Homilias JOÃO PAULO II 1747


VIAGEM APOSTÓLICA À ESLOVÁQUIA



EM HONRA DE SÃO JOÃO CRISÓSTOMO


Roznava, 13 de Setembro de 2003






1. "Recomendo-vos, pois, eu mesmo, prisioneiro no Senhor, que andeis de uma maneira digna do chamamento que recebestes" (cf. Ef Ep 4,1). O convite premente do apóstolo Paulo à comunidade cristã de Éfeso assume um significado particular para todos nós aqui reunidos. A cada fiel, na diversidade das vocações e dos carismas, é confiada a tarefa de ser discípulo e apóstolo: Discípulo, em escuta humilde e dócil da palavra que salva; apóstolo, com o testemunho apaixonado de uma vida modelada pelo Evangelho.

Um provérbio eslovaco diz: "As palavras admoestam, os exemplos atraem". Sim, queridos Irmãos e Irmãs, é grande o contributo que também vós podeis dar, com o "estilo" da vossa vida crista, à evangelização do mundo contemporâneo e à construção de uma sociedade mais justa e fraterna. Por isso digo-vos com o apóstolo Paulo: "Considerai, pois, irmãos, a vossa vocação" (1Co 1,26).

2. Saúdo-vos com afecto, no nome do Senhor, a todos vós, filhos e filhas desta Igreja local, começando pelo vosso Bispo, D. Eduard Kojnok, ao qual agradeço as cordiais palavras que me dirigiu, e pelo seu Coadjutor, D. Vladimír Filo. Dirijo um pensamento benévolo aos Bispos presentes e aos peregrinos que vieram de outros Países e dioceses. Saúdo as Autoridades civis e militares, sobretudo o Senhor Presidente da República Eslovaca e o Presidente do Parlamento. Agradeço a todos o acolhimento e o empenho dedicado para a preparação da minha visita.

(Em húngaro)

Desejo dirigir um pensamento particular à comunidade de língua húngara, tão numerosa nesta região e parte integrante desta diocese. Orgulhosos das vossas tradições, caríssimos Irmãos e Irmãs, e fiéis ao ensinamento dos vossos antepassados, mantende firme a fé e viva a esperança, tirando força do apego a Cristo e à sua Igreja. A vossa presença é um enriquecimento constante para a Terra eslovaca e sei que os Pastores desta Igreja local tem a preocupação de ir ao encontro das vossas aspirações espirituais, salvaguardando sempre a unidade eclesial, factor de crescimento humano e espiritual para toda a sociedade eslovaca.

(Em língua eslovaca)

3. Queridos Irmãos e Irmãs, ao vir de Bratislava e de Kosice, pude admirar as grandes extensões de terra cultivada, testemunha do vosso trabalho e da vossa fadiga. Pensei com grata simpatia em quantos estão empenhados na agricultura e dão com a sua dedicação um contributo indispensável à vida da Nação. Saúdo-os com afecto. Na parábola evangélica que acabou de ser proclamada, o próprio Jesus comparou-se ao semeador, que espalha com confiança a semente da sua palavra no terreno dos corações humanos.

O fruto não depende apenas da semente, mas também das diversas situações do terreno, isto é, de cada um de nós. Ouçamos a explicação da parábola feita pelo próprio Jesus. A semente devorada pelas aves recorda a intervenção do maligno, que leva ao coração a incompreensão do caminho de Deus (cf. Mc Mc 8,33), que é sempre o caminho da Cruz.

A semente sem raízes descreve a situação na qual a Palavra é aceite apenas exteriormente, sem aquela profundidade de adesão a Cristo e sem aquele amor pessoal por Ele (cf. Cl Col 2,7) que são os únicos que permitem conservá-lo.

1748 A semente sufocada recorda as preocupações da vida presente, a atracção exercida pelo poder, o bem-estar e o orgulho.

4. A Palavra não dá fruto automaticamente: mesmo sendo divina portanto omnipotente adapta-se às condições do terreno, ou melhor, aceita as respostas que o terreno dá, e que podem ser também negativas. Mistério da condescendência de Deus, que chega a entregar-se completamente nas mãos dos homens! Porque, no fundo, a semente lançada nos vários terrenos é o próprio Jesus (cf. Jo
Jn 12,24).

A leitura desta parábola e da explicação dada por Jesus aos seus discípulos suscita em nós uma reflexão obrigatória. Nós somos, queridos Irmãos e Irmãs, o terreno no qual o Senhor depõe incansavelmente a semente da sua Palavra e do seu amor. Com que disposições o acolhemos? Como sabemos fazê-lo frutificar?

