Discursos João Paulo II 1999

PAPA JOÃO PAULO II




CARTA DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS FIÉIS E DIOCESES DE ROMA NA IMINÊNCIA


DO GRANDE JUBILEU DO ANO SANTO 2000


Caríssimos Irmãos e Irmãs de Roma!

1. Estamos já próximos do início do Grande Jubileu! Depois de um período de intensa preparação, estamos prestes a cruzar o limiar deste tempo de graça e de perdão, no qual queremos celebrar com alegria e gratidão os 2000 anos desde a Encarnação do Verbo.

Este evento, que envolve toda a Igreja, põe Roma no centro da cristandade e torna-a de maneira especial "cidade sobre o monte" (cf. Mt Mt 5,14), para a qual olham todas as nações. Aqui está a sede de Pedro e dos seus Sucessores, aqui está o coração da Comunidade dos crentes, o centro da difusão do Evangelho. De todos os rincões da terra, para aqui virão os peregrinos a fim de visitar as Basílicas e as igrejas ligadas à memória dos Apóstolos e dos Mártires, assim como ao perene testemunho duma fé fecunda de santidade e de civilização.

Inseridos em Cristo, como herdeiros dos Apóstolos Pedro e Paulo, os cristãos da cidade de Roma constituem o edifício santo, que dá valor actual e extraordinário aos sinais gloriosos do passado. Exorto, portanto, cada um a viver com plena disponibilidade e generosidade esta graça que o Senhor concede à nossa Cidade.

O episódio de Zaqueu, referido pelo evangelista Lucas (cf. 19, 1-10), recorda as maravilhas que a passagem de Jesus opera na vida do homem que livremente Lhe abre a porta da sua casa. O Senhor dá-lhe a capacidade de se converter e de se empenhar no caminho da justiça e do amor para com os outros.

A alegria que Zaqueu experimentou é a mesma que sentem aqueles que encontram Cristo e seguem os seus passos com renovado entusiasmo espiritual. É esta a experiência do Jubileu, uma singular passagem de Jesus pela nossa Cidade.

2. Para este evento extraordinário, estais a preparar-vos há muito tempo. Em particular, a Missão da Cidade, há pouco concluída, abriu as casas, os ambientes e sobretudo o coração de tantos habitantes ao anúncio de Cristo, único Salvador do mundo. É preciso agora consolidar os resultados conseguidos com a Missão, predispondo os espíritos a celebrar o Ano Santo com intensidade de fé e de amor evangélico.

O Jubileu, para os crentes, é tempo propício para saírem de um modo habitual de viver a fé e redescobrirem a amizade verdadeira com o Senhor. É tempo oportuno para dar à conversão o significado de uma ruptura nítida com o pecado, experimentando a alegria do perdão recebido e acolhido. É tempo mais do que nunca favorável para descobrir de novo nas paróquias, nos movimentos e nas várias comunidades a comunhão e a fraternidade, removendo os obstáculos da indiferença, da estraneidade, da rejeição dos outros, e levando à plena realização uma autêntica reconciliação com todos.

É ainda e sempre tempo para fazer ressoar em cada coração e em todos os ambientes o anúncio forte: "Deus ama-te e enviou Jesus Cristo seu Filho para te salvar".

3. Ao falar aos concidadãos na sinagoga de Nazaré, Jesus uniu o ano da graça do Senhor, que a sua presença inaugurava, com o anúncio de uma jubilosa mensagem aos pobres, com a libertação dos prisioneiros, com o dom da visão aos cegos e da liberdade aos oprimidos (cf. Lc Lc 4 Lc Lc 18-20). Ele, desse modo, indicava que celebrar o Jubileu significa também abrir o coração aos nossos irmãos e irmãs, de modo particular àqueles mais pobres e sofredores.

Fiel ao ensinamento do divino Mestre e dos Apóstolos, a Igreja de Roma escreveu ao longo dos séculos páginas luminosas de acolhimento, em especial por ocasião dos jubileus, com sinais concretos e permanentes de amor pelo próximo. No Grande Jubileu do Ano 2000, mais uma vez Roma é chamada a oferecer a hospitalidade evangélica aos peregrinos que chegarão numerosos de todas as partes da Terra.

