Homilias JOÃO PAULO II 1408


PEREGRINAÇÃO JUBILAR NA TERRA SANTA

HOMILIA DE JOÃO PAULO II

NA CONCELEBRAÇÃO DA


EUCARISTIA NO CENÁCULO


Jerusalém, 23 de Março de 2000


1. "Isto é o meu Corpo".

Reunidos no Cenáculo, escutámos a narração evangélica da Última Ceia. Escutámos as palavras que emergem das profundidades do mistério da encarnação do Filho de Deus. Jesus toma em suas mãos o pão, benze-o e parte-o, depois dá-o aos seus discípulos, dizendo: "Isto é o meu Corpo". A aliança de Deus com o seu povo está para culminar no sacrifício do seu Filho, o Verbo Eterno que se fez carne. As antigas profecias estão para se cumprir: "Não quiseste sacrifício nem oblação, mas preparaste-Me um corpo... Eis que venho, para fazer, ó Deus, a Tua vontade" (He 10,5-7). Na encarnação, o Filho de Deus, consubstancial ao Pai, tornou-se homem e recebeu da Virgem Maria um corpo. Agora, na noite antes da sua morte, diz aos seus discípulos: "Isto é o meu Corpo, oferecido em sacrifício por vós".

É com profunda emoção que escutamos, mais uma vez, as palavras pronunciadas aqui, no Cenáculo, há dois mil anos. A partir de então, elas foram repetidas, de geração em geração, por todos os que participam no sacerdócio de Cristo mediante o Sacramento da Ordem sagrada. Desse modo, o próprio Cristo repete constantemente estas palavras, através da voz dos seus sacerdotes, em toda a parte do mundo.

2. "Este é o cálice do meu Sangue, para a nova e eterna aliança; derramado por vós e por todos em remissão dos pecados. Fazei isto em Minha memória".

1409 Obedecendo ao mandato de Cristo, a Igreja repete estas palavras todos os dias na celebração da Eucaristia. Palavras que emergem das profundidades do mistério da Redenção. Na celebração da ceia pascal, na Cenáculo, Jesus tomou o cálice cheio de vinho, benzeu-o e deu-o aos seus discípulos. Isto fazia parte do rito pascal do Antigo Testamento. Contudo, Cristo, o Sacerdote da nova e eterna Aliança, usou estas palavras para proclamar o mistério salvífico da sua Paixão e da sua Morte. Sob as espécies do pão e do vinho, instituiu os sinais sacramentais do Sacrifício do seu Corpo e do seu Sangue.

"Com a vossa cruz e a vossa ressurreição salvai-nos, ó Salvador do mundo". Em cada Santa Missa, proclamamos este "mistério da fé", que durante dois mil anos alimentou e sustentou a Igreja, enquanto realiza a sua peregrinação entre as perseguições do mundo e as consolações de Deus, proclamando a cruz e a morte do Senhor até que Ele venha (cf. Lumen gentium
LG 8). Num certo sentido, Pedro e os Apóstolos, nas pessoas dos seus Sucessores, retornaram hoje ao Cenáculo para professar a fé perene da Igreja: "Cristo morreu, Cristo ressuscitou, Cristo há-de vir".

3. Com efeito, a primeira leitura da Liturgia de hoje recorda-nos a vida da primeira comunidade cristã. Os discípulos "eram perseverantes em ouvir o ensinamento dos Apóstolos, na comunhão fraterna, no partir do pão e nas orações" (Ac 2,42).

Fractio panis. A Eucaristia é tanto um banquete de comunhão na nova e eterna Aliança, quanto o sacrifício que torna presente o poder salvífico da Cruz. Desde o início o mistério eucarístico esteve sempre unido ao ensinamento e seguimento dos Apóstolos e à proclamação da Palavra de Deus, anunciada antes pelos Profetas e agora, uma vez por todas, em Cristo Jesus (cf. Hb He 1,1-2). Em toda a parte onde são pronunciadas as palavras "Isto é o meu Corpo" e invocado o Espírito Santo, a Igreja é revigorada na fé dos Apóstolos e na unidade que tem a origem e o vínculo no Espírito Santo.

4. São Paulo, o Apóstolo dos gentios, compreendeu claramente que a Eucaristia, enquanto partilha do Corpo e do Sangue de Cristo, é também um mistério de comunhão espiritual na Igreja."Nós, embora muitos, somos um só corpo, pois participamos todos desse único pão" (1Co 10,17). Na Eucaristia, Cristo, o Bom Pastor que deu a sua vida pelo rebanho, continua presente na sua Igreja. O que é a Eucaristia senão a presença sacramental de Cristo em todos aqueles que compartilham o único pão e o único cálice? Esta presença é a maior riqueza da Igreja.

Mediante a Eucaristia, Cristo edifica a Igreja. As mãos que partiram o pão para os discípulos durante a Última Ceia haveriam de estender-se na cruz, para reunir todo o povo à volta d'Ele no Reino eterno do Pai. Através da celebração da Eucaristia, Ele jamais cessa de levar homens e mulheres a serem membros do seu Corpo.

5. "Cristo morreu, Cristo ressuscitou, Cristo há-de vir".

Este é o "mistério da fé" que proclamamos em toda a celebração eucarística. Jesus Cristo, o Sacerdote da nova e eterna Aliança, remiu o mundo com o próprio sangue. Ressuscitado dos mortos, foi preparar um lugar para nós na casa do Pai. No Espírito que nos tornou filhos amados de Deus, na unidade do Corpo de Cristo, esperamos o seu retorno com jubilosa esperança.

