Discursos João Paulo II 1999 - Segunda-feira, 15 de Novembro de 1999

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


POR OCASIÃO DA VISITA


À PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE LATERANENSE


PARA A INAUGURAÇÃO DO ANO ACADÉMICO


Terça-feira, 16 de Novembro de 1999

Senhores Cardeais
Veneráveis Irmãos no Episcopado
Ilustres Professores
Caríssimos Estudantes!

1. Aceitei de bom grado o convite para presidir a solene abertura do Ano Académico e encontrar todos os que, de diversos modos, fazem parte da grande família universitária lateranense. Obrigado pelo vosso caloroso acolhimento! Obrigado por este renovado testemunho de fidelidade e devoção ao Sucessor de Pedro!

Em primeiro lugar a minha cordial saudação dirige-se ao Cardeal Camillo Ruini, Grão-Chanceler desta Universidade. Com ele saúdo os Senhores Cardeais e os Bispos presentes, bem como o Reitor Magnífico, D. Ângelo Scola, a quem agradeço as gentis expressões de boas-vindas que me dirigiu em nome de toda a Comunidade universitária.

O meu deferente pensamento dirige-se, também, aos Senhores Embaixadores, aos Reitores Magníficos das Universidades Eclesiásticas e Civis, aos Reitores dos Seminários e dos Colégios, aos patrocinadores e aos benfeitores que participam neste solene Acto académico.

Por fim, desejo dirigir-me com afecto a vós, Professores e queridos estudantes, que empregais quotidianamente as vossas energias na investigação exaltante e fadigosa da verdade. Hoje o vosso empenho pode beneficiar dos novos locais que acabei de benzer, das reformas estatutárias recentemente aprovadas e da actualizada gestão técnico-administrativa, que garantem à Pontifícia Universidade Lateranense e ao Pontifício Instituto João Paulo II para os Estudos sobre Matrimónio e Família um governo e uma rede de serviços profundamente unitários, no respeito da autonomia das duas Instituições e da sua vocação académica de alcance romano e, ao mesmo tempo, universal.

2. Reflectindo sobre as origens da Universidade, encontramo-nos quase a reler uma página da própria história da Igreja que, como se sabe, foi promotora dos mais antigos Ateneus europeus.

Na época moderna a reforma iluminista da Universidade quis responder às perguntas essenciais acerca do homem e do seu destino, partindo da Revelação. Em muitos casos, a própria teologia viu-se, por assim dizer, expulsa da Instituição académica depois de ter sido durante séculos o seu centro.

Contudo, no actual contexto cultural a reorganização das pretensões exclusivistas da religião e a constatada aridez do relativismo agnóstico parecem concentrar de novo a atenção universitária sobre a investigação acerca da integridade do humanum.

Como legítimos herdeiros da tradição académica das escolas medievais, as Universidades "eclesiásticas" são chamadas a tornar-se protagonistas deste despertar, em fecunda colaboração com numerosos pesquisadores do mundo universitário especialmente católico.

3. Esta renovada atenção ao homem no seu intrínseco vínculo com o ser e com o interrogativo acerca de Deus, alarga o nosso olhar às tarefas próprias das Faculdades e dos Institutos operantes na Universidade Lateranense.

A Faculdade de Teologia está chamada a assumir a incessante tensão do intellectus fidei, para penetrar de maneira cada vez mais profunda o mistério de Deus, e a propô-lo na "linguagem" da actual geração.

Por outro lado, a Faculdade de Filosofia confronta-se com o progresso contínuo das ciências da natureza e do homem e, por outro, com a perda de um nível superior de reflexão, quer ele seja de filosofia do homem ou metafísico (cf. Fides et ratio FR 83), a partir do qual rever, ordenar e integrar os outros graus da experiência e do conhecimento, para se abrir depois ao diálogo fecundo com a fé.

O Pontifício Instituto Utriusque Iuris, com a sua particular fisionomia científica, alimentada por uma detalhada visão da história dos direitos, está chamado a remotivar os princípios do ordenamento jurídico canónico e civil, através da colaboração destes "dois ramos" do seu saber.

O Pontifício Instituto Pastoral "Redemptor hominis", que há alguns anos dedica particular atenção à Doutrina Social da Igreja, deverá reflectir sobre a urgência de uma eficaz acção eclesial, a fim de fazer com que nos ambientes religiosos, culturais, sociais, políticos e económicos seja recebida a verdade fundamental recordada pelo Concílio Vaticano II, isto é, que o homem é "a única criatura sobre a terra que Deus quis por si mesma" (Gaudium et spes GS 24).

Por fim, desejo ressaltar ainda a importância da investigação acerca do desígnio de Deus sobre a pessoa, o matrimónio e a família, que se realiza no Pontifício Instituto "João Paulo II" para os Estudos sobre Matrimónio e Família, recordada também por ocasião do recente encontro com o Corpo docente de todas as suas secções internacionais (cf. L'Osserv. Rom Agosto de 1999).

