Homilias JOÃO PAULO II 1610


DURANTE A CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA


DE SUFRÁGIO PELOS CARDEAIS, ARCEBISPOS E BISPOS FALECIDOS DURANTE O ANO


6 de Novembro de 2001






1. Deus Pai "regenerou-nos pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos para uma esperança viva" (1P 1,3). Amparados por estas palavras do apóstolo Pedro, recordamos com a alma repleta de esperança os nossos venerados irmãos Cardeais, Arcebispos e Bispos que nos deixaram durante estes últimos meses. Viveram a sua jornada terrena trabalhando e empenhando-se na vinha do Senhor; agora dormem o sono da paz, na expectativa da ressurreição final.

No muro sombrio da morte, a fé projecta a luz resplandecente do Ressuscitado, primícias dos que passaram através da fragilidade da condição humana e agora participam em Deus no dom da vida sem fim. Cristo, mediante a Cruz, deu um novo significado à morte. De facto, n'Ele ela tornou-se um gesto sublime de amor obediente ao Pai e testemunho supremo de amor solidário aos homens. Por conseguinte, considerado à luz do Mistério pascal, também o êxito da existência humana já não significa uma condenação sem apelo, mas a passagem para a vida plena e definitiva, que coincide com a comunhão perfeita com Deus.

A Palavra de Deus, que ressoa nesta triste celebração, abre o nosso coração à perspectiva de uma "esperança viva": diante da dissolução do cenário deste mundo, ela oferece a promessa de uma "herança que não se corrompe, não se mancha nem se deteriora".

2. Com estes sentimentos, reunidos à volta do altar, dirigimos o pensamento para aqueles nossos irmãos que recentemente regressaram à casa do Pai. Chamados à graça da fé no Baptismo, eles foram escolhidos como Sucessores dos Apóstolos para orientarem o Povo de Deus e serem, como nos recordou recentemente o Sínodo, servidores "do Evangelho de Jesus Cristo para a esperança do mundo".

Na comunhão, real e misteriosa, entre a Igreja peregrina na terra e a Igreja triunfante, estamos próximos deles com afecto, na certeza de que eles continuarão a acompanhar espiritualmente o caminho da Comunidade cristã.

Recordamos de maneira particular os Cardeais falecidos Myroslav Ivan Lubachivsky, Giuseppe Casoria, José Alí Lebrún Moratinos, Pierre Eyt, Thomas Joseph Winning, Silvio Oddi, Giuseppe Maria Sensi e o Patriarca Maximos V Hakim. Juntamente com eles, durante esta celebração, desejamos recordar também todos os Arcebispos e Bispos que nos deixaram nos últimos meses. Estes nossos queridos e venerados Irmãos no Episcopado estão agora junto de Deus, depois de terem vivido a sua existência ao serviço da causa do Evangelho e do bem dos irmãos.

3. "Vinde a Mim... Tomai sobre vós o Meu jugo, e aprendei de Mim... e achareis alívio para as vossas almas" (Mt 11,28-29). As palavras que Jesus dirigiu aos seus discípulos amparam-nos e confortam-nos quando, no início deste mês de Novembro, comemoramos os nossos queridos defuntos. Se a alma está entristecida pelo seu desaparecimento, a promessa de Cristo conforta-nos. Ele acompanha-nos e guia-nos para o conhecimento pleno do Pai: "Ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar" (Mt 11,27). Este conhecimento, que progride continuamente ao longo do percurso da vida terrena, encontrará o seu pleno cumprimento quando finalmente contemplarmos face a face o rosto de Deus. O Catecismo da Igreja Católica recorda-nos que, graças à obediência de Cristo, a morte cristã assume um novo significado positivo, como passagem deste mundo para o Pai: "pelo Baptismo, o cristão já "morreu com Cristo" sacramentalmente para viver uma vida nova; se morremos na graça de Cristo, a morte física consuma este "morrer com Cristo" e leva assim a cabo a nossa incorporação n'Ele, no seu acto redentor" (n. 1010).

4. Enquanto recordamos com particular afecto os saudosos Irmãos que, incorporados a Cristo com o Baptismo, se conformaram com Ele mediante a plenitude do Sacerdócio, elevamos por eles fervorosas súplicas ao Senhor. Oxalá o Pai da misericórdia os liberte definitivamente do que lhes resta da fragilidade humana, para fazer com que gozem eternamente do prémio celeste prometido aos bons e fiéis operários do Evangelho.

