Homilias JOÃO PAULO II 727


VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE

AO EXTREMO ORIENTE (PAQUISTÃO, FILIPINAS,

GUAM, JAPÃO E ALASKA)

SANTA MISSA PELA PAZ

NO "QUEZON MEMORIAL CIRCLE" DE MANILA




Quinta-feira, 19 de Fevereiro de 1981




Acabámos de ouvir, aqui no Quezon Circle, as palavras do Senhor nosso Deus narradas pelo profeta Isaías: "Paz, paz àquele que está longe e àquele que está perto, diz o Senhor, Eu o sararei" (Is 57,19). E ao contemplar hoje esta vasta assembleia, proclamos a todos vós, de perto e de longe, a paz do Senhor, a paz de Cristo! Com o Apóstolo Pedro eu digo: "Paz a todos vós que estais em Jesus Cristo" (1P 5,14).

1. Caros e amados irmãos e irmãs aqui nas Filipinas: nós celebramos hoje a paz de nosso Senhor Salvador Jesus Cristo: a paz que no Seu nascimento foi anunciada pelos anjos; a paz que Ele comunicou a todos aqueles que tiveram contacto com Ele durante a sua vida terrena, a paz dada aos Apóstolos, quando veio pôr-Se no meio deles após a Sua Ressurreição e disse-lhes: "A paz seja convosco" (Jn 20,19).

728 Estamos a celebrar a paz de Cristo conquistada para vós mediante o Seu Mistério Pascal, com a sua paixão, morte e ressurreição dos mortos. Nós podemos gozar a paz, porque Deus enviou o Seu Filho ao mundo para ser o nosso redentor.

2. E a paz que agora celebramos é a nossa redenção do pecado, a nossa libertação da ira de Deus e do castigo eterno. Sem Cristo tornar-nos-emos, segundo as palavras de São Paulo, "filhos da ira" (
Ep 2,3). Mas realmente fomos libertados por Cristo; tudo é novo em nosso relacionamento com Deus. Cristo reconciliou-nos com Ele, "purificando pelo Sangue da Sua cruz" (Col 1,20). Fomos chamados das trevas do pecado para a luz maravilhosa do Reino de Deus, onde recebemos de Jesus Cristo misericórdia, graça e paz.

3. Mediante o amor de Deus não recebemos o dom da vida humana mas tornamo-nos também filhos adoptivos de Deus. Mediante o grande acto de pacificação de Cristo — o seu sacrifício na Cruz — tomamo-nos seus irmãos e irmãs, e com Ele herdeiros da vida eterna. Por esta nossa relação com Deus em Cristo, a paz é agora possível: paz nos nossos corações e nos nossos lares, paz nas nossas comunidades e nas nossas nações, paz no mundo inteiro. Sim, Jesus Cristo é o Supremo Pacificador da história do homem, o reconciliador dos corações humanos, o libertador da humanidade, o redentor do homem. "Ele é a nossa paz" (Ep 2,14).

4. É no plano de Deus Pai que a paz, conquistada pelo seu amado Filho Jesus Cristo no Calvário, deve ser comunicada a todo o ser humano, seja individualmente seja como membro da sociedade. Esta comunicação da paz de Cristo realiza-se na Igreja pela acção do Espírito Santo que actua mediante a palavra de Deus e os Sacramentos.

Com a fé e o Baptismo nós assumimos uma relação com Deus que torna realmente possível a paz. Tornamo-nos de facto filhos de Deus e membros do Corpo de Cristo. Somos baptizados na morte de Cristo (cf. Rom Rm 6,4) — o seu grande acto de pacificação — a fim de que possamos participar da sua Ressurreição e caminhar em novidade de vida.

Mediante o Sacramento da penitência Jesus oferece-nos perdão e paz. Precisamente pela sua importância como Sacramento de reconciliação, salientava na minha primeira Encíclica "o direito do homem a um encontro mais pessoal com Cristo crucificado que perdoa" (Redemptor Hominis RH 20), e convidava à fiel observância da secular prática da confissão individual. Apresenta hoje, mais uma vez, o Sacramento da penitência como dom da paz de Cristo e do seu amor, e peço que todos vós façais todo o esforço para aproveitar esta ocasião da graça.

