Catecismo
da Igreja Católica
PRÓLOGO
"PAI,...
a vida eterna é esta: que eles te conheçam a ti, o Deus único verdadeiro, e
aquele que enviaste, Jesus Cristo" (Jo 17,3). "Deus, nosso
Salvador... quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da
verdade" (1 Tm 2,3-4). "Não há, debaixo do céu, outro nome dado aos
homens pelo qual devamos ser salvos" (At 4,12), afora o nome de JESUS.
I - A vida do homem
conhecer e amar a Deus
- Deus, infinitamente Perfeito e
Bem-aventurado em si mesmo, em um desígnio de pura bondade, criou
livremente o homem para fazê-lo participar de sua vida bem-aventurada. Eis
por que, desde sempre e em todo lugar, está perto do homem. Chama-o e
ajuda-o a procurá-lo, a conhecê-lo e a amá-lo com todas as suas forças.
Convoca todos os homens, dispersos pelo pecado, para a unidade de sua
família, a Igreja. Faz isto por meio do Filho, que enviou como Redentor e
Salvador quando os tempos se cumpriram. Nele e por Ele, chama os homens a
se tornarem, no Espírito Santo, seus filhos adotivos, e portanto os
herdeiros de sua vida bem-aventurada.
- A fim de que este chamado ressoe pela
terra inteira, Cristo enviou os apóstolos que escolhera, dando-lhes o
mandato de anunciar o Evangelho: "Ide, fazei que todas as nações se
tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito
Santo e ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. E eis que eu
estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos" (Mt
28,19-20). Fortalecidos com esta missão, os apóstolos "saíram a
pregar por toda parte, agindo com eles o Senhor, e confirmando a Palavra
por meio dos sinais que a acompanhavam" (Mc 16,20).
- Os que com a ajuda de Deus acolheram o
chamado de Cristo e lhe responderam livremente foram por sua vez
impulsionados pelo amor de Cristo a anunciar por todas as partes do mundo
a Boa Notícia. Este tesouro recebido dos apóstolos foi guardado fielmente
por seus sucessores. Todos os fiéis de Cristo são chamados a transmiti-lo
de geração em geração, anunciando a fé, vivendo-a na partilha fraterna e
celebrando-a na liturgia e na oração.
II. Transmitir a fé - a catequese
- Bem cedo passou-se a chamar de catequese o
conjunto de esforços empreendidos na Igreja para fazer discípulos, para
ajudar os homens a crerem que Jesus é o Filho de Deus, a fim de que, por
meio da fé, tenham a vida em nome dele, para educá-los e instruí-los nesta
vida, e assim construir o Corpo de Cristo.
- "A catequese é uma educação da fé das
crianças, dos jovens e dos adultos, a qual compreende especialmente um
ensino da doutrina cristã, dado em geral de maneira orgânica e
sistemática, com o fim de os iniciar na plenitude da vida cristã."
- Sem confundir-se com eles, a catequese se
articula em torno de determinado número de elementos da missão pastoral da
Igreja que têm um aspecto catequético e que preparam a catequese ou dela
derivam: primeiro anúncio do Evangelho ou pregação missionária para
suscitar a fé; busca das razões de crer; experiência de vida cristã;
celebração dos sacramentos; integração na comunidade eclesial; testemunho
apostólico e missionário.
- "A catequese anda intimamente ligada
com toda a vida da Igreja. Não é somente a extensão geográfica e o aumento
numérico, mas também e mais ainda o crescimento interior da Igreja, sua
correspondência ao desígnio de Deus que dependem da catequese mesma."
- Os períodos de renovação da Igreja são
também tempos fortes da catequese. Eis por que, na grande época dos Padres
da Igreja, vemos Santos Bispos dedicarem uma parte importante de seu
ministério à catequese. É a época de São Cirilo de Jerusalém e de São João
Crisóstomo, de Santo Ambrósio e de Santo Agostinho, e de muitos outros
Padres cujas obras catequéticas permanecem como modelos.
- O ministério da catequese haure energias
sempre novas nos Concílios. O Concílio de Trento constitui neste ponto um
exemplo a ser sublinhado: deu à catequese prioridade em suas constituições
e em seus decretos; está ele na origem do Catecismo Romano, que também
leva seu nome e constitui uma obra de primeira grandeza como resumo da
doutrina cristã. Este concílio suscitou na Igreja uma organização notável
da catequese. Graças a santos bispos e teólogos, tais como São Pedro
Canísio, São Carlos Borromeu, São Toríbio de Mogrovejo, São Roberto
Belarmino, levou à publicação de numerosos catecismos.
- Diante disto, não estranha que, no
dinamismo que seguiu o Concílio Vaticano II (que o papa Paulo VI
considerava como grande catecismo dos tempos modernos), a catequese da
Igreja tenha novamente despertado a atenção. Dão testemunho deste fato o Diretório
geral da Catequese, de 1971, as sessões do Sínodo dos Bispos dedicadas
à evangelização (1974) e à catequese (1977), as exortações apostólicas
correspondentes, Evangelii nuntiandi (1975) e Catechesi
tradendae (1979). A sessão extraordinária do Sínodo dos Bispos de 1985
pediu: "Seja redigido um catecismo ou compêndio de toda a doutrina
católica seja sobre a fé seja sobre a moral". O Santo Padre João
Paulo II endossou este desideratum expresso pelo Sínodo dos Bispos,
reconhecendo que "este desejo responde plenamente a uma verdadeira
necessidade da Igreja universal e das Igrejas particulares". Ele
envidou todos os esforços em prol da realização deste desideratum dos
Padres do Sínodo.
III. O objetivo e os destinatários deste Catecismo
- O presente Catecismo tem por objetivo apresentar
uma exposição orgânica e sintética dos conteúdos essenciais e fundamentais
da doutrina católica tanto sobre a fé como sobre a moral, à luz do
Concílio Vaticano II e do conjunto da Tradição da Igreja. Suas fontes
principais são a Sagrada Escritura, os Santos Padres, a Liturgia e o
Magistério da Igreja. Destina-se ele a servir "como um ponto de
referência para os catecismos ou compêndios que são elaborados nos
diversos países".
- O presente Catecismo é destinado
principalmente aos responsáveis pela catequese: em primeiro lugar aos
Bispos, como doutores da fé e pastores da Igreja. É oferecido a eles como
instrumento no cumprimento de seu ofício de ensinar o Povo de Deus. Por
meio dos Bispos, ele se destina aos redatores de catecismos, aos
presbíteros e aos catequistas. Será também útil para a leitura de todos os
demais fiéis cristãos.
IV. A estrutura deste Catecismo
- O projeto deste Catecismo inspira-se na
grande tradição dos catecismos que articulam a catequese em tomo de quatro
"pilares": a profissão da fé batismal (o Símbolo), os
sacramentos da fé, a vida de fé (os Mandamentos), a oração do crente (o
"Pai-Nosso").
Parte 1: A profissão da fé
- Os que pela fé e pelo Batismo pertencem a
Cristo devem confessar sua fé batismal diante dos homens. Por isso, o Catecismo
começa por expor em que consiste a Revelação, pela qual Deus se dirige e
se doa ao homem, bem como a fé, pela qual o homem responde a Deus (Seção
1). O Símbolo da fé resume os dons que Deus outorga ao homem como Autor de
todo bem, como Redentor, como Santificador, e os articula em tomo dos
"três capítulos" de nosso Batismo a fé em um só Deus: o Pai
Todo-Poderoso, o Criador, Jesus Cristo, seu Filho, nosso Senhor e
Salvador, e o Espírito Santo, na Santa Igreja (Seção II).
Parte II: Os
sacramentos de fé
- A segunda parte do Catecismo expõe como a
salvação de Deus, realizada uma vez por todas por Cristo Jesus e pelo
Espírito Santo, se toma presente nas ações sagradas da liturgia da Igreja
(Seção 1), particularmente nos sete sacramentos (Seção II).
Parte III: A vida
da fé
- A terceira parte do Catecismo
apresenta o fim último do homem, criado à imagem de Deus: a
bem-aventurança e os caminhos para chegar a ela: mediante um agir reto e
livre, com a ajuda da fé e da graça de Deus (Seção I), por meio de um agir
que realiza o duplo mandamento da caridade, desdobrado nos dez Mandamentos
de Deus (Seção II).
Parte IV: A oração na vida da fé
- A última parte do Catecismo trata do
sentido e da importância da oração na vida dos crentes (Seção 1). Ela
termina com um breve comentário sobre os setes pedidos da oração (Seção
II), Com efeito, nesses sete pedidos encontramos o conjunto dos bens que
devemos esperar e que nosso Pai celeste quer conceder-nos.
V. Indicações
práticas para o uso deste Catecismo
- Este Catecismo foi pensado como uma
exposição orgânica de toda a fé católica. Por isso é preciso lê-lo como
uma unidade. Numerosas referências dentro do próprio texto, bem como o
índice analítico no fim do volume permitem ver a ligação de cada tema com
o conjunto da fé.
- Muitas vezes os textos da Sagrada
Escritura não são citados literalmente, mas são feitas apenas referências
(mediante a indicação "cf."). Para uma compreensão mais
aprofundada de tais passagens, é preciso consultar os próprios textos.
Essas referências bíblicas constituem um instrumento de trabalho para a
catequese.
- Quando em certas passagens se usa corpo menor, graficamente isto indica que se
trata de observações de tipo histórico, apologético, ou de exposições
doutrinais complementares.
- As citações, em corpo menor, de fontes
patrísticas, litúrgicas, magisteriais ou hagiográficas são destinadas a
enriquecer a exposição doutrinal. Com freqüência esses textos foram
escolhidos para uso diretamente catequético.
- No final de cada unidade temática, uma
série de textos sucintos resumem em fórmulas condensadas o essencial do
ensinam do ensinamento. Esses "resumindo" têm por objetivo
oferecer sugestões a catequese local para fórmulas sintéticas e
memorizáveis.
VI. As adaptações necessárias
- Neste Catecismo a ênfase é posta na
exposição doutrinal. Quer ele ajudar a aprofundar o conhecimento da fé.
Por isso mesmo está orientado para o amadurecimento desta fé, para seu
enraizamento na vida e sua irradiação no testemunho.
- Por sua própria finalidade, este Catecismo
não se propõe realizar as adaptações da exposição e dos métodos
catequéticos exigidas pelas diferenças de culturas, de idades, de
maturidade espiritual, de situações sociais e eclesiais daqueles a quem a
catequese é dirigida. Tais adaptações indispensáveis cabem aos catecismos
apropriados e mais ainda aos que ministram instrução aos fiéis:
Aquele que ensina deve "fazer-se tudo para
todos" (1 Cor 9,22), a fim de conquistar todos para Jesus Cristo...
Particularmente, não imagine ele que lhe é confiado um único tipo de almas, e
que consequentemente lhe é permitido ensinar e formar de modo igual todos os
fiéis à verdadeira piedade, com um só e mesmo método, sempre igual! Saiba ele
bem que uns são em Jesus Cristo como que criancinhas recém-nascidas, outros,
como que adolescentes, e finalmente alguns estão como que na posse de todas as
suas forças... Os que são chamados ao ministério da pregação devem, na
transmissão dos mistérios da fé e das regras dos costumes, adaptar suas
palavras ao espírito e à inteligência de seus ouvintes.
ACIMA DE TUDO A CARIDADE
- Para concluir este Prólogo, é oportuno
lembrar este princípio pastoral enunciado pelo Catecismo Romano:
Toda a finalidade da doutrina e do ensinamento deve
ser posta no amor que não acaba. Com efeito, pode-se facilmente expor o que é
preciso crer, esperar ou fazer; mas sobretudo é preciso fazer sempre com que
apareça o Amor de Nosso Senhor, para que cada um compreenda que cada ato de
virtude perfeitamente cristão não tem outra origem senão o Amor, e outro fim
senão o Amor.
PRIMEIRA PARTE - A
PROFISSÃO DE FÉ
PRIMEIRA SEÇÃO
"EU
CREIO" - "NÓS CREMOS"
- Quando professamos nossa fé, começamos
dizendo: "Eu creio" ou "Nós cremos". Por isso, antes
de expor a fé da Igreja tal como é confessada no Credo, celebrada na
Liturgia, vivida na prática dos Mandamentos e na oração, perguntamo-nos o
que significa "crer". A fé é a resposta do homem a Deus que se
revela e a ele se doa, trazendo ao mesmo tempo uma luz superabundante ao
homem em busca do sentido último de sua vida. Por isso vamos considerar
primeiro esta busca do homem (capitulo 1), em seguida a Revelação divina,
pela qual Deus se apresenta ao homem (capítulo II), e finalmente a
resposta da fé (capítulo III).