Desejamos confiar as suas almas eleitas à solicitude materna de Nossa Senhora, que eles invocaram e amaram com ternura quando estavam nesta terra, para que lhes abra a porta do paraíso. Maria, Mãe da Esperança, dirija os seus olhos misericordiosos para estes nossos Irmãos e lhes mostre, depois do exílio, Jesus, o fruto bendito do seu seio. Ela, a clemente, a pia, a doce Virgem Maria.



NAS EXÉQUIAS PELO SENHOR CARDEAL PAOLO BERTOLI


1611
Sexta-feira, 9 de Novembro 2001

1. "Pai, quero que aqueles que Me deste, onde Eu estiver, também eles estejam Comigo para que vejam a minha glória" (Jn 17,24). São as palavras da "Oração Sacerdotal" pronunciada por Cristo no final da Última Ceia com os apóstolos no Cenáculo e antes de enfrentar a iminente paixão e morte. Eles convidam-nos a viver na luz da fé a triste liturgia de despedida que estamos a celebrar em sufrágio do nosso venerado irmão, o querido Cardeal Paolo Bertoli.


Enquanto nos preparamos para confiar à terra os seus restos mortais, rezamos ao Senhor que um dia o chamou a ser de modo especial seu discípulo e Ministro da Igreja, para que o acolha na comunhão plena e definitiva da glória celeste.

Deus, "amante da vida" (Sg 11,26), segundo a bonita expressão do Livro da Sabedoria, conceda ao saudoso Purpurado aquela plenitude de vida e de glória que preparou para ele e para cada um de nós desde a eternidade.

Esta confiança no Senhor amparou sempre o saudoso Cardeal nos numerosos e empenhativos serviços eclesiais para que foi chamado, na Europa Oriental e Ocidental, na América Latina, no Médio Oriente e nos Organismos da Santa Sé.

Tendo feito os estudos no seminário de Lucca, obteve em Roma a licenciatura em teologia e em utroque iure. Em 1933 iniciou o seu serviço na Nunciatura de Belgrado, primeiro como Adido e depois como Secretário. Cinco anos mais tarde foi enviado para Paris durante os anos obscuros e difíceis da guerra e da ocupação e, na primavera de 1942, foi transferido para Haiti como Encarregado de Assuntos naquela Nunciatura que na época compreendia todas as Antilhas, excluindo Cuba e Jamaica.

Em 1946 foi enviado para Berna, onde recebeu o cargo de representar a Santa Sé nas várias Conferências internacionais que se realizaram naquele período na Suíça, para a resolução dos problemas causados pela segunda guerra mundial. Naqueles anos de permanência na Confederação helvética, participou na Conferência internacional da Cruz Vermelha em Estocolmo em 1948, na Conferência para a revisão das convenções de Genebra, no ano seguinte e, por fim, nos Congressos organizados pelos Organismos sociais e caritativos católicos, seguindo, sobretudo, os progressos das iniciativas tomadas pelas Organizações Internacionais Católicas e de "Pax Romana", com sede em Friburgo.

3. Na primavera de 1949 foi destinado para a Nunciatura de Praga como Encarregado de Assuntos, mas nunca pôde alcançar essa cidade devido às dificuldades postas pelo Governo Checoslovaco, que estava para interromper as relações com a Santa Sé. Em 1952 foi nomeado Arcebispo Titular de Nicomedia e Delegado Apostólico na Turquia, onde desempenhou também o ministério de Administrador Apostólico para os fiéis de rito latino.

No ano seguinte D. Bertoli foi transferido para a Colômbia, onde promoveu a instituição de novas Circunscrições eclesiásticas, visitando várias vezes os vastos territórios do País e especialmente as missões. Assistiu à criação e participou nas primeiras reuniões do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), instituído em 1955 com sede em Bogotá.

Depois de ter sido, por um ano, Núncio no Líbano, onde se distinguiu pelo interesse demonstrado pelos problemas ecuménicos e pelos contactos com as Igrejas orientais católicas e ortodoxas e com as Comunidades muçulmanas, em 1960 foi nomeado Núncio na França. Permaneceu ali até ser criado Cardeal pelo Papa Paulo VI, no Consistório de 28 de Abril de 1969, e nomeado Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos, cargo que desempenhou até 1973. Também posteriormente, o seu generoso e iluminado serviço à Santa Sé se exprimiu de várias formas, quer como Camerlengo da Santa Igreja Romana, quer como Membro de várias Congregações e Organismos da Cúria Romana, quer com cargos particulares que lhe foram confiados pelo Papa, como aconteceu em 1976, quando foi enviado ao Líbano durante a crise que ensanguentou aquela importante região do Médio Oriente.

