Homilias JOÃO PAULO II 1654


NA CANONIZAÇÃO DO PADRE PIO DE PIETRELCINA


Domingo, 16 de Junho de 2002


1655 1. "O Meu jugo é suave e o Meu fardo é leve" (Mt 11,30).

As palavras dirigidas por Jesus aos discípulos, que acabamos de ouvir, ajudam-nos a compreender a mensagem mais importante desta solene celebração. De facto, podemos considerá-las, num certo sentido, como uma magnífica síntese de toda a existência do Padre Pio de Pietrelcina, hoje proclamado santo.

A imagem evangélica do "jugo" recorda as numerosas provas que o humilde capuchinho de San Giovanni Rotondo teve que enfrentar. Hoje contemplamos nele como é suave o "jugo" de Cristo e verdadeiramente leve o seu fardo quando é carregado com amor fiel. A vida e a missão do Padre Pio testemunham que as dificuldades e os sofrimentos, se forem aceites por amor, transformam-se num caminho privilegiado de santidade, que abre perspectivas de um bem maior, que só Deus conhece.

2. "Quanto a mim, Deus me livre de me gloriar a não ser na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo" (Ga 6,14).

Não é porventura precisamente a "glorificação da Cruz" o que mais resplandece em Padre Pio? Como é actual a espiritualidade da Cruz vivida pelo humilde Capuchinho de Pietrelcina! O nosso tempo precisa de redescobrir o valor para abrir o coração à esperança.

Em toda a sua existência, ele procurou conformar-se cada vez mais com o Crucificado, tendo clara consciência de ter sido chamado para colaborar de modo peculiar na obra da redenção. Sem esta referência constante à Cruz não se compreende a sua santidade.

No plano de Deus, a Cruz constitui o verdadeiro instrumento de salvação para toda a humanidade e o caminho proposto explicitamente pelo Senhor a todos aqueles que desejam segui-l'O (cf. Mc Mc 16,24). O Santo Frade do Gargano compreendeu isto muito bem, e na festa da Assunção de 1914 escreveu: "Para alcançar a nossa única finalidade é preciso seguir o Chefe divino, o qual, unicamente pelo caminho que ele percorreu deseja conduzir a alma eleita; isto é, pelo caminho da abnegação e da Cruz" (Epistolário II, pág. 155).

3. "Eu sou o Senhor, que exerço a misericórdia" (Jr 9,23).

Padre Pio foi um generoso dispensador da misericórdia divina, estando sempre disponível para todos através do acolhimento, da direcção espiritual, e sobretudo da administração do sacramento da Penitência. O ministério do confessionário, que constitui uma das numerosas características que distinguem o seu apostolado, atraía numerosas multidões de fiéis ao Convento de San Giovanni Rotondo. Mesmo quando aquele singular confessor tratava os peregrinos com severidade aparente, eles, tomando consciência da gravidade do pecado e arrependendo-se sinceramente, voltavam quase sempre atrás para o abraço pacificador do perdão sacramental.

Oxalá o seu exemplo anime os sacerdotes a realizar com alegria e assiduidade este ministério, muito importante também hoje, como desejei recordar na Carta aos Sacerdotes por ocasião da passada Quinta-Feira Santa.

4. "Senhor, és tu o meu único bem".

1656 Cantamos assim no Salmo Responsorial. Através destas palavras o novo Santo convida-nos a pôr Deus acima de tudo, a considerá-lo como o nosso único e sumo bem.

De facto, a razão última da eficácia apostólica do Padre Pio, a raiz profunda de tanta fecundidade espiritual encontra-se na íntima e constante união com Deus de que eram testemunhas eloquente as longas horas passadas em oração. Gostava de repetir: "Sou um pobre frade que reza", convencido de que "a oração é a melhor arma que possuímos, uma chave que abre o coração de Deus". Esta característica fundamental da sua espiritualidade continua nos "Grupos de Oração" por ele fundados, que oferecem à Igreja e à sociedade o admirável contributo de uma oração incessante e confiante. O Padre Pio unia à oração também uma intensa actividade caritativa, da qual é uma extraordinária expressão a "Casa Alívio do Sofrimento". Oração e caridade, eis uma síntese muito concreta do ensinamento do Padre Pio, que hoje é proposto a todos.

5. "Bendigo-Te, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque... estas coisas... as revelaste aos pequeninos" (
Mt 11,25).

