Homilias JOÃO PAULO II 224


CERIMÓNIA DO XXI DIA DO FERROVIÁRIO NA ITÁLIA


Quinta-feira, 8 de Novembro de 1979




Excelentíssimo Senhor Ministro Senhor Director-Geral
Técnicos e Trabalhadores dos Caminhos de Ferro do Estado
Caríssimos Irmãos e Irmãs

1. É com grande alegria e satisfação que me encontro hoje no meio de vós, para celebrar o "Dia do Ferroviário", que se festeja cada ano em todas as Secções ferroviárias da Itália, em memória daquele longínquo 3 de Outubro de 1839, quando foi inaugurado o primeiro caminho de ferro italiano: a linha Nápoles-Pórtici. Segundo me confirmaram as saudações há pouco ouvidas, trata-se de festa de família, durante a qual são entregues medalhas e diplomas de ancianidade, distintivos de honra e de benemerência aos mutilados por causa do serviço, e também atestados aos familiares dos saudosos caídos no trabalho.

Agradeço de coração ao Senhor Ministro Luigi Preti as palavras que me dirigiu; agradeço também ao Director-Geral dos Caminhos de Ferro do Estado e ao representante do Pessoal o acolhimento que me ofereceram, interpretando os sentimentos de todos os presentes e pondo em realce actividades, sacrifícios, expectativas e esperanças de toda a vossa benemérita categoria.

Estar presente neste lugar, neste encontro convosco como amigo e como pai, no "Dia" a vós dedicado, é circunstância que eu registo entre as mais importantes do meu ministério pastoral. É por este motivo que tão sentido e vivo é o meu reconhecimento a todos vós, dirigentes, empregados e operários, que me convidastes para uma cerimónia tão significativa e rica de sentimentos humanos e sociais.

Na verdade, pensando no vosso grande número e no espírito típico que vos distingue e caracteriza entre as classes da sociedade, considero-vos como uma família só. Para todos vós aqui presentes, e para os colegas que ria rede da Península inteira seguem, neste momento preciso, a festa, continuando embora o seu trabalho, vai uma saudação, vai um augúrio, vai a estima do Papa, juntamente com a expressão da certeza de que todos estão presentes na sua prece e nas intenções desta celebração. Especial saudação — como é bem compreensível — dirijo aos ferroviários vindos para esta circunstância da Polónia, abraçando neles todos os seus colegas que trabalham na Pátria.

Quantas vezes na minha vida aproveitei também eu o trabalho tão precioso dos Ferroviários! Quantas vezes me entreguei, sereno e confiado, à vossa perícia e à vossa diligência, seguro de chegar à meta! Pois bem, não só em meu nome, mas também em nome de todos os viajantes e da comunidade inteira que utiliza o vosso serviço, aceitai, caros Ferroviários, a minha saudação mais cordial, a minha satisfação e o meu reconhecimento.

2. Ao ouvir as saudações, que me foram dirigidas, primeiramente surge diante dos nossos olhos um admirável maquinismo grande e preciso: nele está um serviço em si completo e bastando-se nas faltas, de chefe de estação, chefes de comboios, maquinistas, condutores, revisores, guardas da linha, agulheiros, enfreadores, serventes, pessoal viajante, encarregados da manutenção, administradores, funcionários, etc. Atrás de vós aparecem depois um organismo e um mecanismo igualmente complexos e exactos: os trilhos, as agulhas, as luzes, as locomotivas e os vagões, as estações e os apeadeiros, as linhas centrais e os desvios; os dispositivos de sinalização, etc. Quanto se andou desde a velha máquina a vapor até às maravilhas dos modernos maquinismos electrónicos!

225 Tudo isto é fruto do pensamento humano e da humana "providência", no sentido daquele "prever" inteligente, graças ao qual o homem, segundo São Tomás, é providência a si mesmo. De facto, as aludidas conquistas no sector ferroviário servem os homens: facilitam entre uns e outros as deslocações, as comunicações e os contactos, que lhes são indispensáveis para a vida e actividade. Antigamente não existia este importante meio de comunicação, que se foi montando desde' os primeiros decénios do século passado: há 150 anos, devido à "providência" humana, tem-se â disposição o comboio, que se tornou assim um dos numerosos sinais do génio humano e um elemento ordinário da vida quotidiana. Direi melhor: este meio de comunicar faz agora parte da civilização e pertence inseparavelmente a ela, por motivo também do contínuo aperfeiçoamento das máquinas e dos serviços.

É verdade que hoje está "superado" por outros meios — pense-se na aviação —, todavia não perdeu o seu significado fundamental.

Olhando para esta obra da "providência" humana, isto é, para a invenção e para a actividade que tende para um objectivo, ficamos tendo diante dos olhos aquela imagem da Providência Divina, que nos dá o Evangelho de hoje: o cuidado com a ovelha desgarrada e a dracma perdida. Uma e outra simbolizam a solicitude pelo homem, pelo seu bem material e espiritual, temporal e eterno. É a mesma solicitude que tendes vós pelos viajantes, homens como vós, irmãos vossos.

Por isso, faço votos por que saiba cada um de vós encontrar esta forma de serviço ao homem, que é o caminho de ferro, o seu posto e a sua "medida interior" neste serviço, de que nos fala o Evangelho de hoje.