4. O longo ministério eclesial do Cardeal Bertoli foi constantemente apoiado pela força do amor de Deus, que encontrava a sua expressão mais genuína e imediata no testemunho de caridade e nos gestos concretos de solidariedade para com os irmãos, sobretudo os mais pobres e sofredores. Como ouvimos do apóstolo João na segunda Leitura, Deus amou-nos primeiro e manifestou o seu amor por nós no seu Filho Jesus: "Nisto conhecemos a caridade: Ele (Jesus) deu a Sua vida por nós" (1Jn 3,16). E é precisamente este amor infinito de Deus continua S. João que nos faz passar da morte para a vida: "Nós sabemos que passamos da morte para a vida, porque amamos os irmãos" (1Jn 3,14).

1612 Toda a vida do Cardeal Paolo Bertoli foi apoiada por este grande ideal: um amor intenso e profundo a Deus, um serviço generoso e fiel à Igreja, uma acção corajosa e solidária a favor dos irmãos, sobretudo dos mais sofredores e necessitados. Disto são testemunho eloquente as simples e intensas palavras que ele nos deixou no seu testamento espiritual. Nele exprime um amor profundo à "Igreja Católica, na qual fui baptizado e vivi na obediência e na submissão à Cátedra de Pedro". Ele ofereceu à Igreja e ao Papa um serviço precioso nos diversos cargos que lhe foram confiados, procurando responder sempre como ele próprio recorda no testamento "com espírito de fé e com lealdade", e com "aquela simplicidade para mim tão querida".

5. No momento em que nos preparamos para dar a derradeira saudação aos restos mortais do nosso saudoso Irmão, confiamos em que aquela vida espiritual que lhe foi comunicada no Baptismo e cresceu com a graça dos sacramentos e a participação na plenitude do Sacerdócio, seja desde agora partilhada por ele na alegria do paraíso e possa manifestar-se plenamente no último dia, no momento da vinda gloriosa de Cristo.

Maria Santíssima, que invocamos de modo particular durante este mês de Novembro com o título de "Rainha dos Anjos e dos Santos", acolha como filho muito amado o nosso venerado Irmão Paolo Bertoli e lhe abra, de par em par, as portas do Paraíso.



NA CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA NA PARÓQUIA ROMANA DE SANTO ALEIXO


Domingo, 18 de novembro de 2001






1. "Pela vossa constância é que salvareis as vossas almas" (Lc 21,19).

Estas palavras, que agora ressoam na nossa Assembleia, realçam bem a mensagem espiritual do 33º Domingo do tempo comum. Enquanto nos aproximamos da conclusão do ano litúrgico, a Palavra de Deus convida-nos a reconhecer que as realidades últimas são governadas e orientadas pela Providência divina.

Na primeira leitura, o profeta Malaquias descreve o dia do Senhor (cf. Mal Ml 3,19) como uma intervenção decisiva de Deus, destinada a vencer o mal e a restabelecer a justiça, punir os malvados e premiar os justos. De modo ainda mais claro as palavras de Jesus, transcritas por S. Lucas, tiram dos nossos corações qualquer forma de receio e de angústia, abrindo-nos à certeza confortadora de que a vida e a história dos homens, apesar dos acontecimentos muitas vezes dramáticos, permanecem firmemente nas mãos de Deus. Aos que tiverem posto n'Ele a própria confiança, o Senhor promete a salvação: "nem um só cabelo da vossa cabeça se perderá" (Lc 21,18).

2. "Quem não quiser trabalhar, não tem o direito de comer" (2Th 3,10). Na segunda leitura, S. Paulo realça que para preparar o advento do Reino de Deus os crentes devem empenhar-se seriamente e, perante uma interpretação desviante da mensagem evangélica, recorda com vigor esta realidade. Com uma expressão extremamente eficaz, o Apóstolo estigmatiza o comportamento dos que induziam a atitudes de desinteresse e de evasão, em vez de viver e testemunhar com entusiasmo o Evangelho, considerando falsamente que já estivesse próximo o "dia do Senhor".

