Discursos João Paulo II 1999 - Cracóvia, 17 de Junho de 1996

MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO SEMINÁRIO DE ESTUDOS


SOBRE OS MOVIMENTOS ECLESIAIS


E AS NOVAS COMUNIDADES




Senhores Cardeais
Venerados Irmãos no Episcopado!

1. Viestes a Roma, provindos de países de todos os continentes, para reflectir juntos sobre a vossa solicitude de Pastores para com os Movimentos eclesiais e as novas Comunidades. É a primeira vez que o Pontifício Conselho para os Leigos, em colaboração com as Congregações para a Doutrina da Fé e para os Bispos, reúne um grupo tão considerável e qualificado de Bispos para juntos examinarem realidades eclesiais, que não hesitei em definir «providenciais» (cf. Discurso no Encontro com os Movimentos eclesiais e as novas Comunidades, n. 7, em L'Osserv. Rom 6/6/1998, pág. Rm 1) devido aos seus estimulantes contributos oferecidos à vida do Povo de Deus.

Agradeço-vos a presença e o empenho neste importante sector pastoral. Manifesto, além disso, aos promotores, ao Pontifício Conselho para os Leigos e às Congregações para a Doutrina da Fé e para os Bispos a minha viva satisfação por esta iniciativa de incontestável utilidade para a missão da Igreja no mundo contemporâneo.

O Seminário que vos ocupou nestes dias inscreve-se de facto, felizmente, num projecto apostólico a mim muito querido, que brotou do meu encontro com os membros de mais de cinquenta destes Movimentos e Comunidades, ocorrido a 30 de Maio do ano passado na Praça de São Pedro. Estou certo de que os efeitos da vossa reflexão não deixarão de ser sentidos, contribuindo a fim de fazer com que aquele projecto e encontro dêem frutos ainda mais abundantes para o bem de toda a Igreja.

2. O Decreto conciliar sobre o serviço pastoral dos Bispos assim indica o núcleo mesmo do ministério episcopal: «No exercício do seu múnus de ensinar, anunciem o Evangelho de Cristo aos homens, que é um dos principais deveres dos Bispos, chamando-os à fé com a fortaleza do Espírito ou confirmando-os na fé viva. Proponham-lhes na sua integridade o mistério de Cristo, isto é, aquelas verdades que não se podem ignorar sem ignorar o mesmo Cristo» (Christus Dominus CD 12). O anseio de todo o Pastor de alcançar os homens e de falar ao seu coração, à sua inteligência, à sua liberdade, à sua sede de felicidade nasce do próprio anseio de Cristo pelo homem, da sua compaixão por aqueles que Ele comparava a um rebanho sem pastor (cf. Mc Mt 9, 36) e faz eco do zelo apostólico de Paulo: «Ai de mim se não evangelizar!» (1Co 9,16). No nosso tempo os desafios da nova evangelização apresentam-se não raro em termos dramáticos e impelem a Igreja, e em particular os seus Pastores, à busca de novas formas de anúncio e de acção missionária, mas conforme às necessidades da nossa época.

Entre as tarefas pastorais hoje mais urgentes quereria indicar, em primeiro lugar, a atenção às comunidades em que é mais profunda a consciência da graça conexa com os sacramentos da iniciação cristã, da qual brota a vocação a ser testemunha do Evangelho em todos os âmbitos da vida. A dramaticidade do nosso tempo incentiva os crentes a uma essencialidade de experiência e de proposta cristã, nos encontros e nas amizades de cada dia, para um caminho de fé iluminado pela alegria da comunicação. Uma ulterior urgência pastoral que não se pode subestimar é constituída pela formação de comunidades cristãs, que sejam autênticos lugares de acolhimento para todos, na constante atenção às necessidades específicas de cada pessoa. Sem essas comunidades resulta sempre mais difícil crescer na fé e cai-se na tentação de reduzir à experiência fragmentária e ocasional precisamente aquela fé que, ao contrário, deveria vivificar a inteira experiência humana.

