Homilias JOÃO PAULO II 72

CERIMÓNIA DE BEATIFICAÇÃO


DE PADRE JACQUES-DÉSIRÉ LAVAL


E PADRE FRANCISCO COLL




Domingo, 29 de Abril de 1979




Queridos Irmãos e Irmãs

73 1. Aleluia! Aleluia! Neste terceiro domingo de Páscoa, a nossa alegria pascal exprime-se como eco da alegria transbordante dos Apóstolos que, desde o primeiro dia, reconheceram Cristo ressuscitado. Na tarde da Páscoa, «Jesus apresentou-se no meio deles». Mostrou-lhes «as suas mãos e os seus pés». Convidou-os a apalparem-no com as próprias mãos. E comeu diante deles (Cfr. Lc 24,36-42). Assombrados, com dificuldade em acreditar, os Apóstolos acabaram afinal por O reconhecer: Alegraram-se ...vendo o Senhor (Jn 20,20 Lc 24,41) ; e desde então ninguém lhes pôde tirar a alegria (Cfr. Jn 16,22), nem levá-los a deixarem de prestar testemunho público (Cfr. Ac 4,20). Alguns instantes mais cedo, os corações dos discípulos de Emaús estavam-lhes a arder dentro, quando Jesus lhes falava pelo caminho e lhes explicava as Escrituras; e tinham-n'O, eles também, reconhecido, no partir do pão (Cfr. Lc 24,32 Lc Lc 24,35).

A alegria destas testemunhas é também a nossa, queridos Irmãos e Irmãs, nossa porque partilhamos da fé que eles tiveram em Jesus ressuscitado. Glorificado junto do Pai, não cessa de atrair os homens para Ele, de lhes comunicar a Sua vida, o Espírito de santidade, ao mesmo tempo que lhes prepara um lugar na casa do Pai. É precisamente esta alegria que hoje encontra brilhante confirmação, pois celebramos dois admiráveis Servos de Deus que, no século passado, brilharam na nossa terra com a santidade de Cristo; os quais pode a Igreja, a partir de agora, declarar bem-aventurados, propô-los ao culto particular e à imitação dos fiéis: o Padre Laval e o Padre Coll, que devemos agora contemplar.

2. É evidentemente impossível indicar aqui todos os factos notáveis da vida do Padre Tiago Laval e todas as virtudes cristãs que praticou em grau heróico. Fixemo-nos naquilo que e característico deste missionário, tendo em vista a missão actual da Igreja.

Primeiramente, o seu cuidado de evangelizar os pobres, os mais pobres; no caso, os seus «queridos Negros» da Ilha Maurício, como lhes chamava. Na sua França, começara por exercer a medicina numa vila da sua diocese natal de Évreux, mas pouco a pouco o chamamento a um amor sem partilhas ao Senhor, que ele algum tempo recalcara, levou-o a abandonar a sua profissão e a vida do mundo: «Fazendo-me padre, poderei fazer maior bem», explicava a seu irmão (Cfr. biografia). Entrando como vocação tardia no Seminário de São Sulpício de Paris, neste foi logo encarregado do serviço dos pobres; depois, como pároco da pequena freguesia normanda de Pinterville, repartia tudo o que tinha com os necessitados. Mas, vindo a conhecer a miséria dos Negros da África e a urgência de os trazer a Cristo, conseguiu partir para a Ilha Maurício com o Vigário Apostólico, Monsenhor Collier. Durante 23 anos, até à morte, consagrou todo o seu. tempo, consumiu todas as suas forças e deu todo o seu coração a evangelizar os autóctones: sem nunca se cansar, soube ouvi-los, catequizá-los e fazer-lhes descobrir a própria vocação cristã. Muitas vezes interveio também para lhes melhorar a condição sanitária e social.

A tenacidade que mostrou não deixa de nos espantar, sobretudo nas condições desanimadoras da sua missão. Mas, no seu apostolado, teve sempre em vista o essencial. O que é certo é que o nosso missionário deixou após si inúmeros convertidos ou à fé ou à piedade sólida. Não era inclinado a cerimónias espalhafatosas, sedutoras para essas almas simples, mas que não dariam fruto duradoiro; nem tendia para arrebatamentos oratórios. O seu empenho educativo inseria-se muito na vida concreta, não se cansava de voltar continuamente aos pontos essenciais da doutrina e da prática da vida cristã; ao baptismo ou à primeira comunhão só admitia pessoas preparadas aos grupos, que tivessem dado boas provas. Muito se empenhou em colocar à disposição dos fiéis capelinhas espalhadas pela ilha. Outra iniciativa notável, que é também objecto do zelo de numerosos pastores de hoje: juntou a si colaboradores; homens e mulheres, como chefes de oração, catequistas, visitadoras e conselheiras dos doentes, responsáveis por comunidadezinhas cristãs; por outras palavras, juntava a si quem se ocupasse dos pobres, quem os evangelizasse.