Este ano do Grande Jubileu é uma oportunidade especial para os sacerdotes crescerem na consideração do mistério que celebram sobre o altar. Por este motivo, desejo assinar a Carta aos Sacerdotes para a Quinta-Feira Santa deste ano aqui, no Cenáculo, onde foi instituído o único sacerdócio de Jesus Cristo, que todos nós compartilhamos.

Ao celebrarmos esta Eucaristia no Cenáculo, em Jerusalém, estamos unidos à Igreja de todos os tempos e lugares. Unidos à Cabeça, estamos em comunhão com Pedro e com os Apóstolos e com os seus Sucessores no decurso dos séculos. Em união com Maria, com os Santos, com os Mártires e com todos os baptizados que viveram na graça do Espírito Santo, dizemos com força: Maranatha! "Vinde, Senhor Jesus!" (cf. Ap Ap 22,20 Ap Ap 22, todos aqueles que escolhestes, à plenitude da graça no vosso Reino eterno!

Amém.





PEREGRINAÇÃO JUBILAR NA TERRA SANTA



NA SANTA MISSA PARA OS JOVENS


JUNTO AO LAGO DE TIBERÍADES


1410
Monte das Bem-Aventuranças

Sexta-feira 24 de Março de 2000




"Irmãos... vede bem quem sois!" (
1Co 1,26).

1. Hoje estas palavras de São Paulo dirigem-se a todos nós que viemos aqui ao Monte das Bem-aventuranças. Encontramo-nos sentados sobre esta colina, como os primeiros discípulos, à escuta de Jesus. No silêncio, ouvimos a sua voz suave e urgente, tão suave como esta mesma terra e tão urgente quanto a chamada a escolher entre a vida e a morte.

Quantas gerações que nos precederam ficaram profundamente sensibilizadas ao ouvirem o Sermão da Montanha! Quantos jovens ao longo dos séculos se reuniram à volta de Jesus para aprenderem as palavras da vida eterna, precisamente como hoje vos encontrais congregados aqui! Quantos jovens corações foram inspirados pelo poder da sua personalidade e pela premente verdade da sua mensagem! É maravilhoso que vos encontreis aqui!

Agradeço-lhe, Arcebispo D. Pierre Mouallem, a sua amável hospitalidade. Peço-lhe a gentileza de transmitir a minha sincera saudação à inteira comunidade greco-melquita à qual Vossa Excelência preside. Faço extensivos os meus votos fraternos aos numerosos Cardeais, ao Patriarca Sabbah, aos Bispos e Sacerdotes aqui reunidos. Saúdo os membros das comunidades Latina, Maronita, Síria, Arménia e Caldeia, assim como todos os nossos irmãos e irmãs das outras Igrejas cristãs e Comunidades eclesiais. Dirijo uma especial palavra de agradecimento aos nossos amigos muçulmanos que se encontram aqui, e aos membros da fé hebraica.

Este grandioso encontro é como que um ensaio para o Dia Mundial da Juventude, que se há-de realizar em Roma no próximo mês de Agosto! O jovem que tomou a palavra prometeu que tereis outra montanha, o Monte Sinai.

2. Há precisamente um mês, tive a graça de ir ali, onde Deus falou a Moisés e comunicou a Lei, "escrita pelo dedo de Deus" (Ex 31,18) em tábuas de pedra. Estas duas montanhas o Monte Sinai e o Monte das Bem-aventuranças oferecem-nos o itinerário da nossa vida cristã e um sumário das nossas responsabilidades perante Deus e o próximo. Juntas, a Lei e as Bem-aventuranças traçam o caminho do seguimento de Jesus e a vereda real para a maturidade e liberdade espirituais.

Os Dez Mandamentos do Sinai podem parecer negativos: "Não terás outros deuses diante de mim... não matarás. Não cometerás adultério. Não roubarás. Não apresentarás falso testemunho..." (Ex 20,3 Ex 20,13-16). Mas na realidade eles são extremamente positivos. Indo para além dos males mencionados, eles indicam o caminho para a lei do amor, que é o primeiro e maior de todos os mandamentos: "Amarás ao Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu entendimento... Amarás ao teu próximo como a ti mesmo" (Mt 22,37 Mt 22,39). Jesus mesmo disse que veio não para abolir a lei, mas para a completar (cf. Mt Mt 5,17). A sua mensagem é nova mas não destrói o que a precede; antes, leva aquilo que existe à sua plena potencialidade. Jesus ensina que o caminho do amor leva a Lei ao seu cumprimento (cf. Gl Ga 5,14). E Ele ensinou esta verdade extremamente importante nesta montanha, aqui na Galileia.

3. "Felizes de vós!", diz Ele, "felizes todos os pobres em espírito, os mansos e os misericordiosos, os aflitos, os que têm fome e sede de justiça, os que são puros de coração, os que promovem a paz e os perseguidos! Felizes de vós!". As palavras de Jesus podem parecem esquivas. É estranho que Jesus exalte aqueles que o mundo geralmente considera frágeis. Ele diz-lhes: "Felizes de vós que pareceis derrotados, porque sois os verdadeiros vencedores, os autênticos vencedores: o reino do céu é vosso!". Pronunciadas por Ele, que é "manso e humilde de coração" (Mt 11,29), estas palavras apresentam um desafio que exige uma profunda e permanente metanoia do espírito, uma grande transformação do coração.