5. São João Crisóstomo, do qual recordamos a festa litúrgica, escreve: "Levo comigo a sua Palavra: ela é o meu apoio, a minha segurança... Ela é a minha fortaleza e defesa" (cf. Homilias antes do exílio, nn. 1-3: ).

Hoje, o Papa confia-vos a todos o tesouro desta Palavra, tornando-se, por sua vez, semeador confiante que coloca no segredo do coração de cada um a "boa nova" do Reino.

Sede o terreno fértil e bom que, com a abundância dos seus frutos, conforta as expectativas da Igreja e do mundo.

"São inúteis os esforços dos homens, se Deus não os abençoar", recita ainda sabiamente outro provérbio vosso. Por isso, invoco sobre vós e sobre o vosso compromisso de vida crista abundantes bênçãos do Altíssimo.

Sede fiéis a Deus, cumpri os seus mandamentos. Defendei a vida e sede fiéis à Igreja e à vossa pátria, a Eslováquia.

Amen!





VIAGEM APOSTÓLICA À ESLOVÁQUIA




NA SANTA MISSA DE BEATIFICAÇÃO


Bratislava, 14 de Setembro de 2003






1. "O Crux, ave spes unica! Salve, ó Cruz, nossa única Esperança!".

1749 Queridos Irmãos e Irmãs, na celebração desta liturgia dominical somos convidados a contemplar a Cruz. Ela é o "lugar privilegiado" em que se revela e se manifesta para nós o amor de Deus. A Cruz foi contemplada com fé inabalável pelo Bispo D. Basílio Hopko e pela Irmã Sidónia Schelingová, que hoje tenho a alegria de inscrever no álbum dos Beatos.

Na Cruz encontram-se a miséria do homem e a misericórdia de Deus. Adorar esta misericórdia incondicional é, para o homem, o único caminho para se abrir ao mistério que a Cruz revela.

A Cruz está plantada na terra e pareceria mergulhar as suas raízes na malícia do homem, mas projecta-se para o alto, como um indicador que aponta para o céu, um indicador que aponta para a bondade de Deus. Por intermédio da Cruz de Cristo, é derrotado o maligno, é vencida a morte, é-nos transmitida a vida, restituída a esperança e comunicada a luz. "O Crux, ave spes unica!".

2. Em nome do Senhor crucificado e ressuscitado, saúdo-vos com afecto a todos vós que viestes à esplanada de Petrzalka: saúdo-te a ti, irmão Ján Sokol, Pastor desta Igreja de Bratislava-Trnava, que hoje me recebe com alegria; os teus Auxiliares e todos os Bispos da Eslováquia, em particular o venerado Cardeal Ján Chryzostom Korec. Uno-me com alegria à acção de graças de todos, pelo X aniversário da constituição da vossa Conferência Episcopal.

Saúdo os Senhores Cardeais e os Bispos que vieram dos Países vizinhos, juntamente com numerosos grupos de fiéis. A vossa presença fraternal realça de maneira eloquente o vínculo de comunhão que une as várias Igrejas locais.

Saúdo o Senhor Presidente da República e as outras Autoridades civis e militares. Agradeço-vos a todos a generosa colaboração para preparar todos os aspectos desta minha Viagem Apostólica.
Por fim, com intensidade de sentimentos, saúdo-te a ti, querido Povo eslovaco, aqui presente ou que me escutas através da rádio e da televisão. Dou graças a Deus porque soubeste conservar, também nos momentos de dificuldade, a tua fidelidade a Cristo e à sua Igreja. E exorto-te: nunca te envergonhes do Evangelho (cf. Rm
Rm 1,16)! Conserva-o no teu coração, como o tesouro mais precioso, de onde tirar luz e força na peregrinação diária da vida.

3. "Assim como Moisés levantou a serpente no deserto, do mesmo modo é preciso que o Filho do Homem seja levantado. Assim, todo aquele que nele acreditar, terá a vida eterna" (Jn 4,14-15), diz Jesus. Portanto, o que é que vemos, quando dirigimos o nosso olhar para a Cruz, onde Jesus está pregado (cf. Jo Jn 19,37)? Contemplamos o sinal do amor infinito de Deus pela humanidade.
"O Crux, ave spes unica!" São Paulo fala disto na sua carta aos Filipenses, que acabámos de escutar. Não apenas Jesus Cristo se fez homem, em tudo semelhante aos homens, mas assumiu a condição de servo e humilhou-se ainda mais, fazendo-se obediente até à morte e morte de cruz (cf. Fl Ph 2,6-8).

