Homilias JOÃO PAULO II 1400

1400 3. "Converte-te e acredita no Evangelho". Este convite, que encontramos no início da pregação de Jesus, introduz-nos no tempo quaresmal, período a dedicar de maneira especial à conversão e à renovação, à oração, ao jejum e às obras de caridade. Recordando a experiência do povo eleito, preparamo-nos como que para repercorrer o mesmo caminho que Israel realizou através do deserto rumo à Terra Prometida. Também nós alcançaremos a meta; depois destas semanas de penitência, experimentaremos o júbilo da Páscoa. Purificados pela oração e pela penitência, os nossos olhos poderão contemplar com maior clarividência o rosto de Deus vivo, rumo ao qual o homem realiza a própria peregrinação ao longo das veredas da existência terrena.

"Não me rejeiteis para longe da vossa face, não retireis de mim o vosso santo espírito" o homem, criado não para a morte mas para a vida, reza precisamente assim. Não obstante esteja consciente das suas fragilidades, caminha sustentado pela certeza do destino divino.
Queira Deus Todo-Poderoso escutar as invocações da Igreja que, na hodierna Liturgia da Quarta-Feira de Cinzas, dirige com maior confiança a sua alma rumo ao alto. O Senhor misericordioso conceda a todos nós abrir o coração ao dom da sua graça, a fim de podermos participar com uma nova maturidade no mistério pascal de Cristo, nosso único Redentor.



DIA DO PERDÃO DO ANO SANTO DE 2000


Domingo 12 de Março de 2000

1. "Suplicamo-vos, pois, em nome de Cristo: reconciliai-vos com Deus. Aquele que não havia conhecido pecado, Deus O fez pecado por nós para que nos tornássemos n'Ele justiça de Deus" (2Co 5,20-21).


Eis as palavras de São Paulo, que a Igreja relê cada ano, na Quarta-Feira de Cinzas, no início da Quaresma. No tempo quaresmal, a Igreja deseja unir-se de modo particular a Cristo que, movido interiormente pelo Espírito Santo, empreendeu a sua missão messiânica indo para o deserto e ali jejuando durante quarenta dias e quarenta noites (cf. Mc Mc 1,12-13).

No termo daquele jejum foi tentado por satanás, como anota de maneira sintética, na liturgia hodierna, o evangelista Marcos (cf. 1, 13). Mateus e Lucas, ao contrário, com maior amplitude tratam deste combate de Cristo no deserto e da sua definitiva vitória sobre o tentador: "Vai-te, Satanás, pois está escrito: ao Senhor, teu Deus, adorarás e só a Ele prestarás culto" (Mt 4,10).
Quem fala assim é Aquele "que não havia conhecido pecado" (2Co 5,21), Jesus, "o Santo de Deus" (Mc 1,24).

2. "Aquele que não havia conhecido pecado, Deus O fez pecado por nós" (2Co 5,21). Pouco antes, na segunda Leitura, escutámos esta afirmação surpreendente do Apóstolo. O que significam estas palavras? Parecem um paradoxo, e efectivamente são-no. Como pôde Deus, que é a própria santidade, "tratar como pecado" o seu Filho unigénito, enviado ao mundo? No entanto, precisamente isto lemos na passagem da segunda Carta de São Paulo aos Coríntios. Estamos diante de um mistério à primeira vista desconcertante, mas inscrito de modo claro na divina Revelação.

Já no Antigo Testamento, o Livro de Isaías fala disto, com inspirada previdência, no quarto cântico do Servo de Javé: "Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas, cada um seguia o seu caminho; o Senhor fez cair sobre ele a iniquidade de todos nós" (53, 6).

Cristo, o Santo, embora sendo absolutamente sem pecado, aceita tomar sobre si os nossos pecados. Aceita para nos remir, aceita assumir os nossos pecados, para cumprir a missão recebida do Pai, que - como escreve o evangelista João - "amou de tal modo o mundo que lhe deu o Seu Filho único, para que todo o que n'Ele crer... tenha a vida eterna" (3, 16).

1401 3. Diante de Cristo que, por amor, assumiu as nossas iniquidades, todos nós somos convidados a um profundo exame de consciência. Um dos elementos característicos do Grande Jubileu está naquilo que qualifiquei como "purificação da memória" (Bula Incarnationis mysterium, 11).

Como Sucessor de Pedro, pedi que "neste ano de misericórdia a Igreja, fortalecida pela santidade que recebe do seu Senhor, se ajoelhe diante de Deus e implore o perdão para os pecados passados e presentes dos seus filhos" (ibid.). Este primeiro domingo da Quaresma pareceu-me a ocasião propícia para que a Igreja, reunida espiritualmente à volta do Sucessor de Pedro, implore o perdão divino para as culpas de todos os crentes. Perdoemos e peçamos perdão!

