Homilias JOÃO PAULO II 1224

SOLENIDADE DO NATAL DO SENHOR




SANTA MISSA DA MEIA NOITE


1225
25 de Dezembro de 1998


1. «Não temais, pois vos anuncio uma grande alegria (...): Hoje, na cidade de David, nasceu-vos um Salvador, que é o Messias Senhor» (
Lc 2,10-11).

Nesta Noite Santa, a Liturgia convida-nos a celebrar, com alegria, o grande acontecimento do nascimento de Jesus, em Belém. Como ouvimos no Evangelho de Lucas, foi dado à luz numa família pobre de meios materiais, mas rica de alegria. Nasce num curral, porque para Ele não há lugar na hospedaria (cf. Lc Lc 2,7); é colocado na manjedoira, porque para Ele não há um berço; chega ao mundo no maior abandono, sem que ninguém o saiba e, ao mesmo tempo, acolhido e reconhecido em primeiro lugar pelos pastores, que recebem, do anjo, o anúncio do seu nascimento.

O acontecimento esconde um mistério. Manifestam-no os coros dos mensageiros celestes que cantam o nascimento de Jesus e proclamam glória «a Deus nas alturas e paz na terra aos homens que Ele ama» (Lc 2,14). O louvor, ao longo dos séculos, torna-se oração que se eleva do coração das multidões que, na Noite Santa, continuam a acolher o Filho de Deus.

2. Mysterium: acontecimento e mistério. Nasce um homem, que é o Filho eterno do Pai Omnipotente, Criador do céu e da terra: neste evento extraordinário revela-se o mistério de Deus. No Verbo que Se faz homem, manifesta-se o prodígio de Deus encarnado. O mistério ilumina o facto do nascimento: um menino é adorado pelos pastores na cabana de Belém. É «o Salvador do mundo», é o «Messias Senhor» (cf. Lc Lc 2,11). Os seus olhos vêem um recém-nascido envolto em panos e deitado numa manjedoira, e naquele «sinal», pela luz interior da fé, reconhecem o Messias anunciado pelos Profetas.

3. É o Emmanuel, o Deus connosco, que vem encher de graça a terra. Vem ao mundo para transformar a criação. Faz-Se homem entre os homens, para que, n'Ele e por Ele, todo o ser humano possa renovar-se profundamente. Com o seu nascimento, introduziu-nos a todos na dimensão da divindade, concedendo a possibilidade de participar na sua própria vida divina a quem, pela fé, se torna disponível a acolher este dom seu.

Tal é o significado da salvação anunciada aos pastores, na noite de Belém: «Nasceu-vos um Salvador» (Lc 2,11). A vinda de Cristo ao nosso meio é o centro da história, que desde então adquire uma nova dimensão. De certo modo, é o próprio Deus que escreve a história, ao inserir-Se dentro dela. O acontecimento da Encarnação é tão amplo que abraça toda a extensão da história humana, desde a criação à parúsia. Por isso é que na Liturgia se faz cantar toda a criação, expressando a sua alegria: os rios aplaudem, exultam as árvores da floresta, regozija-se a multidão das ilhas (cf. Sal Ps 98,8 Ps 96,12 Ps 97,1).

Todo o ser criado sobre a face da terra acolhe o anúncio. No silêncio atónito do universo, ressoa, com eco cósmico, o que a Liturgia coloca nos lábios da Igreja: Christus natus est nobis. Venite, adoremus!

4. Cristo nasceu para nós, vinde adorá-Lo! Penso já ao Natal do próximo ano, quando, se Deus quiser, darei início ao Grande Jubileu com a abertura da Porta Santa. Será um Ano Santo verdadeiramente grande, porque, de uma forma absolutamente singular, celebrar-se-á o bimilénio do acontecimento-mistério da Encarnação, no qual a humanidade atingiu o auge da sua vocação. Deus fez-Se homem para tornar o homem participante da própria divindade.

Eis o anúncio da salvação; eis a mensagem do Santo Natal! A Igreja proclama-o nesta noite, através da minha boca também, para que o ouçam os povos e nações de toda a terra: Christus natus est nobis - Cristo nasceu para nós. Venite, adoremus! - Vinde adorá-Lo.





NA CELEBRAÇÃO DO «TE DEUM» DE ACÇÃO DE GRAÇAS


31 de Dezembro de 1998

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1. A Igreja, em Roma e em todas as partes do mundo, reúne-se nesta tarde para cantar o Te Deum enquanto termina o ano de 1998.


