FIdei donum PT 25

3) As vocações missionárias


25 A Igreja na África, como nas outras regiões missionárias, tem necessidade de mensageiros do evangelho. De novo, pois, apelamos para vós, veneráveis irmãos; por todos os meios a vosso alcance, auxiliai aqueles que, por inspiração divina, sacerdotes, religiosos ou religiosas, são chamados a exercer as funções missionárias.


26 Pertence-vos, como acima dissemos, fortalecer os espíritos dos fiéis e suscitar tal interesse, que participem de todas as solicitudes da Igreja e, de boa vontade, prestem ouvidos ao Senhor que, outrora como em qualquer tempo, ordena: "Sai de tua terra e de teu povo, e da casa de teus pais e vem para a terra que eu te mostrarei" (Gn 12,1). Se nos lares, nas escolas, nas paróquias, nas reuniões da Ação católica ou de qualquer associação religiosa, aprenderem os homens a se interessar por essas preocupações verdadeiramente católicas, sem sombra de dúvida surgirão ministros em socorro da Igreja, que deles necessita para difundir a palavra divina entre os povos. E é de se notar que o ardor pelas missões, despertado em vossas dioceses, será penhor de novo entusiasmo pela vida cristã, nelas aceso. Uma comunidade de fiéis que dá a Igreja os filhos e as filhas, de modo algum poderá desaparecer. Se a vida sobrenatural é vida de caridade e aumenta com o devotamento, pode-se afirmar que a vida católica de uma nação se mede pela parte espontaneamente tomada nas obras missionárias.


27 Mas não é bastante cuidar de que as atenções se voltem para essa questão; exige-se mais ainda. Existem muitas dioceses onde, pela graça de Deus, há tantos ministros sagrados que nenhum prejuízo sofreriam, caso quisessem fazer o sacrifício de alguns sacerdotes. A essas, muito particularmente e com paterna solicitude, lembramos a sentença do evangelho: vosso supérfluo, dai-o aos pobres (cf. Lc Lc 11,41). A nosso pensamento ocorrem os bispos nossos irmãos que, aflitos, vêem rarear espantosamente os candidatos ao sacerdócio ou à vida religiosa, sem poderem assim prover às necessidades espirituais de suas ovelhas. Participamos de suas ansiedades e a eles também dizemos como s. Paulo aos Coríntios: "Não haja penúria para vós e alívio para os outros, mas igualdade" (2Co 8,13). Todavia, não fechem ouvidos essas dioceses pobres à voz suplicante que pede auxílio para as longínquas expedições sagradas. O óbolo da viúva nos foi dado como exemplo pelo Senhor; se alguma diocese pobre ajudar a outra, não se tornará mais pobre por isso; seria impossível. Deus não se deixa vencer em generosidade.


28 Para a solução mais eficaz das múltiplas questões ao recrutamento e escolha dos missionários, não bastam de forma alguma esforços isolados. Delas tratai, veneráveis irmãos, em reuniões, para resolvê-las servi-vos das instituições, se as houver, que em vosso país se devotam às missões. Desse modo, com maior facilidade podereis aplicar os meios mais eficazes para despertar entre os jovens vocações missionárias, e mais leve se tornará vossa responsabilidade pelo progresso seguro do bem comum da Igreja. Favorecei em vossas dioceses a União missionária do clero, tão recomendada por nossos predecessores e por nós mesmos. Já a elevamos à dignidade de Obra pontifícia, de forma que a ninguém é lícito duvidar da grande estima que lhe dedicamos, nem da esperança de frutos provindos de seus progressos. Unam-se, pois, estreitamente, os esforços provocados pelos pastores da Igreja e pelos encarregados das santas missões, visto que o bom êxito depende sobretudo da concórdia. Apraz-nos lembrar aqui os presidentes nacionais das Pontifícias Obras Missionárias, cujos esforços encorajareis, sustentando com vosso zelo e autoridade seus conselhos diocesanos. Fazemos igualmente menção dos superiores das beneméritas Instituições, para as quais a Santa Sé não cessa de apelar em prol das prementes necessidades das missões, e que não podem aumentar o número dos missionários sem o benévolo apoio dos ordinários. Procurai, de comum acordo, conciliar os interesses verdadeiros, atentamente pesados. Se, no momento, parecerem esses divergir, por que não considerá-los novamente, com o vigor de uma fé viva e a causa sobrenatural da unidade e catolicidade da Igreja posta diante dos olhos?


29 Com o mesmo espírito de caridade fraterna, esquecida dos interesses próprios, velai por que os jovens africanos ou asiáticos que, por motivo de estudos, residem temporariamente em vossas dioceses, recebam assistência religiosa. Afastados das relações sociais de sua pátria, freqüentemente por várias causas não tem bastante contato com os centros católicos do povo que os hospeda. Com isso, sua vida cristã pode correr perigo, porque, não percebendo ainda o valor da verdadeira cultura a que aspiram, as seduções do "materialismo" os arrastam e as associações atéias tentam captar-lhes a confiança. Quanto isso importa, agora ou futuramente, vós bem o sabeis. Por conseguinte, atentos às preocupações dos bispos missionários, não hesiteis em designar para esse apostolado alguns sacerdotes, capazes e piedosos. Outra forma de auxílio, bem mais pesada, é dada por alguns bispos; embora lhes custe, consentem em que um ou outro sacerdote saia da diocese para ir, por algum tempo, pôr-se a disposição dos ordinários da África. É grande esse auxílio, pois para lá podem levar, sábia e discretamente, novas formas mais adaptadas de ministério sacerdotal, ou substituir o clero diocesano, onde este não for suficiente, no ensino sagrado ou profano. Exortamo-vos de bom grado a essas oportunas e frutuosas iniciativas. Se prudentemente preparadas e realizadas, trarão inapreciáveis vantagens à Igreja católica na África, portadora de tantas dificuldades e esperanças.