Como se mostram apropriadas estas palavras de Jesus, quando as pensamos referindo-as a ti, humilde e amado Padre Pio.

Nós pedimos-te que nos ensines também a nós a humildade do coração, para sermos conservados entre os pequeninos do Evangelho, aos quais o Pai prometeu revelar os mistérios do seu Reino.

Ajuda-nos a rezar sem nunca nos cansarmos, com a certeza de que Deus conhece aquilo de que precisamos, ainda antes que nós o peçamos.

Obtém-nos um olhar de fé capaz de reconhecer imediatamente nos pobres e nos que sofrem o próprio rosto de Jesus.

Ampara-nos no momento do combate e da prova e, se cairmos, faz com que conheçamos a alegria do sacramento do Perdão.

Transmite-nos a tua terna devoção a Maria, Mãe de Jesus e nossa mãe.

Acompanha-nos na peregrinação terrena rumo à Pátria bem-aventurada, onde também nós esperamos chegar para contemplar eternamente a Glória do Pai, do Filho e do Espírito Santo.

Amen!





JOÃO PAULO II

NA SOLENIDADE LITÚRGICA DOS SANTOS


APÓSTOLOS PEDRO E PAULO PADROEIROS DE ROMA


1657
29 de Junho de2002



1. "Envolve-te na tua capa e segue-me" (
Ac 12,8).

É assim que o Anjo se dirige a Pedro, encarcerado na prisão de Jerusalém. E segundo a narração do texto sagrado, ele "saiu e seguiu-o" (Ac 12,9).

Com esta intervenção extraordinária Deus ajudou o seu apóstolo para que ele pudesse continuar a sua missão. Era uma missão difícil, que exigia um itinerário complexo e cansativo. Missão que se concluirá com o martírio precisamente aqui, em Roma, onde também hoje o túmulo de Pedro é meta de incessantes peregrinações de todas as partes do mundo.

2. "Saulo, Saulo, porque me persegues? [...] Ergue-te, entra na cidade e dir-te-ão o que tens a fazer" (Ac 9,4-6).

Paulo foi iluminado pela graça divina no caminho de Damasco e, de perseguidor de cristãos tornou-se o Apóstolo das nações. Tendo encontrado Jesus no seu caminho, dedicou-se totalmente à causa do Evangelho.

Também a Paulo estava destinada a distante meta de Roma, a capital do império onde, juntamente com Pedro, anunciaria Cristo, único Senhor e Salvador do mundo. Pela fé, um dia também ele derramaria o sangue precisamente aqui, associando para sempre o seu nome ao de Pedro na história da Roma cristã.

3. É com alegria que a Igreja hoje celebra juntamente a memória de ambos. A "Pedra" e o "Instrumento" eleito" encontraram-se definitivamente aqui, em Roma. Realizaram nesta cidade o seu ministério apostólico, selando-o com a efusão do sangue.

O misterioso itinerário de e de amor, que conduziu Pedro e Paulo da sua terra natal até Jerusalém, e depois a outras partes do mundo e, por fim, a Roma, constitui num certo sentido um modelo do caminho que cada cristão está chamado a percorrer, para testemunhar Cristo no mundo.

"Busco o Senhor e Ele responde-me, e livra-me de todos os meus temores" (Ps 34 [33], 5). Como não ver na experiência destes dois Santos, que hoje comemoramos, a realização destas palavras do Salmista? A Igreja é continuamente posta à prova. A mensagem que ela recebe sempre dos santos Apóstolos Pedro e Paulo é clara e eloquente: pela graça de Deus, em todas as circunstâncias o homem tem a possibilidade de se tornar sinal do poder vitorioso de Deus. Por isto ele não deve recear. Quem confia em Deus, libertado de qualquer medo, experimenta a confortadora presença do Espírito também, e especialmente, nos momentos de prova e sofrimento.

4. Queridos e venerados Irmãos no Episcopado! Antes de tudo, o exemplo de Pedro e de Paulo interpela-nos a nós que, com a Ordenação episcopal, fomos constituídos sucessores dos Apóstolos. Como eles, somos enviados a percorrer um itinerário de conversão e de amor a Cristo. Não foi Ele, porventura, quem nos chamou? Não é Ele, porventura, que devemos sempre anunciar com coerência e fidelidade?

