Homilias JOÃO PAULO II 1433

SANTA MISSA COM ORDENAÇÃO SACERDOTAL




Domingo do Bom Pastor, 14 de Maio de 2000

Dia Mundial de Oração pelas Vocações



1434 1. "Eu sou o Bom Pastor" (Jn 10,11).

Ressoa hoje em toda a Igreja esta palavra de Cristo. Ele, o Senhor, é o Pastor que dá a vida pelo seu rebanho. N'Ele se realiza a promessa feita pelo Deus de Israel por boca dos profetas: "Eis que Eu mesmo cuidarei das Minhas ovelhas e Me interessarei por elas" (Ez 34,11).

Neste Domingo, comummente chamado do "Bom Pastor", a Igreja celebra o Dia Mundial de Oração pelas Vocações. E tenho a alegria de ordenar, precisamente neste dia, 26 presbíteros da Diocese de Roma. São os sacerdotes do ano 2000, escolhidos para anunciar o Evangelho na nossa Diocese. A vós, caríssimos Candidatos, dirijo a minha saudação mais cordial, estendendo-a a quantos, familiares, educadores e amigos, vos circundam neste inesquecível momento da vossa existência.

2. "O Bom Pastor dá a vida pelas ovelhas" (Jn 10,11). Cristo apascenta o Povo de Deus com a força do amor, oferecendo-se a Si mesmo em sacrifício. Cumpre a sua missão de Pastor ao fazer-Se Cordeiro imolado. Sacerdos et hostia. Ninguém, porém, O obriga: é Ele mesmo que oferece a própria vida, em absoluta liberdade, para a retomar de novo (cf. Jo Jn 10,17) e vencer assim, "por nós", lá onde estávamos condenados à derrota. "Agnus redemit oves".

Ele é "a pedra que, rejeitada pelos construtores, se tornou a pedra angular" (cf. Sl Ps 117,22 Ac 4,11). Esta é a obra maravilhosa de Deus, que exaltou o seu Filho conferindo-Lhe "o nome que está acima de qualquer outro nome": o único no qual estabeleceu que podemos ser salvos (cf. Act Ac 4,12).

No nome de Jesus Cristo Bom Pastor, vós caríssimos diáconos, hoje sois consagrados presbíteros.

3. "Celebrai o Senhor, porque é bom: porque eterna é a sua misericórdia" (Ps 117,1 Ps 117,29).
Caríssimos Ordinandos, vós tornais-vos sacerdotes durante o Grande Jubileu, no "ano da misericórdia do Senhor" (Is 61,2). A graça inexaurível do Sacramento transformar-vos-á interiormente, para que a vossa vida, unida para sempre à de Cristo Sacerdote, se torne um cântico ao amor de Deus: "Misericordias Dominis in aeternum cantabo" (Ps 88,2).

O mistério do amor divino, criador e redentor, que se revelou na encarnação do Verbo e se realizou no seu sacrifício pascal, é tão grande que inunda de modo superabundante todo o vosso dia e todos os momentos do vosso ministério. Hauri incessantemente deste mistério, sobretudo na celebração da Santa Missa, a energia espiritual para cumprirdes com fidelidade a vossa missão.

Por meio das vossas mãos, o Bom Pastor continuará a oferecer de maneira sacramental a sua vida para a salvação do mundo, atraindo todos a Si e convidando-os a acolher o abraço do único Pai. Estai sempre conscientes e gratos por este dom que hoje a Providência vos concede.
Daqui a pouco, a Igreja assim advertirá a cada um de vós: "Considera aquilo que fazes / imita aquilo que celebras / conforma a tua vida ao mistério da cruz de Cristo Senhor" (Rito). Conformai a vossa vida ao mistério da Cruz de Cristo!

1435 É Cristo que salva e santifica, e vós tereis parte directa na sua obra, na medida da intensidade da vossa união com Ele. Se permanecerdes n'Ele, havereis de produzir muito fruto; sem Ele, ao contrário, nada podereis fazer (cf. Jo Jn 15,5). Ele escolheu-vos, e hoje "constitui-vos", para irdes e produzirdes fruto e o vosso fruto permanecer (cf. Jo Jn 15,16).

4. Queridos diáconos, pertenceis à Diocese de Roma, e realizastes a vossa formação nos Seminários desta Igreja: o Seminário Maior Romano, o Almo Colégio "Caprânica", o "Redemptoris Mater" e o dos Oblatos do Divino Amor. Desejo agradecer a quantos vos acompanharam e guiaram no caminho que vos conduziu até aqui. Penso nos vossos pais e nos sacerdotes que, com o exemplo e o conselho, vos ajudaram na opção vocacional. Penso nos responsáveis pela vossa preparação teológica, espiritual e pastoral, nos Superiores dos Seminários romanos, que de coração encorajo a prosseguirem com generoso empenho no seu serviço, para que a Igreja de Roma seja enriquecida de presbíteros numerosos e bem formados. A alegria de vos ver sacerdotes, sempre fiéis à vossa missão, será para todos a maior recompensa.