Quem crê não deve comportar-se assim! Ao contrário, deve trabalhar de maneira séria e perseverante, em ansiosa expectativa do encontro definitivo com o Senhor. Eis o estilo próprio dos discípulos de Jesus, bem evidenciado pelo Cântico ao Evangelho: "Vigiai, pois, porque não sabeis em que dia virá o Senhor" (Mt 24,42).

3. Caríssimos paroquianos de Santo Aleixo "alle Case Rosse", obrigado pelo vosso caloroso acolhimento! Saúdo com afecto o Cardeal Vigário e o Bispo Auxiliar do Sector. Saúdo o vosso activo pároco, Pe. Giancarlo Casalone, o vigário paroquial e todos os que pertencem a esta Comunidade, assim como os habitantes do bairro.

Celebro com alegria a Santa Missa nesta vossa nova e bonita igreja paroquial. Graças a Deus e ao generoso contributo do Vigário, dos vossos Sacerdotes e de tantas pessoas de boa vontade, depois de cerca de vinte anos, a vossa Comunidade pode usufruir de um adequado complexo paroquial. Tenho a certeza de que ele favorecerá bastante a unidade e o crescimento da própria Comunidade, assim como a sua activa inserção apostólica no território. É importante que haja um lugar onde reunir-se para rezar, receber os sacramentos e estabelecer relações de amizade e de fraternidade com todos. Desta forma, é mais simples formar as crianças, encontrar os jovens, ajudar as famílias e apoiar os idosos. Assim, alimenta-se aquele espírito de acolhimento e de solidariedade do qual o mundo tem tanta necessidade.

1613 4. Enquanto agradecemos ao Senhor este templo e os locais anexos, exorto-vos, queridos Irmãos e Irmãs, a continuar a construir juntos a vossa Comunidade eclesial, constituída por pedras vivas que se baseiam em Cristo, pedra fundamental. São muitos os grupos e as associações que a formam e que se reúnem aqui para rezar, para se formarem na escola do Evangelho, para uma participação assídua nos Sacramentos sobretudo nos da Penitência e da Eucaristia e para crescer na comunhão e no serviço. Recordo, entre outros, os Escuteiros, os vários grupos juvenis, os do Renovamento no Espírito e da Lectio divina, assim como as pessoas que se dedicam ao centro de escuta da Caritas. Caríssimos, caminhai juntos e oferecei generosamente o vosso contributo à Missão diocesana permanente. Perante as mensagens negativas, veiculadas por certas modas culturais da sociedade contemporânea, sede construtores de esperança e missionários de Cristo em toda a parte. Não é este, porventura, o programa pastoral da nossa Diocese? Mas para que o Espírito de Cristo penetre em toda a parte, é necessário fortalecer uma pastoral vocacional pormenorizada e orgânica. É necessário educar as famílias e os jovens na oração e fazer da própria existência um dom ao próximo. Para esta acção vocacional, poderão servir-vos de ajuda os contactos com os Seminários diocesanos, o envolvimento dos Institutos religiosos e o apoio dos serviços oferecidos pelo Vicariato para o apostolado juvenil, universitário e familiar.

5. Perguntai todos os dias: Senhor, que desejas que eu faça? Qual é a tua vontade para nós como família, como pais e como filhos? Que esperas de mim, como jovem que se abre para a vida e deseja viver contigo e para ti? Só respondendo a estas perguntas pessoais e comprometedoras, podereis realizar plenamente a vontade de Deus, e ser "luz" e "sal" que ilumina e dá sabor a esta nossa amada Cidade.

Jesus exorta-nos a "vigiar" e a "estar preparados" (cf. Cântico ao Evangelho). Convida-nos à conversão e a vigiar constantemente. Que a vossa vida se inspire sempre nesta exortação! Quando o caminho se faz árduo e cansativo, quando o receio e a angústia parecem prevalecer, é sobretudo então que a Palavra de Deus deve ser a nossa luz e o nosso conforto firme. Desta forma consolida-se a fé, a esperança mantém-se desperta e intensifica-se o fervor do amor divino.

Maria seja o vosso amparo e o vossa guia! Ela é a Virgem fiel que nos pode ensinar a ser "sempre jubilosos no anúncio do Senhor", como rezamos no início desta Eucaristia, obtendo-nos a força de "perseverar na dedicação a Deus", fonte de todo o bem. Desta forma, poderemos obter uma "felicidade plena e duradoura". Assim seja!