Este apelo suscitou na Comunidade eclesial uma profunda e profícua reflexão, que levou à publicação, nos dias passados, de um documento da Comissão Teológica Internacional, intitulado "Memória e reconciliação: a Igreja e as culpas do passado". Agradeço a quantos contribuíram na elaboração deste texto. Ele é muito útil para uma correcta compreensão e actuação do autêntico pedido de perdão, fundado sobre a responsabilidade objectiva que une entre si os cristãos, enquanto membros do Corpo místico, e impele os fiéis de hoje a reconhecerem, juntamente com as próprias culpas, as dos cristãos de ontem, à luz de um diligente discernimento histórico e teológico.

Com efeito, "por causa daquele vínculo que nos une uns aos outros dentro do Corpo místico, todos nós, embora não tendo responsabilidade pessoal por isso e sem nos substituirmos ao juízo de Deus - o único que conhece os corações - carregamos o peso dos erros e culpas de quem nos precedeu" (Incarnationis mysterium, 11). Reconhecer os desvios do passado serve para despertar as nossas consciências diante dos compromissos do presente, abrindo a cada um o caminho da conversão.

4. Perdoemos e peçamos perdão! Enquanto louvamos a Deus que, no seu amor misericordioso, suscitou na Igreja uma maravilhosa messe de santidade, de ardor missionário, de total dedicação a Cristo e ao próximo, não podemos deixar de reconhecer as infidelidades ao Evangelho, nas quais incorreram alguns dos nossos irmãos, especialmente durante o segundo milénio. Pedimos perdão pelas divisões que surgiram entre os cristãos, pelo uso da violência que alguns deles fizeram no serviço à verdade, e pelas atitudes de desconfiança e de hostilidade às vezes assumidas em relação aos seguidores de outras religiões.

Confessamos, com maior razão, as nossas responsabilidades de cristãos pelos males de hoje. Perante o ateísmo, a indiferença religiosa, o secularismo, o relativismo ético, as violações do direito à vida, o desinteresse para com a pobreza de muitos países, não podemos deixar de perguntar-nos quais são as nossas responsabilidades.

Pela parte que cada um de nós, com os seus comportamentos, teve nestes males, contribuindo para deturpar o rosto da Igreja, pedimos humildemente perdão.

Ao mesmo tempo, enquanto confessamos as nossas culpas, perdoamos as culpas cometidas pelos outros em relação a nós. No decurso da história, inúmeras vezes os cristãos sofreram maus-tratos, prepotências, perseguições por causa da sua fé. Assim como as vítimas dessas injustiças perdoaram, de igual modo perdoamos também nós. A Igreja de hoje e de sempre sente-se empenhada em purificar a memória daquelas tristes vicissitudes de todo o sentimento de rancor ou de vingança. O Jubileu torna-se assim para todos a ocasião propícia para uma profunda conversão ao Evangelho. Do acolhimento do perdão divino deriva o empenho no perdão dos irmãos e na reconciliação recíproca.

5. Mas o que exprime para nós o termo "reconciliação"? Para captar o seu exacto sentido e valor, é preciso antes dar-se conta da possibilidade da divisão, da separação. Sim, o homem é a única criatura sobre a terra que pode estabelecer uma relação de comunhão com o seu Criador, mas é também a única que se pode separar d'Ele. Infelizmente, de facto muitas vezes ele se afasta de Deus.

Felizmente muitos, como o filho pródigo, do qual fala o Evangelho de Lucas (cf. 15, 13), depois de terem abandonado a casa paterna e dissipado a herança recebida, chegando a tocar o fundo, se deram conta de quanto tinham perdido (cf. Lc
Lc 15,13-17). Empreendem, então, o caminho do retorno: "Levantar-me-ei e irei ter com meu pai, e dir-lhe-ei: Pai, pequei..." (ibid., v. 18).

Deus, bem representado pelo pai da parábola, acolhe todo o filho pródigo que a Ele retorna. Acolhe-o mediante Cristo, no qual o pecador pode tornar-se "justo" com a justiça de Deus. Acolhe-o, porque tratou o seu Filho eterno como pecado em nosso favor. Sim. Só por meio de Cristo podemos tornar-nos justiça de Deus (cf. 2Co 5,21).

1402 6. "Deus amou de tal modo o mundo que lhe deu o Seu Filho único". Em síntese, eis o significado o mistério da redenção do mundo! É preciso dar-se profundamente conta do valor do grande dom que o Pai nos concedeu em Jesus. É preciso que diante dos olhos da nossa alma se apresente Cristo - o Cristo do Getsémani, o Cristo flagelado, coroado de espinhos, carregando a cruz e enfim crucificado. Cristo assumiu sobre si o peso dos pecados de todos os homens, o fardo dos nossos pecados, para podermos, em virtude do seu sacrifício salvífico, ser reconciliados com Deus.

Como testemunha, apresenta-se-nos hoje Saulo de Tarso, que se tornou São Paulo: ele experimentou de maneira singular o poder da Cruz no caminho de Damasco. O Ressuscitado manifestou-se-lhe com todo o seu fulgurante poder: "Saulo, Saulo, por que Me persegues?...