3. É neste contexto que se situa o tema do vosso Seminário sobre os Movimentos eclesiais. Se no dia 30 de Maio de 1998 na Praça de São Pedro, ao aludir ao florescimento de carismas e movimentos que se verificou na Igreja após o Concílio Vaticano II, falei de «um novo Pentecostes», quis com esta expressão reconhecer no desenvolvimento dos Movimentos e das novas Comunidades um motivo de esperança para a acção missionária da Igreja. De facto, por causa da secularização que em muitas almas enfraqueceu ou até mesmo extinguiu a fé e abriu o caminho a crenças irracionais, em muitas regiões do mundo Ela tem que enfrentar um ambiente semelhante ao das suas origens.

Estou bem consciente de que os Movimentos e as novas Comunidades, como toda a obra que, embora sob o impulso divino, se desenvolve no interior da história humana, nestes anos não despertaram só considerações positivas. Como eu dizia a 30 de Maio de 1998, a sua «novidade inesperada e por vezes até explosiva [...] não deixou de suscitar interrogativos, dificuldades e tensões; às vezes comportou, por um lado, presunções e intemperanças e, por outro, não poucos preconceitos e reservas» (Ibid., n. 6). Mas, no testemunho comum por eles dado naquele dia à volta do Sucessor de Pedro e de numerosos Bispos, eu via e vejo o sobrevir de uma «etapa nova: a da maturidade eclesial», embora na plena consciência de que «isto não quer dizer que todos os problemas tenham sido resolvidos», uma vez que esta maturidade «é, antes, um desafio. Uma via a percorrer» (Ibidem).

Este itinerário exige da parte dos movimentos uma comunhão sempre mais sólida com os Pastores que Deus escolheu e consagrou para reunir e santificar o seu povo no fulgor da fé, da esperança e da caridade, porque «nenhum carisma dispensa da referência e da submissão aos Pastores da Igreja» (Christifideles laici CL 24). Portanto, o compromisso dos Movimentos é compartilhar, no âmbito da comunhão e missão das Igrejas locais, as suas riquezas carismáticas de modo humilde e generoso.

Caríssimos Irmãos no Episcopado! A vós, a quem pertence a tarefa de discernir a autenticidade dos carismas para dispor o seu justo exercício no âmbito da Igreja, peço magnanimidade na paternidade e caridade clarividente (cf. 1Co 13,4), para com estas realidades, porque qualquer obra dos homens necessita de tempo e paciência para a sua devida e indispensável purificação. Com palavras claras o Concílio Vaticano II escreve: «O juízo acerca da sua (dos carismas) autenticidade e do seu uso recto pertence àqueles que presidem na Igreja, aos quais compete de modo especial não extinguir o Espírito mas julgar tudo e conservar o que é bom (cf. )» (Lumen gentium LG 12), a fim de que todos os carismas cooperem, na sua diversidade e complementaridade, para o bem comum (cf. ibid., 30).

Estou convicto, venerados Irmãos, de que a vossa disponibilidade atenta e cordial, graças também a oportunos encontros de oração, de reflexão e de amizade, tornará não só mais amável mas ainda mais exigente a vossa autoridade, mais eficazes e incisivas as vossas indicações, mais fecundo o ministério que vos foi confiado para a valorização dos carismas em ordem à «utilidade comum». Com efeito, é vossa primeira tarefa abrir os olhos do coração e da mente, para reconhecer as múltiplas formas da presença do Espírito na Igreja, as examinar e levar todas a unidade na verdade e na caridade.

4. No decurso dos encontros que tive com os Movimentos eclesiais e as novas Comunidades, ressaltei em várias ocasiões a íntima conexão entre a sua experiência e a realidade das Igrejas locais e da Igreja universal das quais são fruto e, ao mesmo tempo, expressão missionária. No ano passado, diante dos participantes no Congresso mundial dos Movimentos eclesiais, organizado pelo Pontifício Conselho para os Leigos, constatei publicamente «a sua disponibilidade para pôr as próprias energias ao serviço da Sé de Pedro e das Igrejas locais» (Mensagem ao Congresso mundial dos Movimentos eclesiais, n. 2, em L'Osserv. Rom 6/6/1998, pág. Rm 2). Com efeito, um dos frutos mais importantes gerados pelos movimentos é precisamente o de saber libertar em tantos fiéis leigos, homens e mulheres, adultos e jovens, um vivo impulso missionário, indispensável à Igreja que se prepara para cruzar o limiar do terceiro milénio. Este objectivo, porém, só se alcança lá onde eles «se inserem com humildade na vida das Igrejas locais e são acolhidos cordialmente por Bispos e sacerdotes nas estruturas diocesanas e paroquiais» (Redemptoris missio RMi 72).