NO RITO DE CANONIZAÇÃO DE QUATRO NOVOS SANTOS

25 de Novembro de 2001





1. "Por cima d'Ele havia a inscrição: "Este é o rei dos judeus"" (Lc 23,38).

Aquela inscrição, que Pilatos mandara colocar sobre a cruz (cf Jn 19,19), contém ao mesmo tempo o motivo da condenação e a verdade sobre a pessoa de Cristo. Jesus é rei Ele próprio o afirmou mas o seu reino não é deste mundo (cf. Jo Jn 18,36-37). Diante d'Ele, a humanidade divide-se: quem o despreza pelo seu aparente fracasso, e quem o reconhece como o Cristo, "imagem do Deus invisível, o primogénito de toda a criação" (Col 1,15), segundo a expressão do apóstolo Paulo aos Colossenses, que ouvimos.

Diante da cruz de Cristo abre-se, num certo sentido, o grande cenário do mundo e realiza-se o drama da história pessoal e colectiva. Sob o olhar de Deus, que no Filho Unigénito imolado por nós se fez medida de todas as pessoas, de qualquer situação, civilização, todos somos chamados a decidir-nos.

2. Defronte do Rei crucificado apresentaram-se também aqueles que, há pouco, foram proclamados Santos: José Marello, Paula Montal Fornés de São José de Calasanz, Leónia Francisca de Sales Aviat e Maria Crescência Höss. Cada um deles se confiou à sua misteriosa realeza, proclamando com toda a sua vida: "Jesus, lembra-te de mim quando estiveres no teu reino" (Lc 23,42). E, de modo totalmente pessoal, cada um deles recebeu do Rei imortal a resposta: "Em verdade te digo: Hoje estarás comigo no Paraíso" (v. 43).

Hoje! Aquele "hoje" pertence ao tempo de Deus, ao desígnio de salvação, do qual fala São Paulo na Carta aos Romanos: "Porque os que [Deus] de antemão conheceu, também os predestinou... chamou... justificou... glorificou" (Rm 8,29-30). Aquele "hoje" encerra também o momento histórico da canonização de hoje, na qual estas quatro exemplares testemunhas de vida evangélica são elevadas à glória dos altares.

3. "Agradou a Deus que residisse n'Ele toda a plenitude" (Col 1,19). Desta plenitude foi tornado participante São José Marello, como sacerdote do clero de Asti e como Bispo da diocese de Acqui. Plenitude de graça, fomentada nele pela forte devoção a Maria santíssima; plenitude do sacerdócio, que Deus lhe conferiu como dom e empenho; plenitude de santidade, que lhe adveio ao conformar-se com Cristo, Bom Pastor. D. Marello formou-se no período áureo da santidade do Piemonte, quando, entre numerosas formas de hostilidade contra a Igreja e a fé católica, floresceram exemplos do espírito e da caridade, como Cottolengo, Cafasso, Dom Bosco, Murialdo e Allamano. Jovem bom e inteligente, apaixonado pela cultura e pelo empenho civil, o nosso Santo encontrou só em Cristo a síntese de qualquer ideal e a Ele se consagrou no Sacerdócio. "Ocupar-me dos interesses de Jesus" foi o mote da sua vida, e por isso se reflectiu totalmente em S. José, o esposo de Maria, o "guarda do Redentor". De São José atraiu-o fortemente o serviço escondido, alimentado por uma profunda espiritualidade. Ele soube transmitir este estilo aos Oblatos de São José, a Congregação por ele fundada. Gostava de lhes repetir: "Sede extaordinários nas coisas ordinárias" e acrescentava: "Sede cartuxos em casa e apóstolos fora de casa". Da sua forte personalidade, o Senhor quis servir-se para a sua Igreja, chamando-o ao Episcopado da Diocese de Acqui, onde, em poucos anos, gastou pela grei todas as suas energias, deixando uma marca que o tempo não cancelou.