Quem és Tu, Senhor?... Eu sou Jesus, a quem tu persegues!" (
Ac 9,4-5). Paulo, que experimentou de modo tão forte o poder da Cruz de Cristo, dirige-se hoje a nós com uma ardente súplica: "Exortamo-vos a que não recebais em vão a graça de Deus". Esta graça é-nos oferecida, insiste São Paulo, pelo próprio Deus, que hoje nos diz: "Ouvi-te no tempo favorável e ajudei-te no dia da salvação" (2Co 6,1-2).

Maria, Mãe do perdão, ajuda-nos a acolher a graça do perdão que o Jubileu nos oferece em abundância. Faze que a Quaresma deste Ano Santo extraordinário seja para todos os crentes e para todo o homem que está à procura de Deus, o momento favorável, o tempo da reconciliação, o tempo da salvação!

Esta liturgia que celebrou a misericórdia do Senhor e quis purificar a memória do caminho dos cristãos nos séculos suscite em toda a Igreja, e em cada um de nós, um empenho de fidelidade à mensagem perene do Evangelho: nunca mais a contradição à caridade no serviço da verdade; nunca mais os gestos contra a comunhão da Igreja; nunca mais as ofensas em relação a qualquer povo; nunca mais os recursos à lógica da violência; nunca mais as opressões, o desprezo dos pobres e dos últimos. E com a sua graça o Senhor leve a bom termo o nosso propósito e nos conduza todos juntos à vida eterna.





JUBILEU DOS ARTESÃOS


Domingo, 19 de Março de 2000

1. Deus, "não poupou o Seu próprio Filho, mas entregou-O por todos nós. Como não havia de nos dar também todas as coisas com o Seu Filho?" (Rm 8,32). Na Carta aos Romanos o Apóstolo Paulo faz esta pergunta, da qual sobressai com clareza o tema central da liturgia de hoje: o mistério da paternidade de Deus. Depois, no trecho evangélico é o próprio Pai eterno que se apresenta a nós quando, da nuvem luminosa que encobre Jesus e os Apóstolos no monte da Transfiguração, faz ouvir a sua voz admoestadora: "Este é o Meu Filho amado. Escutai o que Ele diz!" (Mc 9,7). Pedro, Tiago e João intuem depois compreenderão melhor que Deus lhes falou revelando-Se a Si mesmo e o mistério da sua mais íntima realidade.


Depois da ressurreição eles, juntamente com os outros Apóstolos, levarão ao mundo o anúncio perturbante: no Seu Filho encarnado Deus tornou-se próximo de cada homem como Pai misericordioso. N'Ele, cada ser humano é protegido pelo abraço terno e forte de um Pai.

2. Caríssimos Artesãos, este anúncio também se dirige a vós, que viestes a Roma de todas as partes do mundo para celebrar o vosso Jubileu. Na redescoberta desta confortadora realidade Deus é Pai ampara-vos o vosso Padroeiro celeste, São José, artesão como vós, homem justo e protector da Sagrada Família.

Para vós ele é um exemplo de laboriosidade e honestidade no trabalho quotidiano. Nele procurais sobretudo o modelo de uma fé que não vacila e de uma constante obediência à vontade do Pai celeste. Ao lado de São José, encontrais o próprio Filho de Deus que, sob a sua orientação, aprende a arte de carpinteiro e exerce-a até à idade de trinta anos, propondo em si mesmo "o Evangelho do trabalho".

Desta forma, ao longo da sua existência terrena, José torna-se o humilde e laborioso reflexo daquela paternidade divina que será revelada aos Apóstolos no monte da Transfiguração. A liturgia deste segundo Domingo de Quaresma convida-nos a reflectir com mais atenção sobre o mistério. É o próprio Pai celeste que nos leva pela mão nesta meditação.

1403 Cristo é o Filho predilecto do Pai! É principalmente a palavra "predilecto" que, respondendo às nossas perguntas, levanta dum certo modo o véu do mistério da paternidade divina. De facto, dá-nos a conhecer o amor infinito do Pai pelo Filho e, ao mesmo tempo, revela-nos a sua "paixão" pelo homem, por cuja salvação não hesita oferecer este Filho muito amado. Cada ser humano pode ter a certeza de que em Jesus, Verbo encarnado, é objecto de um amor sem limites por parte do Pai celeste.

3. A primeira Leitura, tirada do Livro do Génesis, oferece-nos um ulterior contributo para o conhecimento deste mistério. Deus pede a Abraão que sacrifique o filho: "Toma o teu filho, o teu único filho Isaac, a quem amas, vai à terra de Moriá e oferece-o lá em holocausto, sobre uma montanha que Eu te vou indicar" (
Gn 22,2). Com o coração contrito, Abraão dispõe-se a obedecer à ordem de Deus. Mas quando chegou o momento de sacrificar o seu filho, o Senhor intervém e por meio dum anjo diz-lhe: "Não estendas a mão contra o menino! Não lhe faças nenhum mal! Agora sei que temes a Deus, pois não me recusaste o teu filho único" (Gn 22,12).