4. Para responder a estes desafios é necessário o contributo de todas as componentes universitárias, inclusive daquelas realidades académicas que, nos diversos continentes, estão de vários modos relacionadas com a Universidade Lateranense. Através delas, o vosso Ateneu contribui para determinar os limites ideais e efectivos da Universidade do terceiro milénio, que se irradia, além do continente europeu, a nível planetário. Assim como a Universitas medieval participou na formação da identidade europeia, de forma análoga a Universidade do terceiro milénio é chamada a fazer crescer a nova consciência de pertença à inteira família de homens e povos.

Nesta obra, a vossa tarefa específica será testemunhar como esta consciência se funde em Jesus Cristo, que é o Alfa e o Ómega, a Raiz e o Rebento, o Princípio e o Fim.

5. Queridos professores e estudantes da Alma Mater Lateranensis, que tem a honra e o dever de ser de forma especial a "Universidade do Papa", tende sempre a solicitude pela unidade criativa e dinâmica entre fé e intellectus fidei. Ela, como recorda Santo Anselmo, está exposta ao drama do pecado pelo qual "a verdade fala claramente e, não obstante, o íntimo permanece insensível" (Oratio ad Sanctum Paulum, 82-84). Esta consciência deve levar à busca da unidade eficaz entre os diversos âmbitos pedagógicos, através duma coordenação sempre mais efectiva e cordial entre os responsáveis da vossa Instituição universitária e dos educadores dos seminários e dos colégios, sobretudo dos que se encontram na diocese de Roma.

Com estes votos, confio a Maria Mater Ecclesiae este novo Ano académico, que requer de cada um de vós empenho, audácia e fidelidade, na imediata obediência à "Verdade" que vem do alto, garantida pelo Magistério autêntico da Igreja. O Papa apoia-vos, acompanha-vos e com afecto a todos abençoa.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO PRESIDENTE DAS "SEMANAS SOCIAIS


DA FRANÇA" NA SUA 74ª EDIÇÃO




Ao Senhor Jean BOISSONNAT
Presidente das Semanas Sociais da França

1. Na vigília do Grande Jubileu do Ano 2000, é particularmente importante que as Semanas Sociais da França abordem o tema De um século a outro, o Evangelho, os cristãos e os desafios da sociedade, durante a sua 74ª sessão que se realiza em Paris de 25 a 28 de Novembro, quase cem anos após a sua fundação em 1904. Dou graças ao Senhor pelo trabalho que a vossa Instituição levou a cabo ao longo do século XX, no espírito da Encíclica de Leão XIII Rerum novarum. Mediante a oração, associo-me aos organizadores e aos participantes neste encontro, pedindo ao Espírito Santo que torne fecundos os trabalhos desta nova sessão.

Dez anos depois da queda do muro de Berlim e no actual contexto de globalização, alegro-me pela reflexão alargada que quereis fazer acerca dos problemas complexos que a realidade política, económica e social apresenta à nossa sociedade, fundamentando-vos na doutrina social da Igreja, com o desejo de realizar uma obra inovadora para preparar o futuro, sobretudo na Europa. De modo especial, é importante desenvolver uma cultura social cujo centro seja o homem como pessoa e como membro de um povo.

2. As diferentes Semanas Sociais foram encontros significativos na origem de numerosas transformações na vida pública e uma bonita página de história do catolicismo social, escrita sob a inspiração de Marius Gonin e de Adéodat Boissard. Elas inspiraram inúmeros fiéis que, no seu empenhamento, quiseram viver os princípios sobre os quais está assente o ensinamento social da Igreja. Os vários presidentes que se sucederam, Henri Lorin, Eugène Duthoit e muitos outros, desejaram servir a Igreja mediante a difusão da sua mensagem social. Em 1954, o meu Predecessor Papa Pio XII escrevia ao Senhor Charles Flory, então presidente: "Tanto ontem como hoje as Semanas Sociais, firmes na doutrina, corajosas na investigação e fraternas na colaboração de todos, devem ser para os católicos e os seus diversificados movimentos uma encruzilhada viva em que, à luz de exposições substanciais, se confrontem as experiências, se forjem as convicções e se amadureçam as iniciativas de acção".

3. Para se proceder a um discernimento cristão genuinamente fecundo sobre os problemas da sociedade, é necessário ter em conta em primeiro lugar o Evangelho e, por conseguinte, a atitude mesma de Jesus; Cristo é o paradigma de todo o comportamento humano. "A mensagem social do Evangelho não deve ser considerada uma teoria, mas sobretudo um fundamento e uma motivação para a acção" (Centesimus annus CA 57). O Senhor revela-nos a verdade acerca do homem e convida-nos a prestar atenção a todas as pessoas, de maneira particular as mais débeis e frágeis da nossa sociedade. A Escritura e os Padres da Igreja exortam incessantemente os homens a entretecer relações de caridade, fraternidade, solidariedade e justiça (cf. Filémon, Phm 16-17 Didaqué; Carta Barnabé; São Justino, Diálogos Phm 11,2). A vida das primeiras comunidades cristãs e daquelas do período patrístico é também um exemplo inestimável. Neste espírito, sem dúvida será útil referir-se a autores como Santo Ambrósio e São João Crisóstomo, que souberam evidenciar as consequências sociais das exigências evangélicas e responder às diversas e novas situações que os cristãos de então deviam enfrentar. Desde os primeiros séculos, os cristãos empenharam-se na vida social para corresponder às necessidades que surgiam nessa época.

