Homilias JOÃO PAULO II 1779

1779 4. Convido-vos a vós todos a olhar para a cruz, caríssimos Irmãos e Irmãs, reunidos nesta tarde para a Santa Eucaristia. Sede comunidades paroquiais abertas e acolhedoras. Entre vós residem numerosos fiéis latino-americanos e polacos. Estes nossos irmãos e irmãs sintam-se amados como Cristo amou e serviu cada homem e cada mulher até ao sacrifício de si mesmo. É este o testemunho de fé que toca o coração também dos chamados longínquos.

5. "Se alguém está com Cristo, é uma nova criação; o que era antigo, passou; eis que surgiram coisas novas" (
2Co 5,17). Esta consciência, mencionada pelo Apóstolo na segunda leitura, guie o vosso caminho, caríssimos Irmãos e Irmãs!

Vivei em Cristo como novas criaturas. Elevar-se-á então do vosso coração um transbordante hino de louvor e de agradecimento Àquele que, com o sacrifício da Cruz nos redimiu.

Maria, presente em lágrimas no Calvário, vos obtenha o dom de uma verdadeira conversão, prelúdio da alegria sem fim prometida aos fiéis discípulos do seu divino Filho.

Amém





NA CERIMÓNIA DE BEATIFICAÇÃO


DE QUATRO SERVOS DE DEUS


Domingo, 21 de Março de 2004


1. "Se alguém está com Cristo, é uma nova criatura" (2Co 5,17).

Podemos resumir com estas palavras do apóstolo Paulo a mensagem da hodierna liturgia de beatificação, que bem se insere, no meio do caminho quaresmal, no Domingo chamado "Laetare".
A segunda Leitura e o Evangelho formam como que um hino a duas vozes, o louvor do amor de Deus, Pai misericordioso (Lc 15,11-32), que nos reconciliou em Cristo (2Co 5,17-21). Um hino que se faz premente apelo: "Deixai-vos reconciliar com Deus" (2Co 5,20).

Este convite apoia-se na certeza de que o Senhor nos ama. Ele amou os Israelitas fazendo-os entrar na terra de Canaã, depois do longo caminho do Êxodo, como ouvimos na primeira Leitura, cheia de saudade pungente. A Páscoa que eles celebraram "de manhã, na planície de Jericó" (Jos 5,10) e os primeiros meses que passaram na terra prometida tornaram-se, para nós, um símbolo eloquente da fidelidade divina, que faz dom da sua paz ao povo eleito, depois da triste experiência da escravidão.

2. Os quatro novos Beatos que a Igreja coloca hoje diante de nós: Luís Talamoni, Matilde do Sagrado Coração Téllez Robles, Piedade da Cruz Ortíz Real e Maria Cândida da Eucaristia são singulares testemunhas da amável Providência divina, que acompanha o caminho da humanidade.
1780 Sustentados por uma fé inabalável no Pai celeste, eles enfrentaram as fadigas e as provações da peregrinação terrena. Seu sustento e conforto nos difíceis acontecimentos da existência sempre foi Cristo. Experimentaram assim em si mesmos como é verdade que viver Nele significa tornar-se "novas criaturas" (cf. 2Co 5,17).

3. Reflexo fiel da misericórdia de Deus é o sacerdote Luís Talamoni. O mais ilustre dos seus alunos no Seminário Liceal di Monza, Achille Ratti, depois Papa Pio XI, definiu-o "pela santidade de vida, luz de ciência, grandeza de coração, perícia de magistério, ardor de apostolado e pelas benemerências cívicas a honra de Monza, pedra preciosa do clero ambrosiano, pai e guia de almas sem número". O novo Beato foi assíduo no ministério do confessionário e no serviço aos pobres, nos cárceres e especialmente aos doentes indigentes. Que fúlgido exemplo é ele para todos! Exorto a olhar para ele sobretudo os sacerdotes e a Congregação das Irmãs Misericordinas.

4. "Aquele que está com Cristo, é uma nova criatura" (2Co 5,17). As palavras de São Paulo podem aplicar-se perfeitamente à Madre Matilde Téllez Robles. Apaixonada por Cristo, entregou-se a Ele como verdadeira discípula que encarna essa novidade. Esta mulher incansável e religiosa consagrou-se, com uma intensa vida de oração, à transformação da sociedade do seu tempo mediante o acolhimento das meninas órfãs, a atenção domiciliar aos enfermos, a promoção da mulher trabalhadora e a colaboração nas actividades eclesiais.