A "providência" humana é espelho e imagem da "Providência Divina", e dela brota.

Tudo isto depende certamente da eficiência técnica, mas afinal depende do homem. De cada homem, que, baseando-se neste meio da técnica, serve os outros homens.

Eis, Irmãos, "a verdade do Senhor que permanece eternamente", baseada como está em nós homens, que vivemos cá em baixo, termos um Pai comum que está no céu. Paternidade de Deus e amor de Deus, fraternidade dos homens e amor dos homens: são quatro pontos cardeais do nosso credo e do nosso comportamento cristão. Assim ensinou Jesus há vinte séculos, assim repete hoje o seu humilde Vigário.

3. Este homem de que falo pertence a uma comunidade particular, a uma grande família. É a grande família dos "ferroviários", que celebra hoje a sua festa.

A vida do ferroviário, sendo ordenada para o serviço e portanto para o bem comum da grande família humana, decorre em forma tão organizada, que constitui uma "comunidade profissional" propriamente dita. Que leis morais — refiro-me às leis da moralidade pessoal, social e profissional — devem governar tal comunidade, para ela poder desempenhar a grande obrigação que lhe é imposta, e exercer aquela "parte" que lhe toca na realização do bem comum? Que é necessário para esta realização se governar a si mesma segundo os princípios da ordem social e da cooperação?

Levar-nos-ia longe demais explicar aqui estas normas: limitar-me-ei, por isso, a recordar os critérios fundamentais que devem inspirá-las segundo a luz do Evangelho. Vós sois sensíveis e exigentes em matéria de justiça: tendes a peito o lugar de trabalho, a segurança do trabalho (para não se terem de lamentar os lutos, que tantas vezes, mesmo este ano, feriram dolorosamente a vossa grande família), e tendes a peito a salvaguarda dos vossos direitos, o respeito recíproco entre as pessoas e a eliminação dos actos arbitrários. São estes outros tantos exemplos em que o preceito do amor pode invocar-se positivamente para defesa e completamento da norma mesma da justiça, que aliás, assim como é impressa por Deus no coração do homem, assim também encontra no Evangelho uma superior plenitude. Nele, de facto, a justiça está no cume das virtudes morais como reguladora das relações não só com Deus, mas também com os homens entre si e cada um consigo mesmo, até se atingir o campo mais alto da fé e da graça, para sublimar-se na caridade.

Estou profundamente convencido e quero esperar, Amigos e Irmãos, que estais de acordo comigo em defender que uma coerente fidelidade aos valores primários da caridade e da justiça, segundo o Evangelho, é uma cura sumamente eficaz para os males antigos e novos da sociedade humana; quando estes valores forem respeitados, não se verificará nunca o que lemos há pouco em São Paulo, isto é, que o irmão é julgado ou desprezado (Cfr. Rom
Rm 14,10).

226 4. O Papa vem participar nesta grande festa dos "Ferroviários" e desejar-vos tudo isto. Mas sobretudo deseja ser para vós aquele que exprime o grande reconhecimento que devem alimentar á vosso respeito todos quantos vós servis: o público que viaja, o que espera nas estações ferroviárias, o comércio e o turismo, que encontram facilidades na rede ferroviária. Quero hoje ser o intérprete deste "obrigado", que se dirige aos ferroviários italianos como também aos do mundo inteiro.

E em nome de todos, presto aqui hoje homenagem às fadigas da vida dos ferroviários: às suas contínuas deslocações; aos horários incómodos e nocturnos, aos perigos e às ansiedades, que se repercutem também nas famílias.

Por isso, dirijo também o meu pensamento às pessoas que vos são queridas, às esposas e aos filhos que dominam os vossos pensamentos e por amor de quem suportais o duro trabalho quotidiano. Dizei-lhes que o Papa pensa neles, os abençoa e roga por eles.

5. Ainda um último pensamento me sugere a vossa vida. O viajar contínuo não é acaso imagem doutra viagem que vos é a todos comum? Não é a vida de cada homem na terra uma linha, um percurso, uma trajectória, desde o ponto de partida ao ponto de chegada? Sim, cada um de nós é viajante segundo uma imagem conhecida; e o importante — como lembra também o nome da principal Estação de Roma — é chegarmos felizmente ao "termo" da nossa corrida, conservando, segundo as palavras de São Paulo, a fé para ela, prontos a receber o prémio do Senhor (Cfr.
2Tm 4,7-8).

Esta imagem do caminho forma a vida mesma da Igreja, que se empenha em servir cá em baixo o homem de maneira completa, para levá-lo através do mundo até Cristo, até Deus, até à vida eterna. No nosso viajar, é motivo de verdadeiro conforto ter presente o que o Salmo Responsorial da Missa de hoje nos leva a rezar: O Senhor é a minha luz e a minha salvação, de quem terei medo? O Senhor é a defesa da minha vida, a quem temerei (Ps 27,1). Esta a razão por que a minha palavra se transforma em voto sincero e cordial, por que cada um de vós e de nós tenha a força suficiente e a graça necessária para não perder nunca de vista o ponto final do caminho e, sobretudo, para que possa atingi-lo. Esta nossa ardente esperança é já desde agora, aliás, capaz de animar e manter o nosso esforço quotidiano, no qual está escondida não só a expectativa, mas já também a experiência duma alegre comunhão com Deus.