E a Eucaristia, caros amigos, é o ápice da nossa paz sacramental, na qual nós apresentamos novamente ao Pai o sacrifício do seu Filho e recebemos em recompensa o dom da reconciliação e da paz, o dom de Jesus mesmo. Jesus, Príncipe da paz, comunica-se a si mesmo tornando-se a nossa paz.

5. Caros irmãos e irmãs: é-nos importante compreender de que modo Deus se põe em contacto com Cristo e nos comunica a paz de Cristo. É extremamente importante para os pais transmitir aos seus filhos uma compreensão da fé e um profundo apreço da vida sacramental, de modo que cada geração possa estar consciente da paz de Cristo. O sucesso da missão da Igreja, sob este aspecto, depende de vós; está intimamente ligado à insubstituível actividade catequética da família.

6. Ao mesmo tempo, Cristo convida-nos e pede-nos que levemos a sua paz ao mundo. Este é o modo de vivermos como Ele quer; disse-o, dirigindo-se a nós, nas Bem-aventuranças Evangélicas: "Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus" (Mt 5,9). Somos chamados a transmitir aos outros a cura por nós experimentada, e a reconciliação que nos foi dada tão generosamente. E na segunda leitura de hoje foi-nos dito o que devemos fazer: "Revesti-vos, pois, de entranhas de misericórdia, de benignidade, humildade, mansidão e longanimidade, suportando-vos uns aos outros... Como o Senhor nos perdoou, assim deveis perdoar também vós" (Col 3,12 ss.). Tendo sido perdoados, somos chamados a perdoar. Tendo sido justificados pela graça de Deus, somos chamados a dar na nossa vida o testemunho da justiça, porque sabemos muito bem que somente podem existir no mundo relações pacíficas, quando a justiça de Cristo se difunde nos corações e é manifestada em todas as estruturas da sociedade.

7. Mas para comunicar a paz segundo as palavras de Cristo, devemos viver aquela paz. Conforme as palavras do Apóstolo Paulo, "resida nos vossos corações a paz de Cristo, para a qual fostes chamados, a fim de formar um só corpo" (Col 3,15). Sim, caros irmãos e irmãs, deve haver paz nas nossas famílias, entre esposos e esposas, entre pais e filhos; paz nas nossas comunidades; paz nas nossas paróquias e nas nossas igrejas locais; paz na sociedade e em toda a terra; paz nos corações dos ministros de Cristo, nos corações dos religiosos e dos leigos, nos corações de todos os que abraçam o seu Evangelho de amor.

8. Somente assim a nossa proclamação e comunicação de paz poderá, ser eficaz: paz aos pobres e aos ricos, paz aos jovens e aos anciãos, paz aos doentes e aos que sofrem, aos prisioneiros e a todos os que choram. Paz a todos os que são oprimidos pelo peso do pecado e aos que sucumbem sob o peso da sua cruz. Paz a todos os que servem connosco em nome de Cristo e para a glória do Seu Pai. Paz a todos os nossos irmãos e irmãs em Cristo, a todos os homens: a paz de reconciliação, de justiça, de libertação do medo, de libertação da opressão e do pecado, de libertação da morte eterna. A paz do Reino de Cristo, a paz da esperança, a paz de Jesus mesmo. Meus amados irmãos, esta é realmente a paz que vos proclamo hoje, a todos os que estão longe ou perto: a paz do Reino de Deus, a paz de Cristo.

729 9. A paz é vossa como dom do Senhor, como responsabilidade e como desafio. Ouçamos a Jesus, hoje e todos os dias da nossa vida. Ele fala aos nossos corações quando diz: "Bem-aventurados os pacíficos porque serão chamados filhos de Deus". Amém.



VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE

AO EXTREMO ORIENTE (PAQUISTÃO, FILIPINAS,

GUAM, JAPÃO E ALASKA)

SANTA MISSA PARA PARA AS FAMÍLIAS

NO AEROPORTO DE LAHUNG




Cebu, Ilha de Mindanao (Filipinas)

Quinta-feira, 19 de Fevereiro de 1981




Caros irmãos e irmãs em Cristo

1. Ao encontrar-me nesta importante cidade, conhecida como o berço do cristianismo nas Filipinas, desejo exprimir ao Senhor da história a minha profunda alegria e o meu sentido agradecimento. Pensar que durante 450 anos a luz do Evangelho brilhou sempre viva neste País e sobre o seu povo, é motivo de grande júbilo. Quatro séculos e meio de frutuosa interacção entre cultura local e mensagem cristã tiveram coma resultado aquela harmoniosa fusão chamada "cultura cristã Filipina". Todos os cristãos que chegam aqui do mundo inteiro encontram-se como em sua casa, entre pessoas que compartilham as suas mesmas aspirações e a mesma esperança, que encontram o próprio fulcro em Jesus Cristo, Seja louvado o Nome de Jesus por aquilo que ó Seu amor realizou!