Para esta finalidade, ao longo do arco do Ano Santo haverá solenes celebrações jubilares comuns e oportunos momentos de encontro e de oração nas paróquias. Todos os que provêm de outras Igrejas locais hão-de partir confortados, se tiverem experimentado como a única fé em Cristo os torna membros a pleno título de uma mesma comunhão eclesial.

É importante, portanto, que estes nossos irmãos encontrem à sua chegada não só uma Cidade pronta a recebê-los e capaz de lhes mostrar lugares repletos de memória, de história e de fé, mas de modo especial uma Comunidade que encarna o Evangelho e manifesta sinais concretos do supremo preceito do amor de Cristo.

4. Nesta perspectiva, dirijo-me a todos vós, filhos desta Igreja cujos inícios foram regados pelo sangue dos Apóstolos, e digo: "Roma cristã, não hesites em abrir as portas das tuas casas aos peregrinos. Exerce com alegria a hospitalidade fraterna, em particular durante os eventos de maior significado e amplitude, como por exemplo o Dia Mundial da Juventude, em programa de 15 a 20 de Agosto de 2000. Toda a estrutura existente nas paróquias, institutos, escolas e em qualquer outro lugar de acolhimento seja posta à disposição deles.

Tornar-te-ás, desse modo, Cidade da hospitalidade como a casa amiga de Marta, Maria e Lázaro em Betânia, onde Jesus se detinha de bom grado, juntamente com os seus discípulos, encontrando conforto físico e espiritual!".

Este convite é dirigido às famílias cristãs, para que experimentem a mesma alegria daqueles que acolhiam Jesus na Galileia, na Samaria e na Judeia; às paróquias e às numerosas comunidades religiosas presentes na Diocese, para que ofereçam pleno e cordial acolhimento aos peregrinos pobres; às Instituições e aos muitos voluntários, para que estejam preparados para responder às necessidades dos peregrinos e tornem, o quanto possível, confortável a permanência em Roma aos anciãos, aos doentes e aos portadores de deficiência.

5. Irmãos e Irmãs de Roma! Esta Carta é para cada um de vós. Enquanto agradeço a vossa disponibilidade, desejo com todo o coração confiar-vos à celeste Mãe de Deus, para que o Grande Jubileu do Ano 2000 seja para vós profunda experiência espiritual e estímulo a crescer na solidariedade fraterna.

Maria que foi a primeira a acolher o Verbo do Pai e com fé amorosa O deu ao mundo inteiro; Ela, que, movida pelo Espírito, abriu o coração à Palavra e pronunciou o seu "sim" à vontade do Pai, ajude os habitantes de Roma a abrirem de par em par, com espírito dócil, as portas a Cristo, nosso Redentor. Com o seu coração de Mãe, fale a quem é indiferente ou vive uma fé sem obras e sem entusiasmo, a quem está distante e às vezes até é contrário ao Evangelho. Pela sua intercessão, possa esta nossa Cidade tornar-se protagonista de fé autêntica e construtora da civilização do amor.

As numerosas imagens marianas, que ornam as igrejas e as ruas da Cidade, testemunham uma devoção incessante dos romanos para com Maria. A Ela, juntamente com todos vós, digo: "Virgem Mãe de Deus, abençoa Roma e quantos nela vivem; protege as crianças e os jovens, as famílias e as paróquias, os doentes e os que sofrem, as pessoas sozinhas e quantos perderam a esperança. Mostra a todos Jesus, o fruto bendito do teu seio, para que Ele transforme todo o homem e toda a mulher desta Cidade em testemunha crível de esperança e de paz".

Com estes votos, envio de bom grado a cada um de vós, caríssimos Irmãos e Irmãs, a minha Bênção, para que o Senhor, por intercessão de Maria, "Salus populi romani", dos Apóstolos Pedro e Paulo e de todos os Santos, realize em vós a obra que Ele iniciou.

Vaticano, 1 de Novembro de 1999, solenidade de todos os Santos.