O vosso exemplo encoraje, além disso, outros jovens a seguirem Cristo com igual disponibilidade. Por isto oramos neste Dia dedicado às Vocações: o "Senhor da messe" continue a chamar operários do seu Reino, porque "a messe é grande" (Mt 9,37).

5. Queridos Ordinandos, sobre a vossa vocação vele Maria Santíssima, modelo de todo o chamamento de especial consagração na Igreja. Neste momento, Cristo confia-vos de novo a Ela, repetindo a cada um de vós as palavras que, do alto da Cruz, dirigiu ao Apóstolo João: "Eis a tua mãe!" (Jn 19,27).

Confio cada um de vós e o vosso ministério à Salus Populi Romani. Ela saberá guiar-vos, dia após dia, para vos tornardes um só com o Bom Pastor, de modo especial na quotidiana celebração da Eucaristia.

E Vós, "Bom Pastor, verdadeiro Pão, nutri-nos e defendei-nos" para um serviço sempre mais generoso à vossa Igreja, que actua no mundo para a salvação da humanidade. Amém!







SANTA MISSA POR OCASIÃO DO


JUBILEU DOS PRESBÍTEROS E O


80° ANIVERSÁRIO DO PAPA


Quinta-feira, 18 de maio de 2000




1. "Ecce Sacerdos magnus, qui in diebus suis placuit Deo".

O grande Sacerdote, ou melhor, o Sumo Sacerdote, é Jesus Cristo. Ele - como afirma a Carta aos Hebreus - com o próprio sangue entrou de uma vez para sempre no santuário, obtendo-nos uma redenção eterna (cf. Hb He 9,12). Cristo, Sacerdote e Vítima: Ele "é o mesmo ontem, hoje e por toda a eternidade" (He 13,8). Nesta manhã estamos reunidos para reflectir sobre o seu sacerdócio, nós que, como presbíteros, fomos chamados a participar nele de modo específico.

O sacerdócio ministerial! Dele nos fala a liturgia hodierna, fazendo-nos retornar espiritualmente ao Cenáculo, à Última Ceia, quando Cristo lavou os pés aos Apóstolos. Disto dá testemunho o evangelista João. Também Lucas, porém, no trecho há pouco proclamado, nos oferece a justa interpretação do gesto emblemático de Cristo, que diz de si: "Eu estou no meio de vós como aquele que serve" (Lc 22,27). O Mestre deixa aos seus amigos o mandamento de se amarem como Ele os amou, pondo-se ao serviço uns dos outros (cf. Jo Jn 13,14): "Dei-vos o exemplo, para que, como Eu vos fiz, façais vós também" (Jn 13,15).

2. O sacerdócio ministerial! Para ele nos remete sobretudo a Eucaristia, na qual Cristo instituiu o novo rito da Páscoa cristã, introduzindo, ao mesmo tempo, na Igreja o ministério sacerdotal.

1436 Durante a Última Ceia, Cristo tomou o pão em suas mãos, partiu-o e distribuiu-o aos Apóstolos, dizendo: "Isto é o Meu corpo oferecido em sacrifício por vós" (Rito da Missa, cf. Lc Lc 22,19 Lc Lc 22, tomou o cálice com o vinho deu-o aos Apóstolos, dizendo: "Este é o cálice do Meu sangue para remissão dos pecados. Fazei isto em Minha memória" (Rito da Missa).

Todas as vezes que repetirdes este rito - explica o apóstolo Paulo - "vós anunciais a morte do Senhor, até que Ele venha" (1Co 11,26).

Caríssimos sacerdotes, deste modo, nas nossas mãos Cristo pôs, sob as espécies do pão e do vinho, o vivo memorial do Sacrifício que Ele ofereceu ao Pai na Cruz. Confiou-o à sua Igreja, para que o celebrasse até ao fim do mundo. Na Igreja - sabemo-lo - é Ele mesmo que, como Sumo e Eterno Sacerdote da Nova Aliança, age por nosso intermédio, por meio dos ministros ordenados, ao longo dos séculos.

"Fazei isto em Minha memória": todas as vezes que o fizerdes, anunciareis a Minha morte, até à Minha última vinda.