A providência de Deus nas Filipinas foi verdadeiramente maravilhosa.A evangelização que principiou no século dezasseis não foi alguma coisa de puramente acidental. A graça divina já estava em acção quando o povo desta região teve o seu primeiro contacto com a imagem do Santo Menino. É acontecimento histórico importante, rico de significado religioso, o facto de a 1 de Janeiro de 1571, a cidade real de Sugbu ter sido rebaptizada como "Cidade do Santo Menino", e com isto a primeira cidade das Filipinas ter sido colocada sob a protecção do Menino Jesus.

2. A Providência divina permitiu-nos estar aqui hoje, para podermos oferecer um Sacrifício de louvor e agradecimento ao nosso Pai celeste pelos quatro séculos e meio de cristianismo neste País. Toda a Igreja dá graças a Deus, porque o povo "que um tempo estava longe, se aproximou graças ao sangue de Cristo" (Ep 2,12-13). Agradece a Deus os 450 anos em que o Seu nome foi aqui glorificado, porque lhe foi oferecida uma autêntica adoração, porque a Virgem Maria foi venerada com devoção e com amor, e porque milhões de pessoas renasceram em Cristo. As inesquecíveis celebrações realizadas ontem em Manila em honra do protomártir filipino, o Beato Lorenzo Ruiz, demonstraram-nos com vigor que a fé cristã ganhou raízes profundas no solo das Filipinas.

A Igreja está particularmente grata a Deus por a pequena comunidade cristã de Sugbu, sob a protecção de Jesus Menino, se ter tornado hoje uma florescente arquidiocese de dois milhões de almas, quase todas católicas, com um clero activo e zelante, quer diocesano quer religioso, com homens e mulheres religiosos e comprometidos, e com um número encorajante de seminaristas. Sinto-me também profundamente feliz por saber que existem numerosas instituições e organizações católicas e movimentos laicais. Pode dizer-se verdadeiramente que o crescimento na fé e na vida cristã foi até hoje uma característica constante da Igreja de Cebu, como também de toda a Igreja das Filipinas. O glorioso passado infunde-nos grande esperança para o futuro. As relações harmoniosas, sob a direcção do Cardeal Júlio Rosales, do Arcebispo Coadjutor e do Bispo Auxiliar, entre a jerarquia e o Clero quer diocesano quer religioso; o profundo compromisso na evangelização por parte dos sacerdotes, dos religiosos e dos leigos; a existência de um sólido sentido eclesial e a profunda religiosidade da gente: tudo isto constitui uma grande força espiritual para a construção, em Cebu, de uma Igreja dinâmica.

3. Amados irmãos e irmãs em Cristo, a veneração secular do Santo Menino aqui em Cebu, oferece-nos o ensejo, hoje, para vos falar da família. O pequenino Jesus nasceu da Virgem Maria e viveu numa família, e foi precisamente na família de Nazaré que ele iniciou a missão que o Pai lhe havia confiada. "Porquanto um menino nasceu para nós, um filho nos foi dado" (Is 9,6). N'Ele nasceu uma nova era, n'Ele o mundo foi recriado, n'Ele foi oferecida à humanidade uma nova vida, uma vida remida por Cristo e em Cristo.

Dado o Criador querer que a vida tenha origem do amor de um homem e de uma mulher unidos pelo vínculo matrimonial, e como Cristo elevou esta união esponsal à dignidade de sacramento, nós devemos ver a família, a sua natureza e a sua missão, sob a luz viva da nossa fé cristã. Com legítimo orgulho podemos afirmar que o ensinamento hodierno da Igreja sobre o matrimónio e a família foi o seu ensinamento constante em fidelidade a Cristo. A Igreja católica sempre ensinou — e repito-o aqui com a convicção que me vem da minha missão de Pastor supremo e Mestre — que o matrimónio foi estabelecido por Deus; que o matrimónio é um contrato de amor entre um homem e uma mulher; que o laço que une mulher e marido é indissolúvel por vontade de Deus; que o matrimónio entre os cristãos é um sacramento que é o símbolo da união de Cristo com a sua Igreja; e que o matrimónio deve estar aberto à transmissão da vida humana.