O que isto significa em termos concretos de apostolado e de acção pastoral? Foi esta, precisamente, uma das questões-chave do vosso Seminário. Como acolher este dom particular que o Espírito oferece à Igreja no nosso momento histórico? Como o acolher em todo o seu alcance, em toda a sua plenitude, em todo o dinamismo que lhe é próprio? Responder de modo adequado a esses interrogativos faz parte da vossa responsabilidade de Pastores. A vossa grande responsabilidade é não tornar vão o dom do Espírito mas, ao contrário, fazê-lo frutificar sempre mais no serviço ao inteiro Povo cristão.

Faço votos de coração por que o vosso Seminário seja fonte de encorajamento e de inspiração para tantos Bispos no seu ministério pastoral. Maria, Esposa do Espírito Santo, vos ajude a escutar aquilo que hoje o Espírito diz à Igreja (cf. Ap Ap 2,7). Estou perto de vós com a minha solidariedade fraterna, acompanho-vos com a oração, enquanto de bom grado vos abençoo a vós e a quantos a Providência divina confiou aos vossos cuidados pastorais.

Vaticano, 18 de Junho de 1999.

PAPA JOÃO PAULO II




DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO CONSELHO DAS IGREJAS CRISTÃS


DE MADAGÁSCAR


Sábado, 19 de Junho de 1999



Senhor Cardeal
Caros Irmãos no Episcopado
Prezados amigos!

Tenho a alegria de vos acolher nesta manhã, a vós que sois membros do Conselho das Igrejas Cristãs de Madagáscar. Quisestes vir a Roma em recordação da viagem que, há dez anos, realizei ao vosso país. Agradeço-vos cordialmente este gesto de cortesia para com a pessoa do Sucessor de Pedro. A vossa visita recorda-me o acolhimento caloroso que me foi reservado pelo povo malgaxe e o encontro fraterno com os representantes das diferentes confissões cristãs em Antananarivo.

A partir de então, sei que desenvolvestes colaborações entre as vossas diferentes comunidades, para tornar mais vivo e mais verdadeiro o testemunho de unidade dos discípulos de Cristo, no serviço a todos os compatriotas. Juntos ofereceis uma contribuição preciosa ao progresso humano e espiritual de toda a nação.

Desejo vivamente que os cristãos da Grande Ilha continuem a aprofundar, com ardor renovado, os laços de caridade e de solidariedade que os unem. Deus vos conceda caminhar com coragem pelas vias dum amor sincero e duma colaboração sempre mais fraterna para que, por meio dos cristãos, se possa realizar de modo cada vez mais pleno a oração do Senhor: «Para que todos sejam um» (Jn 17,21), a fim de que o mundo creia n'Aquele que o Pai enviou! Sobre cada um de vós, as vossas famílias e o inteiro povo malgaxe invoco de todo o coração a abundância das bênçãos de Deus.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO SIMPÓSIO


SOBRE O «CENTENÁRIO DO CONCÍLIO


PLENÁRIO LATINO-AMERICANO»


Terça-feira, 22 de Junho de 1999



Senhores Cardeais
Queridos Irmãos no Episcopado
Distintas Senhoras e Senhores!

1. É-me grato ter este encontro com todos vós que estais a participar no Simpósio sobre «Os últimos cem anos da Evangelização da América Latina», organizado pela Pontifícia Comissão para a América Latina, para comemorar o Primeiro Centenário do Concílio Plenário daquele Continente. Tratou-se de uma assembleia que marcou a história da Igreja na Ibero-América, abrindo para aqueles povos novas perspectivas cheias de esperança.

Com efeito, nas Actas e Decretos do Concílio Plenário, do qual me quisestes oferecer uma bonita edição fac-símile, encontram-se normas, orientações e propostas que inspiraram a trajectória do último século da Evangelização da América.