1658 Dirijo-me de modo particular a vós, caríssimos Arcebispos Metropolitanos, que viestes de numerosos países do mundo para receber o Pálio das mãos do Sucessor de Pedro. Saúdo-vos de modo cordial, juntamente com quantos vos acompanharam. O vínculo especial com a Sé Apostólica, que este símbolo litúrgico exprime, estimula a empenhar-se mais intensamente na busca da comunhão espiritual e pastoral em benefício dos fiéis, promovendo neles o sentido da unidade e da universalidade da Igreja. Guardai fielmente em vós, e nas pessoas que vos estão confiadas, aquela santidade de vida que é dom sobrenatural da graça do Senhor.

Saúdo também com especial afecto a Delegação enviada pelo Patriarca de Constantinopla, Bartolomeu I, e aqui chefiada pelo Metropolita Panteleimon. A tradicional visita dos representantes do Patriarcado Ecuménico para a solenidade dos Santos Pedro e Paulo constitui um momento providencial do caminho rumo ao restabelecimento da plena comunhão entre nós. No início do terceiro milénio, sentimos um forte dever de "voltar a partir de Cristo", fundamento da nossa comum fé e missão. "Heri, hodie et in saecula" (
He 13,8), é Cristo a rocha sólida sobre a qual a Igreja foi edificada.

5. "Tu és Cristo, o Filho de Deus vivo" (Mt 16,16). A profissão de fé feita por Pedro em Cesareia de Filipe, quando o Mestre perguntou aos discípulos: "E vós, quem dizeis que Eu sou?" (ibid., v. 15), assume um valor e um significado totalmente singulares para nós que formamos a Comunidade eclesial de Roma. O testemunho de Pedro e de Paulo, selada com o sacrifício extremo da vida, recorda a esta Igreja a tarefa comprometedora de "presidir à caridade" (Inácio de Antioquia, Rom., 1, 1).

Fiéis desta minha querida Diocese, estejamos cada vez mais conscientes da nossa responsabilidade. Perseveremos na oração juntamente com Maria, Rainha dos Apóstolos.
Seguindo o exemplo dos nossos gloriosos Padroeiros e com o seu apoio constante, procuremos dizer em todos os momentos a Cristo: "Tu és Cristo, o Filho de Deus vivo! Tu és o nosso único Redentor". O Redentor do mundo!


(Depois, com uma palavra de carinho, muito apreciada, o Santo Padre proferiu esta saudação)

No final desta solene celebração, desejo agradecer a todos vós, queridos Irmãos e Irmãs que, com a vossa devota participação, honrastes a memória dos Santos Pedro e Paulo. Dirijo uma saudação cordial e reconhecida, de modo particular, à Delegação da Igreja ortodoxa búlgara, chefiada pelo Metropolita Simeon. Em recordação perene da minha recente visita à Bulgária, invoco as bênçãos celestiais sobre os fiéis dessa amada Nação.

Parabéns a todos aqueles que têm o nome de Pedro e de Paulo. Boa festa para todos os romanos e os peregrinos!



VIAGEM APOSTÓLICA À TORONTO,

À CIDADE DA GUATEMALA E À CIDADE DO MÉXICO

XVII JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE

JOÃO PAULO II
Parque "Downsview"

Domingo, 28 de Julho de 2002

"Vós sois o sal da terra...

1659
Vós sois a luz do mundo" (Mt 5,13-14)


Queridos jovens da XVII Jornada Mundial da Juventude,
Estimados Irmãos e Irmãs

1. Numa montanha dos arredores do Lago da Galileia, os discípulos de Jesus estavam à escuta da sua voz suave e premente: suave como a própria paisagem da Galileia, e premente como um apelo a escolher entre a vida e a morte, entre a verdade e a mentira. Então, o Senhor pronunciou palavras de vida, destinadas a ressoar para sempre no coração dos discípulos.

Hoje, Ele dirige-vos as mesmas palavras a vós, jovens de Toronto, do Ontário e de todo o Canadá, dos Estados Unidos, do Caribe, da América de línguas espanhola e portuguesa, da Europa, da África, da Ásia e da Oceânia. Escutai a voz de Jesus, no mais profundo dos vossos corações! As suas palavras dizem-vos quem sois como cristãos. Elas ensinam-vos aquilo que deveis fazer para permanecer no seu amor.