CAPÍTULO I
O HOMEM É "CAPAZ"
DE DEUS
I - O desejo de Deus
- O desejo de Deus está inscrito no coração
do homem, já que o homem é criado por Deus e para Deus; e Deus não cessa
de atrair o homem a si, e somente em Deus o homem há de encontrar a
verdade e a felicidade que não cessa de procurar:
(Parágrafos relacionados
355,1701,1718)
O aspecto mais sublime da dignidade humana está nesta
vocação do homem à comunhão com Deus. Este convite que Deus dirige ao homem, de
dialogar com ele, começa com a existência humana. Pois se o homem existe, é
porque Deus o criou por amor e, por amor, não cessa de dar-lhe o ser, e o homem
só vive plenamente, segundo a verdade, se reconhecer livremente este amor e se
entregar ao seu Criador.
- Em sua história, e até os dias de hoje, os
homens têm expressado de múltiplas maneiras sua busca de Deus por meio de suas
crenças e de seus comportamentos religiosos (orações, sacrifícios, cultos,
meditações etc.). Apesar das ambigüidades que podem comportar, estas
formas de expressão são tão universais que o homem pode ser chamado de um
ser religioso:
(Parágrafos relacionados
843,2566,2095,2109)
De um só (homem), Deus fez toda a raça humana para
habitar sobre toda a face da terra, fixando os tempos anteriormente
determinados e os limites de seu hábitat. Tudo isto para que procurassem a
divindade e, mesmo se às apalpadelas, se esforçassem por encontrá-la, embora
Ele não esteja longe de cada um de nós. Pois
nele vivemos, nos movemos e existimos (At 17,23-28).
- Mas esta "união íntima e vital com
Deus" pode ser esquecida, ignorada e até rejeitada explicitamente
pelo homem. Tais atitudes podem ter origens muito diversas: a revolta
contra o mal no mundo, a ignorância ou a indiferença religiosas, as
preocupações com as coisas do mundo e com as riquezas, o mau exemplo dos
crentes, as correntes de pensamento hostis à religião, e finalmente essa
atitude do homem pecador que, por medo, se esconde diante de Deus e foge
diante de seu chamado.
(Parágrafos
relacionados 2123, 2128, 398)
- "Alegre-se o coração dos que buscam o
Senhor!" (Sl 105,3). Se o homem pode esquecer ou rejeitar a Deus,
este, de sua parte, não cessa de chamar todo homem a procurá-lo, para que
viva e encontre a felicidade. Mas esta busca exige do homem todo o esforço
de sua inteligência, a retidão de sua vontade, "um coração
reto", e também o testemunho dos outros, que o ensinam a procurar a
Deus.
(Parágrafos relacionados 845,
2567, 368)
Vós sois grande, Senhor, e altamente digno de louvor:
grande é o vosso poder, e a vossa sabedoria não tem medida. E o homem, pequena
parcela de vossa criação, pretende louvar-vos, precisamente o homem que,
revestido de sua condição mortal, traz em si o testemunho de seu pecado e de
que resistis aos soberbos. A despeito de tudo, o homem, pequena parcela de
vossa criação, quer louvar-vos. Vós mesmo o incitais a isto, fazendo com que
ele encontre suas delícias no vosso louvor, porque nos fizestes para vós e o
nosso coração não descansa enquanto não repousar em vós.
II. As vias de acesso ao conhecimento de Deus
- Criado à imagem de Deus, chamado a
conhecer e a amar a Deus, o homem que procura a Deus descobre certas
"vias" para aceder ao conhecimento de Deus. Chamamo-las também
de "provas da existência de Deus", não no sentido das provas que
as ciências naturais buscam, mas no sentido de "argumentos
convergentes e convincentes" que permitem chegar a verdadeiras
certezas.
Estas
"vias" para chegar a Deus têm como ponto de partida a criação: o
mundo material e a pessoa humana.
- O mundo: a partir do movimento e do devir, da
contingência, da ordem e da beleza do mundo, pode-se conhecer a Deus como
origem e fim do universo.
(Parágrafos relacionados: 54,
337)
São Paulo afirma a respeito dos pagãos: "O que se
pode conhecer de Deus é manifesto entre eles, pois Deus lho revelou. Sua
realidade invisível - seu eterno poder e sua divindade - tornou-se inteligível
desde a criação do mundo através das criaturas" (Rm 1,19-20).
E Santo Agostinho: "Interroga a beleza da terra,
interroga a beleza do mar, interroga a beleza do ar que se dilata e se difunde,
interroga a beleza do céu... interroga todas estas realidades. Todas elas te
respondem: olha-nos, somos belas. Sua beleza é um hino de louvor (confessio).
Essas belezas sujeitas à mudança, quem as fez senão o Belo (Pulcher, pronuncie
"púlquer"), não sujeito à mudança?"
- O homem: Com sua abertura à verdade e à beleza, com
seu senso do bem moral, com sua liberdade e a voz de sua consciência, com
sua aspiração ao infinito e à felicidade, o homem se interroga sobre a
existência de Deus. Mediante tudo isso percebe sinais de sua alma
espiritual. Como "semente de eternidade que leva dentro de si,
irredutível à só matéria" sua alma não pode ter origem senão em Deus.
(Parágrafos
relacionados: 2500, 1730, 1776,1703,366)
- O mundo e o homem atestam que não têm em
si mesmo nem seu princípio primeiro nem seu fim último, mas que participam
do Ser em si, que é sem origem e sem fim. Assim por estas diversas
"vias", o homem pode aceder ao conhecimento da existência de uma
realidade que é a causa primeira e o fim último de tudo, "e que todos
chamam Deus"
(Parágrafo
relacionado: 199)
- As faculdades do homem o tomam capaz de
conhecer a existência de um Deus pessoal. Mas, para que o homem possa
entrar em sua intimidade, Deus quis revelar-se ao homem e dar-lhe a graça
de poder acolher esta revelação na fé. Contudo, as provas da existência de
Deus podem dispor à fé e ajudar a ver que a fé não se opõe à razão humana.
(Parágrafos relacionados: 50,159)
III. O conhecimento de Deus segundo a Igreja
- "A santa Igreja, nossa mãe, sustenta
e ensina que Deus, princípio e fim de todas as coisas, pode ser conhecido
com certeza pela luz natural da razão humana a partir das coisas
criadas". Sem esta capacidade, o homem não poderia acolher a
revelação de Deus. O homem tem esta capacidade por ser criado "à
imagem de Deus".
(Parágrafo
relacionado: 355)
- Todavia, nas condições históricas em que
se encontra, o homem enfrenta muitas dificuldades para conhecer a Deus
apenas com a luz de sua razão:
(Parágrafo relacionado: 1960)
"Pois, embora a razão humana,
absolutamente falando, possa chegar com suas forças e lume naturais ao
conhecimento verdadeiro e certo de um Deus pessoal, que governa e protege o
mundo com sua Providência, bem como chegar ao conhecimento da lei natural
impressa pelo Criador em nossas almas, de fato, muitos são os obstáculos que
impedem a mesma razão de usar eficazmente e com resultado desta sua capacidade
natural.
As verdades que se referem a Deus e às relações entre
os homens e Deus são verdades que transcendem completamente a ordem das coisas
sensíveis e quando estas verdades atingem a vida prática e a regem, requerem
sacrifício e abnegação. A inteligência humana, na aquisição destas verdades,
encontra dificuldades tanto por parte dos sentidos e da imaginação como por
parte das más inclinações, provenientes do pecado original. Donde vemos que os
homens em tais questões, facilmente procuram persuadir-se de que seja falso ou
ao menos duvidoso aquilo que não desejam que seja verdadeiro"
- Por isso, O homem tem necessidade de ser iluminado
pela revelação de Deus, não somente sobre o que ultrapassa seu
entendimento, mas também sobre "as verdades religiosas e morais que,
de per si, não são inacessíveis à razão, a fim de que estas no estado
atual do gênero humano possam ser conhecidas por todos sem dificuldade,
com uma certeza firme e sem mistura de erro"
(Parágrafo relacionado: 2036)
IV. Como falar de Deus?
- Ao defender a capacidade da razão humana
de conhecer a Deus, a Igreja exprime sua confiança na possibilidade de
falar de Deus a todos os homens e com todos os homens. Esta convicção esta
na base de seu diálogo com as outras religiões, com a filosofia e com as
ciências, como também com Os não-crentes e os ateus.
(Parágrafo
relacionado: 851)
- Uma vez que nosso conhecimento de Deus é
limitado, também limitada é nossa linguagem sobre Deus. Só podemos falar
de Deus a partir das criaturas e segundo nosso modo humano limitado de
conhecer e de pensar.
- As criaturas, todas elas, trazem em si
certa semelhança com Deus, muito particularmente o homem criado à imagem e a semelhança de
Deus. Por isso as
múltiplas perfeições das criaturas (sua verdade, bondade e beleza)
refletem a perfeição infinita de Deus. Em razão disso podemos falar de
Deus a partir das perfeições de suas criaturas, "pois a grandeza e a
beleza das criaturas fazem, por analogia, contemplar seu Autor" (Sb
13,5).
(Parágrafos
relacionados: 213, 299)
- Deus transcende a toda criatura. Por isso, é preciso
incessantemente purificar nossa linguagem daquilo que possui de limitado,
de proveniente de pura imaginação, de imperfeito, para não confundirmos o Deus
"inefável, incompreensível, invisível, inatingível" com as
nossas representações humanas. Nossas palavras humanas permanecem sempre
aquém do Mistério de Deus.
(Parágrafos
relacionados: 212, 300, 370)
- Assim falando de Deus, nossa linguagem se
exprime, sem dúvida, de maneira humana, mas ela atinge realmente O próprio Deus, ainda que sem
poder exprimi-lo em sua infinita simplicidade. Com efeito, é preciso
lembrar que "entre o Criador e a criatura não se pode notar uma
semelhança, sem que se deva notar entre eles uma ainda maior
dessemelhança", e que "não podemos apreender de Deus o que ele
é, mas apenas O que ele
não é e de que maneira os outros seres se situam em relação a ele"
(Parágrafo
relacionado: 206)
RESUMINDO
- O homem é, por natureza e por vocação, um
ser religioso. Porque provém de Deus e para Ele caminha, o homem só vive
uma vida plenamente humana se viver livremente sua relação com Deus.
- O homem é feito para viver em comunhão com
Deus, no qual encontra sua felicidade: "Quando eu estiver inteiramente
em Vós, nunca mais haverá dor e provação; repleta de Vós por inteiro,
minha vida será verdadeira"
- Quando escuta a mensagem das criaturas e a
voz de sua consciência, o homem pode atingir a certeza da existência de
Deus, causa e fim de tudo.
- A Igreja ensina que o Deus único e
verdadeiro, nosso Criador e Senhor, pode ser conhecido com certeza por
meio de suas obras graças à luz natural da razão humana.
- Podemos realmente falar de Deus partindo
das múltiplas perfeições das criaturas, semelhanças do Deus infinitamente
perfeito, ainda que nossa linguagem limitada não esgote seu mistério.
- "Sem o Criador, a criatura se
esvai". Eis por que os crentes sabem que são impelidos pelo amor de
Cristo a levar a luz do Deus vivo àqueles que o desconhecem ou o recusam.
CAPÍTULO II
DEUS VEM AO
ENCONTRO DO HOMEM
- Mediante a razão natural, o homem pode
conhecer a Deus com certeza a partir de suas obras. as existe outra ordem
de conhecimento que O homem de modo algum pode atingir por suas próprias forças, a da
Revelação divina. Por uma decisão totalmente livre, Deus se revela e se
doa ao homem. Fá-lo revelando seu mistério, seu projeto benevolente, que
concebeu desde toda a eternidade em Cristo em prol de todos os homens.
Revela plenamente seu projeto enviando seu Filho bem-amado, nosso Senhor
Jesus Cristo, e o Espírito Santo
(Parágrafos relacionados: 36, 1066)
ARTIGO 1 - A
REVELAÇÃO DE DEUS
I. Deus revela seu "projeto
benevolente"
- "Aprouve a Deus, em sua bondade e
sabedoria, revelar-se a si mesmo e tomar conhecido o mistério de sua
vontade, pelo qual os homens, por intermédio de Cristo, Verbo feito carne,
no Espírito Santo, têm acesso ao Pai e se tomam participantes da natureza
divina".
(Parágrafos
relacionados: 2823, 1996)
- Deus, que "habita uma luz
inacessível" (1 Tm 6,16), quer comunicar sua própria vida divina aos
homens, criados livremente por ele, para fazer deles, no seu Filho único,
filhos adotivos. Ao revelar-se, Deus quer tornar os homens capazes de
responder-lhe, de conhecê-lo e de amá-lo bem além do que seriam capazes
por si mesmos.