6. Caros irmãos, convidastes hoje para qui, para esta vossa festa — que é ao mesmo tempo, profissional, social e familiar — o Bispo de Roma. No meio da Oficina construístes o Altar, para que ele pudesse celebrar sobre ele o Sacrifício de Cristo. Pois bem, que desejais manifestar com tudo isto? Certamente a vossa fé na Eucaristia. Nela, de facto, nós "agradecemos" a Deus todo o bem da criação e da redenção, e ao mesmo tempo "restituímos" a Ele estes bens mediante Cristo, para que se tornem para nós, para cada um de nós, fonte de salvação.

Isto precisamente quero hoje fazer aqui convosco. Enquanto cristãos, vós sois um povo particular, um sacerdócio real (1P 2,9), com que hoje se apresenta diante de vós o Bispo e Sacerdote, para levantar até Deus, "in persona Christi", tudo o que faz parte da vossa vida, da vossa vocação e do vosso trabalho.

Isto importa: oferecer a Deus. Assim é possível dar à própria fadiga o valor mais pleno, que reverte para vós como que restituído pelos frutos que provêm deste Sacrifício, cujo sinal é a "comunhão", isto é, a união íntima com Cristo e a união entre nós, que é penhor de vida eterna.

Confio estes votos a Maria Santíssima para que vos acompanhe e proteja em cada um dos vossos encargos, mas sobretudo na viagem para Deus, meta e fim último do homem. Amen!



VISITA PASTORAL DO SANTO PADRE À PARÓQUIA ROMANA

DE SÃO RAFAEL ARCANJO


Domingo, 11 de Novembro de 1979




Irmãs e irmãos caríssimos

227 1. Salve! Seja-me concedido exprimir, antes de mais, a grande alegria que experimento ao encontrar-me hoje no meio de vós, nesta vossa Paróquia de São Rafael Arcanjo no Trullo, que termina as celebrações do seu vigésimo quinto ano de existência. Vinte e cinco anos são um período considerável no tempo abrangido normalmente por uma vida humana.

É justo, por isso, sublinhar-se um acontecimento como este e determo-nos a relembrar o caminho percorrido, a avaliar as dificuldades superadas, a procurar alento na reflexão dos resultados alcançados.

Estou contente por encontrar-me, também eu, convosco, nesta circunstância tão significativa para a vossa Comunidade e para toda a Igreja que vive, crê e trabalha nesta Cidade de Roma, onde Cristo me colocou como vosso Bispo e Pastor. Convosco penso nos começos da vossa Comunidade: da Comunidade civil, cujo princípio se situa pelo final dos anos trinta, quando se estabeleceram aqui numerosos italianos repatriados do estrangeiro, cujo sucessivo aumento de número foi determinado pela confluência nesta zona dos habitantes de alguns bairros periféricos da Cidade, como ainda de não poucos imigrados de outras Regiões da Itália.

E penso nos inícios da Comunidade cristã como tal, reunida primeiro à volta de centros provisórios de serviço religioso, e erigida, depois, oficialmente em Paróquia em 1953 sob a responsabilidade pastoral dos Padres Capuchinhos.

Quantas recordações afloram à memória daqueles de entre vós que residem aqui há um certo número de anos ou aqui mesmo nasceram e cresceram.

São recordações alegres e recordações tristes; são, em qualquer caso, recordações que vos reportam aos factos salientes, que assinalaram a vossa vida como indivíduos, como famílias e como comunidade. São recordações em que está escrita e guardada a história do vosso Bairro, que nestes últimos anos cresceu e foi assumindo, a pouco e pouco, uma fisionomia própria, à qual vos afeiçoastes cada vez mais, como a uma realidade que, dalgum modo, faz parte de vós e das vossas vidas.

2. Filhos caríssimos, o Papa está hoje aqui para vos dizer que também ele está afeiçoado ao vosso Bairro: este tem um lugar no seu coração. Saúdo, portanto, todos os presentes, a começar pelo Senhor Cardeal Vigário e pelo Bispo Auxiliar do Sector, D. Remígio Ragonesi; saúdo o Pároco, Padre Celso Serri que celebrou o seu vigésimo quinto aniversário de ministério pastoral entre vós; e, nele, saúdo os Sacerdotes que o coadjuvam, oferecendo generosamente as suas energias para assegurar o serviço religioso da Comunidade. E entre os Sacerdotes como não recordar em particular o P. Benedetto Camellini, presente entre vós desde os primeiros meses da Paróquia? Saúdo ainda as Religiosas que trabalham na área da Freguesia: as Irmãs do Instituto dos Sagrados Corações e as Irmãs Mestras Pias de Nossa Senhora das Dores que se dedicam à juventude, no campo da educação escolar; as Irmãs da Caridade de Nossa Senhora da Misericórdia, providencialmente presentes no campo caritativo e assistencial; as Franciscanas Auxiliares Leigas Missionárias da Imaculada, que ajudam a acção dos sacerdotes no campo da animação missionária.