4. Quando Jesus deu início à sua vida pública, pregando e curando, foi enfrentado um dia por alguns fariseus, que desejavam interrogá-lo sobre o matrimónio. Jesus respondeu com clareza e firmeza, reafirmando o que tinham dito as Escrituras "Mas, ao princípio da criação, Deus fê-los homem e mulher. Por causa disso, deixará o homem seu pai e sua mãe e passarão os dois a ser uma só carne. Portanto, já não são dois, mas uma só carne. Aquilo, pois, que Deus uniu não o separe o homem" (Mc 10,6-9). Criando-os homem e mulher, Deus estabeleceu a complementaridade dos sexos; assim um homem deixa o seu pai e a sua mãe para se unir à sua esposa naquela união de amor que abraça todos os níveis da existência humana. Esta união de amor faz que o homem e a mulher cresçam juntos e tomem adequadamente cuidado dos próprios filhos. A união que faz deles uma só coisa não pode ser ofendida por autoridade humana alguma; está sempre ao serviço dos filhos e dos próprios cônjuges. Por este motivo, o amor entre um homem e uma mulher, no matrimónio, é um amor ao mesmo tempo fiel e fecundo. É um amor santo, e representa sacramentalmente a união de amor entre Cristo e a Igreja, como São Paulo escreveu aos Efésios: "É grande este mistério; digo-o, porém, em relação a Cristo e à Igreja!" (Ep 5,32).

730 5. Por estes motivos, a Igreja não modificará nem mudará nunca o próprio ensinamento sobre o matrimónio e a família. Por estes motivos, a Igreja condena todo o atentado, como a poligamia, que possa destruir a unidade do matrimónio, e cada atentado, como o divórcio, que pretenda destruir o vínculo do matrimónio.

Por estes motivos, a Igreja afirma também com clareza que o matrimónio deve estar aberto à transmissão da vida humana. Deus quis que a união de amor entre marido e mulher fosse origem de novas vidas. Ele deseja partilhar, como fez, o Seu poder criativo com os maridos e as mulheres, confiando-lhes o poder de procriar. Deus deseja que este tremendo poder de procriar uma nova vida humana seja aceito pelo casal, livremente e com amor, no momento em que escolhe livremente unir-se em matrimónio. Ser pais, além disso, tem uma dignidade toda particular, garantida pelo próprio Deus. Por meu lado, o meu mandato apostólico obriga-me a reafirmar, o mais clara e firmemente possível, o que a Igreja ensina a este respeito, e a repetir com vigor a sua condenação à contracepção artificial e ao aborto.

6. Exactamente assim: desde o momento da concepção e em todos os seus sucessivos estádios, toda a vida humana é sagrada, porque foi criada à imagem e semelhança de Deus. A vida humana é preciosa, porque é um dom de Deus, cujo amor é ilimitado; e quando Deus dá a vida, esta é para sempre. Quem quer que procure destruir a vida humana no seio materno não só ofende a sacralidade de um ser humano que vive cresce e se desenvolve, e nisto opõe-se a Deus, mas lesa também a sociedade, porque é ameaçado o respeito por toda a vida humana. Desejo repetir aqui o que afirmei durante a visita à minha Pátria: "Se se inflige o direito do homem à vida no momento em que ele começa a ser concebido no seio materno, ataca-se indirectamente toda a ordem moral que serve para assegurar os bens invioláveis do homem. A vida ocupa entre eles o primeiro lugar. A Igreja defende o direito à vida, não só por respeito à majestade do Criador que é o primeiro dador desta vida, mas também por respeito ao bem essencial do homem" (8 de Junho de 1979).

7. Quando a Igreja vos apresenta os ideais do matrimónio e da família cristã, quando insiste que o amor entre marido e mulher, e o amor dos pais devem ser caracterizados pela generosidade, ela sabe que hoje são muitos os factores que ameaçam a vida da família e que tentam o coração humano.