Por meio das vicissitudes de uma paternidade humana submetida a uma dramática prova, é revelada outra paternidade, a que se baseia na fé. Precisamente em virtude do extraordinário testemunho de fé, oferecido naquela circunstância, Abraão obtém a promessa de uma numerosa descendência: "Por meio da tua descendência, todas as nações da terra serão abençoadas, porque Me obedeceste" (Gn 22,18).Graças à sua confiança incondicionada na Palavra de Deus, Abraão torna-se o pai de todos os crentes.

4. Deus Pai "não poupou o Seu próprio Filho, mas entregou-O por todos nós" (Rm 8,32). Abraão com a sua disponibilidade a imolar Isaac, prenuncia o sacrifício de Cristo para a salvação do mundo. A execução efectiva do sacrifício, que foi poupada a Abraão, verificar-se-á com Jesus Cristo. Ele mesmo informa os Apóstolos: ao descer do monte da Transfiguração, Ele ordena-lhes que não contem nada do que viram, antes do Filho do homem ressuscitar dos mortos. O evangelista acrescenta: "Eles observaram a recomendação e discutiam uns com os outros o que queria dizer "ressuscitar dos mortos"" (Mc 9,10).

Os discípulos intuíram que Jesus é o Messias e que n'Ele se realiza a salvação. Mas não conseguem compreender o motivo por que fala de paixão e morte: não aceitam que o amor de Deus se possa esconder por detrás da Cruz. Contudo, onde os homens verão apenas uma morte, Deus manifestará a sua glória ressuscitando o seu Filho; onde os homens pronunciaram palavras de condenação, Deus realizará o seu mistério de salvação e de amor para com o género humano.

Eis a lição que qualquer geração cristã deve aprender de novo. Qualquer geração; também a nossa! Reside aqui a razão do nosso caminho de conversão neste tempo particular de graça. O Jubileu ilumina toda a vida e a experiência dos homens. Também o cansaço e o peso do trabalho quotidiano recebem da fé em Cristo morto e ressuscitado uma nova luz de esperança. Revelam-se elementos significativos do desígnio de salvação que o Pai celeste actua mediante a Cruz do Filho.

5. Queridos artesãos, fortificados por esta autoconsciência, podeis dar nova força e solidez àqueles valores que sempre caracterizaram a vossa actividade: o perfil qualitativo, o espírito de iniciativa, a promoção das capacidades artísticas, a liberdade e a cooperação, a relação correcta entre a tecnologia e o ambiente, a dedicação à família e às relações de boa vizinhança. A civilização artesã soube construir, no passado, grandes ocasiões de encontro entre os povos e entregou às épocas sucessivas sínteses admiráveis de cultura e de fé.

O mistério da vida de Nazaré, do qual São José, padroeiro da Igreja e vosso protector, foi o guardião fiel e a sábia testemunha, é o ícone desta maravilhosa síntese entre vida de fé e trabalho humano, crescimento pessoal e empenho de solidariedade.

Caríssimos artesãos, viestes aqui hoje para celebrar o vosso Jubileu. Oxalá a luz do Evangelho ilumine cada vez mais a vossa experiência quotidiana de trabalho. O Jubileu oferece-vos a ocasião de encontrar Jesus, José e Maria, entrando na sua casa e na humilde oficina de Nazaré. Na escola singular da Sagrada Família aprendem-se as realidades essenciais da vida e aprofunda-se o significado do seguimento de Jesus. Nazaré ensina a vencer a aparente tensão entre a vida activa e a contemplativa; convida a crescer no amor da verdade divina que irradia da humanidade de Cristo e a exercer com coragem o serviço exigente da tutela de Cristo presente em cada homem (cf. Redemptoris custos, 27).

6. Por conseguinte, atravessemos em ideal peregrinação o limiar da casa de Nazaré, a pobre habitação que terei a alegria de visitar, se Deus quiser, na próxima semana, durante a minha peregrinação jubilar na Terra Santa. Detenhamo-nos a contemplar Maria, testemunha da realização da promessa feita pelo Senhor a "Abraão e à sua descendência para sempre" (Lc 1,55).

Queridos artesãos, ela, juntamente com José, seu casto esposo, vos ajude a permanecer em constante escuta de Deus, unindo oração e trabalho. Que eles vos amparem nos vossos propósitos jubilares de renovada fidelidade cristã, e façam com que, por meio das vossas mãos, se prolongue de qualquer forma a obra criadora e providencial de Deus.

1404 A Sagrada Família, lugar do entendimento e do amor, vos ajude a ser capazes de realizar gestos de solidariedade, de paz e de perdão. Desta forma, sereis anunciadores do amor infinito de Deus Pai, rico em misericórida e de bondade para todos.

Amém.



PEREGRINAÇÃO JUBILAR NA TERRA SANTA



NA CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA NO


ESTÁDIO DE AMÃ (JORDÂNIA)


21 de Março de 2000




"Uma voz grita: Preparai no deserto um caminho para o Senhor! Aplanai na estepe uma estrada para o nosso Deus!" (Is 40,3).

Beatitude
Irmãos Bispos e sacerdotes
Irmãos e Irmãs!