1614 4. "Em verdade te digo: hoje estarás Comigo no Paraíso" (Lc 23,43). No paraíso, na plenitude do reino de Deus, foi acolhida Santa Paula Montal Fornés de São José de Calasanz, fundadora do Instituto das Filhas de Maria, Religiosas Escolápias, depois de uma vida de santidade. Primeiro na sua cidade natal, Arenys del Mar, empenhada em várias actividades apostólicas e penetrando, com a oração e a piedade sincera, os mistérios de Deus; depois, como fundadora de uma família religiosa, inspirada no lema calasanziano "piedade e letras", dedica-se à promoção da mulher e da família com o seu ideal de: "Salvar a família, educar as meninas no santo temor de Deus"; por fim, dá provas da autenticidade, da coragem e da ternura do seu espírito, um espírito modelado por Deus, durante os trinta anos de vida escondida em Olesa de Montserrat.

A nova Santa pertence a esse grupo de fundadores de institutos religiosos que no século XIX foram ao encontro das numerosas necessidades que naquela época se apresentavam e às quais a Igreja, na perspectiva do Evangelho e de acordo com as sugestões do Espírito, devia responder para o bem da sociedade. A mensagem de Santa Paula continua a ser actual e o seu carisma educativo é fonte de inspiração para a formação das gerações do terceiro milénio cristão.

5. O desígnio benévolo do Pai que "nos faz entrar no reino de seu Filho predilecto" encontra em Santa Francisca de Sales Aviat uma maravilhosa realização: ela viveu até ao fim a oferta de si própria. No centro do seu empenho e do seu apostolado, a Ir. Francisca de Sales coloca a oração e a união a Deus, onde ela encontra a orientação e a força para vencer as provas e dificuldades, e persevera, até ao fim da sua existência, nesta vida de fé, desejando deixar-se conduzir pelo Senhor: "Ó meu Deus, que a minha felicidade consista em sacrificar-Vos todas as minhas vontades e desejos!". A decisão que melhor caracteriza a Madre Aviat, "esquecer-me de mim completamente", é também para nós um apelo a ir contra a corrente do egoísmo e dos prazeres fáceis, a abrirmo-nos às necessidades sociais e espirituais do nosso tempo. Queridas Irmãs Oblatas de Santa Francisca de Sales, a exemplo da vossa fundadora, em profunda comunhão com a Igreja, sede, onde Deus vos colocou, bem determinadas em receber as graças presentes e em aproveitá-las, pois é em Deus que se encontram a luz e a ajuda necessárias em qualquer circunstância! Confiando na poderosa intercessão da nova Santa, aceitai alegremente o convite a viver, numa fidelidade renovada, as intuições que ela viveu de modo tão perfeito.

6. Prestar honra a Cristo, o rei: este desejo animou Santa Maria Crescência Höss desde a sua infância. Pôs ao seu serviço as suas capacidades. Deus concedera-lhe uma linda voz. Desde tenra idade pôde cantar no coro como solista, não para se pôr em evidência, mas para cantar e tocar para Cristo Rei.

Também colocou os seus conhecimentos ao serviço do Senhor. Esta franciscana foi uma conselheira muito procurada. As pessoas juntavam-se diante das portas do convento: no meio de homens e mulheres simples, encontravam-se também príncipes e imperatrizes, sacerdotes e religiosos, abades e Bispos. Desta forma, ela tornou-se uma espécie de "parteira" que procurava ajudar a dar à luz a verdade no coração de quem lhe pedia conselhos.

Contudo, também não lhe foi poupado o sofrimento. Já naquele tempo existia o "Mobbing". Suportou os difamadores presentes na sua comunidade sem jamais pôr em questão a própria vocação. O grande alcance da paixão fez amadurecer nela a virtude da paciência. Conseguiu tornar-se Superiora: dirigir espiritualmente para ela significava servir. Tinha uma atitude generosa com os pobres, materna com as irmãs e sensível com todos os que precisavam de uma palavra de conforto. Santa Crescência amou o significado do reino de Cristo: "Sempre que fizestes isto a um destes Meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes" (Mt 25,40).

7. "Dando graças a Deus Pai, que vos fez dignos de participar da sorte dos santos na luz" (Col 1,12). Nunca como nestes momentos encontram em nós eco estas palavras de São Paulo! Verdadeiramente a comunhão dos santos fazem-nos pregustar o Reino celeste e, ao mesmo tempo, estimulam-nos, a seu exemplo, a construí-lo no mundo e na história.

"Oportet illum regnare", "É necessário que Ele reine" (1Co 15,25), escrevia o Apóstolo, referindo-se a Cristo.