2. Jesus oferece uma coisa, enquanto "o espírito do mundo" oferece outra. Na leitura de hoje, tirada da Carta aos Efésios, São Paulo afirma que Jesus nos faz passar das trevas para a luz (cf. 5, 8). Sem dúvida, o grande Apóstolo pensava na luz que o tinha cegado, a ele que era o perseguidor dos cristãos, no caminho de Damasco. Quando recuperou a vista, nada mais era como antes. Paulo nasceu de novo e nada mais lhe podia subtrair a alegria, que tinha inundado a sua alma.

Prezados jovens, também vós sois chamados a deixar-vos transformar. "Desperta, tu que dormes. Levanta-te de entre os mortos e Cristo te iluminará" (Ep 5,14): é ainda Paulo que fala.

O "espírito do mundo" oferece múltiplas ilusões, numerosas paródias da felicidade. Sem dúvida, não existem trevas mais densas do que aquelas que se insinuam na alma dos jovens, quando os falsos profetas extinguem neles a luz da fé, da esperança e da caridade. A maior utopia, a fonte mais importante da infelicidade consiste na ilusão de encontrar a vida renunciando a Deus, de conquistar a liberdade excluindo as verdades morais e a responsabilidade pessoal.

3. O Senhor convida-vos a escolher entre estas duas vozes, que concorrem para se apoderar da vossa alma. Esta opção constitui a substância e o desafio da Jornada Mundial da Juventude. Por que motivo vos reunistes aqui, oriundos de todas as regiões do mundo? Para dizerdes, juntamente com Cristo: "Senhor, para quem havemos de ir?" (Jn 6,68). Quem é que tem palavras de vida eterna? É Jesus, o amigo íntimo de cada jovem, que tem palavras de vida.

O mundo que haveis de herdar tem, desesperadamente, necessidade de um sentido renovado da fraternidade e da solidariedade humanas. Trata-se de um mundo que precisa de ser sensibilizado e curado pela beleza e pela riqueza do amor de Deus. O mundo contemporâneo precisa de testemunhas deste amor.Ele tem necessidade de que sejais o sal da terra e a luz do mundo. O mundo tem necessidade de vós, precisa do sal, de vós como sal da terra e como luz do mundo!

4. É ao sal que se recorre para conservar e manter sãos os alimentos.Como apóstolos do terceiro milénio, cabe a vós conservar e manter viva a consciência da presença de Jesus Cristo, nosso Salvador, de maneira especial na celebração da Eucaristia, memorial da sua morte redentora e da sua gloriosa ressurreição. Deveis conservar viva a recordação das palavras de vida que Ele pronunciou, das maravilhosas obras de misericórdia e de bondade que Ele realizou. Deveis recordar ao mundo, constantemente, que "o Evangelho é a força de Deus para a salvação" (cf. Rm Rm 1,16)!

1660 O sal tempera e dá sabor à comida. Seguindo Cristo, deveis transformar e melhorar o "sabor" da história humana. Com a vossa fé, esperança e amor, com a vossa inteligência, fortaleza e perseverança, deveis humanizar o mundo em que vivemos. Na primeira leitura de hoje, já o Profeta Isaías nos indicava a maneira de realizar isto: "Acabar com as prisões injustas... repartir o pão com quem passa fome... se tirares do meio de ti... o gesto que ameaça e a linguagem injuriosa... Então, a tua luz brilhará nas trevas" (58, 6-10).

5. Até mesmo uma pequena chama pode dissipar o obscuro véu da noite. Quanto maior será a luz que vós fareis se, todos juntos, vos unirdes como um só na comunhão da Igreja! Se amais Jesus, amai a Igreja! Não desanimeis perante os pecados e as faltas de alguns dos seus membros. O dano que alguns presbíteros e religiosos causam aos jovens e às pessoas vulneráveis enche-nos de um profundo sentido de tristeza e de vergonha. Contudo, pensai na vasta maioria dos sacerdotes e religiosos dedicados e generosos, cujo único desejo consiste em servir e em praticar o bem! Hoje, há muitos sacerdotes, seminaristas e pessoas consagradas aqui presentes; permanecei perto deles e ajudai-os! E se, nas profundezas dos vossos corações, sentis o mesmo chamamento ao sacerdócio ou à vida consagrada, não tenhais medo de seguir Cristo no caminho real da Cruz! Nos momentos difíceis da vida na Igreja, a busca da santidade torna-se ainda mais urgente. E a santidade não é uma questão de idade; trata-se de viver no Espírito Santo, precisamente como já fizeram Kateri Tekakwitha, aqui na América, e muitos outros jovens.