2. Desde que a mensagem de Jesus Cristo chegou ao Novo Mundo, os Papas tiveram pelo Continente americano uma especial solicitude apostólica, como se pôde constatar estudando com rigor os acontecimentos históricos. Um ponto culminante dessa solicitude foi, por parte de Leão XIII, a convocação do Concílio Plenário da América Latina. Na Carta Apostólica «Cum diuturnum» (25 de Dezembro de 1898) escreve este grande Pontífice: «Nada omitimos, em nenhuma ocasião, que pudesse servir para consolidar nessas nações ou estender o Reino de Cristo; hoje, ao realizar o que há tempo tínhamos desejado com anseio, queremos dar-vos uma nova e solene prova de Nosso amor para convosco. Assim, o que julgamos mais a propósito, foi que todos os Bispos dessas Repúblicas vos reunísseis, com a Nossa autoridade e o Nosso apelo», em ordem a «determinar as disposições mais aptas para que, nessas nações, que a identidade ou pelo menos a afinidade de raça deveria ter estreitamente unidas, se mantenha incólume a unidade da disciplina eclesiástica, resplandeça a visão católica e floresça publicamente a Igreja, graças aos esforços unânimes de todos os homens de boa vontade» (Acta, pp. XXI- XXII).

Os Decretos daquele Concílio, ainda que não directamente aplicáveis às circunstâncias actuais, são uma «memória» que deve iluminar, estimular e ajudar nesta encruzilhada da história. Neles, cuidadosamente redigidos pelos Padres conciliares, percebe-se uma grande inquietude por manter e exaltar a fé católica, configurar a fisionomia das pessoas eclesiásticas, cuidar do culto divino e da celebração dos Sacramentos, promover a educação da juventude e a sua formação nos princípios da doutrina cristã, favorecer a prática da caridade e demais virtudes.

Os Padres conciliares ofereceram um conjunto de resoluções, normas e orientações tendo em conta «as necessidades da Igreja e a salvação das almas», movidos por uma forte comunhão eclesial, como diz o último dos cânones (994): «com filial reverência e coração obedientíssimo, submetemos à Santa Sé Apostólica todas e cada uma das questões que neste Concílio Plenário foram decretadas e sancionadas». Essa comunhão, afectiva e efectiva, foi muito apreciada pelo Pontífice, que no seu discurso de despedida, a 10 de Julho de 1899, que ele mesmo considerava como «o testamento de um Pai amoroso», lhes dizia: «Adeus, enfim, adeus, Irmãos queridos: aproximai-vos para receber o ósculo de paz. Sabei, para o vosso consolo, que Roma inteira admirou a vossa união, a vossa ciência e a vossa piedade; e que consideramos o vosso Concílio como uma das jóias mais preciosas da Nossa coroa» (Acta, pág. CLXIX).

3. Depois do Concílio Plenário a Igreja na América Latina floresceu de maneira notável, às vezes entre não poucas tribulações, graves dificuldades e problemas imensos. Mas as luzes impõem-se às sombras e, assim podemos congratular-nos pelos grandes frutos de vida cristã que surgiram nesse Continente, graças ao trabalho silencioso e sacrificado de tantos Bispos, sacerdotes, religiosos e religiosas, e também leigos em paróquias e centros de apostolado, assim como no campo da educação e da caridade. Precisamente por isso podemos dizer com alegria que a América Latina tem como um sinal da sua identidade a fé católica.

Quero recordar que, desde a celebração do Concílio, a vitalidade da Igreja na América foi crescendo. Demonstram-no os Congressos Eucarísticos e Marianos, e também as quatro Conferências Gerais do Episcopado Latino-Americano, celebradas no Rio de Janeiro (1955), Medellín (1968), Puebla (1979) e Santo Domingo (1992), estas duas últimas inauguradas por mim. Quero também recordar que Paulo VI, na sua histórica peregrinação a Bogotá, abriu o caminho às viagens apostólicas à América, que eu, com o favor de Deus, pude realizar. Tudo isto culminou com a celebração do Sínodo da América, no Vaticano, que tive a ventura de convocar e depois, no início deste ano, encerrar na Basílica mexicana de Guadalupe, coração mariano do Continente, onde entreguei a Exortação Apostólica «Ecclesia in America».