PAPA JOÃO PAULO II




CARTA DO PAPA JOÃO PAULO II


POR OCASIÃO DA REABERTURA AO CULTO


E DA DEDICAÇÃO DA CATEDRAL DE SANTO ANTONINO




Ao venerado Irmão

SALVATORE NUNNARI

Arcebispo de Santo Anjo dos
Lombardos-Conza-Nusco-Bisaccia

1. A feliz reabertura ao culto da Catedral dedicada "ab antiquo" a Santo Antonino, Diácono e Mártir, e semidestruída pelo trágico sismo de 23 de Novembro de 1980, oferece-me a ocasião para me dirigir, mais uma vez, aos fiéis dessa querida Arquidiocese, sempre presente nos meus pensamentos e próxima do meu coração.

Realiza-se, finalmente, uma longa expectativa e cumpre-se um desejo sonhado desde há dezanove anos: como família de Deus ter uma "Casa", na qual viver de maneira mais intensa a comunhão com o Pai e com os irmãos.

Com afecto saúdo-o, venerado e amado Irmão no Episcopado, que há apenas alguns meses iniciou com solerte generosidade o seu serviço pastoral à Arquidiocese. Dirijo o meu fraterno pensamento aos sacerdotes, aos diáconos, aos religiosos, às religiosas, aos seminaristas. Saúdo com deferência as Autoridades civis, políticas e militares. Envio um abraço cordial às mães e aos pais de família, aos jovens, às crianças e, de modo singular, a quantos se encontram no sofrimento, em limitações físicas ou espirituais, e àqueles que estão sem trabalho. A todos e a cada um repito com o apóstolo Paulo: "Graça e paz da parte de Deus Pai e de nosso Senhor Jesus Cristo" (Ga 1,3).

A reconstrução da antiga Catedral de Santo Anjo dos Lombardos evoca o longo caminho do Povo de Deus nessa terra e testemunha a fé conservada íntegra ao longo dos séculos, também em momentos de graves provações e calamidades. Aplicam-se bem, portanto, à experiência dessa Comunidade as palavras de Deus, proclamadas pelos lábios do profeta Sofonias: "Não temas Sião! Não se enfraqueçam as tuas mãos! O Senhor, teu Deus, está no meio de ti como poderoso salvador!" (3, 16).

2. O período entre os anos 1073 e 1085, ao qual remonta a fundação da Catedral, constitui uma etapa importante para a vossa Terra. O primeiro edifício, do qual permanecem alguns restos significativos, revive na actual Catedral de Santo Antonino, como sinal da perseverante adesão desse Povo ao Evangelho. A memória do templo originário, testemunho concreto da fé dos antepassados, ajuda os cristãos de hoje a não perderem a sua identidade e impele-os a olhar para o futuro com sólida esperança. A preciosa relíquia do braço de Santo Antonino, conservada numa teca de prata, trazida de Valença, na Espanha, para essa igreja e que no entanto permaneceu intacta no decurso dos trágicos eventos, constitui como que uma promessa de socorro celeste. Ela testemunha que Deus não abandona os seus filhos no momento da provação e recorda que, para construir um futuro de paz, de fraternidade e de justiça, é preciso conservar íntegro o património de fé transmitido pelos santos das precedentes gerações, primeiro dos quais o Padroeiro Antonino, que a Igreja venera como Diácono e Mártir.

O templo feito de pedras constitui um sinal tangível da Igreja viva, construída sobre o fundamento dos Apóstolos e que tem como pedra angular o próprio Cristo Jesus. Nela, como recorda o Concílio Vaticano II, os crentes estão inseridos como pedras vivas para formar sobre esta terra um templo espiritual (cf. Const. dogm. Lumen gentium LG 6). "Vós sois o edifício de Deus" (1Co 3,9), recordava o apóstolo Paulo aos Coríntios e, por ocasião da dedicação de uma igreja, a Comunidade litúrgica dirige-se assim ao Senhor: "Vós nos destes a alegria de Vos construir entre as nossas casas uma morada onde continuais a cumular de favores a vossa família peregrina sobre a terra e ofereceis-nos o sinal e o instrumento da nossa comunhão Convosco. Neste lugar santo, somos por Vós edificados como templo vivo e reunis e fazeis crescer como corpo do Senhor a vossa Igreja espalhada pelo mundo, até que alcance a sua plenitude na visão de paz da cidade celeste, a santa Jerusalém" (Prefácio da Dedicação).