Vós, jovens, compreendereis por que motivo esta mudança de coração é necessária! Porque estais conscientes de que há outra voz dentro de vós e ao vosso redor, uma voz contraditória. Trata-se de uma voz que diz: "Felizes os soberbos e violentos, aqueles que progridem custe o que custar, os que não têm escrúpulos, os impiedosos e os desonestos, aqueles que promovem a guerra e não a paz, os que perseguem as pessoas que se lhes apresentam como obstáculo ao longo do caminho". E parece que esta voz tem sentido num mundo onde os violentos com frequência triunfam e os desonestos dão a impressão de alcançar o sucesso. "Sim", diz a voz do mal, "são eles que hão-de vencer. Felizes deles!".

1411 4. Jesus transmite uma mensagem muito diferente. Não distante deste lugar, chamou os seus primeiros discípulos, da mesma forma que agora vos chama a vós. A sua chamada sempre exigiu uma escolha entre as duas vozes que concorrem para conquistar o vosso coração até mesmo agora, aqui nesta montanha: a voz entre o bem e o mal, entre a vida e a morte. Os jovens do século XXI que voz preferem seguir? Depositar a vossa fé em Jesus significa escolher acreditar naquilo que Ele diz, por mais estranho que isto possa parecer, e escolher a rejeição das pretensões do mal, por mais sensíveis ou atraentes que elas possam ser.

Em última análise, Jesus não só proclama as Bem-aventuranças. Ele vive as Bem-aventuranças. Ele é as Bem-aventuranças. Olhando para Ele, descobrireis o que significa ser pobre em espírito, manso e misericordioso, aflito, ter fome e sede de justiça, ser puro de coração, promover a paz, ser perseguido. Eis por que Ele tem o direito de dizer: "Vinde, segui-me!". Ele não diz simplesmente: "Fazei o que vos digo!", mas sim: "Vinde, segui-me!".

Vós escutais a sua voz nesta montanha e acreditais naquilo que Ele diz. Todavia, assim como os primeiros discípulos no Mar da Galileia, também vós deveis abandonar as vossas barcas e redes, e isto nunca é fácil, sobretudo quando deveis enfrentar um futuro incerto e sois tentados a perder a confiança na vossa herança cristã. No mundo de hoje, ser um bom cristão pode parecer algo que está acima das vossas forças. Mas Jesus não fica a olhar, deixando que enfrenteis sozinhos este desafio. Ele está sempre convosco para transformar a vossa debilidade em fortaleza. Confiai n'Ele, quando diz: "Basta-te a minha graça, pois é na fragilidade que a força manifesta todo o seu poder" (
2Co 12,9)!

5. Os discípulos passaram muito tempo com o Senhor. Eles conheceram-n'O e amaram-n'O profundamente. Descobriram o significado daquilo que, certa vez, o Apóstolo Pedro disse a Jesus: "A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna" (Jn 6,68). Descobriram que as palavras de vida eterna são as palavras do Sinai e as palavras das Bem-aventuranças. E esta foi a mensagem que eles espalharam em toda a parte.

No momento da sua Ascensão, Jesus confiou aos seus discípulos uma missão e esta certeza: "Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Portanto, ide e fazei com que todos os povos se tornem meus discípulos... Eis que Eu estarei convosco todos os dias, até ao fim do mundo" (Mt 28,18-20). Durante dois mil anos, os seguidores de Cristo cumpriram esta missão. Agora, no alvorecer do Terceiro Milénio, compete a vós realizá-la. Cabe a vós ir pelo mundo fora para anunciar a mensagem dos Dez Mandamentos e das Bem-aventuranças. Quando Deus se pronuncia, fala de coisas que têm a máxima importância para cada pessoa, para as populações do século XXI, em não menor medida do que para aquelas do século I. Os Dez Mandamentos e as Bem-aventuranças falam da verdade e da bondade, da graça e da liberdade, de tudo o que é necessário para entrar no Reino de Cristo. Agora, cabe a vós ser corajosos apóstolos desse Reino!

Jovens da Terra Santa, jovens do mundo inteiro: respondei ao Senhor, respondei ao Senhor com um coração disponível e aberto! Disponível e aberto como o coração da maior filha da Galileia, Maria, a Mãe de Jesus. Como foi que Ela respondeu? Ela disse: "Eis a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra!" (Lc 1,38).

Ó Senhor Jesus Cristo, neste lugar que vós conhecestes tão bem e muito amastes, escutai estes corações jovens e generosos! Continuai a ensinar a estes jovens a verdade dos Mandamentos e das Bem-aventuranças! Transformai-os em jubilosas testemunhas da vossa verdade e em convictos apóstolos do vosso Reino! Permanecei sempre com eles, de modo especial quando se torna difícil e exigente seguir a Vós e o Evangelho! Vós sereis a sua força e vitória!

Ó Senhor Jesus, fizestes destes jovens vossos amigos: conservai-os sempre próximos de Vós!

Amém!



PEREGRINAÇÃO JUBILAR NA TERRA SANTA



DURANTE A SANTA MISSA NA


BASÍLICA DA ANUNCIAÇÃO


Nazaré, 25 de Março de 2000


"Eis aqui a escrava do Senhor: faça-se em mim segundo a tua palavra" (Angelus).