4. Neste documento, ao recolher as propostas dos Padres sinodais eu quis abordar a situação actual do Continente, convidando os Pastores a aprofundar e concretizar depois em cada Igreja particular os seus conteúdos, e centrando a atenção no fundamental: Anunciar Jesus Cristo, que «é a boa nova da salvação comunicada aos homens de ontem, de hoje e de sempre; mas, ao mesmo tempo, Ele é também o primeiro e supremo evangelizador. A Igreja deve colocar o centro da sua atenção pastoral e da sua acção evangelizadora em Cristo crucificado e ressuscitado. Tudo o que se projecta no campo eclesial deve partir de Cristo e do seu Evangelho. Por isso, a Igreja na América deve falar cada vez mais de Jesus Cristo, rosto humano de Deus e rosto divino do homem» (n. 67).

5. Ao participardes neste Simpósio, como Pastores e historiadores, pensastes no futuro a partir da perspectiva do passado. Nesta tarefa há-de proceder-se com objectividade, baseando-se em dados reais e não sobre ideologias ou visões parciais dos factos. Agradeço-vos o vosso trabalho neste sentido para que a Igreja, conhecendo melhor a sua história, possa levar a cabo os seus programas evangelizadores adequados aos novos tempos. Nesses programas, além das estruturas pastorais, o que conta é a pessoa do evangelizador: o Bispo, o sacerdote, o catequista, o cristão comprometido, os quais com a sua fé devem dar jubiloso e corajoso testemunho de Jesus Cristo.

Agradeço à Pontifícia Comissão para a América Latina o esforço realizado para levar avante este Simpósio, que se continuará em certo modo na sua Reunião Plenária. Também vos agradeço a vossa participação no mesmo e o serviço que, animados pelo espírito eclesial, prestastes. Formulo os melhores votos para que o vosso trabalho, que depois será publicado nas Actas correspondentes, ofereça um tesouro de sugestões e propostas que ajudem a tarefa apostólica que, com tanta generosidade, se leva avante nos Países americanos.

Ao invocar sobre todos a protecção da Virgem de Guadalupe, a primeira evangelizadora da América, que com o seu olhar materno, na antiga capela do Pontifício Colégio Pio Latino-Americano guiou e acompanhou os passos do Concílio, concedo-vos de coração a Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS E AMIGOS


DA "REUNIÃO DAS OBRAS PARA


A AJUDA ÀS IGREJAS ORIENTAIS" (R.O.A.C.O.)


Quinta-feira, 24 de Junho de 1999



Senhor Cardeal
Venerados Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio
Caros membros e amigos
da «Reunião das Obras para a Ajuda às Igrejas Orientais» (R.O.A.C.O.)!

1. É-me grato dirigir-vos calorosas boas-vindas, por ocasião da reunião para coordenar os auxílios aos cristãos das Igrejas do Oriente.

Saúdo com afecto o Cardeal Achille Silvestrini, Prefeito da Congregação para as Igrejas Orientais e Presidente da R.O.A.C.O., e agradeço-lhe a saudação que me dirigiu em vosso nome. Saúdo o Secretário, o Subsecretário, os Colaboradores do Dicastério para as Igrejas Orientais, assim como os Responsáveis das Agências e todos vós aqui presentes.

As vossas reuniões semestrais, que tiveram início em 1968, estruturam-se sempre mais e, crescendo na participação e coordenação, registam agora uma eficácia operativa mais comprovada. Sei que nestes últimos anos, foi dedicada uma singular atenção ao método para desenvolver a vossa actividade, em estreita colaboração com as Igrejas Orientais católicas, a cujo serviço quereis trabalhar. A vossa ajuda torna-se assim muito preciosa para o Papa, ao qual consentis exercer, de modo mais diligente, o ministério de presidir «à caridade universal».

Agradeço a todos vós, caros Responsáveis das Agências, a obra que prestais sob a guia da Congregação para as Igrejas Orientais. Através do vosso empenho, aliviais situações de necessidade, fomentais iniciativas sociopastorais, socorreis países divididos por conflitos, ides em socorro de muitas pessoas atingidas pela pobreza e por tantas formas de marginalização.

2. Vós, em particular, sustentais as Comunidades católicas orientais na obra de evangelização. Na iminência do Grande Jubileu, os crentes são chamados a viver de modo mais intenso a fé, na consciência de serem «o fermento e como que a alma da sociedade humana, destinada a renovar-se em Cristo e a transformar-se em família de Deus» (Gaudium et spes GS 41).