Sim, "Deus amou de tal forma o mundo, que lhe deu o seu Filho único" (Jn 3,16)! Admiremos extasiados e agradecidos a amplidão, o comprimento, a altura e a profundidade do amor de Cristo, que ultrapassa todo o saber (cf. Ef Ep 3,18-19)! "O Crux, ave spes unica!".

4. Sem dúvida, é a meditação deste grandioso e admirável mistério que ajudou o Beato Bispo D. Basílio Hopko e a Beata Irmã Sidónia Schelingová, na opção de vida consagrada e, de modo particular, nos sofrimentos enfrentados durante o terrível período passado na prisão.

1750 Ambos brilham diante de nós como exemplos luminosos de fidelidade numa era de dura e impiedosa perseguição religiosa: o Bispo D. Basílio nunca negou o seu apego à Igreja católica e ao Papa; e a Irmã Sidónia não hesitou em arriscar a sua própria vida para ajudar os ministros de Deus.
Ambos enfrentaram um processo injusto e uma condenação iníquia, além das torturas, da humilhação, da solidão e da morte. Assim, a Cruz tornou-se para eles o caminho que os orientou para a vida, manancial de fortaleza e de esperança, prova de amor a Deus e ao homem. "O Crux, ave spes unica!".

5. No jardim do Éden, aos pés da árvore, havia uma mulher, Eva (cf. Gn
Gn 3). Seduzida pelo inimigo, ela assenhoreia-se daquilo que julga ser a vida divina. Ao contrário, trata-se de um germe de morte que se insinua nela (cf. Tg Jc 1,15 Rm 6,23).

No Calvário, aos pés do madeiro da Cruz, havia outra mulher, Maria (cf. Jn 19,25-27). Dócil ao projecto de Deus, ela participa intimamente na oferta que o Filho faz de Si ao Pai, pela vida do mundo e, recebendo de Jesus a entrega do Apóstolo João, torna-se Mãe de todos os homens.

Ela é a Virgem das Dores, que amanhã recordaremos na liturgia, e que vós venerais com terna devoção como vossa Padroeira. Confio-lhe o presente e o futuro da Igreja e da Nação eslovaca, para que cresçam à sombra da Cruz de Cristo e saibam descobrir e aceitar sempre a mensagem de amor e salvação.

Pelo mistério da tua Cruz e da tua ressurreição, salva-nos ó Senhor! Amen.






DURANTE A MISSA CELEBRADA NO XXV ANIVERSÁRIO

DA MORTE DOS SUMOS PONTÍFICES


PAULO VI E JOÃO PAULO I




Sábado, 27 de Setembro de 2003




1. "Por que para este fim é que Cristo morreu e ressuscitou: para ser Senhor dos mortos e dos vivos" (Rm 14,9).

As palavras do Apóstolo Paulo, tiradas da Carta aos Romanos, recordam o mistério central da nossa fé: Cristo, morto e ressuscitado, é a razão derradeira de toda a existência humana.

Todos os domingos, Dia do Senhor, o povo cristão revive de modo particular este mistério de salvação. Aprofunda-o cada vez mais. Esposa de Cristo, a Igreja proclama, com alegria e esperança certa, a sua vitória sobre o pecado e sobre a morte; caminha nos séculos esperando a sua vinda gloriosa. No coração de cada Santa Missa ressoa a aclamação: "Anunciamos, Senhor, a Vossa morte, proclamamos a Vossa ressurreição, esperando a Vossa vinda".

2. Celebramos hoje este grande Mistério da fé em memória especial pelos meus venerados predecessores, o Papa Paulo VI e o Papa João Paulo I.Ambos deixaram este mundo há vinte e cinco anos, respectivamente a 6 de Agosto e a 28 de Setembro de 1978.

1751 Nos meses passados, em várias ocasiões, tive a oportunidade de recordar o Servo de Deus Paulo VI, que, há quarenta anos, recebeu do Beato João XXIII a herança do Concílio Vaticano II. Com sabedoria e firmeza levou-o até ao fim, orientando o povo cristão no período complexo e difícil do pós-Concílio.

Acerca de João Paulo I falei no dia 26 do passado mês de Agosto, no aniversário da sua eleição à Sé de Pedro.