Senhor Patriarca
1412 Venerados Irmãos no Episcopado
Reverendo Padre Guardião
Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. Hoje, 25 de Março de 2000, solenidade da Anunciação no Ano do Grande Jubileu: os olhos de toda a Igreja estão dirigidos para Nazaré. Desejei voltar à cidade de Jesus, para sentir mais uma vez, no contacto com este lugar, a presença da mulher da qual Santo Agostinho escreveu: "Ele escolheu a mãe que havia criado; criou a mãe que escolhera" (cf. Sermo 69, 3, 4). É particularmente fácil compreender aqui por que todas as gerações chamem Maria bem-aventurada (cf. Lc
Lc 1,48).

Saúdo cordialmente Sua Beatitude o Patriarca Michel Sabbah, ao qual agradeço as gentis palavras de introdução. Juntamente com o Arcebispo Boutros Mouallem e com todos vós, Bispos, sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos rejubilo com a graça desta solene celebração. Sinto-me feliz por ter a oportunidade de saudar o Ministro-Geral Franciscano Padre Giacomo Bini, que me recebeu no momento da minha chegada, e de exprimir ao Guardião, Padre Giovanni Battistelli, bem como aos Irmãos da Custódia a admiração da Igreja inteira pela devoção com que desempenhais a vossa vocação única. Presto homenagem com gratidão à vossa fidelidade à tarefa que vos foi confiada pelo próprio São Francisco e confirmada pelos Pontífices ao longo dos séculos.

2. Encontramo-nos aqui reunidos para celebrar o grande mistério que se realizou aqui há dois mil anos. O evangelista Lucas situa claramente o acontecimento no tempo e no espaço: "no sexto mês, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré. Foi a uma virgem, prometida em casamento a um homem chamado José... o nome da Virgem era Maria" (Lc 1,26-27). Mas para compreender o que aconteceu em Nazaré há dois mil anos, devemos voltar à leitura tirada da Carta aos Hebreus. Este texto permite-nos escutar uma conversa entre o Pai e o Filho acerca do desígnio de Deus para toda a eternidade. "Tu não quiseste sacrifício nem oferta.

Em vez disso, deste-me um corpo. Holocaustos e sacrifícios não são do teu agrado. Por isso Eu disse: Eis-me aqui, ó Deus... para fazer a Tua vontade" (10, 5-7). A Carta aos Hebreus diz-nos que, obedecendo à vontade do Pai, o Verbo Eterno veio entre nós a fim de oferecer o sacrifício que supera qualquer sacrifício oferecido na precedente Aliança. O seu é o sacrifício eterno e perfeito que redime o mundo.

O desígnio divino é revelado gradualmente no Antigo Testamento, sobretudo nas palavras do profeta Isaías, que acabámos de ouvir: "Ficai sabendo que Javé vos dará um sinal. A jovem concebeu e dará à luz um filho, e chamá-lo-á Emanuel" (7, 14). Emanuel: Deus connosco. Com estas palavra é prenunciado o acontecimento único que se iria realizar em Nazaré na plenitude dos tempos, e é este evento que celebramos hoje com alegria e felicidade intensas.

3. A nossa peregrinação jubilar foi uma peregrinação no espírito, iniciado nas pegadas de Abraão, "nosso pai na fé" (Cânone Romano; cf. Rm Rm 4,11-12). Esta viagem conduziu-nos hoje a Nazaré, onde encontramos Maria, a filha mais autêntica de Abraão. É Maria, mais que qualquer outra pessoa, quem nos pode ensinar o que significa viver a fé de "nosso pai". Maria é de muitas formas claramente diferente de Abraão; mas de maneira mais profunda "o amigo de Deus" (cf. Is Is 41,8) e a jovem mulher de Nazaré são muito semelhantes.

Abraão e Maria recebem uma maravilhosa promessa de Deus. Abraão ter-se-ia tornado pai de um filho, do qual iria nascer uma grande nação. Maria tornar-se-ia Mãe de um filho que seria o Messias, o Ungido do Senhor. Gabriel diz: "Eis que vais ficar grávida, terás um Filho... o Senhor dar-lhe-á o trono de Seu pai David... e Ele reinará para sempre" (Lc 1,31-33).

Tanto Abraão como Maria não esperavam de modo algum esta promessa. Deus muda o decurso quotidiano da vida deles, modificando os seus ritmos consolidados e as normais expectativas. Quer a Abraão quer a Maria a promessa parece ser impossível. A esposa de Abraão, Sara, era estéril e Maria ainda não é casada: "Como vai acontecer isso", perguntou Maria, "se não vivo com nenhum homem?" (Lc 1,34).

1413 4. Assim como a Abraão, também foi pedido a Maria que respondesse "sim" a algo que jamais acontecera antes. Sara é a primeira mulher estéril da Bíblia que vai conceber através do poder de Deus, precisamente como Isabel será a última. Gabriel fala de Isabel para tranquilizar Maria: "Também a tua parenta Isabel, apesar da sua velhice, concebeu um filho" (Lc 1,36).