Ao lado do testemunho da fé, não pode faltar o serviço da caridade: o anúncio do Evangelho da esperança exige o Evangelho da caridade. Entre os sinais do itinerário jubilar está a «Porta Santa». A indicação da porta é um apelo à responsabilidade de todo o crente a cruzar o limiar da misericórdia (cf. Incarnationis mysterium, 8). «Porta» e «limiar» são sinais daquela caridade, «que abre os nossos olhos às carências daqueles que vivem pobres e marginalizados e cria uma nova cultura de solidariedade e cooperação, na qual todos assumem a sua responsabilidade por um modelo de economia ao serviço de toda a pessoa» (cf. Ibid., 12).

Através da vossa generosa dedicação às necessidades dos irmãos das Igrejas do Oriente, a inteira Comunidade eclesial exerce a sua universal missão pastoral. A criação de uma efectiva co-responsabilidade ajuda a superar a tentação de particularismos egoístas e faz com que se sintam unidos a um único e grande destino diferentes povos, nos quais o Evangelho fez germinar a confiança e a esperança numa nova humanidade.

3. No Jubileu, no centro da atenção eclesial estarão Jerusalém, Nazaré, Belém e a inteira Terra Santa, na qual o Filho de Deus assumiu a nossa carne da Virgem Maria. Sei que já dedicais particular cuidado aos lugares santos e seguis os anseios e as preocupações das Comunidades cristãs locais. Convido-vos sobretudo a não deixar de atender às expectativas dos jovens e a ajudar as famílias cristãs a não perderem a esperança quanto à casa e ao trabalho, apesar das dificuldades socioeconómicas e de um precário contexto ambiental.

Também mediante a tradicional Colecta para a Terra Santa, a Igreja universal torna-se atenta de modo solícito aos irmãos que residem nos lugares sagrados da Redenção. Ao recomendar vivamente esse acto de amor para com os cristãos daquelas regiões, estou certo de que o vosso esforço por fazer chegar ajudas das mais diversas partes do mundo católico, encontrará uma grata correspondência nos Pastores e nos fiéis das Igrejas Orientais católicas e da Comunidade latina da Terra Santa.

Clero e fiéis manifestam a disponibilidade a trabalhar juntos, a programar intervenções e planos pastorais segundo reconhecidas prioridades de evangelização, de caridade e de empenho educativo. É de capital importância a formação de leigos cristãos amadurecidos e responsáveis, capazes de oferecer um corajoso testemunho de fé.

Durante a alegre celebração jubilar, os numerosos peregrinos que visitarem os lugares sagrados da Fé terão a oportunidade não só de compartilhar momentos de oração e de comunhão, mas também de conhecer as obras por vós suscitadas em auxílio à catequese, à animação pastoral e à acção caritativa.

4. Caríssimos Irmãos e Irmãs, exprimo-vos a minha satisfação pela solicitude com que respondeis aos pedidos que vos chegam. Por meu intermédio, manifestam-vos a sua gratidão aquelas comunidades que, mediante o serviço da Congregação para as Igrejas Orientais e da R.O.A.C.O., vêem encorajados os seus esforços orientados para uma retomada mais corajosa do impulso apostólico.

A Mãe de Deus, Maria Santíssima, que «desde o dia da concepção virginal até achar o seu coroamento no Calvário aos pés da cruz» (Incarnationis mysterium, 14), vos confirme nos propósitos e continue «indicando a todos a estrada que conduz ao Filho» (Ibidem).

Com estes votos, de coração concedo uma especial Bênção Apostólica, que de bom grado faço extensiva às Comunidades eclesiais a que pertenceis, aos Organismos que representais e às iniciativas para as quais trabalhais incessantemente.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS CAVALEIROS DA SOBERANA


ORDEM MILITAR DE MALTA


Quinta-feira, 24 de Janeiro de 1999



Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. Por ocasião da solenidade de São João Baptista, vosso santo Padroeiro, quisestes reunir-vos para uma solene celebração na Basílica de São Pedro. Apresento as minhas boas-vindas a cada um de vós e saúdo a inteira Ordem dos Cavaleiros de São João de Jerusalém, chamada Soberana Ordem Militar de Malta, que nestes dias celebrou o próprio Capítulo Geral.