Acomunámo-los agora na oração, enquanto nos apraz pensar que eles já entraram no "templo de Deus", naquele "oitavo dia" que "o Senhor fez" (cf. Sl
Ps 117,24), meta e cumprimento dos nossos dias terrenos.

3. "Os preceitos do Senhor dão alegria". Assim repetimos há pouco no Salmo responsorial. Volta à memória o convite frequente à alegria cristã feito por Paulo VI; convite que, mesmo se entre tantas dificuldades, surgia da consciência de aderir constantemente à vontade divina.

Penso de novo no sorriso tranquilizador do Papa Luciani, que no breve espaço de um mês conquistou o mundo. Aquele sorriso era fruto de um dócil abandono nas mãos da Providência celeste. Reflete-se nos dois Pontífices a alegria pacificadora da Igreja. Mesmo quando está provada por tantos sofrimentos, ela não tem medo; não se fecha em si mesma, mas confia no Senhor. Sabe que é guiada pelo Espírito Santo, e por isso rejubila com os sinais da misericórdia de Deus; admira as maravilhas que o Omnipotente realiza nos pequeninos; nos pobres e em todos os que o temem.

4. "Quem não é contra nós é por nós" (Mc 9,40). Assim diz Jesus no trecho evangélico deste domingo, fazendo eco à primeira Leitura, que apresenta Moisés numa atitude de profunda liberdade interior, motivada pela confiança em Deus (cf. Nm Nb 11,29).

Podemos ver esta mesma atitude em Paulo VI e em João Paulo I, que não cederam a juízos momentâneos nem a visões ligadas a interesses casuais. Firmemente ancorados na Verdade, não hesitaram em dialogar com todos os homens de boa vontade. Eram interiormente livres, porque estavam conscientes de que o Espírito Santo "sopra onde quer" (cf. Jo Jn 3,8), guiando de maneiras diferentes a história da salvação.

No dia seguinte à sua eleição, dirigindo-se aos jornalistas, o Papa Luciani disse: "Vós devereis apresentar muitas vezes a Igreja, falar da Igreja, outras, tereis que comentar o nosso humilde ministério; temos a certeza que o fareis com amor à verdade...". E, com extrema delicadeza, acrescentava: "Pedimos que estejais dispostos a contribuir também vós para salvaguardar na sociedade de hoje aquela consideração profunda pelas coisas de Deus e pela relação misteriosa entre Deus e cada um de nós, que constitui a dimensão sagrada da realidade humana" (Insegnamenti, pág. 37).

5. "Porque nenhum de nós vive para si mesmo... Se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos" (Rm 14,7-8).São Paulo recorda que a realeza de Cristo é fonte suprema de liberdade; liberdade do próprio julgamento e do julgamento do próximo, porque é o Senhor o único juiz, em cujo tribunal todos nos apresentaremos (cf. Rm Rm 14,10). Que graça poder contar sobre um juiz como este! Escreve ainda o Apóstolo: Ele "que morreu, e ainda mais, que ressuscitou, Ele que está à direita de Deus, Ele que intercede por nós" (Rm 8,34). Que paz infunde no coração a certeza de que Ele é o nosso Redentor!

Os meus venerados Predecessores, iluminados por esta verdade, dedicaram a sua existência ao serviço do Evangelho.

Nós continuamos a rezar por eles, amparados pela esperança de que um dia poderemos encontrar também nós o Juiz misericordioso na glória do Paraíso. Juntamente com Maria, Mãe misericordiosa da Igreja e da humanidade.
Assim seja!





HOMILIA DO PAPA JOÃO PAULO II

NA SANTA MISSA PARA A CANONIZAÇÃO

DE DANIEL COMBONI, ARNALDO JANSSEN


E JOSÉ FREINADEMETZ


1752
5 de Outubro de 2003






1. "Pregai o Evangelho a toda criatura" (
Mc 16,15). Foi com estas palavras que o Ressuscitado, antes da Ascensão, confiou aos Apóstolos o mandato missionário universal. Imediatamente em seguida, assegurou-lhes que nessa missão empenhativa poderiam contar com a sua assistência constante (cf. Mc Mc 16,20).

Estas mesmas palavras ressoaram, de modo eloquente, na solene celebração de hoje. Elas constituem a mensagem que nos renovam estes três novos Santos: Daniel Comboni, Bispo, fundador da Congregação dos Missionários do Coração de Jesus e da Congregação das Irmãs Missionárias Combonianas; Arnaldo Janssen, presbítero, fundador da Sociedade do Verbo Divino, da Congregação das Irmãs Missionárias Servas do Espírito e da Congregação das Irmãs Servas do Espírito Santo da Adoração Perpétua; e José Freinademetz, presbítero, da Sociedade do Verbo Divino.