Qual é então o segredo do seu zelo missionário? Encontramo-lo na santidade: no dom de toda a sua pessoa a Jesus Cristo, dom inseparável da sua ternura pelos homens, sobretudo pelos mais humildes, que desejava tornar participantes da salvação trazida por Cristo. Todo o tempo que não consagrava ao apostolado directo, passava-o a orar, sobretudo diante do Santíssimo Sacramento, e juntava continuamente à sua oração mortificações e penitências que muito impressionaram os seus irmãos de hábito, apesar da discrição e da humildade. Muitas vezes fala da pena que tem da sua tibieza espiritual — digamos antes, do sentimento da própria secura: não atribui ele precisamente o maior preço ao amor fervoroso de Deus e de Maria, no qual deseja iniciar os seus fiéis? Nisso está ainda o segredo da sua paciência apostólica: «É unicamente em Deus e na protecção da Santíssima Virgem que nós nos apoiamos» (Carta de 9 de Julho de 1853, cfr. biografia). Que confissão magnífica! A sua espiritualidade missionária tinha-se aliás inscrito, desde o princípio, no enquadramento dum novo instituto religioso e mariano, e sempre teve a peito seguir as exigências espirituais do mesmo, apesar da solidão e afastamento geográfico em que viveu: trata-se da Sociedade do Sagrado Coração de Maria, de que foi um dos primeiríssimos membros ao lado do célebre Padre Libermann; Sociedade que será pouco depois fundida com a Congregação do Espírito Santo. O apóstolo, hoje como ontem, deve primeiramente cultivar em si o vigor espiritual; e deve depois testemunhar aquilo que recebe continuamente da Fonte.

Aqui está um modelo para os evangelizadores. de hoje. Oxalá ele inspire os missionários, e, atrevo-me a dizer, todos os sacerdotes, que têm primeiramente a missão sublime de anunciar Jesus Cristo e formar a vida cristã.

Seja ele, a título especial, a alegria e o estímulo de todos os religiosos espiritanos, que não cessaram de implantar a Igreja, em particular na terra africana, e lá trabalham com tanta generosidade.

O exemplo do Padre Laval anime todos os que, no continente africano e fora dele, se esforçam por construir um mundo. fraterno, isento de preconceitos raciais. Seja também o Beato Laval o orgulho, o ideal e o protector da comunidade cristã da Ilha Maurício, hoje tão dinâmica, e de todos os Mauricianos. A estes votos, tenho o prazer de acrescentar uma saudação muito cordial à Delegação do Governo da Ilha Maurício, como também à do Governo francês, que vieram participar nesta cerimónia.

3. Segundo motivo de alegria eclesial é a beatificação doutra figura que a Igreja quer hoje exaltar e propor à imitação do Povo de Deus: o Padre Francisco Coll. Nova glória da família dominicana e não menos da família diocesana de Vich. Religioso e, ao mesmo tempo, modelo de apóstolo — durante grande parte da sua vida — entre as fileiras do clero vicense.

Uma dessas personalidades eclesiais que, na segunda metade do século XIX, enriqueceram a Igreja com novas fundações religiosas. Filho da terra espanhola, da Catalunha, em que brotaram tantas almas generosas que legaram à Igreja uma herança fecunda.

74 No nosso caso, concretiza-se a herança num trabalho magnífico e incansável de pregação evangélica, a culminar na fundação do Instituto hoje chamado das Religiosas Dominicanas da Anunciada, em grande número aqui presentes para celebrarem o seu Padre Fundador, unidas a tantos membros das diversas obras a que deu vida a Congregação.

Não podemos apresentar agora um esboço completo do novo Beato, espelho admirável — como pudestes observar na leitura da sua biografia — de heróicas virtudes humanas, cristãs e religiosas, que o tornam digno de elogio e de imitação no nosso peregrinar terreno. Limitemo-nos a percorrer brevemente um aspecto mais saliente nesta figura eclesial.

O que mais impressiona, a quem se aproxima da vida do novo Beato, é o seu zelo evangelizador. Num momento histórico muito difícil, em que as convulsões sociais e as leis perseguidoras contra a Igreja lhe fazem abandonar o seu convento e viver permanentemente fora dele, o Padre Coll — sobrepondo-se a inspirações humanas, sociológicas ou políticas — consagra-se inteiramente a uma assombrosa tarefa de pregação. Tanto durante o seu ministério paroquial, especialmente em Artés e Moyá, como na sua fase posterior de missionário apostólico, o Padre Coll manifesta-se verdadeiro catequista e evangelizador, na melhor linha da Ordem dos Pregadores.