3. O sacerdócio ministerial! Todos nós somos dele participantes, e hoje queremos elevar a Deus uma coral acção de graças por este seu extraordinário dom. Dom para todos os tempos e para os homens de toda a raça e cultura. Dom que se renova na Igreja graças à imutável misericórdia divina e à generosa e fiel resposta de tantos homens frágeis. Dom que não cessa de surpreender aquele que o recebe.

Após mais de cinquenta anos de vida sacerdotal, sinto viva em mim a necessidade de louvar a Deus e agradecer-Lhe a sua imensa bondade. O meu pensamento retorna, neste momento, ao Cenáculo de Jerusalém onde, durante a recente peregrinação na Terra Santa, pude celebrar a Santa Missa. Naquele lugar brotou, da mente e do coração de Cristo, o meu e o vosso sacerdócio. Eis por que precisamente daquela "sala do andar de cima" eu quis enviar a Carta aos Sacerdotes por ocasião da Quinta-Feira Santa, que de novo hoje apresento idealmente.

No Cenáculo, na vigília da sua Paixão, Jesus quis tornar-nos participantes da vocação e missão a Ele confiada pelo Pai celeste, isto é, a de introduzir os homens no seu universal mistério de salvação.

4. Abraço-vos com grande afecto, queridos sacerdotes do mundo inteiro! É um abraço que não tem confins e se estende aos presbíteros de cada uma das Igrejas particulares, atingindo de maneira especial vós, amados sacerdotes doentes, sozinhos ou provados por várias dificuldades.
Penso também naqueles sacerdotes que, por diversas circunstâncias, já não exercem o sagrado ministério, embora continuem a trazer em si a especial configuração a Cristo, inserida no carácter indelével da Ordem sagrada. Oro muito também por eles e convido todos a recordarem-se deles na oração, para que, graças à dispensa regularmente obtida, mantenham vivo em si o empenho da coerência cristã e da comunhão eclesial.

5. Queridos presbíteros de todos os Países e de todas as culturas, este é um dia totalmente dedicado ao nosso sacerdócio, ao sacerdócio ministerial.

Com grande afecto saúdo e agradeço ao Cardeal Dario Castrillón Hoyos, Prefeito da Congregação para o Clero, que no início da celebração me dirigiu, também em vosso nome, cordiais expressões de bons votos neste dia para mim muito significativo. Saúdo os Senhores Cardeais, os Arcebispos e Bispos presentes. Saúdo todos vós, caros Irmãos no sacerdócio, que quisestes estar hoje aqui comigo, vindos até de longe à custa de não pequenos sacrifícios. Estreito todos vós no meu coração.

1437 Fomos consagrados na Igreja para este ministério específico. Somos chamados, de vários modos, a contribuir, lá onde a Providência nos coloca, para a formação da comunidade do Povo de Deus. A nossa missão - o apóstolo Pedro no-lo recordou - é apascentar o rebanho de Deus que nos foi confiado, não com força mas de bom ânimo, não com a atitude de dominadores, mas oferecendo um testemunho exemplar (cf. 1P 5,2-3); um testemunho que pode chegar, se for necessário, até ao derramamento de sangue, como aconteceu para não poucos dos nossos coirmãos ao longo do século há pouco concluído.

É esta para nós a via da santidade, que conduz ao encontro definitivo com o "Pastor supremo", em cujas mãos está "a coroa da glória" (1P 5,4). Esta é a nossa missão ao serviço do povo cristão. Ajude-nos Maria, Mãe do nosso sacerdócio. Ajudem-nos os inúmeros santos presbíteros que nos precederam nesta missão sublime e repleta de responsabilidade.

Ora por nós também tu, querido povo cristão, que hoje te estreitas em redor de nós na fé e na alegria. Tu és o povo régio, estirpe sacerdotal, assembleia santa. Tu és o povo de Deus que, em todas as partes da terra, participas do sacerdócio de Cristo. Aceita o dom que nós hoje renovamos ao serviço desta tua singular dignidade. Tu, povo sacerdotal, dá graças connosco a Deus pelo nosso ministério e canta connosco ao teu e nosso Senhor: Louvor a Vós, ó Cristo, pelo dom do sacerdócio! Fazei com que a Igreja do novo milénio possa contar com a obra generosa de numerosos e santos sacerdotes!

Amém.
Saudações do Papa no final da Santa Missa


No termo desta bonita celebração sacerdotal, agradeço cordialmente a todos os participantes, sobretudo aos caríssimos Senhores Cardeais, Patriarcas, Arcebispos e Bispos de todo o mundo, à Cúria Romana, ao Vicariato de Roma e a todos os sacerdotes de língua italiana.