Pensa-se sobretudo na reflexão e na actividade sociais do século IV, devidas em particular a Melânia a anciã e a Rufino, a Paládio e a Inocêncio o italiano, a Melânia a jovem e ao seu marido Pinianus, nos arredores de Jerusalém, como nos refere Basílio de Cesareia, a São Jerónimo e a Paula nas proximidades de Belém, bem como nas numerosas actividades na região de Antioquia e de Damasco.

4. A política é o campo mais vasto da caridade e da solidariedade. Entretanto, "a caridade que ama e serve a pessoa nunca poderá estar dissociada da justiça" (Exortação Apostólica pós-sinodal Christifideles laici CL 42) porque, como sublinhava São Luís, a justiça é a primeira qualidade dos governantes (cf. Ensinamento ao seu filho primogénito Filipe). Por sua vez, os fiéis leigos não podem "absolutamente abdicar da participação na "política", ou seja, da múltipla e variada acção económica, social, legislativa, administrativa e cultural, destinada a promover orgânica e institucionalmente o bem comum" (Ibidem). Isto já fora salientado num texto da Igreja primitiva, dirigido aos cristãos: "O lugar que Deus lhes reservou é tão nobre que não lhes é permitido abandoná-lo" (Carta a Diogneto, 6). Na oração a Deus, o cristão toma consciência da sua missão, discerne as acções que lhe deve levar a cabo e encontra a força para as cumprir. Para participar na res publica, é também importante prestar atenção especial a cada pessoa e realizar um serviço humilde ao conjunto dos seus irmãos, que se identifica com o serviço ao bem comum, com uma solicitude particularmente sentida no que concerne à probidade e à honestidade. Com efeito, todas as funções sociais pressupõem que se desenvolva uma vida interior que oriente a acção e lhe confira profundidade e o seu sentido genuíno.

5. No decurso da sua longa história, de São Martinho de Tours a São Vicente de Paulo, o vosso país soube encontrar no seu interior admiráveis exemplos de dedicação ao bem dos pobres e dos mais desprotegidos. Diante dos novos desafios a enfrentar no próximo milénio, a França não deixará de suscitar mais leigos conscientes de que devem dedicar a sua plena capacidade cristã em benefício do trabalho "no campo próprio da sua actividade evangelizadora... no mundo vasto e complicado da política, da realidade social e da economia, como também da cultura, das ciências e das artes, da vida internacional, dos mass media e ainda de outras realidades abertas à evangelização, como são o amor, a família, a educação das crianças e dos adolescentes, o trabalho profissional" (Paulo VI, Evangelii nuntiandi EN 70). A construção deste mundo e a revitalização dos vínculos sociais constituem uma responsabilidade que Deus confiou aos homens; elas abrem à esperança, dado que a edificação da cidade terrestre é uma preparação activa do advento de um mundo novo e um sinal do Reino vindouro (cf. Didaqué, 16).

6. Os homens são chamados a trabalhar em colaboração sempre mais íntima, a todos os níveis da sociedade, promovendo os direitos fundamentais de todos os seres humanos. Cada um ocupa o próprio lugar na cidade e deve ter a parte de responsabilidade que lhe compete na construção da nação comum, em conformidade com o princípio de subsidiariedade, amplamente desenvolvido pelos Papas (cf. Leão XIII, Rerum novarum, 2; Pio XI, Quadragesimo anno). A este propósito, como deixar de recordar o valor primordial do casal e da família, que constitui a célula básica da sociedade? Quando não se observam os princípios fundamentais, quando o direito positivo jà não se refere à lei natural, é óbvio que "toda a vida social fica progressivamente comprometida, ameaçada e voltada para a sua dissolução" (Encíclica Veritatis splendor VS 101). Cabe à Autoridade genuína assegurar o bom funcionamento das estruturas do Estado, a transparência na administração pública, a imparcialidade no serviço público, o uso correcto e honesto dos fundos públicos, a rejeição dos meios ilícitos em vista de se obter ou conservar o poder, precisamente em virtude do valor da pessoa e das exigências morais objectivas (cf. Ibidem). Observa-se que "em muitas sociedades, inclusive na Europa, os responsáveis parecem ter abdicado das exigências de uma ética política que tem em conta a transcendência do homem e a relatividade dos sistemas de organização da sociedade. É tempo de eles serem concordes, para se conformarem com certas exigências morais que dizem respeito tanto aos poderes públicos quanto aos cidadãos" (Discurso de João Paulo II ao Corpo Diplomático, 15 de Janeiro de 1994, em: ed. port. de L'Osservatore Romano de 22.1.1994, pág. 4, n. 8). Os nossos contemporâneos devem poder readquirir a confiança no valor do processo político, que é um baluarte contra o totalitarismo financeiro e económico.