Dirijo também uma saudação cordial a quantos testemunham activamente a sua fé nas fileiras da Acção Católica, no Grupo Voluntário de Damas de São Vicente, na Comunidade de Santo Egídio e na Comunidade terapêutica de Santo André, mostrando com o seu exemplo como Evangelho não anda desligado da solicitude factual na promoção humana dos habitantes do bairro. Neste sentido merecem uma menção e uma saudação, também todos aqueles que colaboram na organização das actividades recreativas e culturais, que se realizam no Oratório, oferecendo a tantos rapazes e jovens a possibilidade de um divertimento são e formativo e dando, ao mesmo tempo, uma prova concreta da efectiva presença da Paroquia na vida sócio-cultural do bairro. Desejo saudar e encorajar também o Grupo dos Catequistas leigos que, com generosa dedicação, desenvolvem um trabalho precioso, ao lado dos Sacerdotes e das Religiosas, na ajuda aos rapazes que estão a iniciar os primeiros e significativos passos no seu itinerário de fé.

A minha saudação estende-se, por fim, a todos os esposos cristãos, empenhados em viver e testemunhar perante o mundo as riquezas interiores do sacramento do matrimónio; aos jovens que se lançam com afoita coragem e com esperança intacta rumo ao amanhã; às crianças, em cujos olhos inocentes se espelham os melhores desejos escondidos no espírito de cada adulto; aos doentes que, com o seu sofrimento, trazem um contributo insubstituível ao dinamismo interior e ao crescimento espiritual de toda a Comunidade; numa palavra, a todos os que fazem parte desta Paróquia e especialmente a quantos nela são e se sentem mais pobres, mais sós e mais marginalizados.

Eis que hoje, todos juntos, reunidos à volta do altar, damos graças ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo por estes vinte e cinco anos da Paróquia. Damos graças por esta parcela da Igreja, por esta porção do Povo de Deus que tem o nome de "paróquia de São Rafael no Trullo". É um fragmento da história da salvação, delimitado no tempo e no espaço, mas incomensurável ao mesmo tempo, porquanto diz respeito à presença de Deus vivo, à obra salvifica de Cristo, à efusão do Espírito Santo nos corações e nas consciências humanas.

Tudo isto queremos hoje, todos juntos, agradecer. A minha visita quer ser uma visita de agradecimento. Recebendo o convite para "elevarmos os nossos corações", pronunciemos hoje, com particular convicção, as palavras do prefácio: "É verdadeiramente nosso dever, é nossa salvação dar-vos graças"!

228 3. Talvez que, tendo por fundo este vigésimo quinto aniversário, adquira maior relevo na nossa consciência a verdade que São Paulo exprimiu na passagem maravilhosa da Carta aos Hebreus que ouvimos na liturgia de hoje. Eis, Cristo, sacerdote da nova e eterna Aliança, entra no eterno santuário para se apresentar agora diante de Deus por nós (He 9,24). Entra para oferecer continuamente por toda a humanidade o único sacrifício, que ofereceu uma vez só para abolir o pecado mediante a imolação de si mesmo (Ibid. 9, 26).

Todos nós participamos neste único Santo Sacrifício. Todos nós tomamos parte no único e eterno sacerdócio de Cristo, Filho de Deus. O Lugar de tal participação é exactamente este Templo, construído nesta zona de Roma pouco tempo depois da erecção da Paróquia. A Paróquia, de facto, surge e existe, para que todos nós tomemos parte na missão sacerdotal, profética e real (pastoral) de Cristo, como nos ensina o Concílio Vaticano II; para que, oferecendo com Ele e por Ele os nossos dons espirituais, possamos entrar com Ele e por Ele no eterno santuário da Divina Majestade, o santuário que Ele nos preparou como casa do Pai (Jn 14,2).

4. Para chegarmos à casa do Pai devemos deixar-nos guiar pela verdade que Jesus exprimiu na sua vida e no seu ensino. É verdade rica e universal que descobre, perante os olhos da nossa alma, os vastos horizontes das grandes obras de Deus e desce, ao mesmo tempo, tão em profundidade nos mistérios do coração humano, como só a Palavra divina pode fazer. Um dos elementos desta verdade é aquele que, de modo bem vincado, nos parece recordar a liturgia de hoje: Felizes os pobres em espírito, porque é deles o reino dos céus (Mt 5,3).

Pode dizer-se que a liturgia deste domingo explica, de modo particularmente sugestivo, esta primeira bem-aventurança do Sermão da Montanha, permitindo-nos penetrar a fundo na verdade nela contida. Ouvimos na primeira leitura a história da viúva pobre dos tempos de Elias, que habitava em Sarepta de Sídon. Depois ouvimos a história de outra viúva pobre dos tempos de Cristo, que entrou no átrio do templo de Jerusalém. Ambas deram tudo o que podiam. A primeira deu a Elias o último punhado de farinha para fazer um pãozinho. A outra lançou no tesouro do templo duas moedas e estas duas moedas constituíam tudo quanto possuía (Mc 12,44). A primeira não ficou desiludida porque, em conformidade com o que Elias predissera, a farinha não diminuiu na vasilha até que o Senhor fizesse chover sobre a terra (Cfr. 1R 17,14). A segunda pôde ouvir o maior dos louvores da boca do próprio Cristo.