Vós sois jovens e o Papa é idoso, e ter 82 ou 83 anos não é a mesma coisa que ter 22 ou 23. Todavia, ele continua a identificar-se plenamente com as vossas esperanças e as vossas aspirações. Juventude de espírito, juventude de espírito! Embora eu tenha vivido no meio de muitas trevas, sob duros regimes totalitários, tive suficientes motivos para me convencer de maneira inabalável de que nenhuma dificuldade e nenhum temor é tão grande a ponto de poder sufocar completamente a esperança que jorra sem cessar no coração dos jovens.

Vós sois a nossa esperança, os jovens são a nossa esperança! Não permitais que esta esperança morra. Comprometei a vossa vida com ela. Nós não somos a soma das nossas dificuldades e falências; constituímos a soma do amor do Pai por nós e da nossa capacidade concreta de nos tornarmos imagem do seu Filho.

6. Termino com uma oração:

Ó Senhor Jesus Cristo,
Conservai estes jovens
no vosso amor.
Permiti que ouçam a vossa voz
e acreditem naquilo que dizeis
porque somente Vós tendes
1661 palavras de vida eterna.
Ensinai-os a professar a sua fé,
a manifestar o seu amor
e a transmitir a sua esperança
aos outros.
Fazei deles testemunhas
convictas do vosso Evangelho
num mundo tão necessitado
da vossa graça salvífica.
Fazei deles o novo povo
das Bem-Aventuranças,
1662 a fim de que possam ser
o sal da terra
e a luz do mundo no início
do terceiro milénio cristão!
Maria, Mãe da Igreja,
protege e guia estes jovens
e estas jovens do século XXI,
conservando-nos a todos
junto do teu Coração maternal!
Amen!



VIAGEM APOSTÓLICA À TORONTO,

À CIDADE DA GUATEMALA E À CIDADE DO MÉXICO

CANONIZAÇÃO DO BEATO IRMÃO PEDRO

DE SÃO JOSÉ DE BETANCUR

JOÃO PAULO II
Hipódromo da Cidade da Guatemala

1663
Terça-feira, 30 de Julho de 2002




1. "Vinde, benditos de meu Pai... Em verdade vos digo: sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes (
Mt 25,34 Mt 25,40). Como não pensar que estas palavras de Jesus, com as quais se concluirá a história da humanidade, possam ser adequadas também para o Irmão Pedro, que, com tanta generosidade, se dedicou ao serviço dos mais pobres e abandonados?

Hoje, ao inscrever no álbum dos Santos o Irmão Pedro de São José de Betancur, faço-o convencido da actualidade da sua mensagem. O novo Santo, levando como bagagem unicamente a sua fé e a sua confiança em Deus, atravessou o Atlântico para servir os pobres e os indígenas da América: primeiro em Cuba, depois em Honduras e, por fim, neste abençoado solo da Guatemala, a sua "terra prometida".

2. Agradeço cordialmente as palavras que me foram dirigidas por D. Rodolfo Quezada, Arcebispo da Cidade de Guatemala, apresentando-me a estas queridas comunidades eclesiais. Saúdo os Senhores Cardeais, os Bispos da Guatemala, o Bispo de Tenerife e todos os que vieram de outras partes do Continente americano.

Saúdo também com grande estima os sacerdotes, os consagrados, as consagradas e inclusive as religiosas de clausura. Dirijo uma saudação especial e afectuosa aos Irmãos da Ordem de Belém e às Irmãs Betlemitas, fruto da inspiração da Madre Encarnação Rosal, primeira Beata guatemalteca e reformadora da Comunidade que deu início a fundação, para recuperar os valores fundamentais dos seguidores do Irmão Pedro.

Agradeço particularmente a presença nesta celebração dos Presidentes das Repúblicas da Guatemala, El Salvador, Honduras, Nicarágua, Costa Rica, Panamá, República Dominicana, do Primeiro-Ministro de Belize e das outras Autoridades civis. Estimo também a participação neste acto da missão vinda da Espanha para esta feliz ocasião.