Nas suas inumeráveis correrias apostólicas por toda a Catalunha, por meio de memoráveis missões populares e outras formas de pregação, o Padre Coll — Mosén Coll, para muitos — é transmissor de fé; semeador de esperança; pregador de amor, de paz e de reconciliação, entre aqueles que as paixões, a guerra e o ódio mantinham divididos. Verdadeiro homem de Deus, vive em plenitude a sua identidade sacerdotal e religiosa, tornada fonte de inspiração em toda a sua tarefa. A quem não compreende sempre, os motivos de certas atitudes suas, responde com um convencido: «porque sou religioso». Essa profunda consciência de si mesmo é que orienta o seu trabalho incessante.

Tarefa absorvente, mas a que não falta base sólida: a oração frequente. É o motor da sua actividade apostólica. Quanto a isto, o novo Beato fala de maneira bem eloquente: é ele próprio, homem de oração; nesse caminho quer introduzir os fiéis (basta ver o que diz nas suas publicações «A rosa formosa» e «A escada do céu»); tal é a via que indica na Regra às suas filhas, com palavras vibrantes, que pela actualidade que têm faço também minhas: «A vida das Irmãs deve ser vida de oração. (...) Por isso recomendo-vos e torno-vos a recomendar, amadas irmãs: não deixeis a oração».

O novo Beato insiste em diversas formas de oração, como sustentáculo da actividade apostólica. Há uma porém que é a sua preferida e tenho especial gosto em recolher a lição e nela insistir: é a oração contemplando os mistérios do rosário; é essa «escada para subir ao céu», composta de oração mental e vocal, que «são as duas asas que o Rosário de Maria oferece às almas cristãs». Forma de oração que também o Papa usa com assiduidade e a que vos convida vos unais todos, sobretudo no próximo mês de Maio, consagrado à Virgem Maria.

Concluo estas reflexões em língua espanhola, saudando as Autoridades que vieram para as celebrações em honra do Padre Coll, e convidando todos a que imitem os seus exemplos de vida, mas em especial os filhos de São Domingos, o clero e em particular vós, Irmãs Dominicanas da Anunciada, vindas da Espanha, do resto da Europa, da América e da África, onde a vossa actividade religiosa se exerce com generosidade.

4. O voto, que exprimo esta manhã, é, em conclusão, este: que a dupla beatificação de hoje venha reforçar e promover o zelo na acção catequética de toda a Igreja. É sabido que o tema da Quarta Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, realizada aqui em Roma no Outono de 1977, foi exactamente o da catequese. Os Padres sinodais — de quem eu também fazia parte — encararam e estudaram este assunto de primária importância para a vida e para a acção da Igreja de todos os tempos. Insistiram na urgência de atribuir decidida prioridade à catequese, ao lado doutras iniciativas, menos essenciais embora infelizmente mais vistosas, porque nela se põe em prática o aspecto absolutamente original da missão da Igreja. Missão — inculcaram eles — que diz respeito a todos os membros do Povo de Deus, embora em funções diferenciadas, e os obriga à contínua busca de métodos e de meios, adequados para uma cada vez mais eficaz transmissão da Mensagem.

O pensamento dos Padres do Sínodo dirigia-se principalmente aos jovens, de cuja importância no mundo de hoje estavam bem convencidos: apesar de incertezas e desvarios, excessos e frustrações, os jovens representam a grande força, de que depende a sorte da humanidade futura. A pergunta que preocupou os Padres sinodais foi esta precisamente: como levar a multidão de jovens a fazer uma experiência viva de Jesus Cristo, isto não só no encontro fascinador dum momento fugidio, mas por meio dum conhecimento aturado, cada dia mais completo e mais luminoso da Sua pessoa e da Sua mensagem? Como fazer que nasça neles a paixão pelo Reino, que Ele veio inaugurar e no qual, e só nele, pode o ser humano encontrar a plena e saciante realização de si mesmo?

Responder a esta pergunta é a missão mais urgente da Igreja nos dias de hoje. Dependerá do empenho generoso de todos, que às novas gerações seja oferecido um testemunho da palavra de salvação (
Ac 12,26), capaz de conquistar os espíritos e os corações dos jovens e de lhos arrastar para aquelas escolhas concretas, muitas vezes custosas, requeridas pela lógica do amor de Deus e do próximo. Serem os jovens eficazmente atingidos pelos ensinamentos, que lhes sejam dados em casa, na escola e na igreja, dependerá sobretudo da sinceridade e da intensidade, com que as famílias e as Comunidades souberem viver a sua adesão a Cristo.