Profundamente devota da Eucaristia, a contemplação de Jesus no Sacramento do Altar levou-a a desejar ser como ele, pão que se parte e reparte para todos. Isto é o que ensinou também às suas Religiosas, as Filhas de Maria, Mãe da Igreja. O seu luminoso testemunho é um convite a viver em adoração a Deus e ao serviço aos irmãos, dois pilares fundamentais do compromisso cristão.

5. A Madre Piedade da Cruz Ortíz, nascida em Bocairente e fundadora das Salesianas do Sagrado Coração em Alcantarilla (Múrcia), é um maravilhoso exemplo da reconciliação que nos propõe São Paulo na segunda leitura: "Foi Deus quem reconciliou o mundo consigo, em Cristo" (2Co 5,19). Mas Deus pede a colaboração dos homens para levar a cabo a sua obra de reconciliação (cf. vv. 19-20). A Madre Piedade reuniu as diversas jovens desejosas de mostrar aos humildes e aos pobres o amor do Pai providente manifestado no Coração de Jesus, dando assim vida a uma nova família religiosa. Modelo de virtudes cristãs e religiosas, enamorada por Cristo, pela Virgem Maria e pelos pobres, deixa-nos o exemplo de austeridade, oração e caridade para com todos os necessitados.

6. "Nova criatura" tornou-se Maria Barba, que ofereceu toda a sua vida a Deus no Carmelo, onde recebeu o nome de Maria Cândida da Eucaristia. Da Eucaristia, foi uma autêntica mística; fê-la o centro unificante de toda a existência, seguindo a tradição carmelita, em particular o exemplo de Santa Teresa de Jesus e de São João da Cruz.

Enamorou-se a tal ponto de Jesus eucarístico que sentiu um constante e ardente desejo de ser apóstola incansável da Eucaristia. Tenho a certeza de que, do Céu, a bem-aventurada Maria Cândida continua a ajudar a Igreja, para que cresça na admiração e no amor a este supremo Mistério da nossa fé.

6. "Laetare, Jerusalem - Alegrai-vos com Jerusalém" (Antífona de entrada).
O convite à alegria, que caracteriza a hodierna liturgia, amplia-se pelo dom dos Beatros Luís Talamoni, Matilde do Sagrado Coração Téllez Robles, Piedade da Cruz Ortíz Real e Maria Cândida da Eucaristia. Eles fazem-nos saborear, peregrinos na terra, o gáudio do Paraíso e são para todos os fiéis testemunhas de consoladora esperança.







DURANTE A CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA


COM AS PAROQUIAIS ROMANAS DE SÃO JOÃO DA CRUZ,


SANTA FELICIDADE E DOS FILHOS MÁRTIRES


E DOS SANTOS CRISANTE E DÁRIA


Sábado, 27 de Março de 2004





1. "Pois vou realizar algo de novo" (Is 43,19).

1781 O profeta Isaías convida-nos a olhar para a novidade que Deus deseja realizar na história da salvação. Para o povo de Israel ela será a libertação da escravidão da Babilónia e o regresso à pátria. Para o Povo da Nova Aliança será, ao contrário, a libertação da escravidão do pecado, realizada por Cristo na sua Páscoa de morte e ressurreição.

Conscientes disto percorremos a última parte do caminho quaresmal, encorajados pela liturgia a recusar com decisão e a acolher a graça purificadora e renovadora de Deus. O trecho evangélico que há pouco proclamamos exorta-nos a fazer isto. Nele Cristo manifesta o seu amor misericordioso, pronto para perdoar a pecadora arrependida e a oferecer-lhe uma nova esperança de vida (cf. Jo
Jn 8,1-11).

2. Caríssimos Irmãos e Irmãs das Paróquias de São João da Cruz, de Santa Felicidade e Filhos Mártires e dos Santos Crisante e Dária, acolho-vos de bom grado esta tarde para a Celebração eucarística e saúdo-vos a todos de coração.

Dirijo uma grata saudação ao Cardeal Vigário, que quis traçar um quadro ilustrativo das vossas comunidades. Juntamente com ele, sinto-me feliz por saudar o Bispo Auxiliar do Sector Norte, os vossos queridos Párocos: Pe. Enrico Gemma, Pe. Eusébio Mosca, dos Padres Vocacionistas, e Pe. Albino Marin, os Vigários paroquiais e os Sacerdotes seus colaboradores.

Saúdo as Religiosas que trabalham e vivem no âmbito das vossas Paróquias, assim como as associações, os grupos, os movimentos e os fiéis comprometidos na difusão do Evangelho. Depois, não quero esquecer todos os que não puderam estar presentes e, de modo particular, as pessoas sozinhas, os idosos e os doentes. Chegue a todos e a cada um a minha afectuosa saudação.