Convocado no nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, o Povo de Deus recebe nesse lugar santo o dom da salvação nos Sacramentos e, mediante a escuta da Palavra e a "fracção do Pão", abre-se ao amor de Deus para estar pronto a servir os irmãos, de modo especial os mais pobres e necessitados.

Portanto, à luz destes dados de fé formulo votos por que as celebrações para a reabertura da vossa Catedral sejam para todos ocasião de renovada e generosa resposta à chamada do Senhor. Deus conceda à vossa amada Arquidiocese continuar a ser sinal de entendimento e de diálogo, fonte de vocações ao serviço da nova evangelização, exemplo de corajosa adesão ao espírito das Bem-aventuranças.

3. Sei quanto a história da Catedral está intimamente ligada aos eventos alegres e dolorosos da Cidade e da Arquidiocese. As alternas vicissitudes de construção, destruição e reconstrução evocam momentos de tristeza e de morte, bem presentes na memória do povo. Porém, elas constituem também testemunhos eloquentes da grandeza e da constância da fé dos vossos antepassados e de todos vós, que jamais renunciastes ao propósito de reedificar essa igreja-mãe da Comunidade eclesial.

Intimamente ligada à pessoa do Bispo, a Catedral é, com efeito, "mãe" de todas as igrejas da Diocese. Mediante a Catedral e na Catedral manifesta-se a "comunhão" da inteira Comunidade diocesana, unida ao Bispo de modo especial na celebração eucarística. Eis por que bem oportunamente o Concílio Vaticano II reafirma que se deve dar "a maior importância à vida litúrgica da diocese que gravita em redor do Bispo, sobretudo na igreja Catedral, convictos de que a principal manifestação da Igreja se faz na participação perfeita e activa de todo o Povo santo de Deus nas mesmas celebrações litúrgicas, especialmente na mesma Eucaristia, numa única oração, ao redor do único altar a que preside o Bispo rodeado pelo presbitério e pelos ministros" (Sacrosanctum concilium SC 41).

Desejaria exortar os irmãos e irmãs dessa querida Arquidiocese a amar e conservar com zelo constante a sua Catedral. Ela seja para cada um a casa da oração, o templo santo, o lugar da presença do Deus vivo e da familiaridade com Ele; estimule a inteira comunidade a ser unida e solidária, de maneira a pregustar na liturgia e na caridade fraterna alguma coisa da futura bem-aventurança celeste.

Sobre cada um se estenda a protecção do celeste Padroeiro, Santo Antonino, e sobretudo a assistência materna da Virgem Mãe da Igreja. A Maria confio as expectativas e as dificuldades, os propósitos e as esperanças da inteira Arquidiocese, que está empenhada num caminho de sempre mais sólido entendimento e cooperação entre o Bispo e os sacerdotes, entre o clero, os religiosos e cada um dos componentes do povo cristão. Para todos e para cada um a Virgem seja Mãe e sustento.

Da minha parte, enquanto renovo os mais ardentes sentimentos do meu constante e fraterno afecto, concedo-lhe, também aos colaboradores e à inteira Arquidiocese, a confortadora Bênção Apostólica.

Vaticano, 1 de Novembro de 1999, solenidade de Todos os Santos.

PAPA JOÃO PAULO II




DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PEREGRINOS DA POLÓNIA


VINDOS PARA O DIA DO SEU ONOMÁSTICO


Quinta-feira, 4 de Novembro de 1999

1. Apresento cordiais boas-vindas a vós aqui presentes, vindos para o encontro hodierno. Dirijo palavras de particular saudação aos peregrinos da Arquidiocese de Danzigue e da Diocese de Tarnów e aos seus Pastores, D. Tadeusz Goclowski e D. Wiktor Skworc. Agradeço-lhes as palavras que me dirigiram. Saúdo também D. Zygmunt Pawlowicz e o Bispo Emérito, D. Piotr Bednarczyk. Saúdo os representantes das autoridades civis de Danzigue, de Sopot, de Gdynia, das autoridades locais e das autoridades territoriais de Pomorze. Dirijo palavras de boas-vindas também aos representantes das autoridades locais das cidades de Nowy Sacz e de Stary Sacz, assim como de Grybów, do Município de Limanowa e dos Municípios da terra de Sacz. Saúdo os representantes do clero e todos os fiéis.