Peçamos, pois, aos novos Beatos que nos acompanhem com a sua intercessão e nos guiem para uma experiência pessoal e profunda de Cristo ressuscitado, que leve a arder os nossos corações com o dos discípulos no caminho de Emaús enquanto o Senhor «falava com eles pelo caminho e lhes explicava as Escrituras» (Cfr. Lc 24,32). De facto, só quem pode dizer «conheço-O» — e São João avisou--nos que isto não o pode dizer quem não vive segundo os mandamentos de Cristo (Cfr. 2ª leitura) —, só quem atingiu um conhecimento «existencial» d'Ele e do Seu Evangelho, pode oferecer aos outros uma catequese aceitável, penetrante e arrebatadora.

75 A vida dos dois novos Beatos é disto prova eloquente. Não nos seja proposto em vão o exemplo deles.







DURANTE A CELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA


DEDICADA À PEREGRINAÇÃO NACIONAL CROATA


Segunda-feira, 30 de Abril de 1979




Queridos irmãos no Episcopado,
Queridos sacerdotes, religiosos e religiosas,
Queridos filhos e filhas da "sempre fiel" Croácia!

"A graça e a paz de Deus Pai e de nosso Senhor Jesus Cristo estejam convosco" (Cfr. Ga 1,3). "Com os braços abertos cinjo-vos a mim e acolho-vos com amor paternal" (Carta do Papa João VIII ao povo e ao clero croata: Mansi, Sacrorum Conciliorum collectio, XVII, 126) aqui, sobre o Túmulo de São Pedro, por ocasião do significativo aniversário da profissão de fidelidade dos Croatas à Santa Sé, que é ao mesmo tempo a recordação da benevolência paternal dos Sucessores de São Pedro para convosco.

São muitos os motivos que justificam esta nossa comum alegria, como muito bem disse no seu discurso o meu irmão no Episcopado, o Arcebispo Franjo Kuharic.

Realmente, neste encontro sobre o Tumulo de São Pedro parece ter-se concentrado toda a vossa história de mais de treze séculos, e de modo especial os grandes acontecimentos da vida da vossa Igreja, desde que, na época do baptismo do vosso povo, eia começou a fazer parte da Igreja romana, que é "cabeça e mestra de todas as Igrejas" (Carta do Papa João VIII ao Bispo de Nin, Teodósio: Mansi, o.c. XVII, 124). Recordais-vos da "Croácia Branca", vossa terra de origem que se encontra precisamente onde se encontra a minha pátria? Sinto presente a vossa linda e querida nação, todo o vosso povo dentro e fora dos confins da vossa Pátria, as vossas antigas e novas fidelidades e as vossas ansiedades. Aqui, está presente a recordação dos vossos antepassados, dos vossos príncipes e reis cristãos, dos vossos bispos e sacerdotes, da vossa língua litúrgica paleocroata, das vossas maravilhosas igrejas e, de modo especial, dos vossos santuários marianos.

Contudo, hoje recordamos especialmente as relações da Croácia com a Santa Sé, tão claramente expressas nas Cartas do Papa João VIII ao Príncipe Branimiro, ao Clero e ao Povo croata, e ao Bispo Teodósio. Isto verificava-se precisamente há onze séculos. Os acontecimentos de então alegravam o coração do Sucessor de Pedro e eram decisivos para a história futura do povo croata e da Igreja, para a vossa fé, cultura e independência política.

Tendo diante dos olhos o rico e plurissecular passado do vosso povo, parece-me poder alientar estes três momentos extraordinários.

Primeiro: a fidelidade a Jesus Cristo e ao Evangelho, fidelidade que os vossos antepassados souberam testemunhar com o fervor e o espírito dos mártires na luta secular "pela nobre Cruz e a liberdade de ouro".

76 Segundo: o amor e a adesão dos Croatas à Igreja Romana, à Cátedra de São Pedro. Esta Igreja foi verdadeiramente vossa mãe em cuja santa doutrina os vossos antepassados se dessedentaram como numa nascente limpidíssima (Carta do Papa João VIII ao Príncipe croata Branimiro: Mansi, o.c. XVII, 125).

Terceiro: o amor, a fidelidade e a devoção dos Croatas a Maria, Mãe de Deus e Mãe da Igreja, que vós invocais de coração "Rainha dos Croatas" e honrais filialmente nos vossos santuários.

Esta vossa tríplice fidelidade, confiai-la também hoje como "Grande Voto" de fidelidade a Jesus, à Igreja e à mãe de Deus, particularmente depois das solenidades jubilares em Marija Bistrica, em Solin e em Biskupija. Sede fiéis, sede constantes, sede orgulhosos do vosso nome cristão!