A sua assistência põe em evidência o facto de que o anúncio do Evangelho "constitui o primeiro serviço que a Igreja pode prestar a cada homem e a toda a humanidade" (Redemptoris missio RMi 2). A evangelização, ensinam estes novos Santos, além das intervenções de promoção humana, muitas vezes até mesmo arriscadas, como testemunha a experiência de muitos missionários, comporta sempre um anúncio explícito de Cristo. Este é o exemplo e esta é a herança preciosa que os três Santos, hoje elevados à glória dos altares, deixam especialmente às suas Famílias religiosas. O primeiro dever dos Institutos missionários é a missão ad gentes, que não devemos antepor a qualquer outro empenho, mesmo necessário, de carácter social e humanitário.

Daniel Comboni

2. "Todas as nações verão a glória do Senhor". O Salmo responsorial, que cantamos há pouco, sublinha a urgência da missão ad gentes, mesmo nestes nossos tempos. São necessários evangelizadores com entusiasmo e com a paixão apostólica do Bispo D. Daniel Comboni, apóstolo de Cristo entre os africanos. Ele empregou os recursos da sua rica personalidade e de uma sólida espiritualidade para tornar conhecido e acolhido Cristo na África, continente que ele amava profundamente. Como não volver, também hoje, o olhar com afecto e preocupação para aquelas queridas populações? Terra rica de recursos humanos e espirituais, a África continua a ser assinalada por muitas dificuldades e problemas. Possa a Comunidade internacional ajudá-la activamente a construir um futuro de esperança. Confio este meu apelo à intercessão de São Daniel Comboni, insigne evangelizador e protector do Continente negro.

Arnaldo Janssen

3. "As nações caminharão à tua luz" (Is 60,3). A imagem profética da Nova Jerusalém, que difunde a luz divina sobre todos os povos, ilustra bem a vida e o apostolado incansável de Santo Arnaldo Janssen. A sua actividade sacerdotal foi cheia de zelo pela difusão da Palavra de Deus, utilizando os novos meios de comunicação de massa, especialmente a imprensa.
Ele não desanimava diante dos obstáculos. E gostava de repetir: "O anúncio da Boa Nova é a primeira e principal expressão de amor ao próximo". Do céu, agora, ajuda a sua Família religiosa a prosseguir fielmente no sulco por ele traçado, que testemunha a validade permanente da missão evangelizadora da Igreja.

José Freinademetz

4. "Então, eles partiram e pregaram por toda a parte" (Mc 16,20). Assim o Evangelista Marcos conclui o seu Evangelho. Acrescenta, em seguida, que o Senhor não cessa de acompanhar a actividade dos Apóstolos com o poder dos seus prodígios. Destas palavras de Jesus fazem eco as palavras cheias de fé de São José Freinademetz: "Não considero a vida missionária como um sacrifício que ofereço a Deus, mas como a maior graça que Deus me poderia ter dado". Com a tenacidade típica de um montanhêz, esta generosa "testemunha do amor" fez de si mesmo um dom às populações chineses no Shandong meridional. Abraçou por amor e com amor a sua condição de vida, segundo o conselho que ele mesmo dava aos seus missionários: "O trabalho missionário será em vão, se não amarmos e se não formos amados". Modelo exemplar de inculturação evangélica, este Santo imitou Jesus, que salvou os homens compartilhando profundamente a sua existência.
1753 5. "Ide por todo o mundo". Os três Santos, que com alegria hoje honramos, recordam a vocação missionária de cada um dos baptizados. Todo o cristão é enviado em missão, mas para ser testemunha autêntica de Cristo deve procurar constantemente a santidade (cf. Redemptoris missio RMi 90).

Acolhamos, caríssimos Irmãos e Irmãs, este convite que nos vem da hodierna sugestiva celebração. Ilumine-nos do céu a Rainha dos Santos, Estrela da nova evangelização. Voltemo-nos para Ela com confiança, especialmente neste mês de Outubro, dedicado ao Rosário e às Missões. Maria Santíssima, Rainha das missões, roga por nós.