1. As palavras do profeta Isaías, que o Evangelista aplica a João Baptista, recordam-nos o caminho que Deus traçou através do tempo, no seu desejo de instruir e salvar o seu povo. Hoje, como parte da minha peregrinação jubilar para orar em alguns dos lugares relacionados com a intervenção salvífica de Deus, a Providência divina conduziu-me à Jordânia. Saúdo Sua Beatitude Michel Sabbah e agradeço-lhe as amáveis palavras de boas-vindas. Abraço com afecto o Exarca greco-melquita Georges El-Murr e todos os membros da Assembleia dos Ordinários Católicos da Terra Santa, assim como os representantes das outras Igrejas e Comunidades eclesiais. Estou grato ao Príncipe Raad e às Autoridades civis que desejaram honrar a nossa celebração com a sua presença.

O Sucessor de Pedro é peregrino nesta terra abençoada pela presença de Moisés e Elias, onde o próprio Jesus ensinou e realizou milagres (cf. Mc Mc 10,1 Jn 10,40-42), onde a Igreja primitiva deu testemunho com a vida de numerosos santos e mártires. Neste ano do Grande Jubileu a Igreja inteira, e de modo especial hoje a Comunidade cristã da Jordânia, estão espiritualmente unidas numa peregrinação às origens da nossa fé, uma peregrinação de conversão e penitência, de reconciliação e paz.

Procuramos um guia que nos indique o caminho. E aqui vem ao nosso encontro a figura de João Baptista, uma voz que clama no deserto (cf. Lc Lc 3,4). Ele indicar-nos-á o caminho que devemos percorrer a fim de que os nossos olhos possam "ver a salvação de Deus" (Lc 3,6). Guiados por ele, fazemos a nossa peregrinação de fé para vermos de modo mais claro a salvação que Deus realizou ao longo de uma história que remonta a Abraão. João Baptista foi o último dos muitos Profetas que manteve viva e alimentada a esperança do Povo de Deus. Nele o tempo da plenitude chegou ao seu termo.

2. A semente desta esperança foi a promessa feita a Abraão, quando foi chamado a abandonar tudo o que lhe era familiar e a seguir um Deus que ainda não conhecia (cf. Gn Gn 12,1-3). Apesar da sua riqueza, Abraão era um homem que vivia na sombra da morte, pois não tinha filho nem terra própria (cf. Gn 15,2). A promessa parecia vã, pois Sara era estéril e a terra pertencia a outros. Mas Abraão pôs ainda mais a sua fé em Deus: "Ele mesmo, contra o que podia esperar, acreditou" (Rm 4,18).

1405 Por mais impossível que pudesse parecer, Isaac nasceu de Sara, e Abraão recebeu uma terra. E através de Abraão e da sua descendência a promessa tornou-se uma bênção para "todas as famílias da terra" (Gn 12,3 Gn 18,18).

3. Esta promessa foi selada quando Deus falou a Moisés no Monte Sinai. O que se passou entre Moisés e Deus na montanha sagrada plasmou a sucessiva história da salvação como uma Aliança de amor entre Deus e o homem - uma Aliança que exige a obediência mas que promete a libertação. Os Dez Mandamentos gravados nas pedras do Sinai - mas inscrita no coração humano desde o início da criação - são a divina pedagogia do amor, indicando o único caminho seguro para a plena realização do nosso mais profundo desejo: a irrepreensível aspiração do espírito humano à felicidade, verdade e harmonia.

Durante quarenta anos o povo peregrinou antes de chegar a esta terra. Moisés, "com quem o Senhor falara face a face" (Dt 34,10), morreu no Monte Nebo e foi sepultado "num vale da terra de Moab... mas ninguém até hoje soube o lugar da sua sepultura" (Dt 34,5-6). Mas a Aliança e a Lei que ele recebeu de Deus vivem para sempre.

Através dos tempos os profetas tiveram de defender a Lei e a Aliança contra aqueles que estabeleciam normas e regulamentos humanos acima da vontade de Deus, e portanto impunham uma nova escravidão ao povo (cf. Mc Mc 6,17-18). A própria cidade de Amã - Rabá no Antigo Testamento - recorda o pecado do Rei David ao causar a morte de Urias e tomar por esposa a sua mulher Betsabé, pois foi por isso que Urias tinha morrido (2S 11,1-17). "Eles combaterão contra ti", diz Deus a Jeremias na primeira Leitura que hoje escutámos, "mas não vencerão, porque Eu estarei contigo para te proteger" (Jr 1,19). Por terem denunciado as falhas na observância da Aliança, alguns Profetas, inclusive o Baptista, pagaram com o próprio sangue. Mas por causa da promessa divina - "Eu estarei contigo para te proteger" - eles permaneceram firmes como "uma cidade fortificada, como coluna de ferro e muro de bronze" (Jr 1,18), proclamando a Lei da vida e da salvação, do amor que nunca falha.