A todos agradeço a solidariedade e a adesão à Sé de Pedro e ao seu Sucessor. Levai às vossas Comunidades a minha saudação e o agradecimento pelas orações. A comunhão e a unidade entre nós é grande força para a nova evangelização.

Saúdo cordialmente os sacerdotes de língua francesa que participaram nesta celebração e agradeço-lhes ter orado juntamente comigo. Formulo votos por que a sua presença em Roma lhes fortaleça a fé e o sentido da Igreja universal. De todo o coração concedo-lhes uma afectuosa Bênção Apostólica.

Saúdo os sacerdotes anglófonos que participam na hodierna celebração jubilar, em particular todos os que celebram as bodas de prata ou de ouro da própria ordenação sacerdotal e quantos, como eu, celebram o seu octogésimo aniversário natalício. Oremos uns pelos outros, a fim de que a nossa vida seja sempre mais conforme a Jesus Cristo, o Eterno e Sumo Sacerdote, e caracterizada por aquela caridade pastoral cuja fonte é o Sagrado Coração.

Saúdo-vos, sacerdotes de língua espanhola, que participais nesta celebração jubilar. Encorajo-vos a continuar na vossa dedicação generosa e alegre ao ministério recebido, sabendo que o Senhor, que iniciou a boa obra, a levará Ele mesmo a termo.

Apresento uma saudação cordial aos peregrinos de língua alemã. Em particular, alegra-me o grande número de sacerdotes, que se uniram a mim na acção de graças da Eucaristia. Caros Irmãos! Juntos agradeçamos a Deus, Criador da vida, ter-nos criado. Agradeçamos-Lhe em particular a graça do sacerdócio, que vivemos todos os dias.

1438
A Cristo, Sumo e Eterno Sacerdote, elevo as minhas preces por todos os sacerdotes de língua portuguesa aqui presentes. Peço a Deus que vos abençoe nesta festa jubilar e a todos agradeço as demonstrações de afecto e de solidariedade cristã, pela passagem do meu aniversário natalício.

Saúdo os sacerdotes da Polónia que celebraram juntamente comigo a Eucaristia aqui na Praça de São Pedro, por ocasião do Grande Jubileu do Ano 2000.

Agradeço a todos os seus Coirmãos na Polónia a fidelidade à vocação e à Igreja. A Igreja conta convosco e com novas vocações ao sacerdócio.

Deus abençoe o vosso serviço ao Povo de Deus!






HOMILIA DE JOÃO PAULO II



RITO DE CANONIZAÇÃO DE NOVOS SANTOS MEXICANOS

Domingo, 21 de Maio de 2000



1. "Não amemos com palavras, nem com a língua, mas com obras e de verdade" (1Jn 3,18). Esta exortação, tirada do Apóstolo João, no texto da segunda leitura desta celebração, convida-nos a imitar Cristo, vivendo ao mesmo tempo em íntima comunhão com Ele. Jesus mesmo no-lo disse, também no Evangelho que acaba de ser proclamado: "O ramo que não fica unido à videira não pode dar fruto. Vós também não podereis dar fruto, se não ficardes unidos a mim" (Jn 15,4).

Através da profunda união com Cristo, iniciada no baptismo e alimentada pela oração, os sacramentos e a prática das virtudes evangélicas, homens e mulheres de todos os tempos, como filhos da Igreja, alcançaram a meta da santidade. São Santos porque colocaram Deus no centro da sua vida, fazendo da busca e difusão do seu Reino a razão da própria existência; são Santos porque as suas obras continuam a falar do seu amor total ao Senhor e aos irmãos, dando frutos copiosos graças à sua fé viva em Jesus Cristo e ao seu compromisso em amar, inclusivamente os inimigos, como Ele nos amou.

2. No contexto da peregrinação jubilar dos mexicanos, a Igreja alegra-se por proclamar Santos estes filhos do México: Cristóvão Magallanes e os seus 24 Companheiros mártires, sacerdotes e leigos; José Maria de Yermo y Parres, sacerdote fundador das Religiosas Servas do Sagrado Coração de Jesus; e Maria de Jesus Sacramentado Venegas, fundadora das Filhas do Sagrado Coração de Jesus.