- O projeto divino da Revelação realiza-se
ao mesmo tempo "por ações e por palavras, intimamente ligadas entre
si e que se iluminam mutuamente". Este projeto comporta uma
"pedagogia divina" peculiar: Deus comunica-se gradualmente com o
homem, prepara-o por etapas a acolher a Revelação sobrenatural que faz de
si mesmo e que vai culminar na Pessoa e na missão do Verbo encarnado,
Jesus Cristo.
(Parágrafos relacionados: 1953, 1950)
São Irineu de Lião fala repetidas vezes desta pedagogia
divina sob a imagem da familiaridade mútua entre Deus e o homem: "O Verbo
de Deus habitou no homem e fez-se Filho do homem para acostumar o homem a
apreender a Deus e acostumar Deus a habitar no homem, segundo o beneplácito do
Pai "
II. As etapas da Revelação
DESDE A ORIGEM, DEUS SE DÁ A CONHECER
- "Criando pelo Verbo o universo e
conservando-o, Deus proporciona aos homens, nas coisas criadas, um
permanente testemunho de si e, além disso, no intuito de abrir o caminho
de uma salvação superior, manifestou-se a si mesmo, desde os primórdios, a
nossos primeiros pais." Convidou-os a uma comunhão íntima consigo
mesmo, revestindo-os de uma graça e de uma justiça resplandecentes.
(Parágrafos
relacionados: 32,374)
- Esta Revelação não foi interrompida pelo
pecado de nossos primeiros pais. Deus, com efeito, "após a queda
destes, com a prometida redenção, alentou-os a esperar uma salvação e
velou permanentemente pelo gênero humano, a fim de dar a vida eterna a
todos aqueles que, pela perseverança na prática do bem, procuram a
salvação"
(Parágrafos relacionados: 397,410)
E
quando pela desobediência perderam vossa amizade, não os abandonastes ao poder
da morte. (...) Oferecestes muitas vezes aliança aos homens e às mulheres.
A ALIANÇA COM NOÉ
- Desfeita a unidade do gênero humano pelo
pecado, Deus procura antes de tudo salvar a humanidade passando por cada
uma de suas partes. A Aliança com Noé depois do dilúvio exprime o
princípio da Economia divina para com as "nações", isto é, para
com os homens agrupados "segundo seus países, cada um segundo sua
língua, e segundo seus clãs" (Gn 10.5)
(Parágrafos
relacionados: 401,1219)
- Esta ordem ao mesmo tempo cósmica, social
e religiosa da pluralidade das nações destina-se a limitar o orgulho de
uma humanidade decaída que unânime em sua perversidade, gostaria de
construir por si mesma sua unidade à maneira de Babel. Contudo, devido ao
pecado, o politeísmo, assim como a idolatria da nação e de seu chefe,
constitui uma contínua ameaça de perversão pagã para essa Economia
provisória.
- A Aliança com Noé permanece em vigor
durante todo o tempo das nações, até a proclamação universal do Evangelho.
A Bíblia venera algumas grandes figuras das "nações", tais como
"Abel, o justo", o rei-sacerdote Melquisedeque, figura de Cristo,
ou os justos "Noé, Daniel e Jó". Assim, a Escritura exprime que
grau elevado de santidade podem atingir os que vivem segundo a Aliança de
Noé, na expectativa de que Cristo "congregue na unidade todos os
filhos de Deus dispersos" (Jo 11,52).
(Parágrafos
relacionados: 674,2569)
DEUS ELEGE ABRAÃO
- Para congregar a humanidade dispersa, Deus
elegeu Abrão, chamando-o "para fora de seu país, de sua parentela e
de sua casa" (Gn 12,1), para fazer dele "Abraão", isto é,
"o pai de uma multidão de nações" (Gn 17,5): "Em ti serão
abençoadas todas as nações da terra" (Gn 12,3).
(Parágrafos
relacionados: 145,2570)
- O povo originado de Abraão será o
depositário da promessa feita aos patriarcas, o povo da eleição, chamado a
preparar o congraçamento, um dia, de todos os filhos de Deus na unidade da
Igreja; será a raiz sobre a qual serão enxertados os pagãos tornados
crentes.
(Parágrafos
relacionados: 760,762,781)
- Os patriarcas e os profetas, bem como
outras personalidades do Antigo Testamento, foram e serão sempre venerados
como santos em todas as tradições litúrgicas da Igreja.
DEUS FORMA SEU POVO ISRAEL
- Depois dos patriarcas, Deus formou Israel
como seu povo, salvando-o da escravidão do Egito. Fez com ele a Aliança do
Sinal e deu-lhe, por intermédio de Moisés, a sua Lei, para que o reconhecesse
e o servisse como o único Deus vivo e verdadeiro, Pai providente e juiz
justo, e para que esperasse o Salvador prometido.
(Parágrafos
relacionados: 2060,2574,1961)
- Israel é o Povo sacerdotal de Deus, aquele
que "traz o Nome do Senhor" (Dt 28,10). É o povo daqueles
"aos quais Deus falou em primeiro lugar", o povo dos
"irmãos mais velhos" da fé de Abraão.
(Parágrafos
relacionados: 204,2801,839)
- Por meio dos profetas, Deus forma seu povo
na esperança da salvação, na expectativa de uma Aliança nova e eterna
destinada a todos os homens, e que será impressa nos corações. Os profetas
anunciam uma redenção radical do Povo de Deus, a purificação de todas as
suas infidelidades, uma salvação que incluirá todas as nações. Serão
sobretudo os pobres e os humildes do Senhor os portadores desta esperança.
As mulheres santas como Sara, Rebeca, Raquel, Míriam, Débora, Ana, Judite
e Ester mantiveram viva a esperança da salvação de Israel. Delas todas, a
figura mais pura é a de Maria.
(Parágrafos relacionados: 711,1965)
III. Cristo Jesus "Mediador e Plenitude de toda a Revelação"
DEUS TUDO DISSE NO SEU VERBO
- "Muitas vezes e de modos diversos
falou Deus, outrora, aos pais pelos profetas; agora, nestes dias que são
os últimos, falou-nos por meio do Filho" (Hb 1,1-2). Cristo, o Filho
de Deus feito homem, é a Palavra única, perfeita e insuperável do Pai. Nele
o Pai disse tudo, e não há outra palavra senão esta. São João da Cruz, depois de tantos outros,
exprime isto de maneira luminosa, comentando Hb 1,1-2:
(Parágrafo relacionado: 102)
Porque em dar-nos, como nos deu, seu Filho, que é sua
Palavra única (e outra não há), tudo nos falou de uma só vez nessa única Palavra, e nada mais
tem a falar, (...) pois o que antes falava por partes aos profetas agora nos
revelou inteiramente, dando-nos o Tudo que é seu Filho. Se atualmente,
portanto, alguém quisesse interrogar a Deus, pedindo-lhe alguma visão ou
revelação, não só cairia numa insensatez, mas ofenderia muito a Deus por não
dirigir os olhares unicamente para Cristo sem querer outra coisa ou novidade
alguma.
(Parágrafos relacionados: 516,2717)
NÃO HAVERÁ OUTRA REVELAÇÃO
- "A Economia cristã, portanto, como
aliança nova e definitiva, jamais passará, e já não há que esperar nenhuma
nova revelação pública antes da gloriosa manifestação de Nosso Senhor
Jesus Cristo". Todavia, embora a Revelação esteja terminada, não está
explicitada por completo; caberá à fé cristã captar gradualmente todo o
seu alcance ao longo dos séculos.
(Parágrafo
relacionado: 94)
- No decurso dos séculos houve revelações
denominadas "privadas", e algumas delas têm sido reconhecidas
pela autoridade da Igreja. Elas não pertencem, contudo, ao depósito da fé.
A função delas não é "melhorar" ou "completar" a
Revelação definitiva de Cristo, mas ajudar a viver dela com mais plenitude
em determinada época da história. Guiado pelo Magistério da Igreja, o
senso dos fiéis sabe discernir e acolher o que nessas revelações constitui
um apelo autêntico de Cristo ou de seus santos à Igreja.
(Parágrafos relacionados: 84,93)
A
fé cristã não pode aceitar "revelações" que pretendam ultrapassar ou
corrigir a Revelação da qual Cristo é a perfeição. Este é o caso de certas
religiões não-cristãs e também de certas seitas recentes que se fundamentam em
tais "revelações".
RESUMINDO
- Por amor, Deus revelou-se e doou-se ao
homem. Traz assim uma resposta definitiva e superabundante às questões que
o homem se faz acerca do sentido e do objetivo de sua vida.
- Deus revelou-se ao homem, comunicando-lhe
gradualmente seu próprio Mistério por meio de ações e de palavras.
- Para além do testemunho que Deus dá de si
mesmo nas coisas criadas, ele manifestou-se pessoalmente aos nossos
primeiros pais. Falou-lhes e, depois da queda, prometeu-lhes a
salvação e ofereceu-lhes sua aliança.
- Deus fez com Noé uma aliança eterna entre
Ele e todos os seres vivos. Esta há de durar enquanto durar o
mundo.
- Deus escolheu Abraão e
fez uma aliança com ele e sua descendência. Daí formou seu povo, ao qual revelou sua
lei por intermédio de Moisés. Pelos profetas preparou este povo a acolher
a salvação destinada à humanidade inteira.
- Deus revelou-se plenamente enviando seu
próprio Filho, no qual estabeleceu sua Aliança para sempre. O Filho
é a Palavra definitiva do Pai, de sorte que depois dele não haverá outra
Revelação.
ARTIGO 2
A TRANSMISSÃO DA REVELAÇÃO DIVINA
- Deus "quer que todos os homens sejam
salvos e cheguem ao conhecimento da verdade" (1Tm 2,4), isto é, de
Jesus Cristo. É preciso, pois, que Cristo seja anunciado a todos os povos
e a todos os homens, e que desta forma a Revelação chegue até as
extremidades do mundo:
(Parágrafo relacionado: 851)
Deus dispôs com suma benignidade que aquelas coisas
que revelara para a salvação de todos os povos permanecessem sempre íntegras e
fossem transmitidas a todas as gerações.
1. A Tradição apostólica
- "Cristo Senhor, em quem se consuma a
revelação do Sumo Deus, ordenou aos Apóstolos que o Evangelho, prometido
antes pelos profetas, completado por ele e por sua própria boca
promulgado, fosse por eles pregado a todos os homens como fonte de toda a
verdade salvífica e de toda a disciplina de costumes, comunicando-lhes os
dons divinos."
(Parágrafo relacionado: 171)
A PREGAÇÃO APOSTÓLICA...
- A transmissão do Evangelho, segundo a
ordem do Senhor, fez-se de duas maneiras:
- oralmente - "pelos apóstolos, que na pregação oral, por exemplos e
instituições, transmitiram aquelas coisas que ou receberam das palavras, da
convivência e das obras de Cristo ou aprenderam das sugestões do Espírito
Santo";
- por escrito - "como também por aqueles apóstolos e varões apostólicos que, sob
inspiração do mesmo Espírito Santo, puseram por escrito a mensagem da
salvação"
...CONTINUADA NA SUCESSÃO APOSTÓLICA
- "Para que o Evangelho sempre se
conservasse inalterado e vivo na Igreja, os apóstolos deixaram como
sucessores os bispos, a eles 'transmitindo seu próprio encargo de
Magistério." Com efeito, "a pregação apostólica, que é expressa
de modo especial nos livros inspirados, devia conservar-se por uma
sucessão contínua até a consumação dos tempos".
(Parágrafo
relacionado: 861)
- Esta transmissão viva, realizada no
Espírito Santo, é chamada de Tradição enquanto distinta da Sagrada
Escritura, embora intimamente ligada a ela. Por meio da Tradição, "a
Igreja, em sua doutrina, vida e culto, perpetua e transmite a todas as
gerações tudo o que ela é, tudo o que crê". "O ensinamento dos
Santos Padres testemunha a presença vivificante desta Tradição, cujas
riquezas se transfundem na praxe e na vida da Igreja crente e
orante."
(Parágrafos
relacionados: 174,1124,2651)
- Assim, a comunicação que o Pai fez de si
mesmo por seu Verbo no Espírito Santo permanece presente e atuante na
Igreja: "O Deus que outrora falou mantém um permanente diálogo com a
esposa de seu dileto Filho, e o Espírito Santo, pelo qual a voz viva do Evangelho
ressoa na Igreja e através dela no mundo, leva os crentes à verdade toda e
faz habitar neles abundantemente a palavra de Cristo"
II. A relação entre a Tradição e a Sagrada
Escritura
UMA FONTE COMUM...