Mediante estas duas figuras revela-se o verdadeiro significado da pobreza em espírito, que forma o conteúdo da primeira bem-aventurança do Sermão da Montanha. Pode parecer um paradoxo, mas esta pobreza encerra em si uma riqueza particular. Rico, de facto, não é aquele que tem, mas aquele que dá. E dá não tanto aquilo que possui, mas antes a si próprio. Então ele pode dar mesmo quando não possui. Portanto, ele é rico mesmo quando não possui.

Pelo contrário, o homem é pobre não porque não possua, mas porque está ligado — e em particular quando está ligado espasmódica e totalmente — àquilo que possui. Isto é, quando está ligado de tal maneira que não é capaz de dar nada de si. Quando não é capaz de se abrir aos outros e dar-se-lhes a si mesmo. Todos os bens deste mundo se tornam mortos no coração do rico. No coração do pobre; no sentido em que falo, até mesmo os bens mais pequenos revivem e se tornam grandes.

De certo que no mundo muita coisa mudou desde quando, no Sermão da Montanha, Cristo pronunciou a bem-aventurança dos pobres em espírito. Os tempos em que nós vivemos são bem diferentes dos de Cristo. Nós vivemos noutra época da história, da civilização, da técnica e da economia. E, no entanto, as palavras de Cristo não perderam nada da sua exactidão, da sua profundidade e da sua verdade. Antes adquiriram novo alcance.

Hoje é necessário julgar, com a verdade destas palavras de Cristo, não só o comportamento de uma viúva pobre e dos seus contemporâneos, mas é necessário julgar com esta verdade todos os sistemas e os regimes económico-sociais, as conquistas da técnica, a sociedade de consumo e, ao mesmo tempo, toda a geografia da miséria e da fome, inscrita na estrutura do nosso mundo.

E assim, como nos tempos do Sermão da Montanha, também hoje cada um de nós deve julgar com a verdade das palavras de Cristo as suas obras e o seu coração.

Que estupenda instituição é esta Paróquia, que nos permite ouvir constantemente as palavras de Cristo e, com a verdade delas, julgar os nossos corações!

5. Desejo que hoje se dêm a mãos todos os cônjuges que, com base no Sacramento, constituíram nesta paróquia outras tantas comunidades familiares. Renovem hoje, nos seus corações, as sagradas promessas que, diante de Deus e da Igreja, um dia fizeram deles, esposos – marido e mulher – , e depois pais de família – pai e mãe. Rezem pela graça da perseverança na fidelidade matrimonial e na de pais de família. Rezem para obter o amor necessário ao cumprimento da vocação que receberam de Deus.

229 As crianças encontrem nesta Paróquia uma mais vasta casa familiar; assimilem na catequese a verdade da Palavra de Deus; alimentem-se com o Corpo do Salvador.

Os jovens, procurem nesta Paróquia o apoio para os seus ideais e com prometam-se a animá-la com a sua nova vida, com o seu testemunho e com a prontidão em servir a Deus e aos homens.

Os doentes e os que sofrem encontrem aqui conforto e alívio. Visite-os Cristo, através do serviço dos sacerdotes, e faça-lhes entender com a palavra interior do Espírito a grande dignidade e o significado dos seus sofrimentos.

Oxalá todos, nesta Paróquia, tomem consciência de ser os membros do Corpo de Cristo, e se dêem conta que deles se aproxima o Reino de Deus, melhor, que ele está já presente neles.

Por tudo isto rezo hoje convosco, confiando, antes de mais, na intercessão de Maria, que é Mãe da Igreja e causa da nossa alegria, e também na de São Rafael Arcanjo, que escolhestes como Guia do vosso caminho. Com a sua ajuda e a sua protecção, a vossa Comunidade poderá prosseguir, com renovado vigor, no caminho de um coerente e operoso testemunho cristão, oferecendo a quantos são oprimidos pela dúvida, pela perplexidade e pelo desespero a eterna mensagem da alegria e da esperança que nos deixou Cristo no seu. Evangelho. Assim seja!



ORDENAÇÃO EPISCOPAL DO NOVO METROPOLITA

DE FILADÉLFIA DOS UCRANIANOS

MONSENHOR MYROSLAV LUBACHIVSKY


Capela Sistina

Segunda-feira, 12 de Novembro de 1979




1. É com grande comoção que me encontro-hoje no altar para realizar, juntamente convosco, Veneráveis Irmãos; o acto de consagração Episcopal do novo Metropolita de Filadélfia dos Ucranianos.

Há poucas semanas, durante a minha viagem aos Estados Unidos, tive a alegria de visitar a sua catedral em Filadélfia.

O encontro com o Arcebispo eleito e com os Bispos da Província eclesiástica de Filadélfia, com os sacerdotes, as religiosas e os fiéis, que se tinha reunido em grande número juntamente com os seus Pastores, foi para mim um acontecimento que vivi em profundidade. De facto, conheço de perto a história do Vosso Povo e a história da Igreja que, desde há séculos, se ligou a ele. Daqui nasce esta minha disponibilidade a impor hoje as mãos, juntamente convosco, Veneráveis Irmãos, sobre Aquele que o Espírito Santo chama para o ministério episcopal. Chama-o ao mesmo tempo à união com o Sucessor de Pedro e com toda a Jerarquia desta Igreja, em que o mais eminente Jerarca é o nosso Venerabilissimo Irmão o Cardeal Jozef Slipyj.