Para participar nesta solene celebração, honrando assim a memória destes ilustres filhos da Igreja e da vossa Pátria, viestes do México em grande número como peregrinos, acompanhados por um abundante grupo de Bispos. Saúdo todos vós com muito afecto. A Igreja no México regozija-se ao contar com estes intercessores no céu, modelos de caridade suprema, no seguimento das pegadas de Jesus Cristo. Todos eles entregaram a própria vida a Deus e aos irmãos, através do martírio ou pelo caminho da oferenda generosa ao serviço dos necessitados. A firmeza da sua fé e esperança sustentou-os nas várias provações a que foram submetidos. É uma herança preciosa, fruto da fé arraigada em terras mexicanas que, nos alvores do terceiro milénio do Cristianismo, deve ser conservada e revitalizada para continuardes a ser fiéis a Cristo e à sua Igreja, como fostes no passado. México sempre fiel!

3. Na primeira leitura escutámos que quando Paulo se dirigia a Jerusalém, "pregava corajosamente em nome do Senhor... falava e discutia com os judeus de língua grega, mas eles procuravam um modo de o matar" (Ac 9,28-29). Com a missão de Paulo prepara-se a propagação da Igreja, levando a mensagem evangélica a todas as partes. E nesta difusão nunca faltaram perseguições e violências contra os anunciadores da Boa Nova. Porém, para além das adversidades humanas, a Igreja conta com a promessa da assistência divina. Por isso, escutámos que "a Igreja vivia em paz... Ela edificava-se e progredia no temor do Senhor, e crescia em número com a ajuda do Espírito Santo (Ibid., v. 31).

Podemos aplicar esta passagem dos Actos dos Apóstolos à situação que tiveram de viver Cristóvão Magallanes e os seus 24 Companheiros, mártires no primeiro trenténio do século XX. A maioria pertencia ao clero secular e três deles eram leigos seriamente comprometidos na ajuda aos sacerdotes. Eles não abandonaram o corajoso exercício do seu ministério, quando a perseguição religiosa aumentou na amada terra mexicana, desencadeando o ódio contra a religião católica. Todos aceitaram livre e serenamente o martírio como testemunho da própria fé, perdoando os seus perseguidores de modo explícito. Fiéis a Deus e à religião católica tão radicada nas suas comunidades eclesiais, que por eles eram servidas promovendo também o seu bem-estar material, hoje servem de exemplo para toda a Igreja e em particular para a sociedade mexicana.

1439 Após as árduas provas por que a Igreja no México passou naqueles anos turbulentos, hoje os cristãos mexicanos, animados pelo exemplo destas testemunhas da fé, podem viver em paz e harmonia, oferecendo à sociedade a riqueza dos valores evangélicos. A Igreja desenvolve-se e progride como crisol onde nascem abundantes vocações sacerdotais e religiosas, onde se formam famílias segundo o desígnio de Deus e onde os jovens, parte notável do povo mexicano, podem crescer com esperança num futuro melhor. O luminoso exemplo de Cristóvão Magallanes e dos seus Companheiros mártires vos ajude a um renovado compromisso de fidelidade a Deus, capaz de continuar a transformar a sociedade mexicana para que nela reinem a justiça, a fraternidade e a harmonia entre todos.

4. "E o seu mandamento é este: que tenhamos fé no nome do seu Filho Jesus Cristo e nos amemos uns aos outros, como Ele nos mandou" (
1Jn 3,23). O mandato mais importante que Jesus deu aos seus é de se amarem fraternalmente, como Ele os amou (cf. Jo Jn 15,12). Na segunda leitura que escutámos, o mandamento possui um dúplice aspecto: acreditarmos na pessoa de Jesus Cristo, Filho de Deus, confessando-O em todos os momentos e amar-nos uns aos outros, porque Cristo mesmo no-lo mandou. Este mandamento é tão fundamental para a vida do fiel, a ponto de se transformar no pressuposto necessário para que tenha lugar a morada divina. A fé, a esperança e o amor levam a receber Deus existencialmente, como caminho certo rumo à santidade.

Pode-se dizer que este foi o caminho empreendido por José Maria de Yermo y Parres, que viveu a sua total entrega presbiteral a Cristo, aderindo-lhe com todas as suas forças e, ao mesmo tempo, destacando-se por uma atitude primariamente orante e contemplativa. No Coração de Cristo, encontrou a guia para a sua espiritualidade e, considerando o seu amor infinito pelos homens, quis imitá-lo fazendo da caridade a regra da sua vida.

O novo Santo fundou as Religiosas Servas do Sagrado Coração de Jesus e dos Pobres, denominação que condensa os seus dois grandes amores, que expressam na Igreja o espírito e o carisma do novo Santo. Queridas Filhas de São José de Yermo y Parres, vivei com generosidade a rica herança do vosso fundador, a começar pela comunhão fraterna na comunidade, prolongando-a depois no amor misericordioso pelos irmãos, com humildade, simplicidade, eficácia e, sobretudo, em perfeita comunhão com Deus.