DURANTE A EUCARISTIA PARA


O XXV ANO DE PONTIFICADO


16 de Outubro de 2003




1. "Misericordias Domini in aeternum cantabo Cantarei sem fim as maravilhas do Senhor..." (cf. Sl Ps 88,2). Há vinte e cinco anos experimentei de modo particular a misericórdia divina. No Conclave, através do Colégio Cardinalício, Cristo disse também a mim, como outrora dissera a Pedro no Lago de Genezaré: "Apascenta as Minhas ovelhas" (Jn 21,16).

Sentia na minha alma o eco da pergunta feita então a Pedro: "Tu amas-Me mais do que estes...?" (cf. Jo Jn 21,15-16). Como podia não sentir o peso de uma responsabilidade tão grande? Foi necessário recorrer à misericórdia divina, para que, à pergunta "Aceitas?", pudesse responder com confiança: "Na obediência da fé, diante de Cristo meu Senhor, confiando-me à Mãe de Cristo e da Igreja, consciente das grandes dificuldades, aceito".

Hoje, queridos Irmãos e Irmãs, apraz-me partilhar convosco uma experiência que se prolonga há já um quarto de século. Todos os dias se realiza, dentro do meu coração o mesmo diálogo entre Jesus e Pedro. No espírito, fixo o olhar benevolente de Cristo ressuscitado. Ele, apesar de estar consciente da minha fragilidade humana, encoraja-me a responder com confiança como Pedro: "Sim, Senhor, Tu sabes que Te amo" (Jn 21,17).

2. "O bom pastor dá a vida pelas suas ovelhas" (Jn 10,11). Enquanto Jesus pronunciava estas palavras, os Apóstolos não sabiam que Ele falava de si próprio. Não o sabia nem sequer João, o apóstolo predilecto. Compreendeu-o no Calvário, aos pés da Cruz, quando o vê oferecer silenciosamente a vida pelas "suas ovelhas".

Quando chegou para ele e para os outros Apóstolos o momento de assumir esta mesma missão, então recordaram-se das suas palavras. Deram-se conta de que, unicamente pelo facto de lhes ter garantido que Ele mesmo agiria por meio deles, os colocaria em condições de realizar a missão.
Disto estava bem consciente sobretudo Pedro, "testemunha dos sofrimentos de Cristo" (1P 5,1), que admoestava os mais idosos da Igreja: "Apascentai o rebanho que Deus vos confiou" (1P 5,2).

Ao longo dos séculos os sucessores dos Apóstolos, guiados pelo Espírito Santo, continuaram a reunir o rebanho de Cristo e a conduzi-lo para o Reino dos céus, conscientes de poder assumir uma responsabilidade tão grande apenas "por Cristo, com Cristo e em Cristo".

Tive esta mesma consciência quando o Senhor me chamou a desempenhar a missão de Pedro nesta amada cidade de Roma e ao serviço de todo o mundo. Desde o início do Pontificado, os meus pensamentos, as minhas orações e as minhas acções foram animadas por um único desejo: testemunhar que Cristo, Bom Pastor, está presente e age na sua Igreja. Ele está continuamente à procura de todas as ovelhas perdidas, para as reconduzir ao redil e atar-lhes as feridas; curar a ovelha débil e doente e proteger a que é forte. Eis por que, desde o primeiro dia, nunca deixei de exortar: "Não tenhais medo de receber Cristo e de aceitar o seu poder!". Repito hoje com vigor: "Abri, antes, escancarai as portas a Cristo!". Deixai-vos guiar por Ele! Tende confiança no seu amor!

1754 3. Ao começar o meu Pontificado, pedi: "Ajudai o Papa e quantos desejam servir Cristo e, com o poder de Cristo, servir o homem e toda a humanidade!". Enquanto, juntamente convosco, dou graças a Deus por estes vinte e cinco anos, marcados totalmente pela sua misericórdia, sinto uma necessidade particular de exprimir a minha gratidão também a vós, Irmãos e Irmãs de Roma e de todo o mundo, que respondestes e continuais a responder de várias formas ao meu pedido de ajuda. Só Deus conhece quantos sacrifícios, orações e sofrimentos foram oferecidos para apoiar o meu serviço à Igreja. Quanta benevolência e solicitude, quantos sinais de comunhão me circundaram todos os dias. O bom Deus recompense todos com generosidade! Peço-vos, caríssimos Irmãos e Irmãs, que não interrompais esta grande obra de amor pelo Sucessor de Pedro. Mais uma vez vo-lo peço: ajudai o Papa, e todos os que desejam servir Cristo, o homem e toda a humanidade!