3. Sei que vos preparastes para este encontro reflectindo sobre quais sejam para vós, neste momento, as prioridades pastorais e os desafios apostólicos mais urgentes e importantes.

Indicastes justamente como condição indispensável para um testemunho cristão incisivo no mundo de hoje a promoção de uma comunhão fraterna entre todas as componentes paroquiais. Uma Paróquia unida, no âmbito da qual é respeitada a diversidade dos ministérios e dos carismas, mostra o seu rosto de família acolhedora, animada unicamente pelo desejo de anunciar e testemunhar o Evangelho. Continuai por este caminho, caríssimos Irmãos e Irmãs!

Apraz-me repetir também a vós o convite "Duc in altum!", que fiz a toda a Igreja com a Carta apostólica Novo millennio ineunte no final do Grande Jubileu do Ano 2000. Fazei-vos ao largo, preocupando-vos não só dos chamados "vizinhos", mas também dos que vivem afastados da fé.

4. Em primeiro lugar, tende a solicitude pelas famílias e pelos jovens. A pastoral juvenil constitua o objectivo privilegiado da nossa acção evangelizadora, valorizando os Oratórios como lugar de formação humana, espiritual e eclesial das crianças e dos jovens. Podem encontrar-se, nos Oratórios, as diversas gerações para favorecer a transmissão da fé aos mais jovens, que têm necessidade de pontos de referência sólidos.

Além disso, nunca vos canseis de suscitar com a oração e o exemplo as vocações ao sacerdócio e à vida consagrada: a Igreja de Roma precisa de sacerdotes santos, religiosos e religiosas, de homens e mulheres total e jubilosamente consagrados a Deus para o bem do seu povo.

E por fim, estai atentos às necessidades espirituais e materiais dos irmãos próximos e distantes. A respeito disto, agradeço-vos o compromisso que cada comunidade hoje me quis manifestar, isto é, o de adoptar à distância uma criança.

1782 5. Voltando com a mente às palavras do apóstolo Paulo: "considero que tudo isto foi mesmo uma perda, por causa da maravilha que é o conhecimento de Cristo Jesus" (Ph 3,8). São Paulo expressa assim a mudança radical que se verificou na sua vida: sendo perseguidor, tornou-se apóstolo das nações, totalmente "conquistado por Cristo Jesus" (cf. Fl Ph 3,12).

Caríssimos Irmãos e Irmãs, deixai-vos também vós "conquistar" por Cristo; a sua palavra de salvação e o seu amor misericordioso penetrem as vossas consciências e vos orientem nas opções de cada dia.

Maria, fiel até ao fim à missão que lhe foi confiada, vos ajude a aderir sem hesitações a Cristo, para serdes suas testemunhas credíveis entre o povo do bairro. O Evangelho precisa também de vós para alcançar numerosas pessoas que o esperam talvez sem o saber. Cristo conta convosco. Não o desiludais!



DOMINGO DE RAMOS


XIX JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE




24 de Abril de 2004




1. "Bendito seja o Rei que vem em nome do Senhor" (Lc 19,38).

Com estas palavras, a população de Jerusalém recebeu Jesus à sua chegada à cidade santa, aclamando-o rei de Israel. Mas, alguns dias mais tarde, a mesma multidão recusá-lo-á com gritos hostis "Crucifica-o! Crucifica-o!" (Lc 23,21). A liturgia do Domingo de Ramos faz-nos reviver estes dois momentos da última semana da vida terrena de Jesus. Imerge-nos naquela multidão tão volúvel que, em poucos dias, passou do entusiasmo jubiloso ao desprezo homicida.

2. No clima de alegria, velado de tristeza, que caracteriza o Domingo de Ramos, celebramos a XIX Jornada Mundial da Juventude. Este ano ela tem como tema "Queremos ver Jesus" (Jn 12,21), o pedido que "alguns gregos", que chegaram a Jerusalém para a festa da Páscoa, dirigiram aos apóstolos (Jn 12,20).

Face à multidão que veio para o ouvir, o Cristo proclamou "Eu, quando for erguido da terra, atrairei todos a mim" (Jn 12,32). Eis, por conseguinte, a sua resposta todos aqueles que procuram o Filho do homem, vê-lo-ão, na festa da Páscoa, como verdadeiro Cordeiro imolado para a salvação do mundo.