Ao elevar hoje as minhas mãos para abençoar todos vós aqui presentes, todo o vosso povo e toda a vossa terra (Ibidem.), peço ao Senhor que preserve a vossa fé, e imploro à Mãe de Deus que sempre e em toda a parte seja a "vossa validíssima advogada". Faço extensiva a minha bênção aos vossos Bispos, aos Sacerdotes, aos Religiosos e às Religiosas, a fim de que, mantendo-se fiéis à própria vocação, sejam exemplo para todos, não tenham desvios (Carta do Papa João VIII ao Bispo de Nin, Teodósio: Mansi o.c. XVII, 124.), mas anunciem o Evangelho de Cristo como alegre mensagem de salvação, de verdade, de amor e de concórdia. Abençoo todos vós aqui presentes, as vossas famílias, os jovens e os anciãos, os trabalhadores e os intelectuais, e peço-vos: permanecei fiéis a Deus e a Pedro, cultivai o bom espírito de família, respeitai a vida, educa: uma juventude cada vez mais numerosa e conservai a bela tradição da oração em família. Dirijo-me sobretudo a vós, jovens fiéis: conhecei e amai a Jesus Cristo, o único Redentor do homem, e sede orgulhosos do vosso nome cristão.

Abençoo paternalmente também os numerosos operários vindos de outras terras. Tenho conhecimento das preocupações e das dificuldades dos trabalhadores; por conseguinte, exorto-vos a não esquecerdes nunca a vossa fé e a amardes o vosso lar, a vossa Igreja e a vossa Pátria.

Meus queridos Croatas! Agradeço-vos este encontro, esta expressão de renovada fidelidade. Como outrora o Papa João VIII, também eu me regozijo hoje da vossa fé, do vosso afecto, da vossa fidelidade a Jesus Cristo e à Sua Igreja.

Papa ama-vos.
Papa abraça-vos e acolhe-vos.
Papa abençoa-vos! Ámen!



MISSA NO SANTUÁRIO MARIANO DO «DIVINO AMOR»


EM ROMA




1 de Maio de 1979




Tenho o prazer de encontrar-me no meio de vós, queridos Irmãos e Irmãs, em união de fé e de oração sob o olhar da Virgem Santíssima do Divino Amor, que, deste sugestivo Santuário que é o coração da devoção mariana da diocese de Roma e arredores, vigia maternalmente por todos os fiéis que se confiam à Sua protecção e à Sua guarda enquanto peregrinam na terra.

77 1. Neste primeiro dia do mês de Maio, juntamente com todos vós, também eu quis vir em peregrinação a este lugar abençoado para ajoelhar-me aos pés da Imagem miraculosa, que de há séculos não cessa de conceder graças e conforto espiritual, e para dar assim solene início ao mês mariano, que na piedade popular encontra as expressões mais delicadas de veneração e afecto para com a nossa Mãe dulcíssima. A tradição cristã, que nos leva a oferecer «flores», «florinhas» e piedosos propósitos à Toda Bela e à Toda Santa, encontre neste Santuário — que se levanta no meio da planura romana, rica de luz e de verde — o ponto ideal de referência neste mês a Ela consagrado. Tanto mais que a sua Imagem A apresenta sentada num trono, com o Menino Jesus ao colo e com a pomba a descer sobre Ela como símbolo do Espírito Santo, que é precisamente o Divino Amor, nos traz ao espírito os vínculos doces e puros que unem a Virgem Maria ao Espírito Santo e ao Senhor Jesus, Flor desabrochada do Seu seio, na obra da nossa redenção: quadro admirável já contemplado pelo maior Poeta italiano, quando leva São Bernardo a exclamar: «No ventre teu reacendeu-se o Amor / por seu calor na eterna paz / assim germinou esta Flor» (DANTE, Paraíso, XXXIII, 7-9).

2. Neste tempo espiritual de piedade mariana, celebra-se no próximo domingo o dia de orações pelas vocações eclesiásticas, sejam sacerdotais sejam religiosas simplesmente: dia a que a Igreja atribui grande importância, num momento em que o problema das vocações está no centro das mais vivas preocupações e solicitudes da pastoral da Igreja. Não deixeis de colocar esta intenção nas vossas orações durante todo o mês de Maio. O Mundo precisa hoje mais que nunca de sacerdotes e religiosos, de irmãs e de almas consagradas, que valham às imensas necessidades dos homens: são crianças e jovens, que esperam quem lhes ensine o caminho da salvação; são homens e mulheres, a quem o pesado trabalho quotidiano faz sentir mais agudamente a necessidade de Deus; são anciãos, doentes e pessoas que sofrem, a esperarem por quem se debruce sobre as suas tribulações e neles desperte a esperança do Céu. E dever do povo cristão pedir a Deus, por intercessão de Nossa Senhora, que mande operários para a Sua messe (Cfr.
Mt 9,38), fazendo ouvir a muitos jovens a Sua voz que lhes estimule a consciência para os valores sobrenaturais e lhes dê a compreender e a apreciar, em toda a sua beleza, o dom de tal chamada.