Te Deum laudamus: Te Dominum confitemur.
Te aeternum Patrem omnis terra veneratur.

Já estamos no limiar do ano de 1999, que nos introduzirá no Grande Jubileu: este é dedicado ao Pai celeste, segundo o ritmo trinitário, que caracteriza este triénio com o qual se encerra o século XX e o segundo milénio. O ritmo trinitário, inscrito na vida quotidiana do cristão, reflecte-se na fórmula conclusiva de toda a oração litúrgica: "Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus e vive convosco, na unidade do Espírito Santo, por todos os séculos dos séculos".

Deus Pai, mistério inefável, revelou-Se-nos mediante o seu Filho Jesus Cristo, nascido, morto e ressuscitado por nós, e santifica-nos no poder do Espírito Santo. Aclamamos a Santíssima Trindade solenemente no Te Deum, com as venerandas palavras de uma longa tradição:

Patrem immensae maiestatis;
venerandum tuum verum et unicum Filium;
Sanctum quoque Paraclitum Spiritum.

Pai da vida e da santidade, nosso Pai que estais nos céus! Pai que "ninguém conhece... senão o Filho e aquele a quem o Filho O quiser revelar" (
Mt 11,27). Pai de Jesus Cristo e nosso Pai.

2. O texto bíblico, que há pouco escutámos, recorda-nos que além de nos mandar o seu Filho unigénito "na plenitude do tempo", Deus também "enviou aos nossos corações o Espírito que clama: "Abbá! Pai" (Ga 4,6).

Abbá, Pai! Nestas palavras, que o Espírito suscita nos corações dos fiéis, ressoa o eco da invocação de Jesus, assim como os discípulos a tinham recebido dos Seus próprios lábios. Fazendo-a nossa, tomamos profunda consciência da realidade da nossa adopção como filhos em Cristo, Filho eterno e unigénito do Pai, que Se fez homem no seio de Maria.

1227 Nesta tarde, enquanto saudamos o término de 1998, apresentamo-nos ao Pai para Lhe agradecer todo o bem que nos concedeu ao longo dos doze meses transcorridos. Vimos a Ele para pedir perdão pelos pecados nossos e dos outros, bem como para proclamar com confiante abandono: "Deus santo, Deus forte, Santo imortal, tende piedade de nós!". E dizemos-lhe:

"Bendito sejais Vós, Senhor,
Pai que estais nos céus,
porque na vossa infinita misericórdia
quisestes curvar-Vos
sobre a miséria do homem
e nos destes Jesus, vosso Filho,
nascido de mulher,
nosso salvador e amigo, irmão e redentor"
(Oração para o terceiro ano de preparação para o Grande Jubileu).

3. Neste momento de oração, o meu pensamento dirige-se com particular afecto aos habitantes da nossa Cidade. Confio-os ao Senhor juntamente com as suas famílias, as paróquias e as instituições públicas. Rezo especialmente por quantos, oprimidos por dificuldades e sofrimentos, têm dificuldade de em olhar com esperança para o novo ano. A todos dirijo a minha cordial saudação de paz e de bem para o ano de 1999, já às portas.

1228 Além disso, desejo saudar com afecto quantos estão presentes neste tradicional encontro espiritual de fim de ano, a começar pelo Cardeal Vigário, os Bispos Auxiliares de Roma e os outros Prelados que quiseram unir-se a nós para esta celebração. Dirijo um especial pensamento ao Padre Kolvenbach, Prepósito-Geral da Companhia de Jesus, e aos Padres jesuítas a cujo cuidado está confiado este templo, rico de memórias de santidade.

Ao Presidente da Câmara Municipal de Roma e aos membros da Administração do Capitólio, exprimo um profundo reconhecimento pela participação e a renovada homenagem do cálice votivo, recordando com intensa alegria a visita que o Senhor me concedeu realizar à Sede Municipal no início de 1998. Torno extensivo o meu pensamento ao Prefeito de Roma, que há poucos dias assumiu esta importante responsabilidade, ao Presidente da Região do Lácio e a todas as Autoridades civis, militares e religiosas aqui reunidas.