7. Na aurora do próximo milénio, os cristãos são chamados a entrar no novo mundo como protagonistas, trabalhando em vista de promover a justiça e a dignidade do homem e de construir juntamente com todos os homens de boa vontade uma sociedade que respeite cada ser humano. O seu dever consiste em demonstrar que os valores humanos e cristãos são o fundamento do tecido social, e que a liberdade religiosa e da instituição eclesial é primordial, pois abre o caminho para o respeito das outras liberdades, as quais devem ser exercidas ao serviço do melhoramento da vida das pessoas e não da busca irrefreável do poder ou do dinheiro. É inclusivamente necessário salientar o perigo das ideologias, do comunismo ao liberalismo, que paralisam as sociedades e não cessam de fazer crescer as disparidades entre as pessoas e os povos.

8. O século que se avizinha do seu ocaso testificou um importante desenvolvimento do empenho social no vosso país; basta evocar algumas das excelsas figuras cristãs, como Jean Le Cour Grandmaison, Emile Marcesche, Robert Garric, Joseph Folliet, Madeleine Delbrêl, os Abades Godin, Daniel e Raoul Follereau, Edmond Michelet, Robert Schumann, Jacques Maritain, o Padre Gaston Fessard, o Mons. Jean Rodhain e o Beato Frederico Ozanam. Encorajo-vos a continuar a obra empreendida pelos vossos antepassados e a ser os protagonistas da vida pública; assim, oferecer-se-ão aos nossos contemporâneos os elementos de que eles têm necessidade para analisar a situação actual e para encontrar renovadas energias, a fim de poderem cumprir hoje a sua missão no seio da sociedade. A Igreja conta também convosco para participar na formação das consciências e dar aos jovens a educação cívica que fará deles cidadãos responsáveis, capazes de assumir amanhã os seus compromissos ao serviço do próprio país.

Como dizia o profeta (cf. Is Is 21,11-12), os cristãos empenhados na vida social são chamados a ser como as sentinelas no alto da muralha, e devem discernir as expectativas e as esperanças dos homens deste tempo, tendo sempre a coragem de defender o ser humano e os valores essenciais para a construção da sociedade. É importante vigiar a fim de que os homens e os povos não se submetam à opressão de estruturas políticas, económicas e sociais. Ao mesmo tempo, cada cristão é exortado à fidelidade no cumprimento do dever que lhe cabe e da sua missão diária, demonstrando assim o valor de serviço aos próprios irmãos, que toda a acção na cidade terrestre reveste.

Enquanto confio o encontro das Semanas Sociais de 1999 à intercessão dos Santos da vossa terra, concedo do íntimo do coração a Bênção Apostólica aos organizadores e a cada um dos participantes, bem como a todas as pessoas que lhes são queridas.

Vaticano, 17 de Novembro de 1999.

PAPA JOÃO PAULO II




MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


POR OCASIÃO DA CONFERÊNCIA INTERNACIONAL


"O CRISTIANISMO NO LIMIAR DO TERCEIRO MILÉNIO"


: Ao meu venerável Irmão
Card. EDWARD IDRIS CASSIDY
Presidente do Pontifício Conselho para a
Promoção da Unidade dos Cristãos

Transmito-lhe cordiais saudações e, através de Vossa Eminência, cumprimento todos os nossos Irmãos e Irmãs ortodoxos, católicos e protestantes que participam na Conferência: "Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e sempre (He 13,8). O cristianismo no limiar do Terceiro Milénio".

Sinto-me muito encorajado por esta iniciativa da Comissão cristã interconfessional de consultação, dado que é o resultado de uma decisão conjunta das Igrejas e das Comunhões eclesiais que tradicionalmente desempenham a própria actividade pastoral no território da Comunidade dos Estados Independentes e nos países bálticos. Tendo como objectivo a promoção da crescente cooperação entre cristãos nessa região, rezo para que a Conferência inspire todos os participantes a prestarem um testemunho cada vez mais convincente e efectivo do Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo.

Esta Conferência está a realizar-se no limiar do Grande Jubileu do bimilenário do nascimento do Filho de Deus, que o Pai enviou ao mundo para ser o seu Redentor. Aquele que "é o mesmo ontem, hoje e por toda a eternidade" constitui o centro da fé e da verdade cristãs que a sua Igreja, em fidelidade ao mandamento que Ele mesmo lhe deu, proclama de geração em geração.

Neste contexto, é importante reflectir sobre a relação existente entre o Senhor e o Mestre Jesus Cristo, e cada indivíduo e comunidade cristãos; acerca da missão que eles são chamados a desempenhar no mundo contemporâneo; sobre os desafios que eles devem enfrentar; acerca da necessidade de haurir forças n'Aquele que disse: "Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida" (Jn 14,6).

O encontro em que participais congrega representantes das Igrejas e Comunidades eclesiais que, através da incorporação dos seus membros mediante o baptismo em Cristo, já compartilham uma comunhão real, embora ainda seja imperfeita. A redescoberta desta fraternidade no Senhor fará com que os cristãos aprofundem os seus relacionamentos, intensifiquem a própria colaboração e se prodigalizem em benefício da perfeita unidade na fé, a qual é expressa na plena e visível comunhão eclesial à qual Cristo Senhor chama os seus discípulos.