Agradeço-vos não ter esquecido o Papa. Hoje de modo particular agradeço este bonito cântico, que me recorda a visita à Polónia no mês de Junho passado. Escutei com comoção as felicitações que me dirigistes e também cantastes. É mérito dos coros e das bandas aqui presentes, que saúdo de todo o coração.

2. Hoje, juntamente convosco, quero celebrar São Carlos Borromeu, do qual recebi o nome no santo Baptismo. Ele pertence às mais importantes figuras da Igreja católica. Este Bispo e Cardeal é um exemplo de pastor zeloso, dedicado totalmente à causa de Deus, e capaz de se doar sem medidas, sem fatigas nem sacrifícios. Morreu jovem, com apenas 46 anos, consumado por um trabalho sobre-humano e afligido pelas penitencias. A Igreja deve-lhe muitíssimo. Foi precisamente graças a ele que o Concilio de Trento pude levar a bom termo os seus trabalhos. São Carlos Borromeu estava também entre aqueles que foram os primeiros a empreender, com solicitude, a actuação da renovação pós-conciliar. Os frutos da fadiga pastoral de São Carlos perduram na Igreja ambrosiana e também até aos nossos tempos. Graças a eles, num certo sentido, sentimos a sua continua presença. Várias vezes visitei o seu túmulo, que se encontra na cripta da catedral de Milão. Em Roma, na Basílica a ele dedicada (San Carlo in Corso) é conservado o seu coração, num apropriado relicário.

Durante a peregrinação na Polónia no mes de Junho eu dizia-vos, na homilia em Stary Sacz, que "os Santos não passam". Essas palavras referem-se a Santa Kinga, mas também a todos os Santos e Beatos da Igreja universal. Referem-se também a Santo Adalberto - Padroeiro da Igreja de Danzigue, cujo milénio de canonização celebrámos naquela cidade - referem-se também a Santo Estanislau e a Sao Carlos Borromeu. Ao meditarmos a longa história da Igreja, experimentamos plenamente este inefável mistério da santidade. Experimentamos de modo claro como "os Santos não passam". São sempre actuais, sempre presentes, o seu exemplo atrai sempre os outros e exorta-os a empreender o caminho da perfeição. Estas palavras adquirem uma força particular aqui em Roma, junto dos túmulos dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo.

3. Em Stary Sacz eu disse ainda algo mais, isto é: "Os Santos vivem da santidade e tem sede de santidade". Com a sua vida demonstraram que a santidade é possível e a exigem também de nós. O homem é chamado à santidade, e as palavras de Cristo: "Sede, pois, perfeitos, como é perfeito vosso Pai celeste" (Mt 5,48), são uma confirmação disto.

O mundo de hoje, e também a nossa Pátria, tem necessidade de homens santos, quer dizer, de homens rectos, que cumprem com fidelidade a vontade de Deus, repletos de espírito de serviço e de solicitude pelo homem. De homens honestos que amam a verdade, que se empenham pelo bem comum, até à custa de uma generosa renúncia ao que lhe é próprio. "Hoje o mundo e a Polónia tem necessidade de homens de coração grande, que sirvam com humildade e amor, que bendigam e não amaldiçoem, que conquistem a terra com a bênção" - assim eu vos dizia em Danzigue.

Hoje agradecemos aos Santos, nossos irmãos e irmãs, o exemplo que nos deixaram e ter-nos indicado a via, ao longo da qual devemos caminhar rumo ao novo milénio. Não é possível construir o futuro sem referência a Deus, que "amou de tal modo o mundo que lhe deu o seu Filho único, para que todo o que n'Ele crer não pereça, mas tenha a vida eterna" (Jn 3,16).

Quero mais uma vez, nesta ocasião, exprimir a minha gratidão a todos aqueles que estão aqui presentes. Agradeço-vos a oração, que é um invisível vínculo que une a comunidade dos crentes. É um vínculo muito forte e profundo. Procuro retribuir a todos com a prece quotidiana. Deus vos abençoe, a vós, às vossas famílias e àqueles que não puderam estar presentes aqui, embora muito o desejassem.

Deus abençoe toda a nossa Pátria!