"Oportet illum regnare" repetis com o vosso testemunho, vós, S. Jose Marello, Santa Paula Montal Fornés de São José de Calasanz, Santa Leónia de Sales Aviat e Santa Maria Crescência Höss! O vosso exemplo nos estimule a uma contemplação mais viva de Cristo Rei, crucificado e ressuscitado. O vosso apoio nos ajude a caminhar com fidelidade no seguimento dos passos do Redentor, para um dia partilharmos, juntamente convosco, com Maria e com todos os Santos, a sua glória eterna no Paraíso.



SANTA MISSA PARA OS ESTUDANTES DOS ATENEUS ROMANOS

Terça-feira, 11 de Dezembro de 2001






1. "Como um pastor, que apascenta o seu rebanho, reúne os animais dispersos" (Is 40,11).

1615 A primeira Leitura, há pouco proclamada na nossa assembleia, voltou a propor-nos o início daquele que é comummente chamado o "Livro da Consolação". Ao povo eleito, obrigado a viver no exílio, o Profeta, conhecido com o nome de "Segundo Isaías", anuncia o fim dos sofrimentos e o regresso à própria terra.

Este anúncio e esperança começa com o convite: "Consolai, consolai o meu povo" (Ibid. 40, 1). Segue-se uma proclamação jubilosa da intervenção decisiva da Javé que virá libertar o seu povo: "Olhai, o Senhor Deus vem com fortaleza" (Ibid. 40, 10).

"Eis o vosso Deus!". É preciso preparar-se para o encontro com Ele. É necessário preparar os caminhos do Senhor (cf. Ibid. 40, 3), porque Ele vem para cuidar dos seus, oprimidos pela escravidão. Vem cuidadoso e solícito à procura das ovelhas perdidas.

As palavras do Profeta têm a sua realização na figura de Cristo, o Bom Pastor, da qual a página evangélica de hoje, oferece uma breve descrição. Em Cristo, não só Deus vai ao encontro do homem, mas procura-o com uma comovedora intensidade de amor.

2 "Olhai, o Senhor vem com fortaleza" (Ibid. 40, 10).

No clima do Advento, que estamos a viver, a afirmação do Profeta assume um eco ainda mais amplo e significativo. O Advento é o tempo da expectativa vigilante do Messias, que "vem com fortaleza" libertar o seu povo, e que acolheremos daqui a poucos dias na pobreza de Belém. Ele virá como Rei vitorioso no final dos tempos, mas já vem agora constantemente "renovar o mundo". Devemos aprender a perscrutar os "sinais" desta sua presença nos acontecimentos da história.

A Liturgia deste período convida-nos a procurá-lo e a descobrir que Ele está próximo de nós, mesmo quando nos afastamos d'Ele seguindo caminhos efémeros e ilusórios. Se o procuramos, é porque Ele nos procurou e nos encontrou primeiro. Eis por que, perante as situações difíceis, nos momentos obscuros da existência, nunca faltam a esperança e a alegria no coração dos crentes.

3. É com estes sentimentos que vos saúdo, Senhor Ministro da Educação, Universidade e Investigação, caríssimos Reitores, professores e estudantes de várias Universidades romanas, italianas e europeias, aqui presentes. Recebo-vos com afecto e exprimo a cada um de vós as minhas cordiais boas-vindas, agradecendo, sobretudo, as palavras que me foram dirigidas no início da celebração, pelo Professor Mario Arcelli, Reitor da LUISS, e pela jovem universitária, que interpretaram os sentimentos dos professores e dos estudantes.

Este encontro tradicional com o mundo universitário, que se realiza nas proximidades do Natal, constitui sempre para mim uma agradável e esperada ocasião para aproveitar a riqueza de reflexão e de esperança, das quais as novas gerações universitárias são portadoras. Agradeço aos Reitores e aos professores o contributo que oferecem à formação dos jovens. Agradeço cordialmente a vós, queridos jovens, a vossa presença, e desejo que leveis a um feliz êxito os estudos e os projectos que cultivais no coração.

Permiti que eu repita mais uma vez, sobretudo a vós: "Não tenhais medo!". "Fazei-vos ao largo" e ide com confiança ao encontro de Jesus, porque n'Ele sereis livres e protegidos, mesmo quando os caminhos da vida se tornam sinuosos e insidiosos. Tende confiança n'Ele, jovens universitários de várias nações europeias. Acolhê-lo significa abrir-lhe a riqueza de cada uma das culturas e nações, exaltando a sua originalidade, no dinamismo de um diálogo fecundo e no encadeamento harmonioso da multiplicidade.