4. Como não agradecer a Deus os dons abundantes que nos dispensou durante o ano que chega ao fim? Nesta tarde quereria, juntamente convosco, dar-Lhe graças especialmente por quanto Ele realizou na nossa Comunidade diocesana. No meu pensamento evoco as visitas às paróquias, preciosas e enriquecedoras ocasiões de frutuosos encontros pastorais. No arco destes vinte anos visitei 268 paróquias, encontrando em cada uma delas o fervor de fé e de obras, graças à acção de sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos, romanos ou oriundos de outras partes da Itália e do mundo. Depois agradeço ao Senhor a Missão da Cidade que neste ano se caracterizou sobretudo pelas visitas às famílias. Ao entrarem nos lares, os missionários geralmente receberam um acolhimento positivo e encontraram significativos testemunhos de fé, também em quantos não frequentam a Igreja de modo regular. Faço votos por que estes contactos pastorais com cada núcleo familiar continuem tanto através das bênçãos das casas como mediante outras iniciativas oportunas, já experimentadas com fruto em não poucas paróquias romanas.

Nesta tarde desejo dar graças ao Senhor, de modo especial pelos milhares de missionários que, actuantes já há dois anos, constituem um providencial recurso para imprimir na pastoral diocesana um crescente impulso apostólico, também em vista do Grande Jubileu do Ano 2000.

Daqui a um ano já estaremos no Ano Santo e começarão a chegar numerosos peregrinos de todos os recantos da terra. Formulo votos de coração por que a acolhê-los seja uma Igreja viva e rica de fervor religioso; uma Igreja generosa e sensível às exigências dos irmãos, particularmente dos mais pobres e necessitados.

5. Olhando para o ano transcorrido, não posso deixar de recordar os problemas e as dificuldades que, também em Roma, assinalaram a existência de muitos dos nossos irmãos e irmãs. Penso nas famílias que têm dificuldade em corresponder ao balanço quotidiano; nos adolescentes em dificuldade e nos jovens sem perspectivas para o futuro; nos doentes, nos idosos e em quantos vivem na solidão; nas pessoas em estado de abandono, nos desabrigados e naqueles que se sentem rejeitados pela sociedade. Possa o ano novo trazer-lhes serenidade e esperança. Graças a uma ampla colaboração e às orientações sociais, económicas e políticas mais abertas à iniciativa e à mudança na Cidade, serão promovidas atitudes cada vez mais confiantes e criativas.

Quereria convidar de novo, de modo especial os fiéis, a continuarem o esforço de reflexão e de planificação, a fim de que Roma, "tendo como base a sua missão espiritual e civil, e valorizando o seu património de humanidade, de cultura e de fé, possa promover o seu desenvolvimento civil e económico, também em vista do bem da inteira Nação italiana" (Carta de 8 de Dezembro de 1998, n. 8). Formulo votos por que a nossa Metrópole se apresente ao encontro do Jubileu, profundamente renovada em todas as dimensões da vida social e espiritual.

6. Estes meus bons votos fazem-se oração para que o Senhor torne frutuoso o esforço de todos. A Ele confiamos todos as nossas aspirações e projectos. A Ele dirigem-se o nosso louvor e a nossa oração filial e confiante:

"A Vós, Pai da vida,
princípio sem princípio,
suma bondade e luz eterna,
1229 com o Filho e o Espírito Santo,
honra e glória, louvor e gratidão,
pelos séculos sem fim. Amém!"
(Oração para o terceiro ano de preparação para o Grande Jubileu).





                                                                    1999





JOÃO PAULO II


NA SOLENIDADE DA MÃE DE DEUS


E DIA MUNDIAL DA PAZ


1° de Janeiro de 1999


1. Christus heri et hodie,Principium et Finis,Alpha et Omega...

«Cristo é vivo, ontem e hoje: Ele é o Princípio e o Fim, o Alfa e o Ómega. Pertencem-Lhe os anos e os séculos. A Ele a glória e o poder pelos séculos dos séculos» (Missal Romano, Preparação do círiopascal). Todos os anos, durante a Vigília pascal, a Igreja renova esta solene aclamação a Cristo, Senhor do tempo. Também no fim do ano proclamamos esta verdade, na passagem do «ontem» para o «hoje»: «ontem», quando demos graças a Deus no final do ano velho; «hoje», ao saudar o novo ano que inicia.

Here et hodie. Celebramos Cristo que, como diz a Escritura, «é o mesmo ontem, hoje e por toda a eternidade» (He 13,8). Ele é o Senhor da história, pertencem-Lhe os séculos e os milénios.