- "Elas estão entre si estreitamente
unidas e comunicantes. Pois, promanando ambas da mesma fonte divina,
formam de certo modo um só todo e tendem para o mesmo fim." Tanto uma
como outra tornam presente e fecundo na Igreja o mistério de Cristo, que
prometeu permanecer com os seus "todos os dias, até a consumação dos
séculos" (Mt 28,20).
DUAS MODALIDADES DISTINTAS DE TRANSMISSÃO
- "A Sagrada Escritura é a Palavra de Deus enquanto
redigida sob a moção do Espírito Santo".
Quanto
à Sagrada Tradição, ela "transmite integralmente aos sucessores dos
apóstolos a Palavra de Deus confiada por Cristo Senhor e pelo Espírito Santo
aos apóstolos para que, sob a luz do Espírito de verdade, eles, por sua
pregação, fielmente a conservem, exponham e difundam".
(Parágrafo
relacionado: 113)
- Dai resulta que a Igreja, à
qual estão confiadas a transmissão e a interpretação da Revelação,
"não deriva a sua certeza a respeito de tudo o que foi revelado
somente da Sagrada Escritura. Por isso, ambas devem ser aceitas e veneradas com igual sentimento
de piedade e reverência"
TRADIÇÃO APOSTÓLICA E TRADIÇÕES ECLESIAIS
- A Tradição da qual aqui falamos é a que
vem dos apóstolos e transmite o que estes receberam do ensinamento e do
exemplo de Jesus e o que receberam por meio do Espírito Santo Com efeito,
a primeira geração de cristãos ainda não dispunha de um Novo Testamento
escrito, e o próprio Novo Testamento atesta o processo da Tradição viva.
Dela
é preciso distinguir as "tradições" teológicas, disciplinares,
litúrgicas ou devocionais surgidas ao longo do tempo nas Igrejas locais. Constituem
elas formas particulares sob as quais a grande Tradição recebe expressões
adaptadas aos diversos lugares e às diversas épocas. É à luz da grande Tradição
que estas podem ser mantidas, modificadas ou mesmo abandonadas, sob a guia do
Magistério da Igreja.
(Parágrafos relacionados: 1202,2041,2684)
III. A interpretação do depósito da fé
O DEPÓSITO DA FÉ CONFIADO À TOTALIDADE DA IGREJA
- "O patrimônio sagrado" da fé
("depositum fidei"), contido na Sagrada Tradição e na Sagrada
Escritura, foi confiado pelos apóstolos à totalidade da Igreja.
"Apegando-se firmemente ao mesmo, o povo santo todo, unido a seus
Pastores, persevera continuamente na doutrina dos apóstolos e na comunhão,
na fração do pão e nas orações, de sorte que na conservação, no exercício
e na profissão da fé transmitida se crie uma singular unidade de espírito
entre os bispos e os fiéis."
(Parágrafos relacionados: 857,871,2033)
O MAGISTÉRIO DA IGREJA
- "O ofício de interpretar
autenticamente a Palavra de Deus escrita ou transmitida foi confiado unicamente
ao Magistério vivo da Igreja, cuja autoridade se exerce em nome de Jesus
Cristo", isto é, foi confiado aos bispos em comunhão com o sucessor
de Pedro, o bispo de Roma.
(Parágrafos
relacionados: 888,892,2032,2040)
- "Todavia, tal Magistério não está
acima da Palavra de Deus, mas a serviço dela, não ensinando senão o que
foi transmitido, no sentido de que, por mandato divino, com a assistência
do Espírito Santo, piamente ausculta aquela palavra, santamente a guarda e
fielmente a expõe, e deste único depósito de fé tira o que nos propõe para
ser crido como divinamente revelado."
(Parágrafo
relacionado: 688)
- Os fiéis, lembrando-se da palavra de
Cristo a seus apóstolos: "Quem vos ouve a mim ouve" (Lc 10,16),
recebem com docilidade os ensinamentos e as diretrizes que seus Pastores
lhes dão sob diferentes formas.
(Parágrafos relacionados: 1548,2037)
OS DOGMAS DA FÉ
- O Magistério da Igreja empenha plenamente
a autoridade que recebeu de Cristo quando define dogmas, isto é, quando,
utilizando uma forma que obriga o povo cristão a uma adesão irrevogável de
fé, propõe verdades contidas na Revelação divina ou verdades que com estas
têm uma conexão necessária.
(Parágrafos
relacionados: 888,892,2032,2040)
- Há uma conexão orgânica entre nossa vida
espiritual e os dogmas. Os dogmas são luzes no caminho de nossa fé que o
iluminam e tornam seguro. Na verdade, se nossa vida for reta, nossa
inteligência e nosso coração estarão abertos para acolher a luz dos dogmas
da fé.
(Parágrafo
relacionado: 2625)
- Os laços mútuos e a coerência dos dogmas
podem ser encontrados no conjunto da Revelação do Mistério de Cristo.
"Existe uma ordem ou 'hierarquia' das verdades da doutrina católica,
já que o nexo delas com o fundamento da fé cristã é diferente."
(Parágrafos relacionados: 114,158,234)
SENSO SOBRENATURAL DA FÉ
- Todos os fiéis participam da compreensão e
da transmissão da verdade revelada. Receberam a unção do Espírito Santo,
que os instrui e os conduz à verdade em sua totalidade.
(Parágrafo
relacionado: 737)
- "O conjunto dos fiéis... não pode
enganar-se no ato de fé. E manifesta esta sua peculiar piedade mediante o
senso sobrenatural da fé de todo o povo, quando, 'desde os bispos até o
último dos fiéis leigos', apresenta um consenso universal sobre questões
de fé e costumes."
(Parágrafo
relacionado: 785)
- "Por este senso da fé, excitado e
sustentado pelo Espírito da verdade, o Povo de Deus, sob a direção do
sagrado Magistério, (...) adere indefectivelmente à fé 'uma vez para
sempre transmitida aos santos'; e, com reto juízo, penetra-a mais
profundamente e na sua vida a coloca mais perfeitamente em obra."
(Parágrafo
relacionado: 889)
O CRESCIMENTO NA COMPREENSÃO DA FÉ
- Graças à assistência do Espírito Santo, a
compreensão tanto das realidades como das palavras do depósito da fé pode
crescer na vida da Igreja:
(Parágrafo relacionado: 66)
"Pela contemplação e estudo dos que crêem, os
quais as meditam em seu coração", é em especial "a pesquisa teológica
que aprofunda o conhecimento da verdade revelada".
"Pela íntima compreensão que os fiéis desfrutam
das coisas espirituais"; "Divina eloquia cum legente crescunt - as
palavras divinas crescem com o leitor".
(Parágrafos relacionados: 2651,2038,2518)
"Pela pregação daqueles que, com a sucessão
episcopal, receberam o carisma seguro da verdade."
- "Fica, portanto, claro que segundo o
sapientíssimo plano divino, a Sagrada Tradição, a Sagrada Escritura e o
Magistério da Igreja estão de tal modo entrelaçados e unidos que um não
tem consistência sem os outros, e que juntos, cada qual a seu modo, sob a
ação do mesmo Espírito Santo, contribuem eficazmente para a salvação das
almas."
RESUMINDO
- O que Cristo confiou aos apóstolos, estes
o transmitiram por sua pregação e por escrito, sob a inspiração do
Espírito Santo, a todas as gerações, até a volta gloriosa de Cristo.
- "A Sagrada Tradição e a Sagrada
Escritura constituem um só sagrado depósito da Palavra de Deus", no
qual, como em um espelho, a Igreja peregrinante contempla a Deus, fonte de
todas as suas riquezas.
- "Em sua doutrina, vida e culto, a
Igreja perpetua e transmite a todas as gerações tudo o que ela é, tudo o
que crê.
- Graças a seu senso sobrenatural da fé, o
Povo de Deus inteiro não cessa de acolher o dom da Revelação divina, de
penetrá-lo mais profundamente e viver dele com mais plenitude.
- O encargo de interpretar autenticamente a
Palavra de Deus foi confiado exclusivamente ao Magistério da Igreja, ao
Papa e aos bispos em comunhão com ele.
ARTIGO 3 - A SAGRADA ESCRITURA
I. Cristo -
Palavra única da Sagrada Escritura
- Na condescendência de sua bondade, Deus,
para revelar-se aos homens, fala-lhes em palavras humanas: Com efeito, as
palavras de Deus, expressas por línguas humanas, fizeram-se semelhantes à
linguagem humana, tal como outrora o Verbo do Pai Eterno, havendo assumido
a carne da fraqueza humana, se fez semelhante aos homens".
- Por meio de todas as palavras da Sagrada
Escritura, Deus pronuncia uma só Palavra, seu Verbo único, no qual se
expressa por inteiro:
(Parágrafos relacionados: 65,2763)
"Lembrai-vos que é uma mesma a Palavra de Deus
que está presente em todas as Escrituras, que é um mesmo Verbo que ressoa na
boca de todos os escritores sagrados; ele que, sendo no início Deus junto de
Deus, não tem necessidade de sílabas, por não estar submetido ao tempo."
(Parágrafos relacionados:
426,429)
- Por este motivo, a Igreja sempre venerou
as divinas Escrituras, como venera também o Corpo do Senhor. Ela não cessa
de apresentar aos fiéis o Pão da vida tomado da Mesa da Palavra de Deus e
do Corpo de Cristo.
(Parágrafos
relacionados: 1100,1184,1378)
- Na Sagrada Escritura, a Igreja encontra
incessantemente seu alimento e sua força, pois nela não acolhe somente uma
palavra humana, mas o que ela é realmente: a Palavra de Deus "Com
efeito, nos Livros Sagrados o Pai que está nos céus vem carinhosamente ao
encontro de seus filhos e com eles fala".
II. Inspiração e verdade da Sagrada
Escritura
- Deus é o autor da Sagrada Escritura.
"As coisas divinamente reveladas, que se encerram por escrito e se
manifestam na Sagrada Escritura, foram consignadas sob inspiração do
Espírito Santo"
"A
santa Mãe Igreja, segundo a fé apostólica, tem como sagrados e canônicos os
livros completos tanto do Antigo como do Novo Testamento, com todas as suas
partes, porque, escritos sob a inspiração do Espírito Santo, eles têm Deus como
autor e nesta sua qualidade foram confiados à própria Igreja."
- Deus inspirou os autores humanos dos
livros sagrados.. "Na redação dos livros sagrados, Deus escolheu
homens, dos quais se serviu fazendo-os usar suas próprias faculdades e
capacidades, a fim de que, agindo ele próprio neles e por meio deles,
escrevessem, como verdadeiros autores, tudo e só aquilo que ele próprio
queria."
- Os livros inspirados ensinam a verdade.
"Portanto, já que tudo o que os autores inspirados (ou hagiógrafos)
afirmam deve ser tido como afirmado pelo Espírito Santo, deve-se professar
que os livros da Escritura ensinam com certeza, fielmente e sem erro a
verdade que Deus em vista de nossa salvação quis fosse consignada nas
Sagradas Escrituras."
(Parágrafo
relacionado: 702)
- Todavia, a fé cristã não é uma
"religião do Livro". O Cristianismo é a religião da
"Palavra" de Deus, "não de uma palavra escrita e muda, mas
do Verbo encarnado e vivo". Para que as Escrituras não permaneçam
letra morta, é preciso que Cristo, Palavra eterna de Deus vivo, pelo
Espírito Santo nos "abra o espírito à compreensão das
Escrituras".
III. O Espírito Santo, intérprete da
Escritura
- Na Sagrada Escritura, Deus fala ao homem à
maneira dos homens. Para bem interpretar a Escritura é preciso, portanto,
estar atento àquilo que os autores humanos quiseram realmente afirmar e
àquilo que Deus quis manifestar-nos pelas palavras deles.
- Para descobrir a intenção dos autores
sagrados, há que levar em conta as condições da época e da cultura deles,
os "gêneros literários" em uso naquele tempo, os modos, então
correntes, de sentir, falar e narrar. "Pois a verdade é apresentada e
expressa de maneiras diferentes nos textos que são de vários modos
históricos ou proféticos ou poéticos, ou nos demais gêneros de
expressão."
- Mas, já que a Sagrada Escritura é
inspirada, há outro princípio da interpretação correta, não menos
importante que o anterior, e sem o qual a Escritura permaneceria letra
morta: "A Sagrada Escritura deve também ser lida e interpretada com a
ajuda daquele mesmo Espírito em que foi escrita". O Concílio
Vaticano II indica três critérios para uma interpretação da
Escritura conforme o Espírito que a inspirou:
- 1. Prestar muita atenção "ao conteúdo
e à unidade da Escritura inteira". Pois, por mais diferentes que
sejam os livros que a compõem, a Escritura é una em razão da unidade do
projeto de Deus, do qual Cristo Jesus é o centro e o coração, aberto
depois de sua Páscoa
(Parágrafos relacionados: 128,368)
O coração de Cristo designa a Sagrada Escritura, que
dá a conhecer o coração de Cristo. O coração estava fechado antes da Paixão,
pois a Escritura era obscura. Mas a Escritura foi aberta após a Paixão, pois os
que a partir daí têm a compreensão dela consideram e discernem de que maneira as
profecias devem ser interpretadas.