Desejo, de igual modo, exprimir o meu apreço e proximidade aos numerosos indígenas. O Papa não se esquece de vós e, ao apreciar os valores das vossas culturas, estimula-vos a superar com esperança as situações, por vezes difíceis, que estais a viver. Edificai o futuro com responsabilidade, trabalhai pelo progresso harmonioso do vosso povo! Mereceis todo o respeito e tendes direito a realizar-vos plenamente na justiça, no desenvolvimento integral e na paz.

3. "Fortalecidos pelo seu Espírito... Cristo habite pela fé nos vossos corações... de tal sorte que, arraigados e fundados na caridade, possais compreender... a profundidade do amor de Cristo" (Ep 3,16-19). Estas palavras de São Paulo, que acabámos de escutar, manifestam como o encontro interior com Cristo transforma o ser humano, enchendo-o de misericórdia para com o próximo.
O Irmão Pedro foi homem de oração profunda, já na sua terra natal, Tenerife, e depois em todas as etapas da sua vida, até chegar aqui, onde especialmente na eremitério do Calvário, buscava assiduamente a vontade de Deus em todos os momentos.

Assim, ele é um luminoso exemplo para os cristãos de hoje, aos quais recorda que, para ser santo "há necessidade de um cristianismo que se destaque principalmente pela arte da oração" (Novo millennio ineunte, 32). Por isso, repito a minha exortação a todas as comunidades cristãs da Guatemala e de outros países, para que sejam autênticas escolas de oração, nas quais rezar seja a parte central de todas as actividades. Uma vida de piedade intensa produz sempre abundantes frutos.

Foi assim que o Irmão Pedro formou a sua espiritualidade, particularmente na contemplação dos mistérios de Belém e da Cruz. Se no nascimento e na infância de Jesus aprofundou o acontecimento fundamental da Encarnação do Verbo, que o levou a descobrir quase naturalmente o rosto de Deus no homem, na meditação sobre a Cruz encontrou a força para praticar heroicamente a misericórdia com os mais pequeninos e necessitados.

1664 4. Hoje somos testemunhas da verdade profunda das palavras do Salmo que há pouco recitamos: o justo "não teme. Distribui do que é seu, dá aos pobres; a sua prosperidade subsiste para sempre" (11, 8-9). A justiça que persiste é a que se pratica com humildade, partilhando cordialmente o destino dos irmãos, espalhando em toda a parte o espírito de perdão e misericórdia.

Pedro de Betancur distinguiu-se precisamente pela prática da misericórdia com espírito de humildade e vida austera. Sentia no seu coração de servidor a admoestação do Apóstolo Paulo: "Tudo o que fizerdes, fazei-o de todo o coração como quem o faz pelo Senhor e não pelos homens" (
Col 3,23). Por isso foi verdadeiramente irmão de todos os que viviam em situações de necessidade e empenhou-se com ternura e grande amor na sua salvação. É quanto sobressai nos acontecimentos da sua vida, como na sua dedicação aos enfermos do pequeno hospital de Nossa Senhora de Belém, berço da Ordem Betlemita.

Também hoje o novo Santo é um urgente convite a praticar a misericórdia na sociedade actual, sobretudo quando são tantos os que esperam que uma caridosa mão os socorra. Pensamos nas crianças e nos jovens sem casa ou sem educação; nas mulheres abandonadas com tantas necessidades para enfrentar; nas multidões de marginalizados nas cidades; nas vítimas do crime organizado, da prostituição e da droga; nos enfermos desprovidos de assistência ou nos idosos que vivem sozinhos.

5. O Irmão Pedro "é uma herança que não se deve perder, mas fazer frutificar num perene dever de gratidão e num renovado propósito de imitação" (Novo millennio ineunte, 7). Esta herança há-de suscitar nos cristãos e em todos os cidadãos o desejo de transformar a comunidade humana numa grande família, na qual as relações sociais, políticas e económicas sejam dignas do homem, e se promova a dignidade da pessoa com o reconhecimento efectivo dos seus direitos inalienáveis.

Gostaria de concluir recordando como a devoção à Santíssima Virgem acompanhou sempre a vida de piedade e de misericórdia do Irmão Pedro. Oxalá ela nos guie também a nós para que, iluminados pelos exemplos do "homem que foi caridade", como Pedro de Betancur é conhecido, possamos alcançar o seu Filho Jesus.