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


À ASSEMBLEIA PLENÁRIA


DO PONTIFÍCIO CONSELHO "JUSTIÇA E PAZ"




Excelências!
Queridos amigos!

1. Para mim é sempre uma alegria receber os Membros do Pontifício Conselho "Justiça e Paz", juntamente com alguns dos seus Consultores, por ocasião da Assembleia Plenária. Este ano, ela coincide com a minha visita apostólica na Índia e não me permite receber-vos. Contudo, o vosso Presidente, D. Francis-Xavier Van Thuân, informou-me acerca do programa da Assembleia, e desejo, através desta mensagem, saudar-vos e invocar sobre a vossa obra a bênção de Deus.

Durante a sua longa história, o Pontifício Conselho "Justiça e Paz" desempenhou um importante papel na promoção da doutrina social da Igreja. Fundado a pedido do Concílio Vaticano II, ele está chamado a oferecer a todo o Povo de Deus um conhecimento mais completo do seu papel no favorecimento do progresso da família humana, sobretudo dos seus membros mais pobres, perseguindo a justiça social entre os povos e as nações (cf. Motu proprio, 6 de Janeiro de 1967).

A sua finalidade foi sempre, e hoje é mais que nunca, global. Na vigília do Grande Jubileu, continuai a mostrar a vossa determinação em permanecer fiéis a esta missão.

2. Os recentes esforços realizados pelo Pontifício Conselho a fim de difundir o conhecimento da doutrina social da Igreja, quiseram tornar os responsáveis, quer eclesiásticos quer leigos, cada vez mais atentos ao próprio dever de promover a dignidade de todas as pessoas humanas, enfrentando problemáticas tais como a eliminação da miséria e a promoção duma abordagem efectiva dos direitos do homem. Enfrentastes com bom êxito estas questões directamente em várias partes do mundo, procurando ajudar as Igrejas locais a organizar seminários sobre a doutrina social da Igreja, no âmbito dos seus contextos específicos. Ao fazer isto na África, na Ásia e na América Latina exprimis plenamente o espírito do Grande Jubileu, que deseja ser um tempo de libertação e de restabelecimento da igualdade e da paz entre os povos (cf. Lv Lv 25). Fazeis isto com espírito evangélico, visto que a liberdade, a justiça e a paz autênticas são dons de um Deus amoroso que procura a colaboração de todos os que criou no amor. Encorajo os vossos esforços destinados a tornar a prática da doutrina social da Igreja um empenho sentido de maneira cada vez mais profunda entre os fiéis.

Com o mesmo espírito, sustentastes e promovestes esforços ao participar em encontros regionais e internacionais, a fim de ajudar os Países mais pobres a libertarem-se do peso da dívida e do subdesenvolvimento e de pôr fim aos conflitos internos.

3. No ano passado, confiei ao Pontifício Conselho a tarefa de elaborar um "compêndio ou síntese autorizada da doutrina social católica" que mostrasse a conexão entre ela e a nova evangelização (Ecclesia in America ).

Este documento ajudará os membros da Igreja a compreender melhor a importância desta doutrina. O Jubileu é para esta publicação uma oportunidade excelente. O próprio conceito de Jubileu, que comemora o nascimento de Jesus, significa anunciar a Boa Nova aos pobres, mandar em liberdade os oprimidos e recuperar a vista aos cegos (cf. Mt Mt 11,4-5 Lc 7,22), aliviar as pessoas das suas dívidas e restituir a terra (cf. Lv Lv 25,8-28), questões que o Pontifício Conselho enfrentou com eficácia durante os últimos anos de preparação para este grande acontecimento.

4. Por ocasião desta Assembleia Plenária, tomareis em consideração a actual crise ambiental à luz da doutrina social da Igreja. A problemática ambiental está estreitamente ligada com outras importantes questões sociais, porque o ambiente inclui quanto nos circunda e tudo aquilo de que depende a vida humana. Por isto, é importante uma correcta abordagem do problema.

A respeito disso, a reflexão sobre o fundamento bíblico da solicitude pela Criação pode esclarecer o dever de promover um ambiente sadio e saudável.