4. A Ti, Senhor Jesus Cristo,
único Pastor da Igreja,
ofereço os frutos destes
vinte e cinco anos de ministério
ao serviço do povo que me confiaste.

Perdoa o mal feito
e multiplica o bem:
tudo é obra tua e unicamente a ti
é devida a glória.

Com plena confiança
1755 na tua misericórida,
apresento-te de novo, hoje,
aqueles que há anos confiaste
aos meus cuidados pastorais.

Preserva-os no amor,
reúne-os no teu redil, carrega
sobre os teus ombros os débeis,
cura os feridos,
sê solícito com os fortes.

Sê o seu Pastor,
para que não se percam.

1756 Protege a amada Igreja
que está em Roma e as Igrejas
de todo o mundo.

Enche com a luz e com o poder
do teu Espírito
todos os que destinaste
como chefes do teu rebanho:
cumpram com arrebatamento
a sua missão de guias,
mestres e santificadores,
na expectativa da tua vinda gloriosa.

1757 Renovo-te, pelas mãos de Maria,
Mãe amada, o dom de mim próprio,
do presente e do futuro:
tudo se realize segundo
a tua vontade.

Pastor Supremo, permanece
entre nós, para que possamos
caminhar contigo firmes,
rumo à casa do Pai. Amém!

Saudações finais do Santo Padre

Antes de concluir a celebração, desejo dirigir a todos os presentes a minha cordial saudação, agradecendo de modo particular aos numerosos peregrinos provenientes da Itália, da Polónia e de outros Países.

1758 Saúdo os Cardeais, com um pensamento especial para o Cardeal Joseph Ratzinger, Decano do Sagrado Colégio, agradecendo-lhe as afectuosas palavras que me dirigiu. De igual modo, faço extensiva a minha saudação aos numerosos Bispos presentes.

Saúdo a Comunidade diocesana de Roma, aqui reunida com o Cardeal Vigário, os Bispos Auxiliares e os párocos.

Saúdo com deferência os Chefes de Estado, sobretudo o Presidente da Itália, Carlo Azeglio Ciampi, ao qual agradeço as gentis expressões de bons-votos que me dirigiu ontem à tarde através de uma mensagem televisiva. Com ele saúdo o Presidente da Polónia e todas as Autoridades presentes, assim como os Representantes de várias Instituições italianas e internacionais.

Agradeço a todos os que, de tantas partes da Terra, apoiam o meu ministério apostólico quotidiano com a oração e com a oferenda do seu sofrimento.

Obrigado pelo apoio às obras de caridade do Papa.



HOMILIA DO PAPA JOÃO PAULO II

DURANTE O SOLENE RITO DE BEATIFICAÇÃO

DE MADRE TERESA


NO DIA MISSIONÁRIO MUNDIAL


Domingo, 19 de Outubro de 2003




1. "Quem quiser ser o primeiro entre vós, faça-se servo de todos" (Mc 10,44). Estas palavras de Jesus aos discípulos, que ressoaram há pouco nesta Praça, indicam qual é o caminho que leva à "grandeza" evangélica. É o caminho que o próprio Cristo percorreu até à Cruz; um itinerário de amor e de serviço, que inverte qualquer lógica humana. Ser o servo de todos!

Madre Teresa de Calcutá, Fundadora dos Missionários e das Missionárias da Caridade, que hoje tenho a alegria de inscrever no Álbum dos Beatos, deixou-se guiar por esta lógica. Estou pessoalmente grato a esta mulher corajosa, que senti sempre ao meu lado. Ícone do Bom Samaritano, ela ia a toda a parte para servir Cristo nos mais pobres entre os pobres. Nem conflitos nem guerras conseguiam ser um impedimento para ela.

De vez em quando vinha falar-me das suas experiências ao serviço dos valores evangélicos. Recordo, por exemplo, as suas intervenções a favor da vida e contra o aborto, também quando lhe foi conferido o prémio Nobel pela paz (Oslo, 10 de Dezembro de 1979). Costumava dizer: "Se ouvirdes que alguma mulher não deseja ter o seu menino e pretende abortar, procurai convencê-la a trazer-mo. Eu amá-lo-ei, vendo nele o sinal do amor de Deus".

2. Não é significativo que a sua beatificação se realize precisamente no dia em que a Igreja celebra o Dia Missionário Mundial? Com o testemunho da sua vida, Madre Teresa recorda a todos que a missão evangelizadora da Igreja passa através da caridade, alimentada na oração e na escuta da palavra de Deus. É emblemática deste estilo missionário a imagem que mostra a nova Beata que, com uma mão, segura uma criança e, com a outra, desfia o Rosário.