Na Cruz Jesus morre por cada um e cada uma de nós. Por conseguinte, a Cruz é o sinal maior e mais eloquente do seu amor misericordioso, o único sinal de salvação para cada geração e para toda a humanidade.

3. Há vinte anos, no final do Ano Santo da Redenção, entreguei aos jovens a grande Cruz daquele Jubileu. Naquela ocasião exortei-os a serem discípulos fiéis de Cristo, Rei crucificado, "Aquele que traz ao homem a liberdade baseada na verdade, como Aquele que liberta o homem daquilo que limita, diminui e como que espedaça essa liberdade nas próprias raízes, na alma do homem, no seu coração e na sua consciência" (Redemptor hominis RH 12).

Desde então a Cruz continua a percorrer numerosos Países, em preparação para as Jornadas Mundiais da Juventude. Durante as suas peregrinações percorreu os Continentes como o archote que passa de mão em mão, ela foi transportada de um País para outro; tornou-se o sinal luminoso da confiança que anima as jovens gerações do terceiro milénio. Hoje está em Berlim!

1783 4. Queridos jovens! Ao celebrar o vigésimo aniversário do início desta extraordinária aventura espiritual, permiti que vos renove a mesma recomendação que fiz naquela época "Confio-vos a Cruz de Cristo! Levai-a ao mundo como sinal do amor do Senhor Jesus pela humanidade, e anunciai a todos que só em Cristo morto e ressuscitado há salvação e redenção" (Insegnamenti, VII, 1 [1984], 1105).

Sem dúvida, a mensagem que a Cruz comunica não é fácil de compreender no nosso tempo, no qual o bem-estar material e as comodidades são propostos e procurados como valores prioritários. Mas vós, queridos jovens, não tenhais receio de proclamar, em qualquer circunstância o Evangelho da Cruz. Não tenhais medo de ir contra a corrente!

5. "Cristo Jesus... rebaixou-se a si mesmo, tornando-se obediente até à morte... de cruz" (
Ph 2,6 Ph 2,8). O admirável hino da Carta de São Paulo aos Filipenses recordou-nos, há pouco, que a Cruz tem dois aspectos inseparáveis é, ao mesmo tempo, dolorosa e gloriosa. O sofrimento e a humilhação da morte de Jesus estão intimamente ligadas à exaltação e à glória da sua ressurreição.

Queridos Irmãos e Irmãs! Caríssimos jovens! Nunca percais a autoconsciência desta verdade confortadora. A paixão e a ressurreição de Cristo constituem o centro da nossa fé e o nosso amparo nas inevitáveis provas quotidianas.

Maria, Virgem das Dores e testemunha silenciosa do júbilo da ressurreição, vos ajude a seguir Cristo crucificado e a descobrir no mistério da Cruz o sentido pleno da vida.

Louvado seja Jesus Cristo!



MISSA CRISMAL


Quinta-Feira Santa, 8 de Abril de 2004



1. "Pontífice da nova e eterna aliança". Assim se mostra Jesus, de maneira singular, na hodierna Santa Missa crismal, que demonstra o vínculo profundo que existe entre a Eucaristia e o Sacerdócio ministerial. Cristo é o Sumo Sacerdote daquela Nova Aliança, já prenunciada pelo Profeta do exílio na Babilónia (cf. Is Is 61,1-3). N'Ele cumpre-se a antiga profecia, como Ele mesmo proclama na Sinagoga de Nazaré, precisamente no início da vida pública (cf Lc 4,21). O Messias prometido, o "Ungido do Senhor", levará a cumprimento na Cruz a libertação definitiva dos homens da antiga escravidão do Maligno. E, ressuscitando ao tercerio dia, inaugurará a vida que já não conhece a morte.

2. "Cumpriu-se hoje esta passagem da Escritura" (Lc 4,21).O "hoje" evangélico renova-se, de modo singular, nesta Missa do Crisma, que representa um verdadeiro e próprio prelúdio do Tríduo Pascal. Se a Missa in Cena Domini realça o mistério da Eucaristia e a entrega do mandamento novo do amor, a Missa que estamos a celebrar, chamada Missa do Crisma, realça o dom do sacerdócio ministerial.

Quis recordar esta estreita unidade existente entre a Eucaristia e o Sacerdócio na Carta aos Sacerdotes que, precisamente por ocasião da Quinta-Feira Santa, lhes enviei. A Eucaristia e o Sacerdócio são "dois Sacramentos que nasceram juntos e cujas sortes estão indissoluvelmente ligadas até ao fim do mundo" (n. 3).