4. Na plenitude dos tempos, às margens do Rio Jordão João Baptista indica Jesus, Aquele sobre o qual o Espírito Santo desceu em forma de pomba (cf. Lc Lc 3,22), Aquele que baptiza não com água mas "no Espírito Santo e no fogo" (Lc 3,16). Abriram-se os céus e nós ouvimos a voz do Pai: "Este é o meu Filho amado, que muito Me agrada" (Mt 3,17). N'Ele, o Filho de Deus, se cumprem a promessa feita a Abraão e a Lei dada a Moisés.

Jesus é a realização da promessa. A sua morte na Cruz e a sua Ressurreição levam à definitiva vitória da vida sobre a morte. Através da Ressurreição as portas do paraíso estão abertas, e podemos entrar de novo no Jardim da Vida. Em Cristo ressuscitado obtemos a sua "misericórdia conforme prometera aos nossos pais, em favor de Abraão e da sua descendência" (Lc 1,54-55).
Jesus é o cumprimento da Lei. Somente Cristo ressuscitado revela o pleno significado de tudo aquilo que aconteceu no Mar Vermelho e no Monte Sinai. Ele revela a verdadeira natureza da Terra Prometida, onde "não haverá mais morte" (Ap 21,4). Porque Ele é "o primeiro daqueles que ressuscitam dos mortos" (Col 1,18), o Senhor Ressuscitado é a meta de toda a nossa peregrinação: "o Alfa e o Ómega, o Primeiro e o Último, o Princípio e o Fim" (Ap 22,13).

5. Durante os últimos cinco anos, a Igreja nesta região celebrou o Sínodo Pastoral das Igrejas na Terra Santa.Todas as Igrejas Católicas juntas caminharam com Jesus e escutaram de novo o seu chamado, traçando o caminho a percorrer num Plano Pastoral Geral. Nesta solene liturgia, recebo com prazer os frutos do Sínodo como um sinal da vossa fé renovada e do vosso generoso empenho. O Sínodo comportou uma profunda e sentida experiência de comunhão com o Senhor, e também de intensa comunhão eclesial, tal como os discípulos juntos à volta dos Apóstolos no nascimento da Igreja (cf. Act Ac 2,42 Ac 4,32). O Sínodo tornou evidente que o vosso futuro reside na unidade e na solidariedade. Oro hoje, e convido a Igreja inteira a orar comigo, para que o trabalho do Sínodo produza um estreitamento dos vínculos de amizade e de cooperação entre as Comunidades católicas locais, em todas as suas ricas variedades, entre todas as Igrejas cristãs e Comunidades eclesiais, e entre os cristãos e os outros grupos religiosos que aqui florescem. Possam os recursos da Igreja - as famílias, paróquias, escolas, associações leigas, movimentos de jovens - estabelecer a unidade e o amor como o seu objectivo supremo. Não existe modo mais eficaz de participar social, profissional e politicamente, sobretudo no trabalho da justiça, da reconciliação e da paz, do que aquele que o Sínodo almejou.

Aos Bispos e sacerdotes, digo: Sede bons pastores segundo o Coração de Cristo! Guiai o rebanho que vos foi confiado, pelo caminho que leva às pastagens verdejantes do seu Reino! Fortalecei a vida pastoral das vossas comunidades com uma nova e mais dinâmica colaboração com os religiosos e os leigos. No meio das dificuldades do vosso ministério, tende confiança no Senhor. Crescei unidos intimamente a Ele na oração, e Ele será a vossa luz e alegria. A Igreja inteira agradece-vos a dedicação e a missão de fé que desenvolveis nas vossas dioceses e paróquias.

Aos religiosos e religiosas, exprimo a imensa gratidão da Igreja pelo vosso testemunho da supremacia de Deus em todas as coisas! Continuai a resplandecer como faróis do amor evangélico que supera todas as barreiras! Aos leigos, digo: Não tenhais medo de assumir o vosso próprio papel e responsabilidade na Igreja! Sede corajosas testemunhas do Evangelho nas vossas famílias e na sociedade!

Neste Dia das Mães na Jordânia, congratulo-me com as mães presentes aqui, e convido todas a serem edificadoras de uma nova civilização do amor. Amai as vossas famílias. Ensinai-lhes a dignidade de toda a vida; ensinai-lhes as vias da harmonia e da paz; ensinai-lhes o valor da fé, da oração e da bondade! Queridos jovens, o caminho da vida está aberto diante de vós. Construi o vosso futuro sobre o sólido fundamento do amor de Deus, e permanecei sempre unidos na Igreja de Cristo! Ajudai a transformar o mundo que vos circunda, dando-lhe o melhor de vós mesmos no serviço aos outros e ao vosso País.

1406 E às crianças que estão a fazer a sua Primeira Comunhão, digo: Jesus é o vosso melhor amigo; conhece o que existe nos vossos corações. Permanecei unidos a Ele, e nas vossas orações recordai a Igreja e o Papa.