4. ""Clama!", diz uma voz" (Ibid. 40, 6). Ressoa esta exortação do Profeta com particular vigor na nossa assembleia litúrgica. Ela dirige-se a vós, que formais o mundo das Universidades e da cultura. Também vós deveis clamar, queridos amigos. De facto, não podemos silenciar a verdade de Cristo. Ela pede para ser anunciada sem arrogância, mas com firmeza e orgulho. É esta a ousadia da qual o Novo Testamento fala; com ela deve ser também marcado o empenho cultural dos cristãos.

1616 Bradai, jovens universitários, com o testemunho da vossa fé! Não vos contenteis com uma vida medíocre, sem motivações profundas, destinada apenas à obtenção do proveito individual imediato. Trabalhar por uma Universidade digna do homem, que saiba pôr-se também hoje ao serviço da sociedade de maneira crítica.

A Europa precisa de uma nova vitalidade intelectual. Uma vitalidade que proponha projectos de vida austera, capaz de empenho e de sacrifício, simples nas suas legítimas aspirações, linear nas suas realizações, transparente nos seus comportamentos. É necessária uma nova audácia do pensamento, livre e criativa, pronta para receber, na perspectiva da fé, as perguntas e os desafios que surgem da vida, para fazer emergir com clareza as verdades últimas do homem.

5. Queridos Irmãos e Irmãs, vós provindes de várias nações da Europa, do Oriente e do Ocidente. Sois como que um símbolo da Europa que deveis construir em conjunto. Mas para realizar esta difícil tarefa precisais da paciência e da tenacidade do pastor que procura a ovelha perdida, da qual fala a página evangélica de Mateus, há pouco proclamada.

Uma busca incansável, que nunca se desencoraja mesmo diante da escassez dos resultados, nem se deixa limitar pelas inevitáveis e por vezes crescentes incompreensões e oposições. Uma busca inteligente e apaixonada, como quem conhece e ama. Para o pastor, a ovelha perdida não é uma entre cem, mas é como se fosse a única: chama-a pelo nome e reconhece a sua voz. Numa palavra, ama. Assim é Deus para nós. O homem de hoje precisa de reconhecer a voz de Cristo, o verdadeiro Pastor que dá a vida pelas suas ovelhas. Por conseguinte, sede apóstolos capazes de aproximar as almas do Senhor, ajudando-as a experimentar o abraço confortador da sua redenção.

6. "Toda a criatura é como a erva e toda a sua glória é como a flor dos campos!" (
Is 40,6).
A Liturgia do Advento projecta o nosso olhar para as verdades eternas que iluminam de sábio realismo as vicissitudes quotidianas. Nesta óptica, estas palavras do Profeta ressoam como um convite a não ceder às ilusões de um progresso que não é conforme com o desígnio divino. De facto, por muito maravilhoso que seja o moderno desenvolvimento científico e tecnológico, e por muito prometedor que pareça o futuro da humanidade, por vezes ele encerra em si sombras assustadoras de destruição e de morte, como também aconteceu em tempos recentes. É necessário respeitar as limitações insuperáveis apresentadas pelas referências morais. Quando o homem perde o sentido dos limites e se arma em legislador do universo, esquece-se de que está sobre esta terra como a erva e as flores do campo, cuja duração é breve.

A luz divina ilumine todos os que estão empenhados no importante campo da investigação e do progresso, para que se aproximem do homem e da criação com humildade e sabedoria. Oxalá os estudiosos e os cientistas estejam sempre conscientes da nobre missão que a Providência lhes confia! Também vós, caríssimos Irmãos e Irmãs, colaborais nesta missão exaltante. Ao investigar os segredos do cosmos e do ser humano, aproximais-vos cada vez mais do imperscrutável mistério de Deus.

Ampare-vos a constante intercessão de Maria, Sedes Sapientiae e Mãe solícita. Seja ela quem vos orienta na busca da verdade e do bem, numa atitude de escuta sempre dócil, como ela, da vivificante Palavra de Deus.

Bom Natal a todos! Bom Natal a todos!

Merry Christmas!
Bon Noël!
1617 Gesegnete Weihnachten!
Feliz Navidad!
Wesolych Zwiat!
Amen.



Homilias JOÃO PAULO II 1610