3. Queridos Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio, saúdo-vos a todos com afecto e agradeço-vos a vossa numerosa presença e devota participação. Daqui a pouco renovaremos as promessas sacerdotais, dando graças a Deus pelo dom do nosso Sacerdócio. Recordaremos, ao mesmo tempo, o firme propósito de ser imagem cada vez mais fiel de Cristo, Sumo Sacerdote. Ele, Bom Pastor, chama-nos a seguir o seu exemplo, e a oferecer-lhe dia após dia a vida pela salvação da grei que confiou aos nossos cuidados.

1784 Como não voltar, com o pensamento repleto de emoção, ao entusiasmo do primeiro "sim", pronunciado no dia da Ordenação presbiteral? "Eis-me!". Respondemos Àquele que nos chamava para trabalhar no seu Reino. "Eis-me!". Devemos repetir todos os dias, conscientes de ter sido convidados para servir, de modo especial, a comunidade dos salvos in persona Christi.

Verdadeiramente extraordinário é o "dom e mistério" que recebemos. A experiência quotidiana ensina-nos que ele deve ser conservado, graças a uma adesão indefectível a Cristo, alimentada pela oração constante. O povo cristão quer ver-nos antes de mais como "homens de oração". Quem nos encontra deve poder experimentar através das nossas palavras e dos nossos comportamentos o amor fiel e misericordioso de Deus.

4. Queridos Irmãos e Irmãs! A odierna Missa crismal vê, em cada Diocese, o povo cristão reunido à volta do próprio Bispo e de todo o presbitério. Trata-se de uma solene e significativa celebração, durante a qual são abençoados o sagrado Crisma e o óleo dos enfermos e dos catecúmenos. Este rito convida a contemplar Cristo, que assumiu a nossa fragilidade humana e fez dela instrumento de salvação universal. À sua imagem, cada crente, cheio da unção do Espírito Santo, é "consagrado" para se tornar oferta agradável a Deus.

A Virgem Maria, Mãe de Cristo Sumo Sacerdote, que cooperou intimamente na obra da redenção, nos ajude, a nós sacerdotes, a reproduzir de maneira cada vez mais fiel, na nossa existência e no nosso serviço eclesial, a imagem do seu Filho Jesus. Faça com que todos os cristãos sejam cada vez mais conscientes da vocação à qual cada um é chamado, para que a Igreja, alimentada pela Palavra e santificada pelos sacramentos, continue a cumprir plenamente a sua missão no mundo.



SANTA MISSA "IN CENA DOMINI"


Quinta-feira Santa, 8 de Abril de 2004

1. "Amou-os até ao fim" (cf. Jn 13,1).


Antes de celebrar a última Páscoa com os discípulos, Jesus lavou-lhes os pés. Com um gesto que normalmente compete ao servo, quis imprimir nas mentes dos Apóstolos o sentido de quanto iria acontecer dali a pouco.

Com efeito, a paixão e a morte constituem o fundamental serviço de amor com o qual o Filho de Deus libertou a humanidade do pecado. Ao mesmo tempo a paixão e a morte de Cristo revelam o sentido profundo do novo mandamento por Ele confiado aos Apóstolos: "que vos ameis uns aos outros assim como Eu vos amei" (Jn 13,34).

2. "Fazei isto em memória de Mim" (1Co 11,24 1Co 11,25) disse duas vezes, distribuindo o pão que se tornou o seu Corpo e o vinho que se tornou o seu Sangue. "Dei-vos exemplo para que, assim como Eu fiz, vós façais também" (Jn 13,15) recomendara pouco antes, depois de ter lavado os pés aos Apóstolos. Por conseguinte, os cristãos sabem que devem "fazer memória" do seu Mestre ao prestar-se reciprocamente o serviço da caridade: "lavar os pés uns aos outros". Em particular, eles sabem que devem recordar Jesus repetindo o "memorial" da Ceia com o pão e o vinho consagrados pelo ministro que repete sobre eles as palavras então pronunciadas por Cristo.

A comunidade cristã começou a fazer isto desde os primeiros tempos, como ouvimos afirmar por São Paulo: "Todas as vezes que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, anunciais a morte do Senhor até que Ele venha" (1Co 11,26).

3. Por conseguinte, memorial em sentido pleno é a Eucaristia: o Pão e o Vinho, por acção do Espírito Santo, tornam-se realmente o Corpo e o Sangue de Cristo, que se oferece como alimento para o homem no seu caminho na terra. É a mesma lógica de amor que preside à encarnação do Verbo no seio de Maria e ao seu tornar-se presente na Eucaristia. É o agape, a caritas, o amor no sentido mais belo e puro. Jesus pediu insistentemente aos seus discípulos que permanecessem nesse amor (cf. Jo Jn 15 Jo Jn 9).