6. Neste ano do Grande Jubileu, o inteiro povo peregrino de Deus retorna em espírito aos lugares relacionados com a história da nossa salvação. Depois de ter seguido os passos de Abraão e Moisés, a nossa peregrinação penetra agora nas terras onde Jesus Cristo, nosso Salvador, viveu e peregrinou durante a sua vida terrena: "Muitas vezes e de muitos modos, Deus falou aos antepassados por meio dos profetas. No período final em que estamos, falou-nos por meio do Filho" (
He 1,1-2). No Filho todas as promessas foram cumpridas. Ele é o Redemptor hominis, o Redentor do homem, a esperança do mundo! Tendo presente tudo isto, fazei com que a inteira comunidade cristã seja cada vez mais firme na fé e generosa nas obras do serviço amoroso.

A Bem-aventurada Virgem Maria, Mãe da Igreja, vos guie e vos proteja no caminho! Amém.



PEREGRINAÇÃO JUBILAR NA TERRA SANTA



NA CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA NA


"PRAÇA DA MANJEDOURA"


Territórios Palestinos, Belém

Quarta-feira 22 de Março de 2000

"Um Menino nasceu para nós... e este é o seu nome: Conselheiro Admirável, Deus Poderoso... Príncipe da Paz" (Is 9,5).


Senhor Presidente, muito obrigado pela sua presença e pela presença das autoridades civis.
Beatitude
Irmãos Cardeais
Venerados Irmãos
no episcopado e no sacerdócio
1407 Queridos Irmãos e Irmãs!

1. As palavras do profeta Isaías prenunciam a vinda do Salvador ao mundo. E foi aqui em Belém que a grande promessa se cumpriu. Durante dois milénios, geração após geração, os cristãos pronunciaram o nome de Belém com profunda emoção e jubilosa gratidão. Assim como os pastores e os magos, também nós viemos ao encontro do Menino, "envolto em faixas e deitado numa manjedoura" (
Lc 2,12). Como muitos peregrinos antes de nós, ajoelhamo-nos cheios de admiração e em adoração diante do mistério inefável que aqui se realizou.

No primeiro Natal do meu ministério de Sucessor do Apóstolo Pedro, exprimi publicamente o grande desejo de celebrar o início do meu Pontificado em Belém, na gruta da Natividade (cf. Homilia da Missa da meia-noite, 24 de Dezembro de 1978, n. 3). Então não me foi possível, e não tinha sido possível até agora. Hoje, porém, como poderia eu deixar de louvar a Deus de todas as misericórdias, cujas vias são misteriosas e cujo amor não tem fim, como poderia deixar de louvar a Deus por me ter conduzido aqui, neste ano do Grande Jubileu, ao lugar do nascimento do Salvador? Belém está no centro da minha peregrinação jubilar. Os caminhos que empreendi trouxeram-me a este lugar e ao mistério que ele proclama.

Agradeço ao Patriarca Michel Sabbah as amáveis palavras de boas-vindas e, com afecto, abraço todos os membros da Assembleia dos Ordinários Católicos da Terra Santa. No lugar que viu o nascimento do Filho de Deus na carne, é significativa a presença de muitas Comunidades católicas de rito oriental, que formam o rico mosaico da nossa catolicidade. Com afecto no Senhor, saúdo os Representantes das Igrejas Ortodoxas e de todas as Comunidades eclesiais presentes na Terra Santa.

Estou grato aos Responsáveis da Autoridade Palestina que participam na nossa celebração e se unem a nós na oração pelo bem-estar do povo palestino.

2. "Não tenhais medo! Eu anuncio-vos a Boa Notícia, que será uma grande alegria para todo o povo: hoje, na cidade de David, nasceu-vos um Salvador, que é o Messias, o Senhor" (Lc 2,10-11).

A alegria anunciada pelo anjo não é algo que pertence ao passado. É uma alegria de hoje - do hoje eterno da salvação de Deus que abrange todos os tempos o passado, o presente e o futuro. No início do novo milénio, somos chamados a compreender de modo mais claro que o tempo tem um significado, porque aqui o Eterno entrou na história e permanece connosco para sempre. As palavras do Venerável Beda exprimem com clareza este conceito: "Ainda hoje, e em todos os dias até ao fim dos tempos, o Senhor será continuamente concebido em Nazaré e nascerá em Belém" (In Ev. S. Lucae, 2: PL 92, 330). Porque é sempre Natal em Belém, cada dia é Natal nos corações dos cristãos. E todos os dias somos chamados a proclamar a mensagem de Belém ao mundo - "a Boa Nova de uma grande alegria": o Verbo Eterno, "Deus de Deus, Luz da Luz" fez-se carne e veio habitar no meio de nós (cf. Jo Jn 1,14).

O Menino recém-nascido, indefeso e totalmente dependente dos cuidados de Maria e José, confiado ao amor deles, é a inteira riqueza do mundo. Ele é o nosso tudo!

Neste Menino - o Filho que nos foi dado - encontramos repouso para as nossas almas e o verdadeiro pão que nunca falta - o Pão eucarístico prenunciado também no próprio nome desta cidade: Beth-lehem, a casa do pão. Deus escondeu-se no Menino: a divindade permanece escondida no Pão da Vida. Adoro te devote latens Deitas! Quae sub his figuris vere latitas!