5. "Ficai unidos a mim e Eu ficarei unido a vós... Quem fica unido a mim, e Eu a ele, dará muito fruto, porque sem mim nada podeis" (Jn 15,4-5). No Evangelho que escutámos, Jesus exortou-nos a permanecer n'Ele para unir a si todos os homens. Este convite exige que levemos a cabo o nosso compromisso baptismal, vivamos no seu amor, nos inspiremos na sua Palavra, nos alimentemos com a Eucaristia, recebamos o seu perdão e, quando for necessário, carreguemos a Cruz com Ele. A separação de Deus é a maior tragédia que o homem pode viver. A linfa que chega ao sarmento fá-lo crescer; a graça que nos advém de Cristo torna-nos adultos e maduros, a fim de darmos frutos de vida eterna.

Santa Maria de Jesus Sacramentado Venegas, primeira mexicana canonizada, soube permanecer unida a Cristo na sua longa existência terrestre, e por isso deu abundantes frutos de vida eterna. A sua espiritualidade caracterizou-se por uma singular piedade eucarística, pois é claro que um caminho excelente para a união com o Senhor consiste em buscá-lo, adorá-lo e amá-lo no santíssimo mistério da sua presença real no Sacramento do Altar.

Ela desejou prolongar a sua obra com a fundação das Filhas do Sagrado Coração de Jesus, que hoje dão continuidade na Igreja ao seu carisma da caridade para com os pobres e enfermos. Com efeito, o amor de Deus é universal, quer chegar a todos os homens e por isso a nova Santa compreendeu que o seu dever consistia em difundi-lo, prodigalizando-se em atenções a todos até ao ocaso dos seus dias, inclusivamente quando a energia física começava a declinar e as árduas provações por que passou ao longo da sua existência debilitavam as suas forças. Fidelíssima na observância das constituições, respeitosa aos Bispos e sacerdotes, solícita para com os seminaristas, Santa Maria de Jesus Sacramentado constitui uma eloquente testemunha de absoluta consagração ao serviço de Deus e da humanidade que sofre.

6. Esta solene celebração recorda-nos que a fé exige uma profunda relação com o Senhor. Os novos Santos ensinam-nos que os verdadeiros seguidores e discípulos de Jesus são aquelas pessoas que cumprem a vontade de Deus e estão unidas a Ele mediante a fé e a graça.

Escutar a Palavra de Deus, harmonizar a própria existência e reservar o primeiro lugar a Cristo, tudo isto faz com que a vida do ser humano se configure com Ele. "Ficai unidos a mim e Eu ficarei unido a vós", este continua a ser o convite de Jesus, que deve ressoar incessantemente em cada um de nós e no nosso ambiente. Recebendo este mesmo chamamento, São Paulo pôde exclamar: "Eu vivo, mas já não sou eu quem vivo, pois é Cristo que vive em mim" (Ga 2,20). A Palavra de Deus proclamada nesta Liturgia faça com que a nossa vida seja autêntica, permanecendo existencialmente unidos ao Senhor, amando não só com palavras, mas com obras e de verdade (cf. 1Jn 3,18). Assim, a nossa vida será genuinamente "por Cristo, com Ele e n'Ele".

Estamos vivendo o Grande Jubileu do Ano 2000. Um dos seus objectivos consiste em "suscitar em cada fiel um verdadeiro anseio de santidade" (Tertio millennio adveniente, 42). O exemplo destes novos Santos, dádiva da Igreja que está no México à Igreja universal, inspire cada um dos fiéis, com todos os meios ao seu alcance e sobretudo com a ajuda da graça de Deus, a buscarem a santidade com coragem e decisão.

A Virgem de Guadalupe, invocada pelos mártires no momento supremo da entrega de si mesmos, à qual São José Maria de Yermo e Santa Maria de Jesus Sacramentado Venegas professaram uma veneração tão tenra, acompanhe com a sua protecção materna os bons propósitos de quem hoje honra os novos Santos e ajude as pessoas que seguem os seus exemplos, guie e salvaguarde também a Igreja a fim de que, com a sua acção evangelizadora e o testemunho cristão de todos os seus filhos, ilumine o caminho da humanidade no terceiro milénio cristão!

Amém.







JUBILEU DA DIOCESE DE ROMA


1440
Concelebração Eucarística na Praça de São Pedro 28 de maio de 2000




1. "Assim como o Pai me amou, também Eu vos amei: permanecei no meu amor" (
Jn 15,9). Na véspera da sua morte, Cristo abre o próprio coração aos discípulos reunidos no Cenáculo, deixando-lhes o seu testamento espiritual. No período pascal, a Igreja regressa constantemente em espírito ao Cenáculo, para ouvir de novo com reverência as palavras do Senhor e delas haurir luz e conforto para o seu caminho ao longo das sendas do mundo.