Como Abraão, também Maria deve caminhar às escuras, entregando-se àquele que a chamou. Contudo, também a sua pergunta "como vai acontecer isso?" sugere que Maria está disposta a responder "sim", apesar dos receios e incertezas. Maria não pergunta se a promessa se pode realizar, mas unicamente como acontecerá. Por conseguinte, não surpreende que conclua pronunciando o seu fiat: "Eis a escrava do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra" (Lc 1,38). Com estas palavras Maria demonstra-se verdadeira filha de Abraão e torna-se a Mãe de Cristo e a Mãe de todos os crentes.

5. Para penetrar de maneira ainda mais profunda neste mistério, voltemos ao momento da viagem de Abraão quando lhe fora feita a promessa. Isso aconteceu quando recebeu na sua casa três hóspedes misteriosos (cf. Gn Gn 18,1-15) oferecendo-lhes a adoração devida a Deus: tres vidit et unum adoravit. Aquele encontro misterioso prefigura a Anunciação, quando Maria foi poderosamente levada à comunhão com o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Mediante o fiat pronunciado por Maria em Nazaré, a Encarnação tornou-se a maravilhosa realização do encontro de Abraão com Deus. Por conseguinte, seguindo os passos de Abraão chegámos a Nazaré para cantar o louvor da mulher "que deu ao mundo a luz" (hino Ave Regine Caelorum).

6. Contudo viemos aqui também para a suplicar. Que pedimos nós, peregrinos, em viagem no Terceiro Milénio Cristão, à Mãe de Deus? Aqui, na cidade que o Papa Paulo VI, quando visitou Nazaré, definiu "a escola do Evangelho". Aqui aprende-se a observar, a escutar, a meditar, a penetrar o sentido, tão profundo e misterioso, daquela simplicíssima, hulmildíssima, lindíssima aparação" (Alocução em Nazaré, 5 de Janeiro de 1964). Rezo, em primeiro lugar, por uma grande renovação da fé de todos os filhos da Igreja. Uma profunda renovação de fé: não só uma atitude geral de vida, mas uma profissão consciente e corajosa do Credo: "Et incarnatus est de Spiritu Sanctu ex Maria Virgine, et homo factus est".

Em Nazaré, onde Jesus "crescia em sabedoria, em estatura e graça diante de Deus e dos homens" (Lc 2,52), peço à Sagrada Família que inspire todos os cristãos a defender a família, a defender a família contra as numerosas ameaças que actualmente pesam sobre a sua natureza, a sua estabilidade e missão. Confio à Sagrada Família os esforços dos cristãos e de todas as pessoas de boa vontade a fim de defender a vida e promover o respeito pela dignidade de cada ser humano.

Consagro a Maria, a Theotókos, a grande Mãe de Deus, as famílias da Terra Santa, as famílias do mundo.

Em Nazaré, onde Jesus iniciou o seu ministério público, peço a Maria que ajude a Igreja em toda a parte a anunciar a "boa nova" aos pobres, precisamente como Ele fez (cf. Lc Lc 4,18). Neste "ano de graça do Senhor", peço que ela nos ensine o caminho da humilde e jubilosa obediência ao Evangelho no serviço dos nossos irmãos e irmãs, sem preferências nem preconceitos.

"Mãe do Verbo Encarnado, não desprezes a minha oração, mas ouve-me e atende-me com benevolência. Amém" (Memorare).



PEREGRINAÇÃO JUBILAR NA TERRA SANTA

HOMILIA DE JOÃO PAULO II

NA CONCELEBRAÇÃO DA EUCARISTIA NA


BASÍLICA DO SANTO SEPULCRO


Jerusalém, 26 de Março de 2000


"Creio... em Jesus Cristo... que foi concebido pelo poder do Espírito Santo, nasceu da Virgem Maria, padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado... ressuscitou ao terceiro dia".

1. Seguindo o caminho da história da salvação, tal como é narrado pelo Credo Apostólico, a minha Peregrinação jubilar conduziu-me à Terra Santa. De Nazaré, onde Jesus foi concebido da Virgem Maria por obra do Espírito Santo, cheguei a Jerusalém, onde Ele "padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado". Aqui, na Basílica do Santo Sepulcro, ajoelho-me diante do lugar da sua sepultura: "Vede o lugar onde O tinham depositado" (Mc 16,6).

1414 O sepulcro está vazio. É uma testemunha silenciosa do evento central da história humana: a ressurreição de nosso Senhor Jesus Cristo. Durante quase dois mil anos, o sepulcro vazio deu testemunho da vitória da Vida sobre a morte. Com os apóstolos e os evangelistas, com a Igreja de todos os tempos e lugares, também nós damos testemunho e proclamamos: "Cristo ressuscitou! Ressuscitado dos mortos, Ele já não morre; a morte já não tem poder sobre Ele" (cf. Rm Rm 6,9).
"Mors et vita duello conflixere mirando; dux vitae mortuus, regnat vivus" (Sequência pascal latina Victimae Paschali). O Senhor da Vida estava morto; agora reina vitorioso sobre a morte, fonte de vida eterna para todos os que crêem.

2. Nesta igreja, "Mãe de todas as Igrejas" (São João Damasceno), apresento as minhas cordiais saudações a Sua Beatitude o Patriarca Michel Sabbah, aos Ordinários das outras Comunidades católicas, ao Padre Giovanni Battistelli e aos Frades Menores da Custódia da Terra Santa, assim como aos sacerdotes, religiosos e fiéis.

Com fraterna estima e afecto saúdo o Patriarca Diodoros da Igreja greco-ortodoxa e o Patriarca Torkom da Igreja ortodoxa arménia, os representantes das Igrejas copta, síria e etíope, assim como os das Comunidades anglicana e luterana.