Contemplação e acção, evangelização e promoção humana: Madre Teresa proclama o Evangelho com a sua vida inteiramente doada aos pobres mas, ao mesmo tempo, envolvida pela oração.

1759 3. "Quem quiser ser grande entre vós faça-se Vosso servo" (Mc 10,43). É com particular emoção que hoje recordamos Madre Teresa, grande serva dos pobres, da Igreja e do Mundo inteiro. A sua vida é um testemunho da dignidade e do privilégio do serviço humilde. Ela escolheu ser não apenas a mais pequena, mas a serva dos mais pequeninos. Como mãe autêntica dos pobres, inclinou-se diante dos que sofriam várias formas de pobreza. A sua grandeza reside na sua capacidade de doar sem calcular o custo, de se doar "até doer". A sua vida foi uma vivência radical e uma proclamação audaciosa do Evangelho.

O brado de Jesus na cruz, "Tenho sede" (Jn 19,28), que exprime a profundidade do desejo que o homem tem de Deus, penetrou no coração de Madre Teresa e encontrou terreno fértil no seu coração. Satisfazer a sede que Jesus tem de amor e de almas, em união com Maria, Sua Mãe, tinha-se tornado a única finalidade da existência de Madre Teresa, e a força interior que a fazia superar-se a si mesma e "ir depressa" de uma parte a outra do mundo, a fim de se comprometer pela salvação e santificação dos mais pobres.

4. "Sempre que fizestes isto a um destes Meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes" (Mt 25,40). Este trecho do Evangelho, tão fundamental para compreender o serviço de Madre Teresa aos pobres, estava na base da sua convicção, cheia de fé, que ao tocar os corpos enfraquecidos dos pobres tocava o corpo de Cristo. O seu serviço destinava-se ao próprio Jesus, escondido sob as vestes angustiantes dos mais pobres. Madre Teresa realça o significado mais profundo do serviço: um gesto de amor feito aos famintos, aos sequiosos, aos estrangeiros, a quem está nu, doente, preso (cf. Mt Mt 25,34-36), é feito ao próprio Jesus.

Ao reconhecê-l'O servia-O com grande devoção, exprimindo a delicadeza do seu amor esponsal. Assim, no dom total de si a Deus e ao próximo, Madre Teresa encontrou a sua satisfação mais nobre e viveu as qualidades mais elevadas da sua feminilidade. Desejava ser um "sinal do amor de Deus, da presença de Deus, da compaixão de Deus" e, desta forma, recordar a todos o valor e a dignidade de cada filho de Deus "criado para amar e para ser amado". Era assim que Madre Teresa "levava as almas para Deus e Deus às almas", aliviando a sede de Cristo, sobretudo das pessoas mais necessitadas, cuja visão de Deus tinha sido ofuscada pelo sofrimento e pela dor.

5. "Porque o Filho do Homem também não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos" (Mc 10,45). Madre Teresa partilhou a paixão do Crucificado, de modo especial durante longos anos de "obscuridade interior". Aquela foi a prova, por vezes lancinante, acolhida como um singular "dom e privilégio".

Nos momentos mais difíceis ela recorria com mais tenacidade à oração diante do Santíssimo Sacramento. Esta difícil angústia espiritual levou-a a identificar-se cada vez mais com aqueles que servia todos os dias, experimentando o sofrimento e por vezes até a recusa. Gostava de repetir que a maior pobreza é não sermos desejados, não ter ninguém que se ocupe de nós.
6. "Dai-nos, Senhor, a Vossa graça, em Vós esperamos!". Quantas vezes, como o Salmista, também Madre Teresa, nos momentos de desolação interior, repetiu ao seu Senhor: "Em Vós, meu Deus, em Vós espero!".

Prestemos honra a esta pequena mulher apaixonada por Deus, humilde mensageira do Evangelho e infatigável benfeitora da nossa época. Aceitemos a sua mensagem e sigamos o seu exemplo.

Virgem Maria, Rainha de todos os Santos, ajuda-nos a ser mansos e humildes de coração como esta intrépida mensageira do Amor. Ajuda-nos a servir com a alegria e com o sorriso todas as pessoas que encontramos. Ajuda-nos a ser missionários de Cristo, nossa paz e nossa esperança. Amém!



Homilias JOÃO PAULO II 1747