A nossa Igreja de Roma, que celebra o seu Jubileu, retorna hoje ao Cenáculo com o coração trepidante. Volta ali para se deixar interpelar pelo Mestre divino, para meditar sobre as suas palavras e descobrir a resposta mais oportuna aos pedidos que Ele lhe apresenta.

A palavra que hoje a nossa Igreja escuta dos lábios do seu Senhor é vigorosa e clarividente: "Permanecei no meu amor... O meu mandamenteo é este: amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei" (Jn 15,9 Jn 15,12). Como deixar de sentir particularmente "nossas" estas palavras de Jesus? Não tem acaso a Igreja de Roma a tarefa específica de "presidir na caridade" à inteira ecúmena cristã? (cf. Santo Inácio, Ad Rom, inscr.). Sim, o mandamento do amor compromete a nossa Igreja de Roma com vigor e exigência especiais.

E o amor é exigente. Cristo diz: "Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos" (Jn 15,13). O amor levará Jesus à cruz. Cada discípulo deve recordar-se disto. O amor provém do Cenáculo e para ali reconduz. Com efeito, depois da ressurreição será de novo ao Cenáculo que os Apóstolos irão com a mente, para evocar as palavras pronunciadas por Jesus na Quinta-Feira Santa, conscientes do conteúdo salvífico das mesmas. Em virtude do amor de Cristo, recebido e retribuído, eles já são seus amigos: "Não vos chamo empregados, pois o empregado não sabe o que o patrão faz; chamo-vos amigos, porque vos comuniquei tudo o que ouvi do meu Pai" (Jn 15,15).

Congregados no Cenáculo depois da ressurreição e da ascensão ao Céu do Mestre divino, os Apóstolos compreenderão plenamente o sentido das suas palavras: "Não fostes vós que me escolhestes, mas fui Eu que vos escolhi" (Jn 15,16). Sob a acção do Espírito Santo, estas palavras farão deles a comunidade salvífica, que é a Igreja. Os Apóstolos entenderão que foram eleitos para a especial missão de testificar o amor: "Assim como o Pai me amou, também Eu vos amei: permanecei no meu amor".

Hoje, este mandamento chega a nós: enquanto cristãos, somos chamados a ser testemunhas do amor. Este é o "fruto" que somos chamados a dar, e este fruto "permanece" no tempo e para a eternidade!

2. A segunda leitura, tirada dos Actos dos Apóstolos, fala da missão apostólica que brota deste amor. Convocado pelo centurião romano Cornélio, Pedro vai a Cesareia e ali assiste à sua conversão, à conversão de um pagão. O mesmo Apóstolo comenta esse importantíssimo evento: "Agora compreendo que Deus não faz diferença entre as pessoas. Pelo contrário, Ele aceita quem O teme e pratica a justiça, seja qual for a nação a que pertença" (Ac 10,34-35). Depois, quando o Espírito Santo desce sobre aquele grupo de crentes provenientes do paganismo, Pedro comenta: "Será que podemos negar a água do baptismo a estas pessoas que receberam o Espírito Santo, da mesma forma que nós o recebemos?" (Ac 10,47). Iluminado do Alto, Pedro compreende e atesta que todos são interpelados pelo amor de Cristo.

Encontramo-nos aqui diante de uma fase decisiva da vida da Igreja: uma viragem a que o Livro dos Actos atribui um grande relevo. De facto, os Apóstolos, e em particular Pedro, ainda não tinham entendido de forma clara que a sua missão não se limitava unicamente aos filhos de Israel. O que aconteceu na casa de Cornélio persuadiu-os de que não era assim. Doravante teve início o desenvolvimento do cristianismo fora de Israel e começou a consolidar-se uma consciência cada vez mais profunda da universalidade da Igreja: cada homem e cada mulher são chamados, sem distinção de raça e de cultura, a receber o Evangelho. O amor de Cristo é destinado a todos, e o cristão é testemunha deste amor divino e universal.

3. Fortemente persuadido desta verdade, Pedro partiu primeiro para a Antioquia e, enfim, para Roma. É a ele que a Igreja de Roma deve o seu início. O hodierno encontro da comunidade eclesial de Roma, no cerne do Grande Jubileu do Ano 2000, reanima em todos nós a memória desta origem apostólica, a memória de Pedro, primeiro Pastor da nossa Cidade. Nestes dias estão a chegar ao seu túmulo numerosos peregrinos de todas as partes da terra, para celebrarem o Jubileu da encarnação do Senhor e professarem a mesma fé de Pedro em Cristo, Filho de Deus vivo.