A busca egoísta do prazer, o permissivismo sexual e o temor de um compromisso permanente são forças destruidoras. Como uma boa mãe, a Igreja vigia pelos seus filhos nos momentos difíceis; com os seus constantes ensinamentos vigia pelos casais que se encontram em dificuldades. Com amor a compreensão perante a fraqueza humana, mas também conhecendo o poder da graça de Cristo em cada coração humano, a Igreja desafia constantemente os seus filhos. Desafia-os a tomarem consciência da dignidade do seu baptismo e do dom da graça sacramental que lhes foi conferida precisamente para que, na sua vida, possam chegar a reflectir o amor sacrifical de Cristo, desenvolver o seu próprio amor numa união fiel e indissolúvel, e responder com generosidade ao dom de se tornarem pais. Como afirma o Concílio Vaticano II: "O autêntico amor conjugal é assumido no amor divino e rege-se e enriquece-se peia virtude redentora de Cristo e pela acção salvífica da Igreja, para conduzir eficazmente os cônjuges para Deus e ajudá-los e fortalecê-los na sublime missão da paternidade e da maternidade" (Gaudium et Spes
GS 48). A todos vós, casais cristãos — esposos e pais — dirijo este convite: caminhai com Cristo! É Ele que vos revela a dignidade do pacto solene que estipulastes; é Ele quem confere um valor imenso ao vosso amor conjugal; e é Ele, Cristo Jesus, que pode fazer infinitamente mais do que tudo quanto podemos pedir ou entender (cf. Ef Ep 3,20).

8. Numa comunidade cristã, cada um tem responsabilidade para com as famílias. Os programas que têm como finalidade a família e a dignidade do matrimónio são muito importantes: programas que preparam os noivos, e programas que ajudam os cônjuges. Em relação aos próprios filhos, os pais têm um papel insubstituível, não só como primeiros educadores na fé e modelos de virtude, mas também como exemplos de fiel amor conjugal. Naquela comunidade de amor e de confiança que todas as famílias deveriam ser, os pais e os filhos podem ser evangelizados e ser ao mesmo tempo instrumentos de evangelização. O respeito autêntico pela vida e a dignidade humana, a caridade generosa e o sentido do dever e da justiça, radicados firmemente no Evangelho, provêm de uma família onde prevalecem relações sãs entre pais e filhos e onde cada membro da família procura colocar-se ao serviço dos outros. Uma família onde a oração, o amparo amoroso e a formação da fé são os princípios constantes, levará grandíssimos benefícios não só aos membros da família mesma, mas também à Igreja e à sociedade.

9. Sinto-me particularmente satisfeito por saber que em todas as Filipinas o Apostolado das Famílias recebeu entusiástica aprovação e apoio. Desejo exprimir à Conferência Episcopal das Filipinas o meu apreço por ter proclamado o decénio presente, o que vai de 1981 a 1990, "O decénio da família" e por ter preparado um vasto programa pastoral, com esta finalidade. Desejo louvar com todo o coração as várias organizações e os movimentos que, em estreita colaboração com a Jerarquia, dedicam os seus generosos esforços à família. Desejo encorajar todos os educadores católicos, e sobretudo os próprios pais, a dedicarem particular atenção à conveniente formação do jovem n relação à sexualidade humana, acentuando adequadamente o propósito original do Criador, o poder redentor de Cristo e a influência de uma vida verdadeiramente sacramental.

A delicada responsabilidade da educação sexual é tarefa prevalecente das famílias, onde uma atmosfera de respeito recíproco no amor levará a uma compreensão plenamente humana e cristã dos significados do amor e da vida.

10. E assim, meus irmãos e irmãs em Cristo, meus amigos de Cebu City e dos arredores, despeço-me de vós. Este, foi para mim um dia inesquecível: estar convosco, fazer-vos participar do ensinamento de Nosso Senhor Jesus Cristo sobre a família cristã, e sentir o vosso recíproco amor no meio da família de Deus — a Igreja. O Santo Menino vos abençoe. Maria, Mãe de Jesus, e São José, seu esposo, vos assistam e assistam todas as famílias das Filipinas para serem o espelho da santidade, da alegria e do amor da Sagrada Família de Nazaré.

Pagpalain kayo nang Poong Maykapal! Deus vos abençoe!



VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE

AO EXTREMO ORIENTE (PAQUISTÃO, FILIPINAS,

GUAM, JAPÃO E ALASKA)

SANTA MISSA PARA A COMUNIDADE DE DAVAO,

ILHA DE MINDANAO NAS FILIPINAS




Sexta-feira, 20 de Fevereiro de 1981




731 Queridos irmãos e irmãs em nosso Senhor Jesus Cristo

1. O som vibrante das nossas vozes que se difundem no ar desta florescente cidade de Davao, nesta ilha de Mindanao que tão rapidamente se desenvolve, enquanto cantamos louvores a Deus mediante nosso Senhor Jesus, lembra-nos a voz de nosso Senhor dirigida aos primeiros Apóstolos dizendo: "Foi-Me dado todo o poder no céu e na terra: Ide, pois, ensinai todas as nações, baptizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo ensinando-as a cumprir tudo quanto vos tenho mandado.

E Eu estarei sempre convosco até ao fim do mundo" (
Mt 28,18-20). Jesus, que tinha sido Ele mesmo enviado pelo Pai, enviou, por sua vez, os seus Apóstolos: "Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós" (Jn 20,21). Desde então nunca mais houve interrupção no enviar e no partir: "E eles, partindo, foram pregar por toda a parte" (Mc 16,20). Também, desde esse momento, se teve uma incessante resposta eclesial ou comunitária daqueles que crêem e são baptizados. Os Actos dos Apóstolos dizem-nos: "Os que aceitaram a Sua palavra receberam o baptismo... Eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à fracção do pão, e às orações" (Ac 2,41-42). De tudo o que precede, vemos já a natureza, comunitária da Igreja que deveria ser formada por todas as nações reunidas em unidade. Os crentes deveriam permanecer unidos uns aos outros pela e pela união fraterna, através da comum fracção do pão e das comuns orações. Os crentes teriam formado uma Igreja, uma comunidade.

Caríssimos irmãos e irmãs, não vos posso descrever a alegria que sinto de estar hoje aqui convosco nesta celebração Eucarística. Escolhido pela Providência de Deus para ser o Vigário de Cristo na terra e o Sucessor de São Pedro na Sé Apostólica de Roma, celebro convosco, num lugar milhões de milhas distante de Roma, o Sacrifício da Missa, o memorial da morte e da Ressurreição de Cristo. Estamos a proclamar juntos o mistério da fé: "Anunciamos a tua morte, Senhor, proclamamos a tua ressurreição na expectativa da tua vinda".

Este é, na verdade, um momento único de profunda satisfação. De facto, estamos reunidos aqui como Pastor e Rebanho, como uma Igreja, como o Corpo de Cristo, onde variedade de serviço mas o mesmo Senhor, onde variedade de trabalhos, mas é o mesmo Deus que os inspira todos e cada um; onde a cada um é dada a mesma manifestação do Espírito, para o bem comum (cf. 1Co 12,4-7).

Vejo as vossas características faces de Filipinos, cheias de maravilha, as faces dos filhos do nosso Pai comum, irmãos e irmãs em nosso Senhor Jesus Cristo. Mas vejo também nas vossas faces a dor que vos liga à memória de todos aqueles que sofreram e morreram durante as recentes inundações que devastaram seis províncias desta ilha. A todos vós ofereço a expressão da minha participação na dor pela perda dos vossos entes queridos, as minhas orações pelos defuntos, pelos feridos, pelos sem-casa e o meu encorajamento a fim de enfrentardes o futuro com a grave tarefa de reconstruir, com a graça de Deus, as vossas casas e a vossa vida. Vejo em todos vós, reunidos aqui no nome do Senhor, a única família de Deus, o novo Povo de Deus, que constrói junto — cada um segundo a sua função, mas sempre em solidariedade eclesial o Corpo de Cristo na alegria e no sofrimento.