No momento em que tem início o ano de 1999, o último antes do Grande Jubileu, é como se o mistério da história se revelasse com uma profundidade mais intensa diante de nós. Eis por que a Igreja quis imprimir o sinal trinitário da presença do Deus vivo ao triénio de preparação imediata para o acontecimento jubilar.

2. O primeiro dia do novo ano conclui a Oitava do Natal do Senhor e é de dicado à Virgem Santíssima, venerada como Mãe de Deus. O Evangelho recorda-nos que ela «conservava todas estas coisas, ponderando-as no seu coração» (Lc 2,19). Assim aconteceu em Belém, no Gólgota aos pés da cruz, no dia de Pentecostes, quando o Espírito Santo desceu ao Cenáculo.

1230 E o mesmo acontece hoje. A Mãe de Deus e dos homens conserva e medita no seu coração todos os problemas grandes e difíceis da humanidade. A Alma Redemptoris Mater caminha juntamente connosco e guia-nos, com ternura materna, rumo ao futuro. Desta forma, ela ajuda a humanidade a cruzar os «finais» dos anos, dos séculos e dos milénios, alimentando a esperança n'Aquele que é o Senhor da história.

3. Heri et hodie. Ontem e hoje. «Ontem» leva à retrospecção. Quando dirigimos o olhar para os acontecimentos deste século que está para terminar, apresentam-se aos nossos olhos as duas guerras mundiais: cemitérios, túmulos dos mortos pela pátria, famílias destruídas, choro e desespero, miséria e sofrimento. Como esquecer os campos de morte, como esquecer os filhos de Israel cruelmente exterminados, como esquecer os santos mártires: o Padre Maximiliano Kolbe, a Irmã Edith Stein e muitos outros?

Mas o nosso é também o século da Declaração Universal dos Direitos do Homem, da qual celebrámos recentemente o cinquentenário. Tendo em conta esta data, na tradicional Mensagem para o hodierno Dia Mundial da Paz, eu quis recordar que o segredo da paz verdadeira reside no respeito dos direitos humanos. «O reconhecimento da dignidade congénita de todos os membros da família humana... é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo» (n. 3).

O Concílio Vaticano II, Concílio que preparou a Igreja para entrar no Terceiro Milénio, recordou que o mundo, teatro da história do género humano, é libertado da escravidão do pecado por Cristo crucificado e ressuscitado, a fim de «ser transformado segundo os desígnios de Deus e alcançar o seu fim» (Gaudium et spes
GS 2).

Eis o modo como os crentes vêem o mundo dos nossos dias, enquanto se encaminham gradualmente para o limiar do Ano 2000.

4. O Verbo eterno, fazendo-se Homem, entrou no mundo e acolheu-o para o redimir. Por conseguinte, o mundo não está apenas assinalado pela terrível herança do pecado, mas é, em primeiro lugar, um mundo que Cristo, o Filho de Deus crucificado e ressuscitado, salvou.

Eius sunt tempora et saecula: pertencem-lhe os anos e os séculos. Por isso pensamos que, ao entrar no TerceiroMilénio com Cristo, cooperamos na transformação do mundo por Ele redimido, mundus creatus, mundus re dentus. Infelizmente a humanidade cede, de várias formas, à influência do mal. Mas, solicitada pela graça, ela reergue-se continuamente e, orientada pela força da redenção, caminha em direcção ao bem. Caminha rumo a Cristo, de acordo com o projecto de Deus Pai.

«Jesus Cristo é o Princípio e o Fim,o Alfa e o Ómega, pertencem-Lhe os anos e os séculos».

Iniciamos este novo ano no Seu nome. Maria nos obtenha a graça de sermos seus discípulos fiéis, para que com as palavras e as obras Lhe prestemos glória e honra pelos séculos dos séculos: Ipsi gloria et imperium per universa aeternitatis saecula.

Amém!

NA SOLENIDADE DA EPIFANIA DO SENHOR

E ORDENAÇÃO EPISCOPAL


6 de Janeiro de 1999




1231 1. «A luz resplandece nas trevas, mas as trevas não a admitiram» (Jn 1,5).

A inteira Liturgia de hoje fala da luz de Cristo, daquela luz que se acendeu na Noite Santa. A mesma luz que conduziu os pastores à gruta de Belém indica o caminho, no dia da Epifania, aos Magos que vieram do Oriente para adorar o Rei dos Judeus, e brilha para todos os homens e povos que aspiram a encontrar Deus.