3. Mas, além de dar princípio ao mês de Maio, vim, como Bispo de Roma, visitar o centro paroquial que, à sombra do Santuário, exerce actividade pastoral no meio das povoações circunvizinhas sob a direcção do Cardeal Poletti, meu Vigário-Geral, do Bispo Auxiliar Dom Clemente Riva, e por obra do zeloso Pároco, Don Silla, dos vice-párocos e das religiosas Filhas de Nossa Senhora do Divino Amor.

Queridos sacerdotes, conheço o vosso zelo e as dificuldades que encontrais no trabalho apostólico por causa das distâncias e do isolamento em que se encontram os lugares e os casais confiados aos vossos cuidados de pastores. Mas sede intrépidos na fé e na fidelidade ao vosso ministério para desenvolver cada vez mais entre as almas o sentido da Paróquia, como comunidade de verdadeiros crentes; para intensificar a pastoral familiar, graças à qual uma casa ou grupos de casas se tornem lugar de evangelização, de catequese e de promoção humana; e para dedicar a devida atenção às crianças e aos jovens, que representam o futuro da Igreja. Para este vosso esforço dou-vos o meu incentivo e exorto-vos «no meio do Povo de Deus, que olha para Maria com imenso amor e esperança», a recorrer nas dificuldades «a Ela com esperança e amor excepcionais. Efectivamente, deveis anunciar Cristo que é seu Filho: e quem é que melhor do que a sua Mãe vos há-de transmitir a verdade sobre Ele? Depois, vós deveis nutrir os corações humanos com Cristo: e quem é que vos pode tornar mais conscientes daquilo que fazeis, senão Ela que o nutriu a Ele?» (Cfr. Carta aos Sacerdotes por ocasião da Quinta-feira Santa, n.° 11).

4. Já falei da atenção que esta Paróquia dedica às crianças: pois bem, precisamente aos meninos que daqui a pouco vão receber o Sacramento do Crisma quero dirigir uma palavra de sincero afecto e de satisfação pela preparação a que se entregaram a fim de receberem dignamente o dom do Espírito Santo, que no dia do Pentecostes foi mandado aos Apóstolos para estes serem, no meio dos homens, testemunhas intrépidas de Cristo e mensageiros valorosos da boa nova. Queridos meninos, com o Sacramento da Confirmação recebereis a virtude da fortaleza, para não irdes recuar diante dos obstáculos que se apresentem no caminho da vossa vida cristã. Recordai-vos que a imposição das mãos e o sinal da cruz com o santo crisma vos assemelharão mais perfeitamente a Cristo e vos darão a graça e o mandato de espalhar entre os homens o seu «bom perfume» (2Co 2,15).

5. E agora, enquanto nos preparamos para celebrar o sacrifício eucarístico, com que saudamos no altar o «verdadeiro corpo nascido da Virgem Maria», não podemos deixar de sentir no nosso espírito as suaves expressões da liturgia da Palavra, as quais exaltaram Maria como a «Esposa adornada para o seu esposo» (Cfr. Ap 21,1-5), a «Mulher» de quem nasceu o Filho de Deus (Cfr. Ga 4,4-7) e, por fim, a Mãe do «Filho do Altíssimo» (Cfr. Lc 1,26-38). Como vedes, Nossa Senhora está ligada a Jesus; é para Jesus; é Mãe de Jesus; introduz Jesus no mundo: está portanto no vértice da sorte da humanidade. E Ela que por virtude do Espírito Santo, isto é, do Divino Amor, torna Cristo nosso irmão com a Sua divina maternidade, e, como é Mãe de Cristo na carne, assim o é, por solidariedade espiritual, do Corpo místico de Cristo que somos todos nós; é Mãe da Igreja. Por isso, enquanto sobe ao Pai do céu o sacrifício de louvor, elevemos à nossa Mãe dulcíssima, diante do Seu Santuário, uma oração que brote do nosso coração de filhos devotos: Salve, ó Mãe, Rainha do mundo / Tu és a Mãe do belo Amor, / Tu és a Mãe de Jesus, fonte de toda a graça, / o perfume de cada virtude, / / o espelho de toda a pureza. / Tu és alegria no pranto, vitória na batalha, esperança na morte. / Que doce sabor o teu nome na nossa boca, / que suave harmonia nos nossos ouvidos, / que embriaguez no nosso coração! / Tu és a felicidade dos que sofrem, / a coroa dos mártires, a beleza das virgens. / Suplicamos-Te, guia-nos, a seguir a este exílio, / até à posse do Teu Filho, Jesus. / / Ámen.