2. Esta assembleia Eucarística, composta por nós que viemos do Ocidente até aqui, e por vós de Davao e Mindanao que representais única nação católica do Leste, é uma síntese do desejo de Nosso Senhor, do mandato de Nosso Senhor e da nossa resposta pessoal. O Senhor desejou reunir todas as nações num só Rebanho sob um só Pastor. O seu mandato foi fazer discípulos em todas as nações, no Leste e no Oeste, e a nossa resposta é esta grande multidão de povo de várias línguas e cores, de várias culturas e condições, unidas em comunhão eclesial para compartilhar a palavra de Deus e o Pão de vida eterna: aqui, à volta do vosso Arcebispo, e à volta da mesa da palavra de Deus e do Sacrifício Eucarístico, vós formais a vossa Igreja local, a vossa comunidade eclesial local. Estais unidos na unidade de uma única fé e de um único culto, e naquela união de amor que é o sinal distintivo dos verdadeiros discípulos de Cristo: "É por isto que todos saberão que sois Meus discípulos: Se vos amardes uns aos outros" (Jn 13,35).

Esta comunidade eclesial, a nível diocesano, com o Bispo como sinal e centro de unidade, é alimentada constantemente pela adesão leal à palavra de Deus e a um autêntico culto segundo a relação fundamental entre fé e culto: "lex orandi, lex credendi". É também revigorada pelo laço do amor entre os membros e pela participação consciente de todos os membros, segundo os dons que cada um recebeu, para a construção da Igreja local.

3. A mesma vida eclesial a nível diocesano reflecte-se no nível paroquial. A mesma variedade de dons e de ministérios contribui para a única missão de construir o Corpo de Cristo. A mesma consciência de ser membro de uma comunidade eclesial prevalece. A nível paroquial, experimenta-se dia após dia uma comunhão e uma participação de significado verdadeiramente eclesial. Nas pequenas comunidades cristãs onde os membros se conhecem entre si mais pessoalmente, o verdadeiro amor e a relação fraterna são praticados mais facilmente. A aflição e a necessidade de um irmão ou de uma irmã que se conhece e se vê todos os dias movem o coração humano ao amor e à compaixão. Por outro lado, somos menos levados a ter amor e compaixão por aqueles que não conhecemos ou não vemos. "Pois quem não ama a seu irmão, ao qual vê, como pode amar a Deus que não vê?" (1Jn 4,20).

Além disso, a dimensão comunitária da nossa vocação cristã foi fortemente salientada pela reforma litúrgica do Concílio Vaticano II. Cada acto litúrgico é, em si mesmo, um acto de todo o Corpo de Cristo, da Cabeça e dos membros. Cada sacramento e cada Missa que se celebra é um acto de Cristo e do seu Corpo. Cada boa acção realizada por um membro é em vantagem do conjunto dos membros, e cada pecado é não uma ofensa a Deus, mas também uma ferida infligida ao Corpo de Cristo. Nesta perspectiva, o nosso primeiro acto comum no início desta celebração eucarística é uma confissão dos nossos pecados contra Deus e contra o Corpo de Cristo: "Confesso a Deus omnipotente e a vós, irmãos e irmãs"; e na última parte deste acto penitencial comunitário dizemos: suplico à bem-aventurada sempre Virgem Maria, aos Anjos, aos Santos e a vós, irmãos e irmãs, que rogueis por mim a Deus nosso Senhor". De tudo isto resulta evidente que não se pode nem sequer pensar que um cristão existe só para si mesmo.

Nós somos cristãos porque pertencemos a Cristo e ao seu Corpo. Um cristão que não aprendeu a ver e a amar Cristo no seu próximo não é plenamente cristão. Um cristão não pode ser como Caim que recusou ser guarda do seu irmão. Nós somos os guardas dos nossos irmãos, estamos ligados uns aos outros com o vínculo do amor. Este amor é o mandamento de Deus para todos aqueles que crêem n'Ele. Para um cristão, viver é amar, e amar é viver. Magmahalan tayo tulad ng pagmahal sa atro nang Diyos (Amemo-nos uns aos outros como Deus nos amou).

732 4. Esta natureza comunitária ou eclesial da nossa vocação, que se pratica mais facilmente a nível diocesano ou paroquial, deve ser dirigida, todavia, à Igreja universal. Nós somos uma Igreja local só na medida em que somos parte da Igreja universal, instituída por Cristo nosso Senhor. Somos uma parte legítima só porque pertencemos ao conjunto, E Nosso Senhor teve intenção de fundar, e efectivamente fundou, uma Igreja que deveria estender-se de uma extremidade à outra da terra, para se tornar o novo Povo de Deus, e nova Israel. Cristo nosso Senhor quis que a sua Igreja fosse universal e também uma e a mesma em todo o mundo. Quis que todas as nações para além dos confins e das barreiras fossem uma comunidade eclesial guiada por um único supremo Pastor. Quis que a sua Igreja ou comunidade eclesial pregasse a mesma doutrina, praticasse o mesmo culto, observasse a mesma lei de amor e fosse guiada par um guarda das chaves com a assistência do Espírito Santo. Esta mesma Igreja é a fonte da verdade e a nascente do poder espiritual que assimila todas as culturas de todos os lugares e tempos. Esta assimilação não é consequência de culturas humanas e locais, mas da sua elevação. A verdade cristã, por sua vez, encarnou-se em cada cultura local, purificando, elevando e consolidando os seus valores.