Louvado seja Jesus Cristo!

No momento de dar a Bênção final, o Papa pronunciou ainda estas palavras:

Antes de deixar este recinto, o lugar da Canonização do primeiro Santo da Guatemala e de Tenerife, desejo dizer-vos uma vez mais que me comovestes. Obrigado, muito obrigado, Guatemala, por esta fé, esta cordialidade e estas ruas tão maravilhosamente decoradas. Obrigado, porque sei que por detrás de cada cruz se encontra este coração. Sede fiéis a Deus, à Igreja e à vossa tradição católica, iluminados pelo exemplo do Santo Irmão Pedro. Guatemala, sê sempre fiel, sob a salvaguarda do Santo Cristo de Esquípulas! Guatemala, levo-te no meu coração!



VIAGEM APOSTÓLICA À TORONTO,

À CIDADE DA GUATEMALA E À CIDADE DO MÉXICO

CANONIZAÇÃO DO ÍNDIO JUAN DIEGO CUAUHTLATOATZIN

JOÃO PAULO II
Basílica de Nossa Senhora de Guadalupe

Quarta-feira, 31 de Julho de 2002




1. "Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e inteligentes, e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado!" (Mt 11,25-26).

1665 Queridos Irmãos e Irmãs, estas palavras de Jesus no Evangelho deste dia constituem, para nós, um convite especial para louvar e dar graças a Deus pela dádiva do primeiro Santo indígena do Continente americano.

É com grande alegria que fiz a peregrinação até esta Basílica de Nossa Senhora de Guadalupe, coração mariano do México e da América, para proclamar a santidade de Juan Diego Cuauhtlatoatzin, o índio simples e humilde que contemplou o rosto dócil e sereno da Virgem de Tepeyac, tão querido a todas as populações do México.

2. Agradeço as amáveis palavras que me foram dirigidas pelo Senhor Cardeal Norberto Rivera Carrera, Arcebispo da Cidade do México, assim como a calorosa hospitalidade dos homens e das mulheres desta Arquidiocese Primaz: dirijo-vos a todos a minha cordial saudação. Saúdo também com afecto o Senhor Cardeal Ernesto Corripio Ahumada, Arcebispo Emérito da Cidade do México, e os outros Purpurados, Bispos do México, da América, das Filipinas e de outras regiões do mundo. Agradeço igualmente, e de maneira particular, ao Senhor Presidente da República e às Autoridades civis a sua presença nesta celebração.

Hoje, dirijo uma saudação muito especial aos numerosos indígenas provenientes das diferentes regiões do País, representantes das diversas etnias que compõem a rica e multiforme realidade mexicana. O Papa manifesta-lhes a sua proximidade, o seu profundo respeito e admiração, enquanto os recebe fraternalmente em nome do Senhor.

3. Como era Juan Diego? Por que motivo Deus fixou o seu olhar nele? Como acabámos de escutar, o livro do Eclesiástico ensina-nos que somente "Deus é todo-poderoso e apenas os humildes o glorificam" (cf. 3, 19-20). Inclusivamente as palavras de São Paulo, também proclamadas durante esta celebração, iluminam esta maneira divina de realizar a salvação: "Deus escolheu aquilo que o mundo despreza [e que é insignificante]. Deste modo, nenhuma criatura se pode orgulhar na presença de Deus" (cf.
1Co 1,28-29).

É comovedor ler as narrações guadalupanas, escritas com delicadeza e repletas de ternura. Nelas, a Virgem Maria, a escrava "que proclama a grandeza do Senhor" (Lc 1,46), manifesta-se a Juan Diego como a Mãe do Deus verdadeiro. Ela entrega-lhe, como sinal, um ramalhete de rosas preciosas e ele, mostrando-as ao Bispo, descobre gravada no seu manto ("tilma")a imagem abençoada de Nossa Senhora.

"O acontecimento guadalupano como afirmaram os membros da Conferência Episcopal Mexicana significou o começo da evangelização, com uma vitalidade que ultrapassou qualquer expectativa. A mensagem de Cristo através da sua Mãe assumiu os elementos centrais da cultura indígena, purificou-os e atribuiu-lhes o definitivo sentido de salvação" (14 de Maio de 2002, n. 8). Desta maneira, Guadalupe e Juan Diego possuem um profundo sentido eclesial e missionário, e constituem um paradigma de evangelização perfeitamente inculturada.