- 2. Ler a Escritura dentro
"da Tradição viva da Igreja inteira". Consoante um adágio dos Padres,
"Sacra Scriptura principalius est in corde Ecclesiae quam in
materialibus instrumentis scripta a sagrada Escritura está escrita mais no
coração da Igreja do que nos instrumentos materiais". Com efeito, a
Igreja leva em sua Tradição a memória viva da Palavra de Deus, e é o
Espírito Santo que lhe dá a interpretação espiritual da Escritura
("...segundo o sentido espiritual que o Espírito dá à Igreja").
(Parágrafo
relacionado: 81)
- 3. Estar atento "a anagogia da
fé" Por "anagogia da fé" entendemos a coesão das verdades
da fé entre si e no projeto total da Revelação.
(Parágrafo relacionado: 90)
Os SENTIDOS DA ESCRITURA
- Segundo uma antiga tradição, podemos
distinguir dois sentidos da Escritura: o sentido literal e o sentido
espiritual, sendo este último subdividido em sentido alegórico, moral e
analógico. A concordância profunda entre os quatro sentidos garante toda a
sua riqueza à leitura viva da Escritura na Igreja.
- O sentido literal. É o sentido significado
pelas palavras da Escritura e descoberto pela exegese que segue as regras
da correta interpretação. "Omnes sensus fundantur super litteralem -
Todos os sentidos (da Sagrada Escritura) devem estar fundados no
literal"
(Parágrafos
relacionados: 110-114)
- O sentido espiritual. Graças à unidade do
projeto de Deus, não somente o texto da Escritura, mas também as
realidades e os acontecimentos de que ele fala, podem ser sinais.
1.
O sentido alegórico. Podemos adquirir uma compreensão mais profunda dos
acontecimentos reconhecendo a significação deles em Cristo; assim, a travessia
do Mar Vermelho é um sinal da vitória de Cristo, e também do Batismo
2.
O sentido moral. Os acontecimentos relatados na Escritura devem
conduzir-nos a um justo agir. Eles foram escritos "para nossa
instrução" (1Cor 10,11)
3. O sentido anagógico. Podemos ver realidades e acontecimentos em sua significação eterna,
conduzindo-nos (em grego: "anagogé"; pronuncie "anagogué")
à nossa Pátria. Assim, a Igreja na terra é sinal da Jerusalém celeste.
- Um dístico medieval resume a significação
dos quatro sentidos:
Littera gesta
docei, quid credas allegoria,
moralis quid agas, quo tendas anagogia.
A letra ensina o que aconteceu; a alegoria, o que
deves crer;
a moral, o que deves fazer; a anagogia, para onde
deves caminhar.
- "É dever dos exegetas esforçar-se,
dentro dessas diretrizes, por entender e expor com maior aprofundamento o
sentido da Sagrada Escritura, a fim de que, por seu trabalho como que
preparatório, amadureça o julgamento da Igreja. Pois todas estas coisas
que concernem à maneira de interpretar a Escritura estão sujeitas, em
última instância, ao juízo da Igreja, que exerce o divino ministério e
mandato do guardar e interpretar a Palavra de Deus"
(Parágrafo relacionado: 94)
Ego vero Evangelio non crederem, nisi me catholicae
Ecclesiae commoveret auctoritas.
Eu não creria no Evangelho, se a isto não me levasse a
autoridade da Igreja católica"
(Parágrafo relacionado: 113)
IV O Cânon das Escrituras
- Foi a Tradição apostólica que fez a Igreja
discernir que escritos deviam ser enumerados lista dos Livros
Sagrados". Esta lista completa é denominada "Cânon" das
Escrituras. Ela comporta 46 (45, se contarmos Jr e Lm juntos) escritos
para o Antigo Testamento e 27 para o Novo Testamento.
(Parágrafo relacionado: 1117)
Gênesis,
Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio, Josué, Juizes, Rute, os dois livros de
Samuel, os dois livros dos Reis, os dois livros das Crônicas, Esdras e Neemias,
Tobias, Judite, Ester, os dois livros dos Macabeus, Jó, os Salmos, os
Provérbios, o Eclesiastes (ou Coélet), o Cântico dos Cânticos, a Sabedoria, o
Eclesiástico (ou Sirácida), Isaías, Jeremias, as Lamentações, Baruc, Ezequiel,
Daniel, Oséias, Joel, Amós, Abdias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuc, Sofonias,
Ageu, Zacarias, Malaquias, para o Antigo Testamento; os Evangelhos de Mateus,
de Marcos, de Lucas e de João, os Atos dos Apóstolos, as Epístolas de São Paulo
aos Romanos, a primeira e a segunda aos Corintios, aos Gálatas, aos Efésios,
aos Filipenses, aos Colossenses, a primeira e a segunda aos Tessalonicenses, a
primeira e a segunda a Timóteo, a Tito, a Filêmon, a Epístola aos Hebreus, a
Epístola de Tiago, a primeira e a segunda de Pedro, as três Epístolas de João,
a Epístola de Judas e o Apocalipse, para o Novo Testamento.
O ANTIGO TESTAMENTO
- Antigo Testamento é uma
parte indispensável da Sagrada Escritura. Seus livros são divinamente
inspirados e conservam um valor permanente, pois a Antiga Aliança nunca
foi revogada.
(Parágrafo
relacionado: 1093)
- Com efeito, "a Economia do Antigo
Testamento estava ordenada principalmente para preparar a vinda de Cristo,
redentor de todos". "Embora contenham também coisas imperfeitas
e transitórias", os livros do Antigo Testamento dão testemunho de
toda a divina pedagogia do amor salvífico de Deus: "Neles
encontram-se sublimes ensinamentos acerca de Deus e uma salutar sabedoria
concernente à vida do homem, bem como admiráveis tesouros de preces;
nestes livros, enfim está latente o mistério de nossa salvação"
(Parágrafos
relacionados: 702,763,708,2568)
- Os cristãos veneram o Antigo Testamento
como verdadeira Palavra de Deus. A Igreja sempre rechaçou vigorosamente a
idéia de rejeitar o Antigo Testamento sob o pretexto de que o Novo o teria
feito caducar (marcionismo).
O Novo TESTAMENTO
- "A Palavra de Deus, que é força de
Deus para a salvação de todo crente, é apresentada e manifesta seu vigor
de modo eminente nos escritos do Novo Testamento." Estes escritos
fornecem-nos a verdade definitiva da Revelação divina. Seu objeto central
é Jesus Cristo, o Filho de Deus encarnado, seus atos, ensinamentos, paixão
e glorificação, assim como os inícios de sua Igreja sob a ação do Espírito
Santo.
- Os Evangelhos são o coração de todas
as Escrituras, "uma vez que constituem o principal testemunho da vida
e da doutrina do Verbo encarnado, nosso Salvador".
(Parágrafo
relacionado: 515)
- Na formação dos Evangelhos podemos
distinguir três etapas:
1.
A vida e o ensinamento de Jesus. A Igreja defende firmemente que os
quatro Evangelhos, "cuja historicidade afirma sem hesitação, transmitem
fielmente aquilo que Jesus, Filho de Deus, ao viver entre os homens, realmente
fez e ensinou para a eterna salvação deles, até o dia em que foi elevado".
2.
A tradição oral. "O que o Senhor dissera e fizera, os apóstolos,
após a ascensão do Senhor, transmitiram aos ouvintes, com aquela compreensão
mais plena de que gozavam, instruídos que foram pelos gloriosos acontecimentos
de Cristo e esclarecidos pela luz do Espírito de verdade."
3.
Os Evangelhos escritos. "Os autores sagrados escreveram os quatro
Evangelhos, escolhendo certas coisas das muitas transmitidas ou oralmente ou já
por escrito, fazendo síntese de outras ou explanando-as com vistas à situação
das igrejas, conservando, enfim, a forma de pregação, sempre de maneira a
transmitir-nos, a respeito de Jesus, coisas verdadeiras e sincera. "
- O Evangelho quadriforme ocupa a Igreja um
lugar único, como atestam a veneração que lhe tributa a liturgia e o atrativo
incomparável que desde sempre tem exercido sobre os santos:
(Parágrafo relacionado: 1154)
Não existe nenhuma doutrina que seja melhor, mais
preciosa e mais esplêndida que o texto do Evangelho. Vede e retende o que nosso
Senhor e Mestre, Cristo, ensinou com suas palavras e realizou com seus atos.
É acima de tudo o Evangelho que me ocupa
durante as minhas orações; nele encontro tudo o que é necessário para minha
pobre alma. Descubro nele sempre novas luzes, sentidos escondidos e
misteriosos.
(Parágrafo relacionado: 2705)
A UNIDADE ENTRE O ANTIGO E O NOVO TESTAMENTO
- A Igreja, já nos tempos apostólicos, e
depois constantemente em sua Tradição, iluminou a unidade do plano divino
nos dois Testamentos graças à tipologia. Esta discerne, nas obras de Deus
contidas na Antiga Aliança, prefigurações daquilo que Deus realizou na
plenitude dos tempos, na pessoa de seu Filho encarnado.
(Parágrafos
relacionados: 1094,489)
- Por isso os cristãos lêem o Antigo
Testamento à luz de Cristo morto e ressuscitado. Esta leitura tipológica
manifesta o conteúdo inesgotável do Antigo Testamento. Ela não deve levar
a esquecer que este conserva seu valor próprio de Revelação, que o próprio
Nosso Senhor reafirmou. De resto também o Novo Testamento exige ser lido à
luz do Antigo. A catequese cristã primitiva recorre constantemente a ele.
Segundo um adágio antigo, o Novo Testamento está escondido no Antigo, ao
passo que o Antigo é desvendado no Novo "Novum in Vetere latet et in
Novo Vetus patet".
(Parágrafos
relacionados: 651,2055,1968)
- A tipologia exprime o dinamismo em direção
ao cumprimento do plano divino, quando "Deus será tudo em todos"
(1 Cor 15,28), Também a vocação dos patriarcas e o Êxodo do Egito, por
exemplo, não perdem seu valor próprio no plano de Deus, pelo fato de serem
ao mesmo tempo etapas intermediárias deste plano.
V. A Sagrada Escritura na vida da Igreja
- "É tão grande o poder e a eficácia
encerrados na Palavra de Deus, que ela constitui sustentáculo e vigor para
a Igreja, e, para seus filhos, firmeza da fé, alimento da alma, pura e
perene fonte da vida espiritual." "É preciso que o acesso à
Sagrada Escritura seja amplamente aberto aos fiéis."
- "Que o estudo das Sagradas Páginas
seja, portanto, como que a alma da Sagrada Teologia. Da mesma palavra da
Sagrada Escritura também se nutre salutarmente e santamente floresce o
ministério da palavra, a saber, a pregação pastoral, a catequese e toda a
instrução cristã, na qual deve ocupar lugar de destaque a homilia
litúrgica."
(Parágrafo
relacionado: 94)
- A Igreja "exorta com veemência e de
modo peculiar todos os fiéis cristãos... a que, pela freqüente leitura das
divinas Escrituras, aprendam 'a eminente ciência de Jesus Cristo"(Fl
3,8). "Com efeito, ignorar as Escrituras é ignorar
Cristo".
(Parágrafos
relacionados: 2653,1792)
RESUMINDO
- Omnis Scriptura divina unus liber est, et
hic unus liber est Christus, "quia omnis Scriptura divina de Christo
loquitur, et omn is Scriptura divina in Christo impletur" - Toda a
Escritura divina é um único livro, e este livro único é Cristo, já que
toda Escritura divina fala de Cristo, e toda Escritura divina se cumpre em
Cristo.
- "As Sagradas Escrituras contêm a
Palavra de Deus e, por serem inspiradas, são verdadeiramente Palavra de
Deus. "
- Deus e o autor da Sagrada Escritura
inspirar seus autores humanos; age neles e por meio dele. Fornece assim a
garantia de que seus escritos ensinem sem erro a verdade salvífica.
- A interpretação das Escrituras inspiradas
deve antes de tudo estar atenta àquilo que Deus quer revelar por
intermédio dos autores sagrados para nossa salvação. O que vem do Espírito
só é plenamente entendido pela ação do Espírito.
- A Igreja recebe e venera como inspirados
os 46 livros do Antigo e os 27 livros do Novo Testamento.