Oxalá Deus abençoe todos aqueles que, durante estes dias, participam na Conferência. A "Deus, (que) por meio do seu poder que age em nós, pode realizar muito mais do que pedimos ou imaginamos" (Ep 3,20), confio o bom êxito dos vossos esforços destinados a revigorar a colaboração e a comunhão cristãs.

Vaticano, 18 de Novembro de 1999.

PAPA JOÃO PAULO II




DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


DURANTE O ENCONTRO COM O SEGUNDO GRUPO


DE BISPOS DA ALEMANHA EM


VISITA "AD LIMINA APOASTOLORUM"


Quinta-feira, 18 de Novembro de 1999



Senhor Cardeal
Caros Irmãos no Episcopado!

1. É para mim uma grande alegria receber-vos, aqui no Palácio Apostólico: "A graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós" (2Co 13,13). Com esta saudação, acompanho os meus votos para a visita "ad Limina" que vos trouxe a Roma "para visitar Pedro" (Ga 1,18). Junto dos túmulos dos Príncipes dos Apóstolos o nosso pensamento dirige-se a Pedro e Paulo, os fundadores "da Igreja muito grande e muito antiga" (Santo Ireneu, Adv. Haer. III, 3, 2). Embora fossem diferentes por carácter e vocação, eles estiveram unidos no testemunho da fé. Juntos se consumaram pelo Evangelho no serviço de Deus e do homem. Apesar de tensões momentâneas, jamais romperam as relações entre si; antes, deram um ao outro "as mãos... em sinal de comunhão" (Ga 2,9). Com efeito, sabiam que fora o próprio Senhor quem constituiu Pedro como Pastor universal do seu rebanho (cf. Jo Jn 21,15-17) e fundamento visível da unidade da Igreja (cf. Mt Mt 16,18).

No mesmo espírito de comunhão fraterna e hierárquica, desejaria continuar a reflexão iniciada com o precedente grupo de Bispos da vossa pátria, sobre a Igreja como "sacramento universal da salvação" (Lumen gentium LG 48 Gaudium et spes GS 45). Enquanto no encontro com os vossos Coirmãos eu ressaltara o papel da Igreja na sociedade civil da Alemanha reunificada, quereria hoje reflectir juntamente convosco sobre a natureza e a missão do vosso ministério pastoral na Igreja, entendida como "o sinal e o instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano" (Lumen gentium LG 1).

2. O próprio Filho, enviado pelo Pai, enviou os Apóstolos e disse-lhes: "Ide, pois, ensinai todas as nações, baptizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a cumprir tudo quanto vos tenho mandado" (Mt 28,19-20). Esta solene missão de Cristo para o anúncio da verdade salvífica foi transmitida pelos Apóstolos aos Bispos, seus sucessores. Eles são chamados a levá-la até aos extremos confins da terra (cf. Act Ac 1,8), "para a edificação do Corpo de Cristo" (Ep 4,12) que é a Igreja.

Eles exerceram a sua missão em união com o Bispo de Roma. Com efeito este, enquanto sucessor de Pedro, por instituição divina é revestido na Igreja de um poder supremo, pleno, imediato, universal, para o bem das almas (cf. Christus Dominus CD 2). Como Pastor de todos os fiéis, tendo a missão de cuidar do bem comum da Igreja inteira e do bem de cada uma das Igrejas, ele "preside à comunidade universal no amor (cf. Inácio de Antioquia, Ad. Rom.,Proémio).

Como "Vigário do amor de Cristo" (Santo Ambrósio, Expositio in Luc., livro X), recentemente considerei meu dever resolver as dissonâncias que se criaram entre vós e nas Igrejas particulares a vós confiadas, procurando harmonizar de novo cada uma das vozes "na única e grande sinfonia em prol da vida", à qual a Igreja católica deve permanecer fiel, em todos os tempos e lugares. Peço ao Senhor que faça com que a Igreja na Alemanha dê testemunho, com unanimidade e clareza, a favor do Evangelho da Vida. Da minha parte, conto com a vossa oração, para que me seja dado servir a verdade de maneira coerente, como pleno fiduciário para o bem da Igreja universal. Talvez a Providência me tenha confiado a Cátedra de Pedro para ser, no limiar do terceiro milénio, um apaixonado "advogado da vida". De facto, desde jovem tive de experimentar como, durante um capítulo particularmente obscuro da história deste século conturbado, a vida humana foi ultrajada e sistematicamente exterminada não muito distante da minha cidade natal de Wadowice!

3. Os Bispos são chamados pelo Espírito Santo a fazer as vezes dos Apóstolos como Pastores das Igrejas particulares. Para isto estão revestidos de um poder próprio, que "não é diminuído pela autoridade suprema e universal, mas pelo contrário, é por ela assegurado, fortificado e defendido" (Lumen gentium LG 27). Juntamente com o Sumo Pontífice e sob a sua autoridade, os Bispos têm a missão de perpetuar a obra de Cristo, Pastor eterno. Com efeito, Cristo deu aos Apóstolos e aos seus sucessores o mandato e o poder de ensinar todas as nações, de santificar os homens na verdade e de os guiar (cf. Christus Dominus CD 2).