4. Com o salmista, acabámos de recitar: "Do céu, o Senhor contempla e vê todos os homens" (Ps 33 [32], 13), professando uma vez mais a nossa fé em Deus, que não considera as diferenças de raça ou de cultura. Ao acolher a mensagem cristã, sem renunciar à sua identidade indígena, Juan Diego descobriu a profunda verdade da nova humanidade, em que todos são chamados a ser filhos de Deus em Cristo. Desta forma, facilitou o encontro fecundo de dois mundos e transformou-se num protagonista da nova identidade mexicana, intimamente vinculada a Nossa Senhora de Guadalupe, cujo rosto mestiço dá expressão da sua maternidade espiritual que abarca todos os mexicanos. Por isso, o testemunho da sua vida deve continuar a dar impulso à edificação da Nação mexicana, a promover a fraternidade entre todos os seus filhos e a favorecer cada vez mais a reconciliação do México com as suas origens, os seus valores e as suas tradições.

Esta nobre tarefa de edificar um México melhor, mais justo e mais solidário, exige a colaboração de todos. Em particular, hoje em dia é necessário apoiar os indígenas nas suas aspirações legítimas, respeitando e defendendo os valores autênticos de cada um dos grupos étnicos. O México tem necessidade dos seus indígenas e os seus indígenas precisam do México!

Amados Irmãos e Irmãs de todas as etnias do México e da América, ao exaltar neste dia a figura do índio Juan Diego, desejo expressar-vos a proximidade da Igreja e do Papa em relação a todos vós, enquanto vos abraço com amor e vos animo a ultrapassar com esperança as difíceis situações por que estais a passar.

5. Neste momento decisivo da história do México, tendo já passado o limiar do novo milénio, recomendo à valiosa intercessão de São Juan Diego as alegrias e as esperanças, os temores e as angústias do querido povo mexicano, que trago com muito afecto no íntimo do meu coração.

1666 Ditoso Juan Diego, índio bondoso e cristão, em quem o povo simples sempre viu um homem santo! Nós te suplicamos que acompanhes a Igreja peregrina no México, para que seja cada dia mais evangelizadora e missionária. Encoraja os Bispos, sustenta os presbíteros, suscita novas e santas vocações, ajuda todas as pessoas que entregam a sua própria vida pela causa de Cristo e pela difusão do seu Reino.

Bem-aventurado Juan Diego, homem fiel e verdadeiro! Nós te rencomendamos os nossos irmãos e as nossas irmãs leigos a fim de que, sentindo-se chamados à santidade, penetrem todos os âmbitos da vida social com o espírito evangélico. Abençoa as famílias, fortalece os esposos no seu matrimónio, apoia os desvelos dos pais, empenhados na educação cristã dos seus filhos. Olha com solicitude para a dor dos indivíduos que sofrem no corpo e no espírito, de quantos padecem em virtude da pobreza, da solidão, da marginalização ou da ignorância. Que todos, governantes e governados, trabalhem sempre em conformidade com as exigências da justiça e do respeito da dignidade de cada homem individualmente, para que desta forma a paz seja consolidada.

Amado Juan Diego, a "águia que fala"! Ensina-nos o caminho que conduz para a Virgem Morena de Tepeyac, para que Ela nos receba no íntimo do seu coração, dado que é a Mãe amorosa e misericordiosa que nos orienta para o Deus verdadeiro.

No final da celebração, antes de conceder a Bênção apostólica a todos os fiéis ali presentes, o Santo Padre disse:

Ao concluir esta Canonização de Juan Diego, desejo renovar a minha saudação a todos vós que nela pudestes participar, alguns nesta Basílica, outros nos arredores e muitos outros ainda através da rádio e da televisão. Agradeço de coração o afecto de todas as pessoas que encontrei pelas ruas que percorri. No novo Santo, encontrais o maravilhoso exemplo de um homem justo, de costumes rectos, leal filho da Igreja, dócil aos pastores, amante da Virgem e bom discípulo de Jesus. Ele seja um modelo para vós, que muito o amais, e oxalá interceda pelo México, a fim de que seja sempre fiel. Levai a todos quantos a mensagem desta celebração, além da saudação e do afecto do Papa a todos os mexicanos.



Homilias JOÃO PAULO II 1654