Na sua busca espiritual, o ser humano já dispõe naturalmente de uma luz que o guia: é a razão, graças à qual mesmo tacteando ele pode orientar-se (cf. Act Ac 17,27), para o seu Criador. Mas dado que é fácil perder o caminho, Deus mesmo lhe veio em socorro com a luz da revelação, que alcançou a sua plenitude na encarnação do Verbo, eterna Palavra de verdade.

A Epifania celebra o aparecimento desta Luz divina no mundo, com a qual Deus Se encontrou com a fraca chama da razão humana. Na solenidade hodierna é proposta assim a íntima relação que se interpõe entre razão e fé, as duas asas de que dispõe o espírito humano para se elevar rumo à contemplação da verdade, como recordei na recente Encíclica Fides et ratio.

2. Cristo não é só luz que ilumina o caminho do homem. Ele fez-Se também caminho para os seus passos incertos rumo a Deus, fonte da vida. Um dia, Ele dirá aos Apóstolos: «Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vem ao Pai senão por Mim. Se vós Me conhecêsseis, também conheceríeis Meu Pai; desde agora O conheceis e O tendes visto» (Jn 14,6-7). E, diante da objecção de Filipe, acrescentará: «Quem Me vê, vê o Pai... Eu estou no Pai e o Pai está em Mim» (ibid., vv. 9.11). A epifania do Filho é a epifania do Pai.

Não é talvez este, em definitivo, o objectivo da vinda de Cristo ao mundo? Ele mesmo declarou que tinha vindo para «fazer conhecer o Pai», para «explicar» aos homens quem é Deus, para revelar o Seu rosto, o Seu «nome» (ibid.17, 3). No encontro com o Pai consiste a vida eterna (cf. ibid. 17, 3). Como é oportuna, portanto, esta reflexão, especialmente no ano dedicado ao Pai!

A Igreja prolonga nos séculos a missão do seu Senhor: o seu primeiro empenho é fazer com que todos os homens conheçam o rosto do Pai, reflectindo a luz de Cristo, lumen gentium, luz de amor, de verdade, de paz. Por isto o divino Mestre enviou ao mundo os Apóstolos e, no mesmo Espírito, continuamente envia os Bispos seus sucessores.

3. Segundo um significativo costume, na solenidade da Epifania o Bispo de Roma confere a Ordenação episcopal a alguns Prelados, e hoje tenho a alegria de vos consagrar, caríssimos Irmãos, para que na plenitude do sacerdócio vos torneis ministros da epifania de Deus entre os homens. A cada um de vós são confiadas específicas atribuições, diferentes entre si, mas todas finalizadas a difundir entre os homens o único Evangelho de salvação.

Tu, Mons. Alessandro D'Errico, como Núncio Apostólico no Paquistão; tu, Mons. Salvatore Pennacchio, como meu Representante em Ruanda; e tu, Mons. Alain Lebeaupin, como Núncio Apostólico no Equador, sereis testemunhas da unidade e da comunhão entre as Igrejas locais e a Sé Apostólica.

A ti, Mons. Cesare Mazzolari, é confiada a diocese de Rumbek, no Sudão, uma terra cuja população, submetida há anos a extenuantes sofrimentos, espera uma paz justa, no respeito dos direitos humanos de todos, a começar pelos mais débeis; e tu, Mons. Pierre Tran Dinh Tu, és por tua vez chamado a fazer-te mensageiro de esperança na diocese de Phú Cuong, no Vietname, entre irmãos e irmãs na fé, provados por não poucas dificuldades.

Tu, Mons. Diarmuid Martin, Secretário do Pontifício Conselho «Justiça e Paz»; e tu, Mons. José Luís Redrado Marchite, Secretário do Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde, continuareis o vosso apreciado serviço na Cúria Romana, tendo diante dos olhos o vasto horizonte da Igreja inteira.

1232 Missão rica de expectativas é a tua, Mons. Rafael Cob García. Vigário Apostólico de Puyo, no Equador; e a tua, Mons. Mattew Moolakkattu, Auxiliar do Bispo de Kottayam dos Sírio-Malabares, na Índia; as vossas pessoas trazem à mi- nha mente a Ásia e a América, continentes para os quais celebrámos recentemente duas Assembleias Especiais do Sínodo dos Bispos.