Aqui, onde nosso Senhor Jesus Cristo morreu "para trazer à unidade os filhos de Deus que andavam dispersos" (Jn 11,52), oxalá o Pai misericordioso fortaleça o nosso desejo de unidade e paz entre todos aqueles que receberam o dom da nova vida mediante a água salvífica do Baptismo.

3. "Destruí este templo e Eu em três dias o levantarei" (Jn 2,19).

O evangelista João diz-nos que, depois de Jesus ter ressuscitado dos mortos, os discípulos se recordaram destas palavras e acreditaram (cf. Jo Jn 2,22). Jesus pronunciou-as para que fossem um sinal para os seus discípulos. Quando visitou o Templo juntamente com os discípulos, Ele expulsou do lugar santo os cambistas e os vendedores (cf. Jo Jn 2,15). No momento em que os presentes protestaram, perguntando: "Que sinal nos mostras que justifique o Teu procedimento?", Jesus respondeu: "Destruí este Templo e em três dias Eu o levantarei". O evangelista observa que "o Templo de que falava era o Seu corpo" (Jn 2,18-21).

A profecia contida nas palavras de Jesus cumpriu-se na Páscoa, quando "ao terceiro dia Ele ressuscitou dos mortos". A ressurreição de nosso Senhor Jesus Cristo é o sinal de que o Pai celeste é fiel à sua promessa e da morte faz surgir a vida nova: "a ressurreição do corpo e a vida eterna". O mistério reflecte-se de maneira clara nesta antiga igreja da Anástasis, que contém não só o sepulcro vazio - sinal da Ressurreição - mas também o Gólgota - lugar da Crucificação. A Boa Nova da Ressurreição nunca está separada do mistério da Cruz. Na segunda Leitura escutada hoje, São Paulo diz-nos: "Nós pregamos a Cristo crucificado" (1Co 1,23). Cristo, que se ofereceu como sacrifício vespertino no altar da Cruz (cf. Sl Ps 141,2), agora revelou-se como "poder de Deus e sabedoria de Deus" (1Co 1,24). E na sua Ressurreição, os filhos e filhas de Adão tornaram-se participantes da vida divina, que era Sua desde toda a eternidade, com o Pai, no Espírito Santo.

4. "Eu sou o Senhor, teu Deus, que te fez sair do Egipto, de uma casa de escravidão" (Ex 20,2).

A Liturgia quaresmal de hoje apresenta-nos a Aliança que Deus fez com o seu povo no Monte Sinai, quando deu a Moisés os Dez Mandamentos da Lei. O Sinai representa a segunda etapa daquela grande peregrinação de fé que teve início quando Deus disse a Abraão: "Deixa a tua terra, a tua família e a casa do teu pai, e vai para a terra que Eu de indicar" (Gn 12,1).

A Lei e a Aliança são o selo da promessa feita a Abraão. Através do Decálogo e da lei moral inscrita no coração humano (cf. Rm Rm 2,15), Deus desafia de maneira radical a liberdade de todo o homem e mulher. Responder à voz de Deus que ressoa no mais íntimo da nossa consciência e escolher o bem é o uso mais sublime da liberdade humana.Significa verdadeiramente escolher entre a vida e a morte (cf. Dt Dt 30,15). Caminhando pela via da Aliança com Deus Santíssimo, o povo tornou-se guardião e testemunha da promessa, a promessa de uma autêntica libertação e da plenitude de vida.

1415 A Ressurreição de Jesus é o selo definitivo de todas as promessas de Deus, o lugar de nascimento de uma humanidade nova e ressuscitada, o penhor de uma história marcada pelos dons messiânicos da paz e da alegria espiritual. No alvorecer de um novo milénio, os cristãos podem e devem olhar para o futuro com firme confiança no poder glorioso que o Ressuscitado tem de renovar todas as coisas (cf. Ap Ap 21,5). Ele é Aquele que liberta toda a criatura da escravidão da caducidade (cf. Rm Rm 8,20). Mediante a Ressurreição, Ele abre o caminho para o repouso do grande Sabbath, o Oitavo Dia, quando a peregrinação da humanidade chegar ao termo e Deus será tudo em todos (cf. 1Co 15,28).

Aqui, junto do Santo Sepulcro e do Gólgota, enquanto renovamos a nossa profissão de fé no Senhor Ressuscitado, podemos nós talvez duvidar que no poder do Espírito da Vida nos será dada a força para superar as nossas divisões e trabalhar juntos a fim de construirmos um futuro de reconciliação, de unidade e de paz? Aqui, como em nenhum outro lugar do mundo, ouvimos mais uma vez o Senhor dizer aos seus discípulos: "Tende confiança, Eu venci o mundo!" (cf. Jo Jn 16,33).

5. "Mors et vita duello conflixere mirando; dux vitae mortuus, regnat vivus".
Resplandecente da glória do Espírito, o Senhor Ressuscitado é a Cabeça da Igreja, seu Corpo místico. Ele sustenta-a na missão de proclamar o Evangelho da salvação aos homens e mulheres de todas as gerações, até que retorne na glória!