1785 A fim de se manterem fiéis a este pedido, para permanecer n'Ele como os ramos unidos à videira, para amar como Ele amou é necessário alimentar-se com o seu Corpo e com o seu Sangue. Ao dizer aos Apóstolos: "Fazei isto em Minha memória", o Senhor uniu a Igreja ao memorial vivo da sua Páscoa. Mesmo sendo o único Sacerdote da Nova Aliança, quis ter a necessidade de homens que, consagrados pelo Espírito Santo, agissem em união íntima com a sua Pessoa, distribuindo o alimento da vida.

4. Por isso, enquanto fixamos o olhar em Jesus que institui a Eucaristia, tomemos de novo consciência da importância dos presbíteros na Igreja e do seu vínculo com o Sacramento eucarístico. Na Carta que escrevi aos Sacerdotes para este dia santo quis repetir que dom e mistério é o Sacramento do altar, dom e mistério é o Sacerdócio, tendo surgido os dois do Coração de Cristo durante a Última Ceia.

Só uma Igreja enamorada da Eucaristia gera, por sua vez, vocações sacerdotais santas e numerosas. E faz isto através da oração e do testemunho da santidade, oferecida de modo especial às novas gerações.

5. Na escola de Maria, "mulher eucarística", adoremos Jesus verdadeiramente presente nos sinais do pão e do vinho. Supliquemo-lo para que não cesse de chamar para o serviço do altar sacerdotes segundo o seu coração.

Peçamos ao Senhor que nunca falte ao Povo de Deus o Pão que o ampare ao longo da peregrinação terrena. Que a Virgem Santa nos ajude a redescobrir com admiração que toda a vida cristã está ligada ao mysterium fidei, que esta tarde celebraremos solenemente.



VIGÍLIA PASCAL

JOÃO PAULO II
Sábado Santo, 10 de abril de 2004




1. "Essa noite [...] será de vigia para todos os filhos de Israel, de geração em geração, em honra do Senhor" (Ex 12,42).

Celebramos nesta noite santa a Vigília Pascal, a primeira, melhor, "a mãe" de todas as vigílias do ano litúrgico. Nela, como canta repetidamente o Precónio, volta-se a percorrer o caminho da humanidade, desde a criação até o acontecimento culminante da salvação, que é a morte e a ressurreição de Cristo.

A luz d'Aquele que "ressuscitou dos mortos como primícias dos que morreram" (1Co 15,20) torna "clara como o dia" (cf. Sal Ps 139 [138], 12) esta noite memorável, considerada justamente o "coração" do ano litúrgico. Nesta noite, a Igreja inteira vigia e torna a percorrer, meditando, as etapas significativas da intervenção salvífica de Deus no universo.

2. "Uma noite de vigia em honra do Senhor". Duplo é o significado da solene Vigília Pascal, tão rica de símbolos acompanhados por uma extraordinária abundância de textos bíblicos. Por um lado ela é memória orante das mirabilia Dei, ao relembrar as páginas capitais da Sagrada Escritura, desde a criação ao sacrifício de Isaac, à passagem do Mar Vermelho, à promessa da nova Aliança.

Por outro lado, esta sugestiva vigília é expectativa confiante no pleno cumprimento das antigas promessas. A lembrança da obra de Deus culmina na ressurreição de Cristo e se projecta no acontecimento escatológico da parusia.

1786 Vislumbramos assim, nesta noite pascoal, o amanhecer do dia que não tem mais ocaso, o dia de Cristo ressuscitado, que inaugura a vida nova, "os novos céus e a nova terra" (2P 3,13 cf. Is Is 65,17 Is 66,22 Ap 21,1).

3. Desde os seus inícios, a comunidade cristã situou a celebração do Baptismo no contexto da Vigília Pascal. Também aqui, nesta noite, alguns catecúmenos, mergulhados com Jesus na sua morte, com Ele ressuscitarão para a vida imortal. Deste modo renova-se o prodígio do misterioso renascimento espiritual, actuado pelo Espírito Santo, que incorpora os neo-baptizados no povo da nova e definitiva Aliança sancionada pela morte e ressurreição de Cristo.

A cada um de vós, caros Irmãos e Irmãs que estais para receber os sacramentos da iniciação cristã, dirijo com afecto uma particular saudação. Vós provindes da Itália, do Togo e do Japão: a vossa origem manifesta a universalidade da chamada à salvação e a gratuidade do dom da fé. Convosco, saúdo os vossos parentes, amigos e os que cuidaram da vossa preparação.