Saúdo de modo particular o Príncipe e Grão-Mestre, Fra Andrew Bertie, o «Cardinalis Patronus», Pio Laghi, o Prelado Monsenhor Donato de Bonis, o Grão-Chanceler e os Dignitários do Soberano Conselho há pouco renovado. A todos desejo bom trabalho ao serviço de Deus, da Igreja e da Ordem. Há mais de novecentos anos, a vossa benemérita Ordem oferece ao mundo um testemunho fiel ao próprio lema: «Tuitio fidei, obsequium pauperum», que corresponde ao mandato evangélico de «amar a Deus e amar o próximo».

2. Vós estais bem persuadidos de que a defesa e o testemunho da fé constituem a base da evangelização, e quereis oferecer o vosso contributo para que a mensagem evangélica continue a iluminar também o terceiro milénio da era cristã, já iminente. Para isto, senti-vos empenhados em traduzir em factos a fidelidade a Cristo mediante o testemunho do amor, que se faz serviço em favor dos irmãos, de modo especial dos pobres: aquilo a que vós justamente chamais «obsequium pauperum». Este amor pelos últimos é validamente testemunhado pela vossa presença ao lado dos doentes, dos que sofrem, das vítimas dos tremores de terra, dos prófugos. Ele qualifica a vossa Ordem religiosa e soberana como válida estrutura que se ocupa do peso do sofrimento do homem.

Permanecei firmes na fidelidade a Cristo, à Igreja e aos pobres. Tende sempre presentes as palavras de Jesus: «O Meu mandamento é este: que vos ameis uns aos outros, como Eu vos amei» (Jn 15,12), e ainda: «Sempre que fizestes isto a um destes Meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes» (Mt 25,40).

Enquanto faço votos por que intensifiqueis a vossa benemérita acção, imploro sobre cada um a protecção materna da celeste Padroeira, a Bem-aventurada Virgem Maria do Monte Filéremo, que sempre vos acompanhou na Pátria e no exílio. Sustente-vos também o Protector da Ordem, São João Baptista, anunciador da presença de Cristo na história do mundo.

Com estes sentimentos, concedo de bom grado a Bênção Apostólica ao Grão-Mestre, a vós aqui presentes e à inteira Soberana Ordem Militar de Malta, de modo particular aos doentes e aos que sofrem, por vós assistidos em todas as partes do mundo.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DO PONTIFÍCIO CONSELHO


PARA A PASTORAL DOS MIGRANTES E ITINERANTES


Sexta-feira, 25 de Julho de 1999



Venerados Irmãos no Episcopado
Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. Para mim constitui motivo de alegria acolher-vos no termo dos trabalhos da reunião plenária do Pontifício Conselho para a Pastoral dos Migrantes e Itinerantes. Saúdo a todos com afecto e, enquanto vos agradeço a visita, exprimo vivo apreço pelo empenho que dedicais ao serviço da Santa Sé. Estou particularmente reconhecido a D. Stephen Fumio Hamao, Presidente desse Pontifício Conselho, pelas amáveis palavras que me dirigiu em vosso nome.

Durante estas jornadas, reflectistes sobre o papel que as peregrinações aos santuários desempenham na vida da Igreja. Estes lugares de oração, como já tive ocasião de ressaltar, são «as pedras miliares que orientam o caminho dos filhos de Deus sobre a terra» (Homilia aos fiéis de Corrientes, Argentina, 9/4/1987: Insegnamenti, X, 1 [1987], 1188). Olhando para a sua rica realidade, é fácil constatar que eles representam um grande dom de Deus à sua Igreja e à inteira humanidade.

2. O homem deseja ardentemente encontrar Deus e as peregrinações habituam-no a pensar no porto aonde ele pode chegar no decurso da sua busca religiosa. Ali o fiel pode cantar com o Salmista a sua sede e fome do Senhor: «Vós, Senhor, sois o meu Deus, anseio por Vós. A minha alma está sedenta de Vós, o meu corpo anela por Vós, numa terra árida, exausta, sem água. Desejo contemplar-Vos no santuário... O Vosso amor é mais precioso do que a vida» (Ps 63,2-4).