Deste lugar, onde em primeiro lugar às mulheres e aos Apóstolos foi dado conhecer a Ressurreição, exorto todos os membros da Igreja a renovarem a sua obediência ao mandato do Senhor de levar o Evangelho até aos confins da terra. No alvorecer de um novo Milénio, há uma grande necessidade de bradar dos tectos a Boa Nova de que "Deus amou de tal modo o mundo que lhe deu o Seu Filho único, para que todo o que n'Ele crer, não pereça, mas tenha a vida eterna" (Jn 3,16). "Senhor... Tu tens palavras de vida eterna" (ibid., 6, 68). Hoje, como humilde Sucessor de Pedro, desejo repetir estas palavras enquanto celebramos o Sacrifício Eucarístico neste lugar, o mais sagrado no mundo. Com a inteira humanidade remida, faço minhas as palavras que Pedro, o pescador, dirigiu a Cristo, Filho de Deus vivo: "Senhor, para quem havemos de ir? Tu tens palavras de vida eterna".

Christós anésti!

Cristo ressuscitou! Ele verdadeiramente ressuscitou! Amém.



HOMILIA DE JOÃO PAULO II


DURANTE A CERIMÓNIA DE BEATIFICAÇÃO


DE CINCO SERVOS DE DEUS


Domingo 9 de Abril de 2000





1. "Queremos ver Jesus" (Jn 12,21).

Este é o pedido que alguns gregos, que tinham ido a Jerusalém por ocasião da Páscoa, dirigiram a Filipe. O desejo de encontrar Jesus e de ouvir a sua palavra suscita uma sua resposta solene: "Chegou a hora em que o Filho do Homem vai ser glorificado" (Ibid., v. 23). Qual é esta "hora" a que Jesus alude? O contexto esclarece-o: é a "hora" misteriosa e importante da sua morte e ressurreição.

Ver Jesus! Assim como esse grupo de gregos, ao longo dos séculos inúmeros homens e mulheres desejaram conhecer o Senhor. Viram-no com os olhos da fé. Reconheceram-no como o Messias crucificado e ressuscitado. Deixaram-se conquistar por Ele e tornaram-se seus discípulos fiéis. São os Santos e os Beatos que a Igreja nos indica como modelos a imitar e exemplos a seguir.

1416 No contexto das celebrações do Ano Santo, hoje tenho a alegria de elevar alguns novos Beatos à glória dos altares. São cinco Confessores da fé, que anunciaram Cristo com a palavra e O testemunharam com o incessante serviço aos irmãos. Trata-se de Mariano de Jesus Euse Hoyos, Sacerdote diocesano e pároco; Francisco Xavier Seelos, Sacerdote professo da Congregação do Santíssimo Redentor; Ana Rosa Gattorno, viúva, Fundadora do Instituto das Filhas de Santa Ana; Maria Isabel Hesselblad, Fundadora da Ordem das Irmãs do Santíssimo Salvador; e Maria Teresa Mankidiyan, Fundadora da Congregação da Sagrada Família, na Índia.

2. "Se alguém quer servir-Me, que Me siga. E onde Eu estiver, aí também estará o Meu servo" (
Jn 12,26), disse-nos Jesus no Evangelho que escutámos. O Sacerdote colombiano Mariano de Jesus Euse Hoyos, que hoje é elevado à glória dos altares, foi um fiel seguidor de Jesus Cristo no exercício abnegado do ministério sacerdotal. Da sua íntima experiência de encontro com o Senhor, o Padre "Marianito", como é familiarmente conhecido na sua pátria, comprometeu-se de maneira incansável na evangelização de crianças e adultos, de forma especial dos camponeses. Não poupou sacrifícios nem sofrimentos, consagrando-se durante quase cinquenta anos numa modesta paróquia de Angostura, em Antioquia, à glória de Deus e ao bem das almas que lhe eram confiadas.

O seu luminoso testemunho de caridade, compreensão, serviço, solidariedade e perdão sirva de exemplo na Colômbia e também de auxílio valioso para se continuar a trabalhar pela paz e a reconciliação nesse amado País. Se o dia 9 de Abril de há cinquenta anos assinalou o início de violências e conflitos, que infelizmente ainda hoje perduram, oxalá este dia do ano do grande Jubileu marque o começo de uma etapa em que todos os colombianos construam juntos a nova Colômbia, assente na paz, na justiça social, no respeito de todos os direitos humanos e no amor fraterno entre os filhos da mesma pátria.

3. "Devolve-me o júbilo da tua salvação, e um espírito generoso me sustente. Vou ensinar os teus caminhos aos culpados, e os pecadores voltarão para ti" (Ps 51 [50], 14-15). Fiel ao espírito e ao carisma da Congregação redentorista a que pertencia, o Padre Francisco Xavier Seelos meditava com frequência estas palavras do Salmista. Sustentado pela graça de Deus e por uma intensa vida de oração, o Padre Seelos deixou a sua pátria, a Baviera, e empenhou-se generosa e alacremente no apostolado missionário entre as comunidades de imigrantes nos Estados Unidos.

Nos vários lugares onde trabalhou, o Padre Francisco Xavier difundiu o seu entusiasmo, espírito de sacrifício e zelo apostólico. A quem estava abandonado e perdido, anunciou a mensagem de Jesus Cristo, "fonte de salvação eterna" (He 5,9) e, nas horas transcorridas no confessionário, convenceu muitos a voltarem para Deus. Hoje, o Beato Francisco Xavier Seelos convida os membros da Igreja a aprofundarem a sua união com Cristo nos Sacramentos da Penitência e da Eucaristia. Através da sua intercessão, todos aqueles que trabalham na vinha para a salvação do povo de Deus sejam encorajados e revigorados na própria tarefa.