O uso dos recursos da terra é outro aspecto importantíssimo da questão ambiental. A análise deste problema complexo toca o centro da organização da sociedade moderna. Reflectindo sobre ambiente, à luz das Sagradas Escrituras e da doutrina social da Igreja, não podemos ignorar o problema do estilo de vida promovido pela sociedade moderna, e sobretudo a questão relacionada com a desigual distribuição dos benefícios do progresso. O Pontifício Conselho prestará um precioso serviço à Igreja, e através dela a toda a humanidade, promovendo uma compreensão mais profunda do dever de trabalhar a fim de se permitir que as pessoas, com base numa maior justiça e igualdade, partilhem os recursos da Criação.

5. Por ocasião do vosso encontro, invoco de todo o coração as bênçãos divinas sobre todos os Membros e Consultores do Conselho. Agradeço a todos vós a enorme ajuda que prestais à Santa Sé com base nas vossas específicas capacidades e na vossa rica e múltipla experiência em numerosas partes do mundo. A graça e a paz de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja com todos vós e com os membros das vossas famílias! Com a minha Bênção apostólica.

Vaticano, 4 de Novembro de 1999.

PAPA JOÃO PAULO II




JOÃO PAULO II



AOS REPRESENTANTES DE VÁRIAS RELIGIÕES


E OUTRAS CONFISSÕES CRISTÃS


Nova Déli, 7 de Novembro de 1999

Ilustres responsáveis religiosos
Queridos amigos!

1. É para mim motivo de grande alegria visitar mais uma vez a querida terra da Índia e, sobretudo, ter a oportunidade de vos saudar, Representantes de diferentes tradições religiosas, que encarnais não só os grandes progressos do passado, mas também a esperança de um futuro melhor para a família humana. Agradeço ao Governo e ao povo da Índia o acolhimento que me reservaram. Venho até vós como peregrino de paz e como viajante pelo caminho que leva à completa satisfação dos mais profundos desejos humanos. Por ocasião do Diwali, a festa das luzes, que simboliza a vitória da vida sobre a morte, do bem sobre o mal, exprimo a esperança de que este encontro fale a todo o mundo do que nos une: as nossas comuns origem humana e destino, a nossa partilhada responsabilidade pelo bem-estar e o progresso das pessoas e a necessidade de luz e de força que procuramos nas nossas convicções religiosas. Ao longo dos séculos e de várias maneiras, a Índia ensinou a verdade que também os grandes mestres cristãos propõem, isto é, que os homens e as mulheres "por instinto" estão profundamente orientados para Deus e O procuram no mais profundo do seu ser (cf. S. Tomás de Aquino, Summa theologiae, III, q. 60, art. 5, 3). Sobre esta base, tenho a certeza de que, juntos, poderemos empreender com bom êxito o caminho da compreensão e do diálogo.

2. A minha presença aqui entre vós quer ser um ulterior sinal do facto que a Igreja católica deseja dar continuidade, de maneira cada vez mais intensa, ao diálogo com as outras religiões do mundo. Ela considera este diálogo um acto de amor que afunda as suas raízes no próprio Deus. "Deus é amor", proclama o Novo Testamento, "quem permanece no amor permanece em Deus, e Deus permanece nele... amemos, porque Ele nos amou primeiro... pois, quem não ama o seu irmão, a quem vê, não poderá amar a Deus, a Quem não vê" (1Jn 4,16 1Jn 4,19-20).

É sinal de esperança que as religiões do mundo estejam a tornar-se cada vez mais conscientes da sua responsabilidade comum pelo bem-estar da família humana. Esta é uma parte crucial da globalização da solidariedade que deve existir, para que o mundo futuro seja melhor. Este sentido de responsabilidade partilhada aumenta à medida que descobrimos o que temos em comum enquanto homens e mulheres religiosos.

Quem de nós não deve enfrentar o mistério do sofrimento e da morte? Quem é que não considera a vida, a verdade, a paz, a liberdade e a justiça valores extremamente importantes? Quem não está convencido de que a bondade moral está sadiamente enraizada na abertura da sociedade e do indivíduo ao mundo transcendente da divindade? Quem é que não acredita que o caminho rumo a Deus requer a oração, o silêncio, o ascetismo, o sacrifício e a humildade? Quem é que não se preocupa por um progresso científico e técnico, que deveria ser acompanhado de uma autoconsciência moral e espiritual? E quem é que não pensa que os desafios, perante os quais a sociedade se encontra agora, podem ser enfrentados unicamente edificando uma civilização do amor, baseada em valores universais de paz, solidariedade, justiça e liberdade? E que isto só pode ser realizado através do encontro, da compreensão recíproca e da cooperação?