Inseridos na nobre cadeia da sucessão apostólica, vós participais do dom espiritual de Deus transmitido pelos Apóstolos aos seus colaboradores (cf. 2Tm 1,6-7). Pela imposição das mãos e a oração, a cada um de vós foram conferidos os poderes de ensinar, santificar e governar, "os quais, por sua própria natureza, só podem ser exercidos em comunhão hierárquica com a cabeça e os membros do Colégio episcopal" (Lumen gentium LG 21).

Juntos queremos deter-nos a reflectir em que consiste esse empenho do Bispo. Nesta ocasião, reafirmo quanto já ressaltei há vinte anos como Bispo de Roma, na minha primeira Carta por ocasião da Quinta-Feira Santa: "Analisando com atenção os textos conciliares, torna-se claro que convém antes falar de uma tríplice dimensão do serviço e da missão de Cristo, do que de três funções diversas. Com efeito, elas estão intimamente conexas entre si, explicam-se reciprocamente, condicionam-se reciprocamente e reciprocamente também se iluminam" (Carta aos Sacerdotes 1979, 3).

4. Antes de reflectir sobre a tríplice dimensão da missão pastoral, quereria primeiramente exaltar o centro para o qual todas as vossas actividades devem convergir: "O mistério de Cristo como fundamento da missão da Igreja" (Carta Enc. Redemptor hominis RH 11). Aquele que de algum modo participa na missão da Igreja deve compartilhar desta base para actuar de maneira coerente com o próprio mandato. Isto vale em primeiro lugar para os Bispos que foram, por assim dizer, "inseridos" no mistério de Cristo de maneira muito especial. Revestido da plenitude do sacramento da Ordem, o Bispo é chamado a propor e viver o mistério integral de Cristo (cf. Christus Dominus CD 12) na Diocese a ele confiada. É mistério que contém "insondáveis riquezas" (Ep 3,8). Conservemos este tesouro! Façamos dele a pérola da nossa vida! Não nos cansemos de o meditar, para dele haurir sempre nova luz e nova força no quotidiano exercício do nosso ministério.

Os homens e as mulheres de hoje são mais sensíveis ao testemunho da nossa vida do que ao poder dos nossos discursos. Eles querem encontrar em nós pessoas cuja existência esteja voltada totalmente para Jesus Cristo, "o Filho único, que está no seio do Pai" (Jn 1,18). Esperam que também nós, como os Apóstolos, saibamos transmitir o que vimos com os nossos olhos, o que contemplámos e o que as nossas mãos tocaram (cf. 1Jn 1,1): transmitir aos outros a fé vivida - esta é a finalidade da nova evangelização. Com efeito, a tarefa dos Pastores é expor a doutrina e a disciplina cristã "com métodos apropriados às necessidades dos tempos, isto é, que respondem às dificuldades e problemas que mais preocupam e angustiam os homens" (Christus Dominus CD 13). Porque a Palavra de Deus é viva e eficaz (cf. Hb He 4,12), ela não deixará de agir naqueles que são "obedientes à fé" (cf. Rm Rm 1,5) na liberdade e no amor. O "Credo" que todo o pastor exprime na Professio Fidei é portanto essencial e necessário para o seu esforço de ensinar e viver as verdades da fé, com transparência, entusiasmo e coragem.

5. No tríplice ministério dos Bispos - como ensina o Concílio Vaticano II - num certo sentido sobressai o da pregação do Evangelho. Os Pastores devem ser sobretudo "testemunhas de Cristo diante de todos os homens" (Christus Dominus CD 11), "arautos da fé que para Deus conduzem novos discípulos" (Lumen gentium LG 25). Como homens "que distribuem rectamente a palavra da verdade" (2Tm 2,15) devemos transmitir juntos aquilo que nós mesmos recebemos. Não se trata da nossa própria palavra, por mais douta que seja, porque não pregamos a nós mesmos, mas a verdade revelada que deve ser transmitida com fidelidade e em união com os outros membros do Colégio episcopal.

De quanto referistes sobre as vossas Dioceses, resulta que, ao exercerdes o vosso ministério de ensinar, encontrais um clima cultural de desconfiança e também de hostilidade, porque muitos contemporâneos se opõem à exigência da certeza no conhecimento da verdade. Uma mentalidade hoje muito difundida tende a excluir da vida pública os interrogativos acerca das verdades últimas e a confinar na esfera privada a fé religiosa e as convicções acerca dos valores morais. Este processo chegou ao ponto em que parece oportuno perguntar-se que papel é atribuído ainda a Deus, ao qual os fundadores da Lei Fundamental do vosso país, há cinquenta anos, quiseram fazer referência explícita, quando no início da Constituição evocaram a "consciência da responsabilidade diante de Deus e dos homens" (Preâmbulo da Lei Fundamental da República Federal da Alemanha de 23 de Maio de 1949).

Corre-se o perigo de que as leis, que exercem uma forte influência sobre o pensamento, e também sobre o comportamento dos homens, aos poucos se cansem do fundamento moral. Isto, porém, iria em detrimento das próprias leis que, com o passar do tempo, seriam consideradas apenas como meios para o ordenamento da sociedade, sem referência alguma à ordem moral objectiva. Diante desta situação entendo que não vos é fácil anunciar "a palavra da verdade, o Evangelho da salvação" (Ep 1,13) e favorecer a sua difusão.