SANTA MISSA POR OCASIÃO DA VISITA


À PARÓQUIA ROMANA DE SANTO ANTÓNIO DE PÁDUA




6 de Maio de 1979




Caríssimos irmãos e irmãs

Hoje celebra-se, em toda a Igreja Católica, o Dia das vocações sacerdotais e religiosas, e eu tenho o prazer de o celebrar convosco, aqui em Roma, no centro da Cristandade, e na vossa paróquia confiada aos Sacerdotes da Congregação dos Rogacionistas, que do coração saúdo.

O actual domingo foi dedicado a esta suprema e essencial necessidade, exactamente porque a Liturgia nos apresenta a figura de Jesus «Bom Pastor».

Já o Antigo Testamento fala habitualmente de Deus como Pastor de Israel, do povo da aliança, por Ele escolhido para realizar o projecto de salvação. O Salmo 22 é hino maravilhoso ao Senhor, Pastor das nossas almas: O Senhor é meu pastor: nada me falta. Leva-me a descansar em verdes prados, conduz-me às águas refrescantes e reconforta a minha alma. Ele me guia por sendas direitas ... Ainda que tenha de andar por vales tenebrosos, não temerei nenhum mal, porque Vós estais comigo ... (Ps 22,1-3).

78 Os profetas Isaías, Jeremias e Ezequiel voltam muitas vezes ao tema do povo «rebanho do Senhor». Eis o vosso Deus ... Como pastor apascentará o Seu rebanho e reunirá os animais dispersos ... (Is 40,11). E sobretudo anunciam o Messias como Pastor que apascentará verdadeiramente as suas ovelhas e não as deixará tresmalhar: Suscitarei, para as apascentar, um só pastor, o Meu servo David. Será ele quem as levará a pastar e lhes servirá de pastor ... (Ez 34,23).

No Evangelho é familiar esta doce e comovedora figura do pastor, que, embora os tempos estejam mudados por causa da industrialização e do urbanismo, continua a manter a sua fascinação e a sua eficácia; e todos nos recordamos da parábola tão fascinadora e sugestiva do Bom Pastor que vai à procura da ovelha tresmalhada (Lc 15,3-7)...

Em seguida, nos primeiros tempos da Igreja a iconografia cristã utilizou muito e desenvolveu este tema do Bom Pastor, cuja imagem aparece muitas vezes pintada ou esculpida nas catacumbas, nos sarcófagos e nos baptistérios. Essa iconografia, tão interessante e devota, certifica-nos que, desde os primeiros tempos da Igreja, Jesus «Bom Pastor» impressionou e comoveu os ânimos dos crentes e dos não-crentes, e foi motivo de conversão, de compromisso espiritual e de conforto. Pois bem, Jesus «Bom Pastor» está, vivo e verdadeiro, ainda hoje no meio de nós, no meio da humanidade inteira, e a cada um quer fazer ouvir a Sua voz e o Seu amor.

1. Que significa ser Bom Pastor?

Jesus no-lo explica com clareza convincente:

— O pastor conhece as suas ovelhas e as ovelhas conhecem-no a Ele: como é bonito e consolador sabermos que Jesus nos conhece um a um, que não somos anónimos para Ele, que o nosso nome — aquele nome que é combinado pelo amor dos pais e dos amigos —a Ele o conhece! Não somos «massa», «multidão», para Jesus. Somos «pessoas» individuais com valor eterno, seja como criaturas seja como pessoas remidas. Ele conhece-nos. Ele conhece-me e ama-me e entregou-se a Si mesmo por mim (Cfr. Ga 2,20).

— O pastor alimenta as suas ovelhas e condu-las a pastagens frescas e abundantes: Jesus veio trazer a vida às almas e dá-la em medida superabundante. E a vida das almas consiste essencialmente em três realidades supremas: a verdade, a graça e a glória. Jesus é a verdade, porque é o Verbo encarnado, é a «pedra angular», como dizia São Pedro aos Chefes do povo e aos anciãos, a única sobre a qual é possível construir o edifício familiar, social e político: Não há salvação em nenhum outro, pois não há debaixo do céu qualquer outro nome, dado aos homens, que nos possa salvar (Ac 4,12).

Jesus dá-nos a «graça», quer dizer, a vida divina por meio do Baptismo e dos outros Sacramentos. Mediante a «graça» tornamo-nos participantes da própria trindade de Deus. Mistério enorme, mas de indizível alegria e consolação.

Jesus, enfim, dar-nos-á a glória do Paraíso, glória total e eterna, onde seremos amados e amaremos, participando da felicidade mesma de Deus que é Infinito mesmo na alegria. O que havemos de ser — comenta São João—ainda não se manifestou. Mas sabemos que, quando Ele se manifestar, seremos semelhantes a Ele, porque O veremos como Ele é (1Jn 3,3).