Assim, manifesta-se uma vez mais a especial vocação que a divina Providência reservou a Roma: ser um ponto de referência para a comunhão e a unidade de toda a Igreja, para a retomada espiritual da inteira humanidade.

1441 4. Caríssimos fiéis desta amada Igreja de Roma, estou feliz por vos dirigir a minha afectuosa saudação nesta circunstância, que nos vê reunidos para celebrar o Jubileu diocesano. Saúdo o Cardeal Vigário, o Vice-Gerente, os Bispos Auxiliares, os sacerdotes, os diáconos, os religiosos, as religiosas e todos vós, leigos activamente comprometidos nas paróquias, nos movimentos, nos grupos e nos vários ambientes de trabalho e de vida da Cidade. Cumprimento também o Presidente da Câmara Municipal e as Autoridade aqui presentes.

O dia de hoje constitui o ápice ideal de um inteiro caminho preparatório. Do Sínodo diocesano à Missão da Cidade, a nossa Igreja de Roma nas suas várias componentes demonstrou durante estes anos uma grande vitalidade pastoral e um ardente impulso evangelizador. Hoje queremos dar graças ao Senhor por isto. Através de oportunas iniciativas pastorais, a inteira Cidade pôde escutar de novo o anúncio do Evangelho nos lares e nos lugares de trabalho. Assim, manifestou-se de modo claro quanto a Igreja está arraigada no tecido da população e como se sente próxima das pessoas mais pobres e marginalizadas.

No encerramento da Missão da Cidade, na noite da Vigília de Pentecostes do ano passado, tive a oportunidade de vos dizer: não devemos extraviar os frutos desta estação, rica de dons do Senhor. Eis por que o encontro hodierno é, sim, um ponto de chegada, mas também um indispensável ponto de partida. Doravante é necessário despender um esforço geral que faça penetrar o "espírito da Missão da Cidade" cada vez mais na pastoral ordinária e diária das paróquias e das realidades eclesiais. É preciso que todos considerem isto como um "compromisso permanente", empenhando todo o povo de Deus, a começar pelos "missionários", sacerdotes, religiosos e leigos que experimentaram pessoalmente a beleza e o júbilo da evangelização. E mesmo em vista desta necessária retomada nas famílias e nos ambientes da Cidade, é mais oportuno do que nunca que no próximo ano pastoral se dê início a um atento discernimento dos frutos do caminho até aqui percorrido.

5. Damos graças a Deus por tudo o que a Diocese está a viver; estamos gratos sobretudo pelos eventos que pouco a pouco se estão a celebrar durante este Ano jubilar. Já nos encontramos na vigília de grandes e imponentes encontros, que exigem a mais vasta e generosa colaboração. Penso em primeiro lugar no Congresso Eucarístico Internacional, "coração do Jubileu", que celebra a presença viva no meio de nós e para nós do Verbo que se fez carne, "pão de vida para o mundo".
E depois, a XV Jornada Mundial da Juventude, que no mês de Agosto verá reunir-se em Roma uma multidão de jovens oriundos de todas as partes do mundo, que esperam ser recebidos com júbilo e simpatia pelos seus coetâneos romanos, e ser hospedados pelas famílias e pela inteira comunidade cristã da Cidade.

Além disso, no mês de Outubro celebraremos o Jubileu das Famílias, que exigirá um cuidado especial por parte da Diocese e das famílias cristãs. Preparemo-nos para estes eventos com íntima participação.

6. Igreja de Roma, está consciente da singularidade da tua missão, também em vista do Jubileu! Não te desencorajes diante das dificuldades que encontrares no teu caminho quotidiano!

Animar-te-á o testemunho dos Apóstolos Pedro e Paulo, que consagraram os teus primórdios com o seu sangue; encoraja-te o exemplo dos santos e dos mártires, que te entregaram a tocha de uma invicta dedicação ao Evangelho. Não temas! Graças ao empenhamento dos teus filhos, o amor de Cristo chegue a todos os habitantes da Cidade; difunda-se em cada ambiente, para levar alegria e esperança a todas as partes.

E Tu, Maria, Salus populi romani, Nossa Senhora do Divino Amor, ajuda-nos! Entregamo-nos a ti com confiança. Através da tua intercessão materna, oxalá se renove na Igreja de Roma a descida do Espírito Santo, princípio da sua unidade e força para a sua missão.

Louvado seja Jesus Cristo!






Homilias JOÃO PAULO II 1433