Infelizmente, a pressão psicológica de alguns ambientes da sociedade civil na Alemanha induz também os fiéis católicos a porem em questão a doutrina da Igreja e a sua disciplina. Num clima de difundido individualismo religioso alguns membros da Igreja até se arrogam o direito de escolher, em matéria de fé, os ensinamentos que, segundo eles, seriam admissíveis e os que ao contrário deveriam ser rejeitados. Mas as verdades da fé constituem um conjunto orgânico, que não consente semelhantes discriminações arbitrárias. Quem é condescendente com isto não pode ser considerado coerente com a fé que professa.

6. Caros Irmãos, vós sabeis que é dever fundamental do Bispo como Pastor convidar os membros das Igrejas particulares, a ele confiadas, a aceitarem em toda a sua plenitude o ensinamento autorizado da Igreja a respeito das questões de fé e moral. Não devemos desanimar se o nosso anúncio não é acolhido em toda a parte. Com a ajuda de Cristo, que venceu o mundo (cf. Jo Jn 16,33), o remédio mais eficaz para combater o erro é o anúncio corajoso e sereno do Evangelho "oportuna e inoportunamente" (2Tm 4,2).

Exprimo estes votos especialmente pensando nos jovens. Muitos deles são exigentes a respeito daquilo que se refere ao sentido e modelo da sua vida e desejam libertar-se da confusão religiosa e moral. Ajudai-os neste empreendimento! Com efeito, as novas gerações são abertas e sensíveis aos valores religiosos, mesmo se às vezes de modo irreflectido. Elas intuem que o relativismo religioso e moral não torna feliz e que a liberdade sem a verdade permanece vã e ilusória. Ao exercerdes o ministério eclesial de ensinar em união com os vossos sacerdotes e com os colaboradores no serviço catequético, tende particular cuidado na formação da consciência moral. Sem dúvida, a consciência moral deve ser respeitada como "santuário" do homem, onde ele está sozinho com Deus, cuja voz ressoa na intimidade do coração (cf. Gaudium et spes GS 16). Mas com igual fervor recordai aos vossos fiéis que a consciência é um tribunal exigente, cujo juízo deve sempre conformar-se às normas morais reveladas por Deus e propostas com autoridade pela Igreja, com a assistência do Espírito.

Um claro e unívoco ensinamento a respeito dessas questões não deixará de influir de maneira positiva no necessário retorno ao sacramento da reconciliação, hoje infelizmente - também nas regiões católicas do vosso País - bastante abandonado.

7. Outra tarefa fundamental dos Bispos consiste no exercício da missão de santificação. "O Bispo deve ser considerado como o sumo sacerdote do seu rebanho, de quem deriva e depende, de algum modo, a vida de seus fiéis em Cristo" (Sacrosanctum concilium SC 41). Por isso, o Bispo é, por assim dizer, o primeiro liturgo da sua Diocese e o principal dispensador dos Mistérios de Deus. Ao mesmo tempo, compete-lhe organizar, promover e defender a vida litúrgica na Igreja particular a ele confiada (cf. Christus Dominus CD 15).

A respeito disso, quereria recomendar-vos vivamente os dois sacramentos fundamentais, do Baptismo e da Eucaristia. Logo que fui elevado à Cátedra de Pedro, aprovei a Instrução sobre o Baptismo das crianças, na qual a Igreja confirmou a práxis baptismal das crianças, em uso desde o início. Justamente na práxis pastoral das vossas Igrejas locais se insiste na exigência de só administrar o Baptismo no caso em que se tenha a fundada esperança de que a criança seja educada na fé católica, de maneira que o sacramento possa produzir frutos (cf. CIC, cân. 868, 2). Às vezes, porém, as normas da Igreja são interpretadas de modo mais restritivo de quanto elas entendem. Acontece assim que aos pais o Baptismo do filho é adiado ou até mesmo rejeitado sem motivo suficiente. A prudência e a caridade pastoral parecem sugerir uma atitude mais compreensiva para com aqueles que, com recta intenção, procuram aproximar-se da Igreja, pedindo o Baptismo para o próprio filho. A mesma solicitude pastoral deve de igual modo evitar que os pastores exijam coisas que não são requeridas pela doutrina ou pelos mandamentos da Igreja. É justo que os pais sejam preparados de modo adequado para o Baptismo do seu filho pelo pastor de almas, mas é também importante que o primeiro sacramento da iniciação cristã seja visto sobretudo como um dom gratuito de Deus Pai à criança. A índole livre e gratuita da graça jamais resulta tão evidente como por ocasião do Baptismo: "Nisto consiste o Seu amor: não fomos nós que amámos a Deus, mas foi Ele que nos amou e enviou o Seu Filho como propiciação pelos nossos pecados" (1Jn 4,10).

