da revelação em Cristo.

O paralelismo ilustra de maneira eficaz o princípio hermenêutico enunciado por S. Agostinho: "Novum Testamentum in Vetere latet, Vetus in Novo patet" (cf. Quaest. in Hept. 2, 73). E na realidade, a própria disposição dos afrescos, quer vista na ordem histórica progressiva quer nas específicas correspondências temáticas, evidencia que tudo gravita em redor de Cristo. O seu baptismo, maravilhosamente interpretado por Perugino, exprime a plenitude daquilo que a circuncisão moisaica simplesmente encobria. As tentações vencidas por Cristo são colocadas por Botticelli em simetria com as provações suportadas por Moisés. A convocação do novo povo, colhida por Ghirlandaio na vocação dos discípulos nas margens do lago de Genesaré, está em relação com a reunião do antigo povo, delineado no fundo dramático da travessia do Mar Vermelho. Cristo pintado por Rosselli na solenidade do sermão da montanha, em comparação com Moisés, parece o novo legislador, que veio não para abolir a lei, mas para a reconfirmar (cf. Mt Mt 5,17). E Cristo sobressai ainda nos afrescos da entrega das chaves e da última ceia, igualmente evidenciados por equivalências do Antigo Testamento.

3. Por conseguinte, destas decorações eleva-se um hino a Cristo. Tudo leva a Ele. N'Ele tudo tem a sua plenitude. Mas é importante considerar que nestas pinturas Ele nunca está só: em redor d'Ele, como de Moisés, são numerosos os rostos de homens e mulheres, de idosos e de crianças. É o povo de Deus a caminho, é a Igreja "casa espiritual", feita de pedras vivas que se unem a Cristo, "pedra viva rejeitada pelos homens, mas escolhida e preciosa aos olhos de Deus" (1P 2,4).

Contudo, uma característica distingue o inteiro desígnio teológico e iconográfico, isto é, a atenção dada aos guias deste povo peregrino. Se no Antigo Testamento o olhar se detém em Moisés, acompanhado pelo sacerdote Arão no movimento pintado por Botticelli, no gesto de mostrar a sua autoridade em vão insidiada, no Novo Testamento a centralidade absoluta de Cristo não é ofuscada, mas evidenciada, pelo papel que ele próprio atribui aos apóstolos e sobretudo a Pedro.


Discursos João Paulo II 1999 - Quinta-feira, 9 de Dezembro de 1999