2. Então permite-me, Eminência, que de modo particular me dirija a Ti. Não só os filhos e as filhas do teu Povo, mas toda a Igreja e o mundo contemporâneo, conhecem o testemunho não comum que, com a tua difícil vida e particularmente com a prisão durante muitos anos, deste a Jesus Cristo e à Igreja, nascida da Sua Cruz e Ressurreição. Aqueles anos de prisão afastaram-te da dilecta Sé de Lviv, para a qual te tinha nomeado o nosso venerado predecessor Pio XII. É consolador verificar que hoje te encontras junto de nós, liberto há muitos anos, pela solicitude do meu venerado predecessor João XXIII, e criado Cardeal por Paulo VI. Podes, por conseguinte, dedicar-te ao teu povo para o bem do qual, segundo as palavras da Carta aos Hebreus, foste constituído (Cfr. Heb He 5,11).

230 E és constituído continuamente como o pastor que oferece a vida pelas ovelhas (Cfr. Jo Jn 10,15), desterrado daquela Igreja que, desde o ano de 1596, permanece em união com a Sé de São Pedro, mantendo a própria fidelidade há quase 400 anos. Esta fidelidade, particularmente durante os últimos séculos, foi paga e continua a ser paga com grandes sacrifícios. A tua vida de pastor é prova e exemplo particular disso.

3. Desejo aproveitar a hodierna ocasião para manifestar a veneração que nutrem pela vossa Igreja a Sé Apostólica e toda a Igreja Católica. A fidelidade testemunhada a Pedro e aos Seus Sucessores obriga-nos a uma particular gratidão e também a uma recíproca fidelidade para com aqueles que a mantêm com tanta firmeza e nobreza de alma. Deseja-mos oferecer, em relação a eles, um tributo de verdade e de amor. Desejamos com todas as forças aliviar as provas daqueles que sofrem precisamente por causa da sua fidelidade. Desejamos com todo o coração assegurar a unidade interior da vossa Igreja e a unidade com a Sé de Pedro.

Permite, Eminência, que eu manifeste os mesmos sentimentos para com o outro consagrante, o Metropolita Maxim Hermaniuk, de Winnipeg, no Canadá, e aos Representantes da Jerarquia da Vossa Igreja aqui presentes, como também que manifeste a minha estima e o meu afecto à Igreja Ucraniana inteira.

4. Celebramos a liturgia eucarística de consagração no dia de São Josafat, bispo e mártir, que a Vossa Igreja venera como particular Padroeiro. As suas relíquias, que desde o ano de 1963 estão depostas na Basílica de São Pedro, constituem novo motivo para este acontecimento de hoje, em que o novo Pastor é agregado ao corpo dos Bispos da vossa Igreja recebendo a Ordenação em Roma junto das relíquias martirizadas deste Santo. Hoje, toda a Igreja Católica, juntamente convosco, venera São Josafat.

5. E tu, D. Myroslav Lubachivsky, como novo Pastor do rebanho és chamado a dar novo testemunho daquela fidelidade que forma grande parte da tradição do teu povo. Como Bispo católico, és chamado a ser sinal da fidelidade mesma de Deus à sua aliança, sinal do amor imortal de Cristo à sua Igreja. Este é o ministério que hoje te é confiado: oferecer incessantemente aos fiéis o pão da vida, que, segundo as palavras do Concílio Vaticano II, é tomado quer da mesa, quer da palavra de Deus, quer do Corpo de Cristo (Cfr. Dei Verbum DV 21).

Sim, mediante a palavra e os sacramentos, alimentarás o teu povo na sua fé no Evangelho, e guiá-lo-ás no caminho da salvação. A palavra de Deus será lâmpada para os seus passos e luz sobre o seu caminho (Cfr. Sl Ps 119,105). E todos os teus esforços pastorais serão dirigidos para este fim: isto é, para que a palavra de Deus seja a norma prática do viver cristão, e traga frutos de justiça e santidade de vida para a comunidade a que presidirás e à qual servirás. Mediante a celebração do sacrifício eucarístico continuarás a alimentar o povo na alegria, confirmando-o na paz, na unidade e no vínculo da caridade. Esta, venerável irmão, é uma grande missão, em que serás herdeiro e guarda de uma grande tradição, que é católica e ao mesmo tempo ucraniana. Por conseguinte, no nome de nosso Senhor Jesus Cristo te exorto a ir para a frente na continuidade apostólica e na fidelidade em proclamar ao povo o Evangelho da salvação. Ao voltares para Filadélfia, peço-te transmitas aos teus fiéis a minha cordial saudação e a minha bênção.

6. A nossa assembleia de hoje, diante da Majestade de Deus Omnipotente na Santíssima Trindade, seja nova confirmação deste caminho pelo qual prosseguem a vossa Igreja e o vosso Povo, em ligação com este grande milésimo aniversário do Baptismo, para o qual iniciastes os preparativos este ano.