- Os quatro Evangelhos ocupam um lugar
central, já que Cristo Jesus é o centro deles.
- A unidade dos dois Testamentos decorre da
unidade do projeto de Deus e de sua Revelação. O Antigo Testamento prepara
o Novo, ao passo que este último cumpre o Antigo; os dois se iluminam
reciprocamente; os dois são verdadeira Palavra de Deus.
- "A Igreja sempre venerou as divinas
Escrituras da mesma forma como o próprio Corpo do Senhor": ambos
alimentam e dirigem toda a vida cristã. "Tua Palavra é a lâmpada para
meus pés, e luz para meu caminho" (Sl 119,105).
CAPÍTULO III - A
RESPOSTA DO HOMEM A DEUS
- Por sua Revelação, "o Deus invisível,
levado por seu grande amor, fala aos homens como a amigos, e com eles se
entretém para os convidar à comunhão consigo e nela os receber". A
resposta adequada a este convite é a fé.
(Parágrafo
relacionado: 1102)
- Pela fé, o homem submete
completamente sua inteligência e sua vontade a Deus. Com todo o seu ser, o homem dá seu
assentimento a Deus revelador. A Sagrada Escritura denomina
"obediência da fé" esta resposta do homem ao Deus que revela.
(Parágrafo relacionado: 2087)
ARTIGO 1 - EU CREIO
(Parágrafos
relacionados: 1814-1816)
144.
I. A obediência
da fé
Obedecer
("ob-audire") na fé significa submeter-se livremente à palavra
ouvida, visto que sua verdade é garantida por Deus, a própria Verdade. Desta
obediência, Abraão é o modelo que a Sagrada Escritura nos propõe, e a Virgem
Maria, sua mais perfeita realização.
ABRAÃO "O PAI DE TODOS OS CRENTES"
- A Epístola aos Hebreus, no grande elogio à
fé dos antepassados, insiste particularmente na fé de Abraão: "Foi
pela fé que Abraão, respondendo ao chamado, obedeceu e partiu para
uma terra que devia receber como herança, e partiu sem saber para onde
ia" (Hb 11,8). Pela fé, viveu como estrangeiro e como peregrino na
Terra Prometida. Pela fé, Sara recebeu a graça de conceber o filho da
promessa. Pela fé, finalmente, Abraão ofereceu seu filho único em
sacrifício.
(Parágrafos
relacionados: 59,2570,489)
- Abraão realiza, assim, a definição da fé
dada pela Epístola aos Hebreus: "A fé é uma posse antecipada do que
se espera, um meio de demonstrar as realidades que não se vêem" (Hb
11,1). "Abraão creu em Deus, e isto lhe foi levado em conta de
justiça" (Rm 4,3). Graças a esta "fé poderosa" (Rm 4,20),
Abraão tornou-se "o pai de todos os que haveriam de crer" (Rm 4,1
1.18)
(Parágrafo
relacionado: 1819)
- O Antigo Testamento é rico em testemunhos
desta fé. A Epístola aos Hebreus proclama o elogio da fé exemplar dos
antigos, "que deram o seu testemunho" (Hb 11,2.39). No entanto,
"Deus previa para nós algo melhor": a graça de crer em seu Filho
Jesus, "o autor e realizador da fé, que a leva à perfeição"
(Hb11,40; 12,2).
(Parágrafo relacionado: 839)
MARIA "BEM-AVENTURADA A QUE ACREDITOU"
- A Virgem Maria realiza da maneira mais
perfeita a obediência da fé. Na fé, Maria acolheu o anúncio e a promessa
trazida pelo anjo Gabriel, acreditando que "nada é impossível a
Deus" (Lc 1,37) e dando seu assentimento: "Eu sou a serva do
Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra" (Lc 1,38). Isabel a
saudou: "Bem-aventurada a que acreditou, pois o que lhe foi dito da
parte do Senhor será cumprido" (Lc 1,45). É em virtude desta fé que
todas as gerações a proclamarão bem-aventurada.
(Parágrafos
relacionados: 494,2617,506)
- Durante toda a sua vida e
até sua última provação, quando Jesus, seu filho, morreu na cruz, sua fé
não vacilou. Maria não
deixou de crer "no cumprimento" da Palavra de Deus. Por
isso a Igreja venera em Maria a realização mais pura da fé.
(Parágrafos
relacionados: 969,507,829)
II. "Sei em quem pus minha fé"
(2Tm 1,12)
CRER SOMENTE EM DEUS
- A fé é primeiramente uma adesão
pessoal do homem a Deus; é, ao mesmo tempo e inseparavelmente, o
assentimento livre a toda a verdade que Deus revelou. Como adesão
pessoal a Deus e assentimento à verdade que ele revelou, a fé cristã é diferente
da fé em uma pessoa humana. E justo e bom entregar-se totalmente a Deus e
crer absolutamente no que ele diz. Seria vão e falso pôr tal fé em uma
criatura
(Parágrafo relacionado: 222)
CRER EM JESUS CRISTO, O FILHO DE DEUS
- Para o cristão, crer em Deus é,
inseparavelmente, crer naquele que Ele enviou, "seu Filho
bem-amado", no qual Ele pôs toda à sua complacência; Deus mandou que O escutássemos. O próprio Senhor
disse a seus discípulos: "Crede em Deus, crede também em mim"
(Jo 14,1). Podemos crer em Jesus Cristo por que ele mesmo é Deus, o Verbo
feito carne: "Ninguém jamais viu a Deus: o Filho unigênito, que está
voltado para o seio do Pai; este o deu a conhecer" (Jo 1,18). Por ter
ele "visto o Pai" (Jo 6,46), ele é o único que o conhece e pode
revelá-lo.
(Parágrafo relacionado: 424)
CRER NO ESPÍRITO SANTO
- Não se pode crer em Jesus Cristo sem
participar de seu Espírito. E o Espírito Santo que revela aos homens quem
é Jesus. Pois "ninguém pode dizer 'Jesus é Senhor' a não ser no
Espírito Santo" (1 Cor 12,3). "O Espírito sonda todas as coisas,
até mesmo as profundidades de Deus... O que está em Deus, ninguém o
conhece a não ser o Espírito de Deus" (1 Cor 2,10-11). Só Deus
conhece a Deus por inteiro. Cremos no Espírito Santo porque Ele é Deus.
(Parágrafos relacionados: 243,683)
A
Igreja não cessa de confessar sua fé em um só Deus, Pai, Filho e Espírito Santo
(Parágrafo relacionado: 232)
III. As características da fé
A FÉ É UMA GRAÇA
- Quando São Pedro confessa que Jesus é o
Cristo, Filho do Deus vivo, Jesus lhe declara que esta revelação não lhe
veio "da carne e do sangue, mas de meu Pai que está nos céus". A
fé é um dom de Deus, uma virtude sobrenatural infundida por Ele.
"Para que se preste esta fé, exigem-se a graça prévia e adjuvante de
Deus e os auxílios internos do Espírito Santo, que move o coração e o
converte a Deus, abre os olhos da mente e dá a todos suavidade no
consentir e crer na verdade."
(Parágrafos relacionados: 552,1814,1996,2606)
A FÉ É UM ATO HUMANO
- Crer só é possível pela graça e pelos
auxílios interiores do Espírito Santo Mas não é menos verdade que crer é
um ato autenticamente humano. Não contraria nem a liberdade nem a
inteligência do homem confiar em Deus e aderir às verdades por Ele
reveladas. Já no campo das relações humanas, não é contrário à nossa
própria dignidade crer no que outras pessoas nos dizem sobre si mesmas e
sobre suas intenções e confiar nas promessas delas (como, por exemplo,
quando um homem e uma mulher se casam), para entrar assim em comunhão
recíproca. Por isso, é ainda menos contrário à nossa dignidade
"prestar, pela fé, à revelação de Deus plena adesão do intelecto e da
vontade" e entrar, assim, em comunhão íntima com ele.
(Parágrafos
relacionados: 1749,2126)
- Na fé, a inteligência e a
vontade humanas cooperam com a graça divina: "Credere est actus
intellectus assentientis veritati divinae ex imperio voluntatis a Deo
motae per gratiam - Crer é um ato da inteligência que assente à
verdade divina a mando da vontade movida por Deus através da graça"
(Parágrafo relacionado: 2008)
A FÉ E A INTELIGÊNCIA
- O motivo de crer não é o fato de as verdades
reveladas aparecerem como verdadeiras e inteligíveis à luz de nossa razão
natural. Cremos "por causa da autoridade de Deus que revela e que não
pode nem enganar-se nem enganar-nos". "Todavia, para que o
obséquio de nossa fé fosse conforme à razão, Deus quis que os auxílios
interiores do Espírito Santo fossem acompanhados das provas exteriores de
sua Revelação. Por isso, os milagres de Cristo e dos santos, as profecias,
a propagação e a santidade da Igreja, sua fecundidade e estabilidade
"constituem sinais certíssimos da Revelação, adaptados à inteligência
de todos", "motivos de credibilidade" que mostram que o
assentimento da fé não é "de modo algum um movimento cego do espírito".
(Parágrafos
relacionados: 1063,2465,548,812)
- A fé é certa, mais certa que
qualquer conhecimento humano, porque se funda na própria Palavra de Deus,
que não pode mentir. Sem dúvida, as verdades reveladas podem parecer
obscuras à razão e à experiência humanas, mas "a certeza dada pela
luz divina é maior que a que é dada pela luz da razão natural. "Dez
mil dificuldades não fazem uma única dúvida.
(Parágrafo
relacionado: 2088)
- "A fé procura compreender": e
característico da fé o crente desejar conhecer melhor Aquele em quem pôs
sua fé e compreender melhor o que Ele revelou; um conhecimento mais
penetrante despertará por sua vez uma fé maior, cada vez mais ardente de
amor. A graça da fé abre "os olhos do coração" (Ef. 1,18) para
uma compreensão viva dos conteúdos da Revelação, isto é, do conjunto do
projeto de Deus e dos mistérios da fé, do nexo deles entre si e com
Cristo, centro do Mistério revelado. Ora, para "tomar cada vez mais
profunda a compreensão da Revelação, o mesmo Espírito Santo aperfeiçoa continuamente
a fé por meio de seus dons. Assim, segundo o adágio de Santo Agostinho,
"eu creio para compreender, e compreendo para melhor crer".
(Parágrafos
relacionados: 2705,1827,90,2518)
- Fé e ciência. "Porém, ainda que a fé esteja acima
da razão, não poderá jamais haver verdadeira desarmonia entre uma e outra,
porquanto o mesmo Deus que revela os mistérios e infunde a fé dotou o
espírito humano da luz da razão; e Deus não poderia negar-se a si mesmo,
nem a verdade jamais contradizer a verdade." "Portanto, se a
pesquisa metódica, em todas as ciências, proceder de maneira
verdadeiramente científica, segundo as leis morais, na realidade nunca
será oposta à fé: tanto as realidades profanas quanto as da fé originam-se
do mesmo Deus. Mais ainda: quem tenta perscrutar com humildade e
Perseverança, os segredos das coisas, ainda que disso não tome
consciência, e como que conduzido pela mão de Deus, que sustenta todas as
coisas, fazendo com que elas sejam o que são."
(Parágrafos relacionados: 283,2293)
A LIBERDADE DA FÉ
- Para que o ato de fé seja humano, "o
homem deve responder a Deus, crendo por livre vontade. Por conseguinte,
ninguém deve ser forçado contra sua vontade a abraçar a fé. Pois o ato de
fé é por sua natureza voluntário". "Deus de fato chama os homens
para servi-lo em espírito e verdade. Com isso os homens são obrigados em
consciência, mas não são forçados... Foi o que se patenteou em grau máximo
em Jesus Cristo." Com efeito, Cristo convidou à fé e à conversão, mas
de modo algum coagiu. "Deu testemunho da verdade, mas não quis
impô-la pela força aos que a ela resistiam. Seu reino... se estende graças
ao amor com que Cristo, exaltado na cruz, atrai a si os homens."
(Parágrafos relacionados: 1738,2106,616)
A NECESSIDADE DA FÉ
- E necessário, para obter esta salvação,
crer em Jesus Cristo e naquele que o enviou para nossa salvação
"Como, porém, "sem fé é impossível agradar a Deus' (Hb 11,6) e
chegar ao consórcio dos seus filhos, ninguém jamais pode ser justificado
sem ela, nem conseguir a vida eterna, se nela não permanecer até o
fim" (Mt 10,22; 24,13)".