30 O socorro prestado às dioceses missionárias assume hoje nova forma, que muito nos agrada e é bem digna de vos ser proposta, antes de terminarmos esta carta. Muito eficaz é o auxílio dos leigos militantes, quase todos pertencentes às associações católicas nacionais ou internacionais, em favor das recém-fundadas comunidades cristãs. Essa cooperação pede interesse pelo bem de outrem, moderação e prudência; mas pode, e muito, ser de proveito para as dioceses sobrecarregadas de novos trabalhos apostólicos. Tais leigos, militando sob o estandarte de Cristo, sinceramente obedientes ao bispo, a quem pertence o apostolado como tal, em pleno acordo com os católicos africanos, gratos por esse auxílio fraterno, põem à disposição das dioceses recém-fundadas uma experiência antiga, seja na Ação católica e na ação social, seja em qualquer outro gênero particular de apostolado. Além disso - o que não é menos de vantagem - realizam mais depressa e com maior facilidade a união das instituições católicas de seu país com as congêneres, inúmeras, pertencentes a todas as outras nações. A todos esses, realizadores de tão importante trabalho em prol da Igreja, nossos sinceros agradecimentos.



IV.


CONCLUSÃO



31 Levantando nossa voz, por séria exortação em favor das missões da África, nosso coração, como bem o compreendeis, veneráveis irmãos, não se esquece dos filhos que, noutros continentes, se dedicam à expansão da Igreja. Amamos a todos, e muito especialmente os que no Extremo Oriente sofrem tão atrozmente. Se a peculiar condição da África foi-nos ocasião de escrever esta carta encíclica, não queremos terminá-la sem lançar um olhar sobre todas as missões da Igreja católica.


32 Para vós, veneráveis irmãos, que recebestes o múnus pastoral de regiões, onde a semente do evangelho há pouco foi lançada, e que com grande trabalho fundais e consolidais novas comunidades cristãs, queremos seja esta carta, não apenas penhor de nossa solicitude paterna, porém mais ainda um testemunho pelo qual a sociedade universal fundada por Jesus Cristo, duramente despertada pela amplidão e dificuldade de vossas responsabilidades, reconheça ser seu dever auxiliar-vos o mais possível por orações, assistência material e ministério de seus melhores filhos. Que importância tem a grande distância material que vos separa do centro da cristandade? Não são os mais próximos do coração da Igreja aqueles filhos superiores em virtude e que sustentam coisas mais duras? Também a vós, missionários, sacerdotes do clero indígena, religiosos e religiosas, seminaristas, catequistas, leigos militantes sob os estandartes do evangelho, a todos vós, semeadores da religião de Jesus Cristo, espalhados por todo o mundo e ignorados, nosso testemunho de gratidão confiante. Continuai firmes na obra começada, orgulhosos de servir a Igreja, obedecer-lhe a voz e deixar-se levar sempre mais pelo seu espírito, unidos pelos laços da caridade fraterna. Grande conforto e penhor de vitória infalível será para vós, diletos filhos, pensar que a obscura e pacífica luta, empenhada em favor da Igreja, não é apenas a vossa luta ou a de vossa época ou país, mas o perene combate da Igreja, combate que todos os seus filhos têm o dever de travar com suma coragem, pois a Deus e aos irmãos devem o dom da fé recebido no santo batismo.


33 "Se prego o evangelho, não é para minha glória, pois me é imposta esta obrigação; e ai de mim, se não pregar o Evangelho" (1Co 9,16). Tomamos para nós essas fortes palavras, para nós, vigário de Jesus Cristo, constituído pelo múnus apostólico "pregador e apóstolo... doutor dos povos na fé e na verdade" (1Tm 2,7). Invocando, pois, sobre as missões católicas o duplo patrocínio de s. Francisco Xavier e de s. Teresa do Menino Jesus, a proteção de todos os santos Mártires e a poderosa e materna guarda da Virgem Maria, Mãe de Deus e Rainha dos apóstolos, repetimos de bom grado à Igreja as vitoriosas palavras de seu divino Fundador: "Faze-te ao largo" (Duc in altum) (Lc 5,4).


34 Confiante em que nossos pedidos serão atendidos com vontade enérgica por todos os católicos, a fim de que, pelo impulso da graça divina, possam as santas missões levar até os confins da terra o esplendor da verdade e das virtudes cristãs, juntamente com o progresso da civilização, concedemos de todo o coração, como testemunho de nossa paternal benevolência e penhor dos dons celestes, a cada um de vós, veneráveis irmãos, a vossos rebanhos e a um por um dos arautos do evangelho, tão amados, a bênção apostólica.

Dado em Roma, junto de São Pedro, no dia 21 de abril, na solenidade da Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo do ano de 1957, XIX do nosso pontificado.



PIO PP. XII









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