Graças ao Baptismo iniciareis a fazer parte da Igreja, que é um grande povo peregrino, sem limites de raça, língua e cultura; um povo chamado à fé a partir de Abraão e destinado a tornar-se uma bênção no meio de todas as nações da terra (cf. Gn Gn 12,1-3). Sede fiéis Àquele que vos escolheu e confiai-Lhe, com generoso empenho, toda a vossa existência.

4. Juntamente com os que dentro de pouco serão baptizados, a liturgia convida a todos nós aqui presentes a renovar as promessas do nosso Baptismo. A nós o Senhor pede para Lhe renovar a expressão da nossa plena docilidade e total dedicação ao serviço do seu Evangelho.

Caríssimos Irmãos e Irmãs! Se às vezes esta missão vos aparecer difícil, recordai as palavras do Ressuscitado: "Eu estarei sempre convosco, até ao fim do mundo" (Mt 28,20). Assim, na certeza da sua presença, não temereis qualquer dificuldade nem obstáculo. A sua Palavra vos iluminará; o seu Corpo e o seu Sangue servirão de alimento e amparo no caminho quotidiano para a eternidade.

Ao lado de cada um de vós permanecerá sempre Maria, como esteve presente entre os Apóstolos amedrontados e desconcertados na hora da prova. E, com a sua fé, Ela vos indicará, para além da noite do mundo, a aurora gloriosa da ressurreição. Amem.





DURANTE A CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA


PARA A PROCLAMAÇÃO DE SEIS BEATOS


25 de Abril de 2004







1. "Bem sabiam que era o Senhor" (Jn 21,12): o evangelista João expressa desta forma a reacção de alegria dos discípulos ao reconhecerem o Senhor ressuscitado. Jesus manifesta-se-lhes depois de uma noite de trabalho difícil e infrutuoso no lago de Tiberíades. Confiando na sua palavra, eles lançam as redes à água e trazem para as margens uma "grande quantidade de peixes" (Jn 21,6).

Como os apóstolos, também nós ficamos admirados perante a riqueza das maravilhas que Deus realiza no coração de quantos têm confiança nele. Durante esta Celebração eucarística contemplamos tudo o que Ele realizou nos seis novos Beatos: no presbítero Augusto Czartoryski; em quatro religiosas: Laura Montoya, Maria Guadalupe García Zavala, Nemésia Valle, Eusébia Palomino Yenes; e numa leiga, Alexandrina Maria da Costa. São exemplos eloquentes do modo como o Senhor transforma a existência dos crentes, quando têm confiança n'Ele.

2. "Como são amáveis as tuas moradas, ó Senhor do universo! A minha alma suspira e tem saudades dos átrios do Senhor... Um dia em teus átrios vale por mil" (Ps 84,2 Ps 84,11). O beato Augusto Czartoryski escreveu estas palavras do Salmo como lema de vida sobre a pequena imagem da primeira Missa. Nelas está contido o arrebatamento de um homem que, seguindo a voz da chamada, descobre a beleza do ministério sacerdotal. Ressoa nelas o eco das diversas opções que deve fazer quem descobre a vontade de Deus e deseja cumpri-la. Augusto Czartoryski, jovem príncipe, elaborou um método eficaz de discernimento dos desígnios divinos. Apresentava a Deus na oração todas as perguntas e perplexidades principais e, depois, em espírito de obediência seguia os conselhos dos seus guias espirituais. Compreendeu assim a sua vocação de empreender a vida pobre para servir os mais pequeninos. O mesmo método permitiu-lhe, ao longo de toda a sua vida, realizar tais opções, podendo nós hoje dizer que ele realizou os desígnios da Providência Divina de maneira heróica.

1787 Desejo deixar o exemplo da sua santidade sobretudo aos jovens, que hoje procuram a maneira para decifrar a vontade de Deus em relação à sua vida e desejam comportar-se todos os dias em fidelidade à palavra divina. Meus queridos jovens amigos, aprendei do beato Augusto a pedir ardentemente na oração a luz do Espírito Santo e guias sábias, para que possais conhecer o plano divino na vossa vida e sede capazes de caminhar sempre pelos caminhos da santidade.