(Parágrafos relacionados: 432,1257,846)
A PERSEVERANÇA NA FÉ
- A fé é um dom gratuito que Deus concede ao
homem. Podemos perder este dom inestimável; São Paulo alerta Timóteo sobre
isso: 'Combate... o bom combate, com fé e boa consciência; pois alguns,
rejeitando a boa consciência, vieram a naufragar na fé" (1Tm
1,18-19). Para viver, crescer e perseverar até o fim na fé, devemos
alimentá-la com a Palavra de Deus; devemos implorar ao Senhor que a aumente;
ela deve "agir pela caridade" (Gl 5,6), ser carregada
pela esperança e estar enraizada na fé da Igreja.
(Parágrafos relacionados:
2089,1037,2016,2573,2849)
A FÉ - COMEÇO DA VIDA ETERNA
- A fé nos faz degustar como por antecipação
a alegria e a luz da visão beatífica, meta de nossa caminhada na terra.
Veremos então a Deus "face a face" (1Cor 13,12), "tal como
Ele é" (1Jo 3,2). A fé já é, portanto, o começo da vida
eterna:
(Parágrafo
relacionado: 1088)
Enquanto desde já contemplamos as bênçãos da fé, como
um reflexo no espelho, é como se já possuíssemos as coisas maravilhas que um
dia desfrutaremos, conforme nos garante nossa fé.
- Por ora, todavia, "caminhamos pela
fé, não pela visão" (2Cor 5,7), e conhecemos a Deus "como que em
um espelho, de uma forma confusa..., imperfeita" (1Cor 13,12).
Luminosa em virtude daquele em que ela crê, a fé é muitas vezes vivida na
obscuridade. A fé pode ser posta à prova. O mundo em que vivemos muitas
vezes parece estar bem longe daquilo que a fé nos assegura; as experiências
do mal e do sofrimento, das injustiças e da morte parecem contradizer a
Boa Nova; podem abalar a fé e tornar-se para ela uma tentação.
(Parágrafos
relacionados: 2864,309,1502,1006)
- É então que devemos nos voltar para as testemunhas
da fé: Abraão, que creu, "esperando contra toda esperança"
(Rm 4,18); a Virgem Maria, que na "peregrinação a fé" foi até a
"noite da fé", comungando com o sofrimento de seu Filho e com a
noite de seu túmulo e tantas outras testemunhas da fé: "Com tal nuvem
de testemunhas ao nosso redor, rejeitando todo fardo e o pecado que nos
envolve, corramos com perseverança para o certame que nos é proposto, com
os olhos fixos naquele que é autor e realizador da fé, Jesus" (Hb
12,1-2).
(Parágrafo
relacionado: 2719)
ARTIGO 2 - NÓS
CREMOS
- A fé é um ato pessoal: a
resposta livre do homem à iniciativa de Deus que se revela. Ela não é,
porém, um ato isolado. Ninguém
pode crer sozinho, assim como ninguém pode viver sozinho. Ninguém deu a fé
a si mesmo, assim como ninguém deu a vida a si mesmo. O crente recebeu a
fé de outros, deve transmiti-la a outros. Nosso amor por Jesus e pelos
homens nos impulsiona a falar a outros de nossa fé. Cada crente é como um
elo na grande corrente dos crentes. Não posso crer sem ser carregado pela
fé dos outros, e pela minha fé contribuo para carregar a fé dos outros.
(Parágrafo
relacionado: 875)
- "Eu creio": esta é a fé da
Igreja, professada pessoalmente por todo crente, principalmente pelo
batismo. "Nós cremos": esta é a fé da Igreja confessada pelos bispos reunidos em Concílio
ou, mais comumente, pela assembléia litúrgica dos crentes. "Eu
creio" é também a Igreja, nossa Mãe, que responde a Deus com sua fé e
que nos ensina a dizer: "eu creio", "nós cremos".
(Parágrafos relacionados: 1124,2040)
I. "Olhai, Senhor, para a fé da vossa Igreja"
- É antes de tudo a Igreja que crê e que
desta forma carrega, alimenta e sustenta minha fé. E antes de tudo a
Igreja que, em toda parte, confessa o Senhor ("Te per orbem
terrarum sancta confitetur Ecclesia A vós por toda a terra proclama a
Santa Igreja", assim cantamos no Te Deum), e com ela e nela
também nós somos impulsionados e levados a confessar: "Eu
creio", "nos cremos". É por intermédio da Igreja que
recebemos a fé e a vida nova no Cristo pelo batismo. No "Ritual
Romano", o ministro do batismo pergunta ao catecúmeno: "Que
pedes à Igreja de Deus?" E a resposta: "A fé." "E que
te dá a fé?" "A vida eterna."
(Parágrafo
relacionado: 1253)
- A salvação vem exclusivamente de Deus,
mas, por recebermos a vida de fé por meio da Igreja, esta última é nossa
mãe: "Nós cremos na Igreja como a mãe de nosso novo nascimento, e não
como se ela fosse a autora de nossa salvação". Por ser nossa mãe, a
Igreja é também a educadora de nossa fé.
(Parágrafos relacionados: 750,2030)
II. A linguagem da fé
- Não cremos em fórmulas, mas nas realidades
que elas expressam e que a fé nos permite "tocar". "O ato
(de fé) do crente não pára no enunciado, mas chega até a realidade
(enunciada). Todavia, temos acesso a essas realidades com o auxílio das
formulações da fé. Estas permitem expressar e transmitir a fé, celebrá-la
em comunidade, assimilá-la e vivê-la cada vez mais.
(Parágrafo
relacionado: 186)
- A Igreja, que é "a coluna e o
sustentáculo da verdade" (1 Tm 3,15), guarda fielmente a fé
uma vez por todas confiada aos santos. E ela que conserva a memória das
Palavras de Cristo, é ela. que transmite de geração em geração a confissão
de fé dos apóstolos. Como uma mãe que ensina seus filhos a falar e, com
isto, a, compreender e a comunicar, a Igreja, nossa Mãe, nos ensina a
linguagem da fé para introduzir-nos na compreensão e na vida da fé.
(Parágrafos relacionados: 78,84,857,185)
III. Uma única fé
- Há séculos, mediante tantas línguas,
culturas, povos e nações, a Igreja não cessa de confessar sua única fé,
recebida de só Senhor, transmitida por um único batismo, enraizada na
convicção de que todos os homens têm um só Deus e Pai, São Irineu de Lião,
testemunha desta fé, declara:
(Parágrafo
relacionado: 813)
- "Com efeito, a Igreja, embora
espalhada pelo mundo inteiro até os confins da terra, tendo recebido dos
apóstolos e dos discípulos deles a fé... guarda [esta pregação e esta fé]
com cuidado, como se habitasse em uma só casa; nelas crê de forma
idêntica, como se tivesse uma só alma; e prega as verdades de fé, as
ensina e transmite com voz unânime, como se possuísse uma só boca".
(Parágrafo
relacionado: 830)
- "Pois, se no mundo as línguas
diferem, o conteúdo da Tradição é uno e idêntico. E nem as Igrejas
estabelecidas na Germânia têm outra fé ou outra Tradição, nem as que estão
entre os iberos, nem as que estão entre os celtas, nem as do Oriente, do
Egito, da Líbia, nem as que estão estabelecidas no centro do
mundo..." "A mensagem da Igreja é, portanto, verídica e sólida,
pois é nela que um único caminho de salvação aparece no mundo
inteiro."
(Parágrafo
relacionado: 78)
- "Esta fé que recebemos da Igreja, nós
a guardamos com cuidado, pois sem cessar, sob a ação do Espírito de Deus,
à guisa de um depósito de grande preço encerrado em um vaso precioso, ela
rejuvenesce e faz rejuvenescer o próprio vaso que a contém."
RESUMINDO
- A fé é uma adesão pessoal do homem inteiro
a Deus que se revela. Ela inclui uma adesão da inteligência e da vontade à
Revelação que Deus fez de si mesmo por suas ações e palavras.
- Por conseguinte, "crer" tem uma
dupla referência: à pessoa e à verdade; à verdade, por confiança na pessoa
que a atesta.
- Não devemos crer em ninguém a não ser em
Deus, o Pai, o Filho e o Espírito Santo
- A fé é um dom sobrenatural de Deus. Para
crer, o homem tem necessidade dos auxílios interiores do Espírito Santo
- "Crer" e um
ato humano, consciente e livre, que corresponde à dignidade da pessoa
humana.
- "Crer" e um
ato eclesial. A fé da Igreja precede, gera, tenta e alimenta nossa fé. A Igreja é a mãe de todos os
crentes. "Ninguém pode ter a Deus por Pai, que não tenha Igreja por
mãe. "
- "Nós cremos em tudo o que está
contido na Palavra de Deus escrita ou transmitida, e que a Igreja propõe a
crer c divinamente revelado. "
- A fé é necessária à salvação. O próprio
Senhor afirma: "Aquele que crer e for batizado será salvo; aquele que
não crer será condenado" (Mc 16, 16).
- "A fé é um antegozo do conhecimento
que nos tornará bem-aventurados na vida futura".
O CREDO
Símbolo
dos Apóstolos
|
Símbolo
niceno-constantinopolitano
|
Creio em Deus
Pai Todo-Poderoso,
criador do céu e da terra.
|
Creio em um só Deus,
Pai Todo-Poderoso,
criador do céu e da terra,
de todas as coisas visíveis e invisíveis.
|
E em Jesus Cristo,
seu único Filho,
Nosso Senhor,
|
Creio em um só Senhor,
Jesus Cristo
Filho Unigênito de Deus,
nascido do Pai antes de todos os séculos Deus de Deus,
Luz da Luz,
Deus verdadeiro de Deus verdadeiro;
gerado, não criado,
consubstancial ao Pai.
Por ele todas as coisas foram feitas.
E por nós, homens, e para nossa salvação, desceu dos céus
|
que foi concebido pelo
poder do
espirito Santo,
nasceu da Virgem Maria,
padeceu sob Pôncio Pilatos,
foi crucificado, morto
e sepultado.
Desceu à mansão dos mortos,
Ressuscitou ao terceiro dia,
|
e se encarnou pelo
Espírito Santo,
no seio da Virgem Maria,
e se fez homem.
Também por nós foi crucificado sob
Pôncio Pilatos,
padeceu e foi sepultado.
Ressuscitou ao terceiro dia,
conforme as Escrituras,
|
subiu aos céus
está sentado à direita de Deus Pai
Todo-Poderoso,
donde há de vir a julgar os vivos e os mortos.
|
e subiu aos céus,
onde está sentado à direita do Pai.
E de novo há de vir, em sua glória,
para julgar os vivos e os mortos;
e o seu reino não terá fim.
|
Creio no Espírito Santo,
|
Creio no Espírito
Santo,
Senhor que dá a vida
e procede do Pai e do Filho;
e com o Pai e o Filho
é adorado e glorificado:
|
na Santa Igreja
católica,
na comunhão dos santos,
|
Ele que falou pelos
profetas.
Creio na Igreja,
una, santa, católica e apostólica.
|
na remissão dos
pecados,
na ressurreição da carne,
na vida eterna. Amém.
|
Professo um só batismo
para a remissão dos pecados.
E espero a ressurreição dos mortos
e a vida do mundo que há de vir.
Amém.
|
PRIMEIRA PARTE - SEGUNDA SEÇÃO
A PROFISSÃO DA FÉ CRISTÃ
OS SÍMBOLOS DA FÉ
- Quem diz creio diz "dou minha adesão
àquilo que não cremos". A comunhão na fé precisa de uma linguagem
comum da fé, normativa para todos e que una na mesma confissão de fé..
(Parágrafos
relacionados: 171,949)
- Desde a origem, a Igreja apostólica
exprimiu e transmitiu sua própria fé em fórmulas breves e normativas para
todos. Mas já muito cedo a Igreja quis também recolher o essencial de sua
fé em resumos orgânicos e articulados, destinados sobretudo aos candidatos
ao Batismo:
Esta
síntese da fé não foi elaborada segundo as opiniões humanas mas da Escritura
inteira recolheu-se o que existe de mais importante, para dar, na sua
totalidade, a única doutrina da fé. E assim com a semente de mostarda contém em
um pequeníssimo grão um grande número de ramos, da mesma forma este resumo da
fé encerra em algumas palavras todo o conhecimento da verdadeira piedade
contida no Antigo e no Novo Testamento.
- Estas sínteses da fé chamam-se
"profissões de fé", pois resumem a fé que os cristãos professam.
Chamam-se "Credo" em razão da primeira palavra com que
normalmente começam: "Creio". Denominam-se também "Símbolos
da fé".
- A palavra grega "symbolon"
significava a metade de um objeto quebrado (por exemplo, um sinete) que
era apresentada como sinal de reconhecimento. As partes quebradas eram
juntadas para se verificar a identidade do portador. O "símbolo da
fé" é, pois, um sinal de reconhecimento e de comunhão entre os
crentes. "Symbolon" passa em seguida a significar coletânea,
coleção ou sumário. O "símbolo da fé" é a coletânea das
principais verdades da fé. Daí o fato de ele servir como ponto de
referência primeiro e fundamental da catequese.