Além disso, não podemos falar de renovação espiritual da Diocese sem que o tema valha para a Eucaristia. Uma tarefa primordial do vosso ministério sacerdotal consiste em reafirmar o papel vital da Eucaristia como "fonte e centro de toda a vida cristã" (Lumen gentium LG 11). Na celebração do Sacrifício eucarístico culmina não só o serviço dos Bispos e presbíteros, mas encontra o seu centro dinâmico também a vida de todos os outros membros do Corpo de Cristo. A falta de sacerdotes e a sua distribuição desigual, por um lado, e a redução preocupante do número de quantos regularmente frequentam a Santa Missa dominical, por outro, constituem um desafio com o qual as vossas Igrejas se devem confrontar. Para reagir de modo justo, convém ter em consideração o princípio fundamental segundo o qual a comunidade paroquial é necessariamente uma comunidade eucarística; como tal, ela deve ser presidida por um sacerdote ordenado que, em virtude do seu sagrado poder e da consequente e insubstituível responsabilidade, ofereça o sacrifício eucarístico in persona Christi (cf. Pastores dabo vobis PDV 48). Dou-me conta de que alguns de vós - até mesmo nas regiões de antiga tradição católica - já não são capazes de assegurar a presença do sacerdote em cada paróquia. É evidente que essa situação exige uma solução provisória, para não deixar a comunidade no abandono, com o risco de um progressivo empobrecimento espiritual. O facto de os religiosos e os leigos, por vós encarregados, presidirem às funções dominicais da Palavra, pode ser louvável em circunstância de emergência, mas essa situação de longa duração não pode ser considerada satisfatória. Antes, o incompleto carácter sacramental dessas funções litúrgicas deveria induzir toda a comunidade paroquial a orar ao Senhor, com fervor ainda mais insistente, para que envie trabalhadores para a sua messe (cf. Mt Mt 9,38).

8. Por fim, uma palavra sobre a missão de governar, a vós confiada. Ao exercerdes esta tarefa, tendes sem dúvida diante dos olhos a imagem do Bom Pastor, que não veio para ser servido, mas para servir (cf. Mt Mt 20,28). A imagem é importante, tanto mais porque quem deve medir-se com ela sabe que foi tirado do meio dos homens e, como tal, está sujeito às debilidades humanas. Mas precisamente esta consciência jamais poderá deixar de o induzir à compreensão benévola para com aqueles que estão confiados ao seu cuidado e ao seu governo pastoral (cf. Lumen gentium LG 27).

Recomendo-vos vivamente sobretudo os primeiros "co-inquilinos" na casa das vossas Igrejas locais, isto é, os presbíteros, para os quais, como Bispos, vós constituís "o perpétuo e visível fundamento da unidade" (Lumen gentium LG 23). O serviço do cuidado das almas é exigente, porque com frequência os resultados visíveis não parecem corresponder às fadigas que a ele se empregam, às vezes até ao extremo limite das forças. Muitos pastores têm a impressão de dever trabalhar em vez de numa vinha evangélica, numa pedreira árida. O que dizer depois a respeito do progressivo envelhecimento dos sacerdotes e da escassez de vocações que pesa sobre o futuro das Dioceses? Desejaria encorajar-vos a estar ainda mais perto dos vossos sacerdotes e seminaristas. Conheço o peso dos empenhos diários conexos com o vosso ministério. Com solicitude paterna quereria evocar as esperanças expressas pelo Concílio Vaticano II, com palavras claras e repletas de sensibilidade: "Por causa desta comunhão no mesmo sacerdócio e ministério, os Bispos devem estimar os presbíteros, como irmãos e amigos, e ter a peito o bem deles, quer o material, quer sobretudo o espiritual... Estejam dispostos a ouvi-los, consultem-nos e troquem com eles impressões sobre os problemas pastorais e o bem da Diocese" (Presbyterorum ordinis PO 7). "Tenham uma compaixão prática pelos sacerdotes que se encontram nalgum perigo ou faltaram já a alguns dos seus deveres" (Christus Dominus CD 16).

Venerados Irmãos, não deixeis de aproveitar a ocasião para assegurar aos vossos sacerdotes que o Bispo de Roma está próximo de todos e de cada um deles. A sua presença é extremamente importante. Sem os sacerdotes, aos Bispos faltariam os braços.

9. Caros Irmãos! Sobre os conceitos de mestre, sacerdote e guia, propus-vos algumas observações que me estão a peito. Elas têm em vista estimular a vossa reflexão sobre o tríplice ministério pastoral a vós confiado, em proveito da Igreja na vossa pátria. Consciente da grande dedicação com que exerceis o ministério episcopal, quereria concluir estas minhas palavras, testemunhando-vos o meu fraterno e grato apreço. Em todas as situações nos conforte o pensamento de que Cristo Jesus não nos chamou ao seu serviço como "administradores", mas nos consagrou ministros dos seus mistérios.

Enfim, confio a vossa existência e a vossa missão como Pastores dos vossos rebanhos à intercessão de Maria, Mãe de Cristo e Mãe da Igreja. Sobre vós, os sacerdotes, os diáconos, os religiosos e os leigos nas vossas Dioceses, desça a abundância das graças celestes, cujo penhor é a Bênção Apostólica que a todos concedo de coração.




Discursos João Paulo II 1999 - Segunda-feira, 15 de Novembro de 1999