Digne-se o Senhor fazer com que cada um de vós, novos Bispos sobre os quais hoje imporei as mãos, leve a todas as partes, com as palavras e as obras, o jubiloso anúncio da Epifania, na qual o Filho revelou ao mundo o rosto do Pai, rico em misericórdia.

4. No limiar do terceiro milénio, o mundo tem mais do que nunca necessidade de experimentar a bondade divina, de sentir o amor de Deus por todas e cada uma das pessoas.

Também a esta nossa época condiz o oráculo do profeta Isaías, que acabámos de escutar: «A noite cobre a terra e a escuridão os povos; mas sobre ti levantar-se-á o Senhor, a sua glória te iluminará» (
Is 60,2-3). No ápice, por assim dizer, entre o segundo e o terceiro milénio, a Igreja é chamada a revestir-se de luz (cf. ibid., 60, 1), para brilhar como cidade construída sobre o monte: a Igreja não pode permanecer escondida (cf. Mt Mt 5,14), porque os homens têm necessidade de recolher a mensagem de luz e esperança e de dar glória ao Pai, que está nos céus (cf. ibid., 5, 16).

Conscientes desta tarefa apostólica e missionária, que é de todo o povo cristão, mas de modo especial de quantos o Espírito Santo pôs como Bispos a governar a Igreja de Deus (cf. Act Ac 20,28), dirigimo-nos a Belém como peregrinos, para nos unirmos aos Magos do Oriente, enquanto oferecem dons ao Rei recém-nascido.

O verdadeiro dom, porém, é Ele: Jesus, o dom de Deus ao mundo. É Ele que devemos acolher para O levar, por nossa vez, a todos aqueles com quem nos encontrarmos no nosso caminho. Para todos Ele é a epifania, a manifestação de Deus esperança do homem, de Deus libertação do homem, de Deus salvação do homem. Cristo em Belém nasceu para nós.

Vinde, adoremos! Amém.







NA FESTA DO BAPTISMO DO SENHOR


Domingo, 10 de Janeiro de 1999




1. «Este é o meu Filho amado, que muito Me agrada» (Mt 3,17).

Na hodierna festa do Baptismo de Jesus ecoam estas palavras solenes. Elas convidam-nos a reviver o momento em que Jesus, baptizado por João, sai das águas do rio Jordão e Deus Pai O apresenta como Seu Filho unigénito, o Cordeiro que tira o pecado do mundo. Ouve-se uma voz que provém do céu, enquanto o Espírito Santo, em forma de pomba, desce sobre Jesus que dá início público à sua missão de salvação; missão caracterizada pelo estilo do servo manso e humilde, preparado para a partilha e a abnegação total: «Ele não gritará nem clamará... Não quebrará a cana que já está rachada, nem apagará o pavio que ainda fumega. Promoverá fielmente o direito» (Is 42,2-3).

A Liturgia faz-nos reviver o sugestivo cenário evangélico: entre a multidão que caminha penitente em direcção a João Baptista, a fim de receber o baptismo, encontra-se também Jesus. Eis que está para se cumprir a promessa e tem início uma nova era para a humanidade inteira. Este homem, que aparentemente não é diferente dos outros, na realidade é Deus que veio até nós para dar a todos os que O acolherão o poder de «se tornarem filhos de Deus... àqueles que acreditam no Seu nome... Estes não nasceram do sangue, nem do impulso da carne, nem do desejo do homem, mas nasceram de Deus» (Jn 1,12-13).

1233 2. «Este é o Meu Filho muito amado, escutai-O!» (Aclamação ao Evangelho).

Hoje, este anúncio e este convite, ricos de esperança para a humanidade, ressoam de maneira particular para as crianças que, daqui a pouco, através do sacramento do Baptismo, serão transformadas em novas criaturas. Tornados partícipes do mistério de morte e ressurreição de Cristo, serão enriquecidos com o dom da fé e incorporados no povo da Nova Aliança, que é a Igreja. Em Cristo, o Pai torná-los-á seus filhos adoptivos, revelando-lhes um particular projecto de vida: ouvir como discípulos o Seu Filho, a fim de serem chamados a tornarem-se realmente seus filhos.

Sobre cada um deles descerá o Espírito Santo e, como aconteceu connosco no dia do nosso Baptismo, também eles gozarão daquela vida que o Pai doa aos crentes através de Jesus, o Redentor do homem. Desta riqueza de dons tão grande brotará para eles, como para todos os baptizados, uma única tarefa, que o Apóstolo Paulo não se cansou de indicar aos primeiros cristãos com as palavras: «Vivei segundo o Espírito» (
Ga 5,16), isto é, vivei e agi constantemente no amor de Deus.