O amor de Deus Pai, a graça do Senhor Nosso Jesus Cristo e a comunhão do Espírito Santo, par intercessão da Santíssima e imaculada Mãe de Cristo, e de São Josafat e de todos os Santos, esteja com todos vós.

Amen.



ASSEMBLEIA GERAL DA UNIÃO INTERNACIONAL


DAS SUPERIORAS-GERAIS




14 de Novembro de 1979




Queridas Irmãs no Senhor

231 Constitui para mim grande alegria encontrar-me hoje convosco, representantes particularmente autorizadas da grande riqueza que forma na Igreja a vida religiosa. Na verdade, mediante esta, é oferecido testemunho particularmente evidente do que significa a entrega total ao amor e ao serviço de Deus. Alegro-me ao mesmo tempo por ver e saudar em vós como que a imagem da universalidade da Igreja: representais aqui todos os Continentes e as diversas culturas, manifestais ao mesmo tempo a realização multiforme da resposta à chamada do Senhor. Por meio de vós desejo reafirmar a todas as Religiosas o apreço e a confiança que a Igreja tem nelas, não somente pelo apostolado inteligente, constante e generoso, mas ainda mais pela vida de consagração e de entrega muitas vezes oculta, de aceitação, alegre e corajosa, das inevitáveis provas e dificuldades. Peço-vos que transmitais a minha bênção especialíssima a todas as Irmãs provadas ou cansadas, no corpo e no espírito, às idosas e às doentes, cuja vida de abnegação e sacrifício é — para a Igreja, o Papa e o Povo de Deus — valor preciosíssimo, irrenunciável e único.

Desejo ainda que esta celebração eucarística juntamente com o Papa constitua para cada uma de vós salutar momento de animação e conforto no cumprimento dum dever sempre exigente, muitas vezes acompanhado pelo sinal da Cruz e por uma dolorosa solidão, requerendo esta da vossa parte, sentido profundo de responsabilidade, de generosidade sem fraquezas nem desvarios, e de constante esquecimento de vós mesmas. Vós, de facto, deveis animar e guiar as vossas Irmãs neste período pós-conciliar, certamente rico de novas experiências, mas também tão exposto a erros e desvios, que vós procurais evitar e corrigir. É patente a evolução positiva destes últimos anos na vida religiosa, interpretada com espírito mais evangélico, mais eclesial e mais apostólico; todavia não se pode ignorar que certas opções concretas, se bem que sugeridas por boa embora não iluminada intenção, não têm oferecido ao mundo a autêntica imagem de Cristo, que a religiosa, deve tornar presente entre os homens.

Encontrando-vos reunidas à volta do Altar para renovar a oferta de Cristo ao Pai, sentis-vos intimamente convidadas a repetir, mesmo em nome das vossas Irmãs, a consagração de vós mesmas, que, já iniciada com o Baptismo, se tornou definitiva e perfeita com os votos religiosos.

1. Acolhei portanto a minha primeira exortação à prece fervorosa e perseverante, para que se torne cada vez mais evidente a importância da vocação religiosa e a necessidade de lhe aprofundar o valor essencial, na vida da Igreja e dá sociedade. A existência pessoal, com efeito, de cada religiosa, é centrada no amor esponsal a Cristo, velo qual ela, modelada pelo Seu espírito, Lhe dá a vida inteira, fazendo próprios os Seus sentimentos, os Seus ideais e a Sua missão de caridade e salvação. Como já disse às Religiosas da Irlanda: «Nenhum movimento da vida religiosa tem valor se não é simultaneamente movimento para o interior, para o profundo centro da vossa existência onde Cristo tem a Sua morada. Não é aquilo que fazeis o que mais importa, mas aquilo que sois como mulheres consagradas ao Senhor» (1).

— Pedi que todas as Irmãs, vivendo com alegria a sua relação única e fiel com Cristo, encontrem na sua consagração o remate mais alto da realidade característica própria da mulher, toda predisposta para o dom de si mesma.

— Pedi confiadamente que todos os Institutos consigam sem custo vencer as próprias dificuldades de crescimento e perseverança e que a vossa reunião anual contribua para cada vez maior aperfeiçoamento das várias congregações a que pertenceis.

— Pedi, por fim, sem descanso pelas vocações religiosas: o ideal da vida consagrada, dom imenso e gratuito de Deus, exerça cada vez maior atracção sobre numerosas jovens inclinadas para as realizações mais altas e mais nobres.

O tema, escolhido pela Sagrada Congregação para os Religiosos e os Institutos Seculares e destinado à próxima reunião plenária, «dimensão contemplativa da vida religiosa», seja ocasião privilegiada para aprofundar o valor fundamental da oração. A este propósito, desejo dirigir um pensamento fervoroso e de bênção para as Irmãs de vida contemplativa, a quem agradeço de todo o coração a sua intensa e constante prece, que forma auxílio insubstituível na missão evangelizadora da Igreja.

2. A minha segunda exortação, agora, quer ser convite para que vos empenheis num testemunho religioso adaptado ao nosso tempo.