Estes «oásis do espírito» oferecem assim à comunidade eclesial um clima singularmente favorável para meditar a Palavra de Deus e celebrar os Sacramentos, em particular da Penitência e da Eucaristia. Neles, além disso, é possível efectuar profícuas experiências de fé, assim como manifestar o próprio amor aos irmãos mediante obras de caridade e de serviço aos necessitados.

Nessa óptica, os Bispos nas várias partes do mundo sempre favoreceram os santuários como centros de profunda espiritualidade, nos quais os crentes, além de reavivarem a própria fé tomam consciência mais clara dos deveres que dela derivam no campo social e se sentem empenhados em oferecer a sua ajuda concreta, para que o mundo se transforme progressivamente naquele reino de justiça e de paz, que as inspiradas palavras de Isaías indicam: «De Sião sairá a lei, de Jerusalém, a palavra do Senhor... Das suas espadas forjarão relhas de arado, e das suas lanças, foices... Não haverá dano nem destruição em todo o meu Monte Santo, porque a terra está cheia da ciência do Senhor, tal como as águas que cobrem o mar» (2, 3; 11, 9).

A paz e a solidariedade entre os homens derivam, considerando as coisas em profundidade, da reconciliação da pessoa com Deus. É preciso, portanto, que os peregrinos encontrem nos santuários concretas possibilidades de oração e de silêncio, para favorecer o encontro com Deus e a íntima experiência da ternura do seu nome. Desta experiência têm particular necessidade os migrantes, os refugiados e os desabrigados, provados por situações dolorosas e injustas; sentem a sua necessidade os marítimos, o pessoal da aviação civil, os nómades e os circenses; dela haurem conforto espiritual todos os que, por diversas razões, estão longe dos próprios entes queridos.

3. Diversas são as atitudes interiores com que as pessoas chegam ao santuário. Muitos fiéis para lá se dirigem a fim de viverem momentos intensos de contemplação e oração, assim como de profunda renovação espiritual. Outros os frequentam de maneira irregular por ocasião de celebrações significativas. Outros ainda só os visitam em busca de repouso, por interesses culturais ou por simples curiosidade. Será tarefa do Ordinário do lugar para os santuários diocesanos e da Conferência Episcopal para os santuários nacionais, fixar as normas pastorais oportunas para fazer com que se ofereça uma adequada resposta às expectativas de cada um. É importante que a todos seja apresentada a iniciativa misericordiosa de Deus, que quer comunicar aos seus filhos a sua própria vida e o dom da salvação. No santuário ressoam as palavras de Cristo aos «pequeninos» e aos «pobres da terra»: «Vinde a Mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e aliviar-vos-ei» (Mt 11,28).

Quando, depois, se tem a possibilidade de acolher meninos e jovens, isto deve impelir os responsáveis pela pastoral dos santuários, em colaboração com a inteira comunidade eclesial, a oferecerem um serviço ainda mais qualificado e adaptado à sua idade.

4. Caríssimos Irmãos e Irmãs, estamos a caminhar rumo ao Grande Jubileu do Ano 2000. No contexto do evento jubilar, a peregrinação assume o valor de sinal excelente do caminho que o cristão é chamado a percorrer e do empenho com o qual deve celebrar o Jubileu (cf. Incarnationis mysterium, 7). Enquanto de coração agradeço a cada um o empenho e a solicitude pastoral que manifestais nas vossas actividades quotidianas, confio os vossos esforços à activa intercessão da Virgem Maria, venerada e invocada nos inúmeros santuários que, em toda a parte do mundo, são testemunhas da sua presença materna no meio dos discípulos de Cristo.

Do encontro comunitário e pessoal com Maria, «Estrela da evangelização» (EN 82), os peregrinos são incentivados a tornar-se, como Ela, anunciadores das «maravilhas» que Deus continua a realizar na sua Igreja. Maria faça sentir a sua presença materna no meio do Povo de Deus que se prepara para cruzar o limiar do terceiro milénio. Com estes sentimentos, concedo de bom grado a Bênção Apostólica a todos vós, aqui presentes, e a quantos vos são queridos.




Discursos João Paulo II 1999 - Cracóvia, 17 de Junho de 1996