3. O caminho que temos à nossa frente é difícil e somos sempre tentados a escolher uma via de isolamento e de divisão que leva ao conflito. Isto, por sua vez, desencadeia aquelas forças que tornam a religião um pretexto para a violência, como se verifica com muita frequência no mundo. Recentemente, recebi com prazer no Vaticano os representantes das religiões do mundo, que se reuniram para desenvolver os resultados do encontro de Assis de 1986. Repito aqui quanto declarei perante aquela distinta assembleia: "A religião não é, e não deve tornar-se, um pretexto para conflitos, sobretudo quando a identidade religiosa, cultural e étnica coincidem. A religião e a paz caminham a par e passo: declarar guerra em nome da religião é uma evidente contradição". Sobretudo os Responsáveis religiosos têm o dever de fazer o possível a fim de garantir que a religião seja o que Deus deseja, uma fonte de bondade, respeito, harmonia e paz! Eis o único modo para honrar Deus na justiça e na verdade!

O nosso encontro interpela-nos a lutar para discernir e acolher quanto há de bom e santo em nós, de forma a podermos reconhecer, tutelar e promover as verdades morais e espirituais, as únicas que garantem o futuro do mundo (cf. Nostra aetate, NAE 2). Neste sentido, o diálogo jamais é uma tentativa de impor as nossas opiniões ao próximo, porque um diálogo desta natureza tornar-se-ia uma forma de domínio espiritual e cultural. Isto não significa abandonar as nossas convicções. Significa que, firmes naquilo em que cremos, escutamos o próximo com respeito, procurando discernir o que é bom e santo e o que favorece a paz e a cooperação.

4. É essencial reconhecer que existe um vínculo estreito e indissolúvel entre a paz e a liberdade. A liberdade é a prerrogativa mais nobre da pessoa humana e uma das principais exigências da liberdade é o livre exercício da religião na sociedade (cf. Dignitatis humanae, DH 3). Nenhum Estado nem grupo tem o direito de controlar, quer directa quer indirectamente, as convicções religiosas de uma pessoa, nem pode com razão reivindicar o direito de impor ou de impedir a profissão pública e a prática da religião ou o respeitoso apelo de uma particular religião à livre consciência das pessoas. Celebrando-se neste ano o cinquentenário da Declaração Universal dos Direitos do Homem, escrevi que "a liberdade religiosa constitui o coração dos direitos humanos. É de tal modo inviolável que exige que se reconheça à pessoa inclusivamente a liberdade de mudar de religião, se a sua consciência o pedir. Com efeito, cada um tem o dever de seguir em todas as ocasiões a sua consciência, e não pode ser forçado a agir contra ela (cf. Artigo 18)" (Mensagem por ocasião do Dia Mundial da Paz de 1999, n. 5).

5. Na Índia, o caminho do diálogo e da tolerância foi a via seguida pelos grandes Imperadores Ashoka, Akbar e Chatrapati Shivaji, por homens sábios, tais como Ramakrishna Paramahamsa e Swami Vivekananda e por figuras luminosas tais como o Mahatma Gandhi, Gurudeva Tagore e Sarvepalli Radhakrishnan, que compreenderam profundamente que servir a paz e a harmonia é uma tarefa santa. Existem pessoas que, tanto na Índia como noutras partes, ofereceram um significativo contributo ao incremento da consciência da nossa fraternidade universal e nos orientam rumo a um futuro, no qual satisfaremos o nosso profundo desejo de cruzar a porta da liberdade, porque o faremos juntos. Escolher a tolerância, o diálogo e a cooperação como caminho para o futuro significa tutelar o que há de mais precioso no ingente património religioso da humanidade. Serve também para garantir que no decurso dos próximos séculos o mundo não permaneça sem aquela esperança que é a linfa vital do coração humano. Que o Senhor do céu e da terra no-lo conceda agora e sempre!




Discursos João Paulo II 1999