Depois dos anos de experiência, tendentes à actualização da vida religiosa segundo o espírito do próprio Instituto, chegou o momento de apreciar objectiva e humildemente as tentativas realizadas, para nelas reconhecer os elementos positivos, os possíveis desvios, e ainda a fim de preparar uma Regra de vida estável, aprovada pela Igreja, Regra que deverá constituir para todas as Irmãs estímulo para um conhecimento mais profundo das suas obrigações e para uma alegre fidelidade em vivê-las.

O primeiro testemunho seja de adesão filial e de fidelidade, a toda a prova, mostrada à Igreja, esposa de Cristo. Esta ligação com a Igreja deve manifestar-se no espírito do vosso Instituto e nos seus encargos de apostolado, porque a fidelidade a Cristo não pode nunca separar-se da fidelidade à Igreja. «A vossa generosa e fervorosa adesão ao Magistério autêntico da Igreja é garantia da fecundidade de todo o vosso apostolado e da exacta interpretação dos sinais dos tempos» (2).

232 À imitação de Maria, Virgem de coração sempre disponível à palavra de Deus, deveis encontrar a vossa serenidade interior e a vossa alegria, na disponibilidade à palavra da Igreja e palavra d'Aquele que Cristo nomeou como seu Vigário na terra.

O segundo testemunho seja o da vida comunitária. Esta, de facto, é elemento importante da vida religiosa; é característica que desde as origens foi vivida pelas pessoas religiosas, porque os laços espirituais não podem criar-se, desenvolver-se e perpetuar-se senão mediante relações quotidianas e prolongadas. Tal vida comunitária, na caridade evangélica, está intimamente ligada ao mistério da Igreja, que é mistério de comunhão e de participação, e dá prova da vossa consagração a Cristo. Ponde todo o empenho e cuidado em que esta vida comunitária seja facilitada e amada, de maneira que se torne meio precioso de auxílio recíproco e de realização pessoal.

Por fim, como já outras vezes tive ocasião de dizer, um último e especial testemunho é também o do hábito religioso. Constitui, de facto, sinal evidente de consagração total aos ideais do Reino dos Céus, considerando sempre todas as devidas circunstâncias como, por exemplo, as da tradição, dos diversos campos de compromisso apostólico, do ambiente, etc.; é sinal, também, de desprendimento definitivo dos interesses só humanos e terrenos; e é ainda sinal de pobreza alegremente vivida e amada, em confiante abandono à acção providencial de Deus.

Caríssimas Superioras-Gerais, deveis assumir a missão delicada e às vezes difícil, mas também muito preciosa, de promover entre as Religiosas tudo o que pode contribuir para a união dos espíritos e dos corações. Vida fraterna, fervorosa e autêntica é indispensável para as Religiosas poderem arrostar de modo duradouro as obrigações, as fadigas e as dificuldades, que uma vida de consagração e de apostolado comporta no mundo de hoje.

O vosso encargo na feliz realização de tal vida, profundamente radicada nos valores evangélicos, reveste importância de primeiro plano. O exercício da autoridade, em espírito de serviço e de amor para com todas as Irmãs, é missão vital, embora seja difícil e requeira não pouca coragem e dedicação. A Superiora tem o dever de ajudar a Religiosa a realizar dada vez mais perfeitamente a sua vocação. Ela não pode subtrair-se a esta obrigação, certamente árdua mas indispensável.

O cumprimento de tal dever requer oração constante, reflexão e consulta, mas também decisões corajosas, conhecendo a própria responsabilidade diante de Deus, da Igreja e das Religiosas mesmas, que esperam este serviço. Tanto a fraqueza como o autoritarismo constituem desvios, igualmente prejudiciais ao bem das almas e ao anúncio do Reino.

3. Concluindo, exorto-vos com afecto: tende confiança. Sede sempre corajosas na vossa entrega religiosa, não vos deixeis abater pelas possíveis dificuldades, pela diminuição de pessoal e pelas incertezas que possam pesar sobre o futuro. Não duvideis da validez das formas aprovadas de apostolado no campo da educação juvenil, no cuidado dos doentes, das crianças, dos anciãos e de todos os que sofrem.

Ficai certas que — se os vossos Institutos se empenharem sinceramente em promover entre as Religiosas uma fidelidade constante, generosa e dinâmica, às exigências da sua vida consagrada — o Senhor, que não se deixa vencer em generosidade, vos mandará as desejadas vocações, que esperais para o advento do seu Reino.

Atentas às sugestões e às palavras da Sabedoria — como convém a pessoas chamadas a desempenhar alta responsabilidade de governo, e agradecidas a Deus, juntamente com todas as vossas Irmãs, pela especial vocação recebida — continuai com serena confiança pelo caminho do vosso compromisso de total consagração a Cristo e às almas. Conforte-vos e sustente-vos Maria Santíssima, Mãe e modelo de todas as pessoas consagradas, e acompanhe-vos, com especial benevolência, a minha Bênção Apostólica.
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Notas

233 1. Discurso aos Sacerdotes, Religiosos e Religiosas da Irlanda, 1 de Outubro de 1979.

2. Discurso às Religiosas dos Estados Unidos, 7 de Outubro de 1979.



Homilias JOÃO PAULO II 224