3. "Ao romper do dia, Jesus apresentou-se na margem, mas os discípulos não sabiam quem era Ele" (
Jn 21,4). É possível que o homem não conheça o Senhor, apesar das numerosas manifestações ao longo da história. A Madre Laura Montoya, ao ver como viviam tantos indígenas, longe dos centros urbanos, desconhecendo Deus, dedicou-se a fundar a Congregação das Missionárias de Maria Imaculada e de Santa Catarina de Sena, para levar a luz do Evangelho aos habitantes das florestas.

Esta Beata colombiana sentiu-se mãe espiritual dos indígenas, aos quais quis mostrar o amor de Deus. Os seus tempos não foram fáceis, porque as tensões sociais ensanguentavam também naquela época a sua nobre pátria. Inspirando-nos na sua mensagem pacificadora, pedimos-lhe hoje que a amada Colômbia goze depressa da paz, da justiça e do progresso integral.

4. Escutámos no Evangelho a tríplice pergunta que Jesus fizera a Pedro: "Tu amas-Me?". Cristo faz esta mesma pergunta aos homens e mulheres de todas as épocas. Os cristãos devem responder com firmeza e prontidão aos projectos que Ele tem para cada um. Aconteceu assim na vida da Beata Maria Guadalupe García Zavala, mexicana, que ao renunciar ao matrimónio, se dedicou ao serviço dos mais pobres, dos necessitados e dos enfermos, e por isso fundou a Congregação das Servas de Santa Margarida Maria e dos Pobres.

Com fé profunda, uma esperança sem limites e um grande amor a Cristo, a Madre Lupita procurou a própria santificação partindo do amor ao Coração de Jesus e da fidelidade da Igreja. Desta forma viveu o lema que deixou às suas filhas: "Caridade até ao sacrifício e constância até à morte".

5. "Manifestar o amor de Deus aos pequeninos, aos pobres, a cada homem, em todas as partes da terra": foi este o compromisso da beata Nemésia Valle durante toda a sua existência. Ela deixa este ensinamento particularmente às suas co-irmãs, as Irmãs da Caridade de Santa Joana Antida Thouret, assim como aos fiéis da Arquidiocese de Turim. Trata-se do exemplo de uma santidade luminosa, finalizada para o alto vértice da perfeição evangélica, e que se traduz nos simples gestos da vida quotidiana dedicada totalmente a Deus.

A nova Beata continua a repetir a todos nós: "A santidade não consiste em fazer muitas coisas ou em fazer coisas grandes... Santo é quem se consome todos os dias no seu lugar de trabalho, pelo Senhor".

6. O Senhor diz a Pedro de modo decidido e incisivo: "Segue-Me". Também a Irmã Eusébia Palomino Yenes, das Filhas de Maria Auxiliadora, ouviu a chamada de Deus e respondeu com uma intensa espiritualidade e profunda humildade na sua vida quotidiana. Como boa salesiana, foi animada pelo amor à Eucaristia e à Virgem. Importante para ela era amar e servir; o resto não tinha importância, fiel ao lema salesiano do "da mihi animas, caetera tolle".

Com a radicalidade e a coerência das suas opções, a Irmã Eusébia Palomino Yenes delineia um caminho de santidade fascinante e exigente para todos nós e, de modo especial, para os jovens do nosso tempo.

7. "Tu amas-Me?" pergunta Jesus a Simão Pedro. Ele responde: "Tu sabes tudo, Senhor, bem sabes que Te amo". A vida da Beata Alexandrina Maria da Costa pode resumir-se neste diálogo de amor. Investida e abrasada por estas ânsias de amor, não quer negar nada ao seu Salvador: de vontade forte, tudo aceita para mostrar que O ama. Esposa de sangue, revive misticamente a paixão de Cristo e oferece-se como vítima pelos pecadores, recebendo a força da Eucaristia que se torna o único alimento dos seus últimos treze anos de vida.

Pela esteira da Beata Alexandrina, expressa na trilogia "sofrer, amar, reparar", os cristãos podem encontrar estímulo e motivação para nobilitar tudo o que a vida tenha de doloroso e triste com a prova maior de amor: sacrificar a vida por quem se ama.

1788 8. "Sim, Senhor, Tu sabes que eu sou deveras teu amigo" (Jn 21,15). Como Pedro, como os Apóstolos nas margens do lago de Tiberíades, também estes novos beatos fizeram sua, levando-a até às extremas consequências, esta simples mas incisiva profissão de fé e de amor. O amor a Cristo é o segredo da santidade!

Caríssimos Irmãos e Irmãs, sigamos o exemplo destes Beatos! Ofereçamos, como eles, um testemunho coerente de fé e de amor na presença viva e operante do Ressuscitado!



Homilias JOÃO PAULO II 1779