4. "E, quando Eu for levantado da terra Jesus prometeu no Evangelho atrairei todos a Mim" (Jn 12,32). Efectivamente, será do alto da Cruz que Jesus revelará ao mundo o amor ilimitado de Deus pela humanidade necessitada de salvação. Atraída irresistivelmente por este amor, Ana Rosa Gattorno transformou a sua vida numa contínua imolação pela conversão dos pecadores e a santificação de todos os homens. Ser "porta-voz de Jesus", para fazer a mensagem do amor salvífico chegar a todos os lugares: eis o anélito mais profundo do seu coração!

Totalmente consagrada à Providência e animada por um destemido impulso de caridade, a Beata Ana Rosa Gattorno teve um único propósito, aquele de servir a Jesus nos membros dolorosos e feridos do próximo, com sensibilidade e atenção materna a todas as misérias humanas.
O singular testemunho de caridade, deixado pela nova Beata, ainda hoje constitui um encorajamento estimulante para quantos na Igreja estão comprometidos em transmitir, de maneira mais específica, o anúncio do amor de Deus que cura as feridas de cada coração e oferece a todos a plenitude da vida imortal.

5. "E, quando Eu for levantado da terra, atrairei todos a Mim" (Ibid.). A promessa de Jesus realiza-se maravilhosamente inclusive na vida de Maria Isabel Hesselblad. Assim como a sua compatriota Santa Brígida, também ela adquiriu uma profunda compreensão da sabedoria da Cruz através da oração e nos eventos da própria vida. Primeiro a experiência de pobreza; depois, o contacto com os enfermos que a impressionavam pela serenidade e confiança na ajuda de Deus; e, não obstante os numerosos obstáculos, a perseverança na fundação da Ordem do Santíssimo Salvador de Santa Brígida ensinaram-lhe que a Cruz se encontra no âmago da vida humana e constitui a derradeira revelação do amor do nosso Pai celestial. Meditando constantemente a palavra de Deus, a Irmã Isabel foi confirmada no seu propósito de trabalhar e rezar para que todos os cristãos sejam um só (cf. Jo Jn 17,21).

Ela estava persuadida de que, ouvindo a voz de Cristo crucificado, eles haveriam de congregar-se num só rebanho, sob um único Pastor (cf. Jo Jn 10,16), e desde o início mesmo a sua fundação, caracterizada pela espiritualidade eucarística e mariana, comprometeu-se na causa da unidade cristã mediante a oração e o testemunho evangélico. Por intercessão da Beata Maria Isabel Hesselblad, pioneira do ecumenismo, Deus abençoe e fecunde os esforços que a Igreja despende em vista de edificar uma comunhão cada vez mais profunda e de promover uma cooperação sempre mais eficaz entre todos os seguidores de Cristo. Ut unum sint!

6. "Se o grão de trigo não cai na terra e não morre, fica sozinho. Mas se morre, produz muito fruto" (Jn 12,24). Desde a infância, Maria Teresa Mankidiyan sabia instintivamente que o amor de Deus por ela exigia uma profunda purificação pessoal. Comprometida numa vida de oração e de penitência, a disponibilidade da Irmã Maria Teresa em abraçar a Cruz de Cristo permitiu-lhe permanecer firme diante dos frequentes mal-entendidos e das árduas provações espirituais. Sucessivamente, o paciente discernimento da sua vocação conduziu-a à fundação da Congregação da Sagrada Família, que continua a haurir inspiração do seu espírito contemplativo e do seu amor pelos pobres.

1417 Convicta de que "Deus dará a vida eterna àqueles que convertem os pecadores e os orientam pelo caminho recto" (Carta 4 ao seu Director espiritual), a Irmã Maria consagrou-se a esta tarefa mediante visitas, conselhos, orações e a prática penitencial. Por intercessão da Beata Maria Teresa, todos os consagrados e consagradas sejam fortalecidos na própria vocação de rezar pelos pecadores e de atrair os outros a Cristo através de palavras e exemplos.

7. "Eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo" (
Jr 31,33). Deus é o nosso único Senhor e nós somos o seu povo. Este inseparável pacto de amor entre Deus e a humanidade teve a sua plena realização no sacrifício pascal de Cristo. É nele que nós, não obstante pertençamos a diferentes terras e culturas, nos tornamos um único povo, uma só Igreja, a mesma construção espiritual cujas pedras luminosas e sólidas são os Santos.

Estamos gratos ao Senhor pelo maravilhoso testemunho destes novos Beatos. Olhemos para eles, especialmente neste tempo quaresmal, a fim de haurirmos deles o entusiasmo para a preparação das iminentes celebrações pascais.

Maria, Rainha dos Confessores, nos ajude a seguir o seu Filho divino, como fizeram os novos Beatos. E vós, Mariano de Jesus Euse Hoyos, Francisco Xavier Seelos, Ana Rosa Gattorno, Maria Isabel Hesselblad e Maria Teresa Chiramel Mankidiyan intercedei por nós a fim de que, participando intimamente na Paixão redentora de Cristo, possamos viver a fecundidade da semente que morre e ser recebidos como sua messe no Reino dos céus.

Amém!



JOÃO PAULO II

Homilias JOÃO PAULO II 1408