3. O grande mistério do divino despojamento de si mesmo, a obra da nossa redenção que se manifesta na fragilidade: não é uma verdade fácil. O Salvador nasceu de noite - nas trevas, no silêncio e na pobreza da gruta de Belém. "O povo que andava nas trevas viu uma grande luz, e uma luz brilhou para os que habitavam um país tenebroso", declara o profeta Isaías (9, 1). Este é um lugar que conheceu "o jugo" e "o bastão" da opressão. Quantas vezes se ouviu nestas ruas o clamor dos inocentes? Também a grande igreja construída no lugar do nascimento do Salvador aparece como uma fortaleza combatida pela discussão dos tempos. A manjedoura de Jesus está sempre à sombra da Cruz. O silêncio e a pobreza do nascimento em Belém são uma coisa só com as trevas e a tristeza da morte no Calvário. A manjedoura e a Cruz são o mesmo mistério do amor que redime; o corpo que Maria recostou na manjedoura é o mesmo corpo sacrificado na Cruz.

4. Onde está, então, o domínio do "Conselheiro Admirável, Deus Poderoso, Príncipe da Paz", a respeito do qual fala o profeta Isaías? Qual é o poder a que Jesus mesmo se refere quando afirma: "Toda a autoridade Me foi dada no céu e na terra" (Mt 28,18)? O reino de Cristo "não é deste mundo" (Jn 18,36). O seu Reino não é a acção da força, da riqueza, da conquista que parece forjar a nossa história humana. Ao contrário, trata-se do poder de vencer o Maligno, da definitiva vitória sobre o pecado e a morte. É o poder de curar as feridas que desfiguram a imagem do Criador nas suas criaturas. Cristo tem o poder de transformar a nossa frágil natureza e de nos tornar capazes, mediante a graça do Espírito Santo, de viver em paz uns com os outros e em comunhão com o próprio Deus. "Ele deu o poder de se tornarem filhos de Deus a todos aqueles que O receberam, isto é, aqueles que acreditam no seu nome" (Jn 1,12). Esta é a mensagem de Belém, hoje e para sempre. Este é o dom extraordinário que, há dois mil anos, o Príncipe da Paz trouxe ao mundo.

1408 5. Nesta paz, saúdo todo o povo palestino, ciente como estou da importância deste momento na vossa história. No amor de Cristo, abraço os meus irmãos e irmãs palestinos católicos - os Pastores, os religiosos e os fiéis - assim como os outros católicos presentes, em particular os fiéis de língua hebraica. Oro para que o Sínodo Pastoral há pouco concluído, no qual todas as Igrejas católicas participaram, vos infunda coragem e fortaleça entre vós os vínculos da unidade e da paz. Deste modo sereis cada vez mais eficazes testemunhas da fé, edificando a Igreja e servindo o bem comum. Ofereço o ósculo santo aos cristãos das outras Igrejas e Comunidades eclesiais. Saúdo a comunidade muçulmana de Belém e oro por uma nova era de entendimento e cooperação entre todos os povos da Terra Santa.

Hoje dirigimos o olhar para um momento de há dois mil anos, mas em espírito abraçamos todos os tempos. Estamos reunidos num lugar, mas abrangemos o mundo inteiro. Celebramos um Menino recém-nascido, mas incluímos todos os homens e mulheres onde quer que estejam. Hoje, da Praça da Manjedoura, proclamamos, proclamamos com força em todos os tempos e praças, e a cada pessoa: "A paz esteja convosco! Não tenhais medo!" Estas palavras ressoam em todas as páginas da Escritura. São palavras divinas, pronunciadas pelo próprio Jesus depois de ter ressuscitado dos mortos: "Não tenhais medo!" (
Mt 28,10). Eis as palavras que a Igreja hoje vos dirige. Não tenhais medo de preservar a vossa presença e herança cristãs no próprio lugar onde o Salvador nasceu.

Na gruta de Belém, para usar as palavras de São Paulo na segunda Leitura de hoje, "a graça de Deus manifestou-se" (Tt 1,11). No Menino que nasceu, o mundo recebeu "a misericórdia prometida para sempre aos nossos pais em favor de Abraão e da sua descendência" (cf. Lc Lc 1,54-55). Deslumbrados pelo mistério do Verbo eterno que se fez carne, abandonamos qualquer temor e tornamo-nos como os anjos, glorificando a Deus que oferece ao mundo tantos dons. Com o coro celestial, "cantamos um novo cântico" (Ps 96,1):

"Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens que Ele ama" (Lc 2,14).
Ó Menino de Belém, Filho de Maria e Filho de Deus, Senhor de todos os tempos e Príncipe da Paz, "o mesmo ontem, hoje e por toda a eternidade" (He 13,8): dado que entramos no novo milénio, cura todas as nossas feridas, fortalece os nossos passos, abre o nosso coração e a nossa mente ao "amor misericordioso do nosso Deus, no qual o Sol nos visitou, vindo do alto" (Lc 1,78).

Amém.





Homilias JOÃO PAULO II 1400