A unidade da doutrina e do culto proclamada e salvaguardada de toda a adulteração, por obra da Igreja universal, é perfeitamente completada pela lei do amor que une todos os cristãos a Deus e cada um ao outro, todas as Igrejas locais à Igreja universal e uma à outra. Também e Igreja universal, através das Igrejas locais e sob o impulso do Espírito que nela reside, transforma gradualmente o inundo inteiro no reino de Deus aqui na terra e promove incessantemente a civilização do amor.

5. Queridos irmãos e irmãs, nosso Senhor Jesus Cristo quer que vivamos a nossa fé para a construção da comunidade eclesial, de modo que a sua redenção possa ser aplicada aos membros individualmente mediante o ministério da Igreja. Ao mesmo tempo não devemos nunca deixar de pôr em evidência que cada membro deve converter-se continuamente a Deus e conformar-se a Cristo com o amor, com o fim de neste trabalho comum, participar na construção do Corpo de Cristo.

Pode não ser difícil para alguns permanecerem fiéis à doutrina da fé como é proposta pela Igreja universal, e a um autêntico culto; podemos também ser capazes de falar línguas e interpretá-las e ter o dom de fazer profecias. Mas se não seguirmos o mandato de Nosso Senhor de amarmos Deus e nos amarmos uns aos outros, não seremos julgados dignos da sua recompensa eterna. Nosso Senhor sintetizou com clara deliberação todos os mandamentos da Antiga Lei na ordem de amar a Deus e ao próximo. Não fazer mal ou não ofender os outros é muito menos, e é um modo verdadeiramente inadequado de amar o próximo. Na nossa comunidade de cristãos, a compreensão do amor em São Paulo é a verdadeira compreensão do mandamento de Nosso Senhor de nos amarmos uns aos outros. "Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver caridade, sou como bronze que ressoa, ou como o címbalo que tine. Ainda que eu tenha o dom da profecia e conheça todos os mistérios e toda a ciência, ainda que possua a fé em plenitude, a ponto de transportar montanhas, se não tiver caridade, nada sou. Ainda que distribua todos os meus bens em esmolas e entregue o meu corpo a fim de ser queimado e não tiver caridade, de nada me aproveita" (
1Co 13,1-3).

Queridos irmãos e irmãs, se a minha visita aqui conseguisse que cada um de vós amasse só um bocadinho mais o outro; se a minha visita aqui se tornasse só um pouco mais eclesial ou oriental para a comunidade, de modo que pensásseis cada vez mais nos outros com amor; se a minha visita aqui alimentasse em vós um desejo maior de servir em vez de ser servidos, então ela, por graça de Deus, seria frutuosa e válida.

Finalmente, permiti-me, meus caríssimos em Nosso Senhor, que vos recorde e vos proponha como regra de vida nas nossas relações eclesiais a insuperável oração do Doutor Seráfico, São Francisco de Assis: "Faz de mim um instrumento da tua paz; onde há ódio faz que eu leve o teu amor, onde há ofensa o teu perdão, Senhor, e onde há dúvida a verdadeira fé em Ti. Mestre, faz que não procure tanto ser consolado como consolar ser compreendido como compreender, ser amado como amar com toda a minha alma. Faz de mim um instrumento da tua paz, para que perdoando sejamos perdoados, dando a todos os homens recebamos, e morrendo ressuscitemos para a vida eterna. Faz de mim um instrumento da tua paz. Onde há desespero que eu leve a esperança; onde há trevas que eu leve a luz e onde há tristeza que eu difunda sempre alegria".

Maraming salamat at Pagpalain nawa kayo nang Diyos.



Homilias JOÃO PAULO II 727