Faço votos por que o Baptismo, recebido hoje por estas crianças, as possa tornar, no decurso de toda a sua vida, testemunhas corajosas do Evangelho. Isto será possível graças ao seu constante empenho. Mas também será necessária a vossa obra educativa, queridos pais, que hoje dais graças a Deus pelos dons extraordinários que Ele concede a estes vossos filhos, assim como será de igual modo preciso o apoio dos padrinhos e das madrinhas.

3. Caríssimos Irmãos e Irmãs, aceitai o convite que a Igreja vos faz: sede os seus «educadores na fé», para que neles se desenvolva a semente da vida nova e alcance a sua plena maturidade. Ajudai-os com as vossas palavras e sobretudo com o vosso exemplo.

Que eles aprendam cedo de vós a amar Cristo, a proclamá-l'O sem cessar, a imitá-l'O com uma constante adesão à sua chamada. Recebestes no lugar deles, no símbolo da vela, a chama da fé: preocupai-vos por que ela seja continuamente alimentada, a fim de que todos eles, no conhecimento e no amor de Jesus, proceda sempre segundo a sabedoria evangélica. Desta forma, tornar-se-ão verdadeiros discípulos do Senhor e apóstolos jubilosos do seu Evangelho.

Confio à Virgem Maria cada uma destas crianças e as suas respectivas famílias. Nossa Senhora ajude todos a percorrer com fidelidade o caminho inaugurado com o sacramento do Baptismo.





POR OCASIÃO DA VISITA PASTORAL


À PARÓQUIA ROMANA DEDICADA A SÃO LIBÓRIO


Domingo 17 de Janeiro de 1999




1. «Eis o Cordeiro de Deus, Aquele que tira o pecado do mundo!» (Jn 1,29). O testemunho de João Baptista continua a ecoar ainda hoje, à distância de quase dois mil anos dos acontecimentos narrados no Evangelho: o Precursor indica em Jesus de Nazaré o Messias esperado e convida-nos a todos a renovar e a aprofundar a nossa fé n'Ele.

Jesus é o nosso Redentor! A Sua missão salvífica, solenemente proclamada no momento do Baptismo no Jordão, culmina no mistério pascal, quando na cruz Ele, o verdadeiro Cordeiro imolado por nós, liberta e redime o homem, cada homem, do mal e da morte.

Na liturgia eucarística é reproposto o grande anúncio do Baptista. Antes da Comunhão, o Celebrante apresenta à adoração dos fiéis a Hóstia consagrada, dizendo: «Felizes os convidados para a Ceia do Senhor. Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo». Daqui a pouco também nós, ao participar no Banquete eucarístico, receberemos o verdadeiro Cordeiro pascal sacrificado para a salvação da humanidade inteira.

1234 2. «Eis o Cordeiro de Deus, Aquele que tira o pecado do mundo!» (Ibid.). Caríssimos paroquianos de S. Libório, dirijo-me a vós com as palavras do Baptista que acabamos de ouvir. São palavras que exprimem muito bem o significado das minhas Visitas pastorais e das Viagens apostólicas, que me levam a encontrar irmãos e irmãs na fé em Roma e noutras partes do mundo. Como o Baptista, sinto o dever de indicar a todos o Cordeiro de Deus, Jesus, o único Salvador do mundo ontem, hoje e por toda a eternidade. No mistério da sua Encarnação, Ele fez-Se o Emanuel, o «Deus-connosco», tornando-Se próximo de nós e dando significado ao tempo e às nossas vicissitudes quotidianas. Ele é o nosso ponto de referência constante, a luz que ilumina os nossos passos, a fonte da nossa esperança.

Caríssimos Irmãos e Irmãs! Saúdo todos com afecto, juntamente com o Senhor Cardeal Vigário e o Bispo Auxiliar do Sector. Saúdo o vosso zeloso Pároco, Pe. Paolo Cardona, do Instituto secular dos «Apostolici sodales», os Sacerdotes seus cooperadores, as Irmãs Franciscanas do Senhor e todos os que, com várias funções, prestam a sua generosa colaboração no âmbito da comunidade paroquial.