— O pastor defende as suas ovelhas; não é como o mercenário que, ao chegar o lobo, foge, porque não se importa das ovelhas. Por desgraça sabemos bem que no mundo há sempre mercenários que semeiam ódio, maldade, dúvida, perturbação das ideias e dos sentimentos. Jesus, pelo contrário, com a luz da Sua palavra divina e com a força da Sua presença sacramental e eclesial, forma a nossa mente, fortifica a vontade, purifica os sentimentos e assim defende e salva de tantas experiências dolorosas e dramáticas;

— O pastor oferece até a vida pelas ovelhas: Jesus realizou o projecto do amor divino, mediante a Sua morte na cruz. Ofereceu-se na cruz para remir o homem, cada homem individual, criado pelo amor para a eternidade do Amor.

79 — O pastor, por último, sente desejo de aumentar o seu rebanho: Jesus afirma claramente o Seu anseio universal: Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco e também tenho de as conduzir; ouvirão a Minha voz e haverá um só rebanho e um só Pastor (Jn 10,16). Jesus quer que todos os homens o conheçam, o amem e o sigam.

2. Jesus quis na Igreja o sacerdote como «Bom Pastor».

A paróquia é a comunidade cristã, iluminada pelo exemplo do Bom Pastor, à volta do próprio Pároco e dos sacerdotes colaboradores.

Na paróquia o Sacerdote continua a missão e o encargo de Jesus; e por isso, deve «apascentar o rebanho», deve ensinar, instruir, dar a graça, defender as almas do erro e do mal, consolar, ajudar, converter e sobretudo amar.

Por isso, com toda a ansiedade do meu coração de Pastor da Igreja universal, vos digo: amai os vossos sacerdotes. Estimai-os, escutai-os, segui-os. Pedi todos os dias por eles. Não os deixeis sós nem no altar nem na vida quotidiana.

E não deixeis nunca de pedir pelas vocações sacerdotais e pela perseverança no compromisso da consagração ao Senhor e às almas. Mas sobretudo criai nas vossas famílias uma atmosfera propícia ao desabrochar de vocações. E vós, pais, sede generosos em corresponder aos desígnios de Deus sobre os vossos filhos.

3. Por fim, Jesus quer que seja cada um «bom pastor».

Cada cristão, em virtude do Baptismo, é chamado a ser ele próprio um «bom pastor» no ambiente em que vive. Vós, pais, deveis exercer as funções do Bom Pastor para com os vossos filhos, e também vós, filhos, deveis edificar com o vosso amor, a vossa obediência e sobretudo com a vossa fé corajosa e coerente.

Também as relações recíprocas entre os cônjuges devem modelar-se pelo exemplo do Bom Pastor, para que a vida familiar se mantenha sempre àquela altura de sentimentos e ideais como os quer o Criador, em virtude dos quais a família foi definida «Igreja doméstica». Assim também na escola, no trabalho, nos lugares de jogo e do descanso, nos hospitais e onde se sofre, procure sempre cada um ser «bom pastor» como Jesus. Mas sobretudo sejam «bons pastores» na sociedade as pessoas consagradas a Deus: os religiosos, as irmãs, aqueles que pertencem aos Institutos Seculares. Hoje e sempre devemos pedir por todas as vocações religiosas, masculinas e femininas, a fim de que na Igreja este testemunho da vida religiosa seja cada vez mais numeroso, cada vez mais vivo, cada vez mais intenso e mais eficaz. O mundo tem, hoje mais que nunca, necessidade de testemunhas convictas e inteiramente consagradas.

Caríssimos fiéis, termino recordando a sentida invocação de Jesus, Bom Pastor: A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. Rogai portanto ao Senhor da messe que envie trabalhadores para a Sua messe. (Mt 9,37 Lc 10,2).

Queira o céu que a minha visita pastoral suscite na vossa paróquia algumas vocações sacerdotais no meio de vós, jovens e meninos, inocentes e devotos; algumas vocações religiosas e missionárias no meio de vós, meninas e jovenzinhas, que desabrochais para a vida, cheias de entusiasmo.

80 Recomendemos o desejo a Maria Santíssima, Mãe de Jesus, Bom Pastor, Mãe nossa e inspiradora de todas as vocações sagradas.

Invoquemos também a intercessão do Servo de Deus, Cónego Annibale di Francia, fundador da Congregação dos «Rogacionistas», a qual, mediante o centro vocacional «Rogate», dedica a sua actividade principalmente à promoção das vocações sacerdotais e religiosas.



Homilias JOÃO PAULO II 72