Dirijo um pensamento especial ao Rev.mo Mons. Bruno Theodor Kresing, Vigário-Geral da Arquidiocese de Paderborn, na Alemanha, que se encontra hoje aqui para ressaltar os vínculos de comunhão espiritual que unem a vossa Paróquia à Arquidiocese alemã, por mim visitada em 1996. Desde então, a comunidade eclesial de Paderborn participou com generosidade na realização deste novo complexo paroquial. Desejo exprimir aqui a minha profunda gratidão e invoco para estas duas comunidades a constante protecção do Padroeiro comum, São Libório.

Os laços de comunhão e de solidariedade, que relacionam entre si diversas comunidades cristãs, constituem experiências espirituais e pastorais de grande valor e convidam a desenvolver, cada vez mais, a abertura, a compreensão recíproca e o acolhimento. O pensamento dirige-se naturalmente para o próximo Jubileu, quando Roma hospedará numerosos peregrinos provenientes de todos os continentes. Tenho a certeza de que as Paróquias, os Institutos religiosos e as famílias romanas lhes abrirão generosamente as portas de casa, com entusiasmo e simplicidade evangélica. Será a ocasião para um profícuo intercâmbio de dons espirituais, e uma magnífica experiência eclesial, que ajudará todos a sentirem-se membros da única Igreja espalhada em todos os recantos da terra.

3. Paroquianos de São Libório, a vossa Comunidade recebeu muito e por este motivo agora estais chamados a ser, também vós, generosos com os outros. Viveis num bairro onde a Igreja paroquial constitui o único centro de união significativo. Tendo à disposição estruturas novas e apropriadas, sois estimulados a abrir-vos com maior arrebatamento às necessidades do território.

Neste âmbito, sinto-me feliz por inaugurar o «Sportello di fraternità» (Guiché de fraternidade) que, com a ajuda da Cáritas diocesana, inicia precisamente hoje, unindo e pondo ao serviço dos mais necessitados preciosas forças profissionais presentes na comunidade. Continuai a projectar e a realizar outras iniciativas caritativas, anunciando com coragem o Evangelho. Todos, também os que não estão oprimidos por precárias condições materiais, precisam de alguém que, como o Baptista, lhes indique Cristo, Caminho, Verdade e Vida.

Dedicai-vos com todas as energias à Missão da cidade que este ano, prosseguindo e consolidando-se no empenho pelas famílias, se dirige aos ambientes de trabalho e de actividades. Depois de terdes erigido um templo de pedra, deveis agora fazer com que, graças à vossa obra convicta, a Igreja feita de pedras vivas, isto é, de baptizados, seja cada vez mais atraente. Abertos ao diálogo, estai preparados para valorizar todas as ocasiões de crescimento na fraternidade com os cristãos e os não-cristãos, com crentes de outras confissões e não crentes.

4. Para realizar as empenhativas acções missionárias que o Senhor vos pede, é necessário estar conscientes da pessoal vocação à santidade de cada baptizado. O Apóstolo Paulo, no início da Carta aos Coríntios, recorda que, santificados em Jesus Cristo, somos «chamados a ser santos, juntamente com todos os que invocam em todo o lugar o nome de nosso Senhor» (
1Co 1,2). Somos chamados a viver o Evangelho com fidelidade total. Só assim compartilhamos deveras com as outras comunidades espalhadas pelo mundo a mesma fé em Cristo, os mesmos sacramentos e a universal vocação ao Amor.

S. Paulo dirige-se aos cristãos de Corinto com as seguintes palavras: «Graça e paz vos sejam dadas da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo» (1Co 1,3). «Graça e paz vos sejam dadas da parte de Deus nosso Pai», repito hoje, Irmãos e Irmãs desta Paróquia, e a vós da Comunidade eclesial de Paderborn, unidos pela comum devoção a São Libório. O Pai celeste vos proteja; vos assista com a sua graça e vos conceda dias de paz.

Invoco para cada um a protecção de Maria, a Virgem da escuta e do caminho. Caminhai unidos no itinerário espiritual e eclesial rumo ao Terceiro Milénio cristão. Caminhai repletos de confiança e fervor missionário, seguindo São Libório e os vossos santos Padroeiros. Aceitando o convite de João, percorrei com coragem e fidelidade os caminhos de Cristo. Ele é «o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo»! Ele é «a luz das Nações que leva a salvação até aos confins da terra».

Amém!





Homilias JOÃO PAULO II 1224