- A primeira "profissão de fé" é
feita por ocasião do Batismo. O "símbolo da fé" é inicialmente o
símbolo batismal. Uma vez que o Batismo é dado "em nome do Pai e do Filho
e do Espírito Santo" (Mt 28,19), as verdades de fé professadas por
ocasião do Batismo estão articuladas segundo sua referência às três
pessoas da Santíssima Trindade.
(Parágrafos
relacionados: 1237,232)
- O símbolo está, pois,
dividido em três partes: "Primeiro, fala-se da primeira Pessoa divina
e da obra admirável da criação; em seguida, da segunda Pessoa divina e do
Mistério da Redenção dos homens; finalmente, da terceira Pessoa divina,
fonte e princípio de nossa santificação". Esses são "os três capítulos
de nosso selo (batismal)".
- "Estas três partes são distintas,
embora interligadas. Segundo uma comparação usada com freqüência pelos
Padres, chamamo-las de artigos. Pois da mesma forma que em nossos membros
existem certas articulações que os distinguem e os separam, assim também
nesta profissão de fé, com acerto e razão, se deu o nome de artigos às
verdades em que devemos crer especificamente e de forma distinta".
Segundo uma antiga tradição, já atestada por Santo Ambrósio, também se
costuma contar doze artigos do Credo, simbolizando com o número dos
apóstolos o conjunto da fé apostólica.
- As profissões ou símbolos da fé têm sido
numerosos ao longo dos séculos e em resposta às necessidades das diversas
épocas: os símbolos das diferentes Igrejas apostólicas e antigas, o
Símbolo "Quicumque", dito de Santo Atanásio, as profissões de fé
de certos Concílios (Toledo; Latrão; Lião; Trento) ou de certos papas,
como a "Fides Damasi" (Profissão de Fé de São Dâmaso) ou o
"Credo do Povo de Deus" [SPF], de Paulo VI (1968).
- Nenhum dos símbolos das diferentes etapas
da vida da Igreja pode ser considerado ultrapassado e inútil. Eles nos
ajudam a viver e a aprofundar hoje a fé de sempre por meio dos diversos
resumos que dela têm sido feitos.
Entre
todos os símbolos da fé, dois ocupam um lugar particularíssimo na vida da
Igreja.
- O Símbolo dos Apóstolos, assim chamado por
ser, com razão considerado o resumo fiel da fé dos apóstolos. É o antigo
símbolo batismal da Igreja de Roma. Sua grande autoridade vem do seguinte
ato: "Ele é o símbolo guardado pela Igreja Romana, aquela onde Pedro,
o primeiro apóstolo, teve sua Sé e para onde ele trouxe comum expressão de
fé (sententia communis = opinião comum)".
- O Símbolo denominado
niceno-constantinopolitano tem sua grande autoridade no fato de ter
resultado dos dois primeiros Concílios ecumênicos (325 e 381). Ainda hoje
ele é comum a todas as grandes Igrejas do Oriente e do Ocidente."
(Parágrafos
relacionados: 242,245,465)
- Nossa exposição da fé seguirá o Símbolo
dos Apóstolos que constitui, por assim dizer, "o mais antigo
catecismo romano. Contudo, a exposição será completada por constantes
referências ao Símbolo niceno-constantinopolitano, muitas vezes mais
explícito e mais detalhado.
- Como no dia de nosso batismo, quando toda
a nossa vida foi confiada "a regra de doutrina" (Rm 6,17),
acolhamos Símbolo de nossa fé que da vida. Recitar com fé o Credo entrar
em comunhão com Deus Pai, Filho e Espírito Santo É também entrar em
comunhão com a Igreja inteira, que nos transmite a fé e no seio da qual
cremos:
(Parágrafos relacionados: 1064,1274)
Este Símbolo é o selo espiritual, a meditação do nosso
coração e o guardião sempre presente; ele é, seguramente, o tesouro da nossa
alma.
CAPÍTULO I - CREIO
EM DEUS PAI
- Nossa profissão de fé começa com Deus,
pois Deus é ô o Primeiro e o ultimo" (Is 44,6), o Começo e o Fim de
tudo. O Credo começa com Deus Pai, pois o Pai é a Primeira Pessoa Divina
da Santíssima Trindade; nosso Símbolo começa pela criação do céu e da
terra, porque a criação é o começo e o fundamento de todas as obras de
Deus.
ARTIGO 1
"CREIO EM DEUS
PAI TODO-PODEROSO,
CRIADOR DO CÉU E DA TERRA"
PARÁGRAFO 1 - CREIO EM DEUS
- "Creio em Deus": esta primeira
afirmação da profissão de fé é também a mais fundamental. O Símbolo
inteiro fala de Deus, e, se fala também do homem e do mundo, fá-lo pela
relação que eles têm com Deus. Os artigos do Credo dependem todos do
primeiro, da mesma forma que os mandamentos explicitam o primeiro deles.
Os demais artigos nos fazem conhecer melhor a Deus tal como se revelou
progressivamente aos homens. "Os fiéis fazem primeiro
profissão de crer em Deus".
(Parágrafo
relacionado: 2083)
I. "Creio em um só Deus"
- É com estas palavras que começa o Símbolo
niceno-constantinopolitano. A confissão da Unicidade de Deus, que tem sua
raiz na Revelação Divina da Antiga Aliança, é inseparável da confissão da
existência de Deus, e igualmente fundamental. Deus é único, só existe um
Deus. "A fé cristã confessa que há Um só Deus, por natureza, por
substância e por essência."
(Parágrafo
relacionado: 2085)
- A Israel, seu eleito, Deus revelou-se como
o Único: "Ouve, ó Israel: O Senhor nosso Deus é o único Senhor!
Portanto, amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua
alma e com toda a tua força" (Dt 6,4-5). Por meio dos profetas, Deus
chama Israel e todas as nações a se voltarem para Ele, Único:
"Voltai-vos para mim e sereis salvos, todos os confins da terra,
porque eu sou Deus e não há nenhum outro!... Com efeito diante de mim se
dobrar todo joelho, toda língua h de jurar por mim, dizendo: Só no Senhor
há justiça e força".
(Parágrafo
relacionado: 2083)
- Jesus mesmo confirma que Deus é "o
único Senhor" e que é preciso amá-lo de todo o coração, com toda a
alma, com todo o espírito e com todas as forças. Ao mesmo tempo, dá a
entender que ele mesmo é "o Senhor". Confessar que "Jesus é
Senhor" é o específico da fé cristã. Isso não contraria a fé em Deus
único. Crer no Espírito Santo "que é Senhor e dá a Vida" não
introduz nenhuma divisão no Deus único:
(Parágrafos relacionados: 446,152,42)
Cremos firmemente e afirmamos simplesmente que há um só verdadeiro Deus
eterno, imenso e imutável, incompreensível, Todo-Poderoso e inefável, Pai,
Filho e Espírito Santo: Três Pessoas, mas uma Essência, uma Substância ou
Natureza absolutamente simples.
II. Deus revela seu nome
- A seu povo, Israel, Deus
revelou-se, dando-lhe a conhecer o seu nome. O nome exprime a essência, a
identidade da pessoa e o sentido de sua vida. Deus tem um nome. Ele não é
uma força anônima. Desvendar
o próprio nome é dar-se conhecer aos outros; é, de certo modo, entregar-se
a si mesmo, tomando-se acessível, capaz de ser conhecido mais intimamente
e de ser chamado pessoalmente.
(Parágrafo
relacionado: 2143)
- Deus revelou-se
progressivamente a seu povo e com diversos nomes, mas é a revelação do
nome divino feita a Moisés na teofania da sarça ardente, pouco antes do
Êxodo e da Aliança do Sinai, que se tomou a revelação fundamental para a
Antiga e a Nova Aliança.
(Parágrafo
relacionado: 63)
O DEUS VIVO
- Deus chama Moisés do meio de uma sarça que
queima sem consumir-se. Ele diz a Moisés: "Eu sou o Deus de teu pai,
o Deus de Abra o, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó" (Ex 3,6).
Deus é o Deus dos pais, Aquele que havia guiado os patriarcas em suas peregrinações.
Ele é o Deus fiel e compassivo que se lembra deles e de suas próprias
promessas; vem para libertar seus descendentes da escravidão. Ele é o Deus
que, para além do espaço e do tempo, pode e quer fazê-lo, e que colocará
sua onipotência em ação a serviço desse projeto.
(Parágrafos relacionados: 2575,268)
"Eu sou AQUELE QUE É"
Moisés disse a Deus: "Quando eu for aos filhos de
Israel e disser: O Deus de vossos pais me enviou até vós", e me
perguntarem: "Qual é o seu nome?", que direi?" Disse Deus a
Moisés: "Eu sou AQUELE QUE É". Disse mais: "Assim dirás aos
filhos de Israel: "EU SOU me enviou até vós"... Este é o meu nome
para sempre, e esta ser a minha lembrança de geração em geração (Ex 3,13-15).
- Ao revelar seu nome misterioso de Iahweh,
"Eu sou AQUELE QUE É" ou "Eu Sou Aquele que SOU" ou
também "Eu sou Quem sou", Deus declara quem Ele é e com que nome
se deve chamá-lo. Este nome divino é misterioso como Deus é mistério. Ele
é ao mesmo tempo um nome revelado e como que a recusa de um nome, e é por
isso mesmo que exprime da melhor forma a realidade de Deus como ele é,
infinitamente acima de tudo o que podemos compreender ou dizer: ele é o
"Deus escondido" (Is 45,15), seu nome é inefável, e ele é o Deus
que se faz próximo dos homens.
(Parágrafo
relacionado: 43)
- Ao revelar seu nome, Deus, revela ao mesmo
tempo sua fidelidade, que é de sempre e para sempre, válida tanto para o
passado ("Eu sou o Deus de teus pais", Ex 3,6) como para o
futuro ("Eu estarei contigo", Ex 3,12). Deus, que revela seu nome
como "Eu sou", revela-se como o Deus que está sempre presente
junto a seu povo para salvá-lo.
- Diante da presença atraente e misteriosa
de Deus, o homem descobre sua pequenez. Diante da sarça ardente, Moisés
tira a sandálias e cobre o rosto em face da Santidade Divina. Diante da
glória de Deus três vezes santo, Isaias exclama: "Ai de mim estou
perdido! Com efeito, sou um homem de lábios impuros" (Is 6,5). Diante
dos sinais divinos que Jesus faz, Pedro exclama "Afasta-te de mim,
Senhor, porque sou um pecador" (Lc 5,8). Mas porque Deus é santo,
pode perdoar o homem que se descobre pecador diante dele: "Não
executarei o ardor da minha ira... porque sou Deus e não homem, eu sou
santo no meio de ti" (Os 11,9). O apóstolo João dirá: "Diante
dele tranqüilizaremos nosso coração, se nosso coração nos acusa, porque
Deus é maior do que nosso coração e conhece todas as coisas" (1Jo
3,19-20).
(Parágrafos
relacionados: 724,448,388)
- Por respeito à santidade de Deus, o povo
de Israel não pronuncia seu nome. Na leitura da Sagrada Escritura, o nome
revelado é substituído pelo título divino "Senhor"
("Adonai", em grego "Kýrios"). É com este título que
ser aclamada a divindade de Jesus: "Jesus é Senhor".
(Parágrafo relacionado: 446)
"DEUS DE TERNURA E DE COMPAIXÃO"
- Depois do pecado de Israel, que se desviou
de Deus para adorar o bezerro de ouro, Deus ouve a intercessão de Moisés e
aceita caminhar no meio de um povo infiel, manifestando, assim o seu amor.
A Moisés, que pede para ver sua glória, Deus responde: "Farei passar
diante de ti toda a minha beleza e diante de ti pronunciarei o nome de
Iahweh" (Ex 33,18-19). E o Senhor passa diante de Moisés e proclama:
"Iahweh, Iahweh, Deus de ternura e de compaixão, lento para a cólera
e rico em amor e fidelidade" (Ex 34,6). Moisés confessa então que o Senhor
é um Deus que perdoa.
(Parágrafos
relacionados: 2116,2577)
- O Nome divino "Eu sou" ou
"Ele é" exprime a fidelidade de Deus, que, apesar da
infidelidade do pecado dos homens e do castigo que ele merece,
"guarda seu amor a milhares" (Ex 34,7). Deus revela que é
"rico em misericórdia" (Ef 2,4), indo até o ponto de dar seu
próprio Filho. Ao dar sua vida para libertar-nos do pecado, Jesus revelará
que ele mesmo traz o Nome divino: "Quando tiverdes elevado o Filho do
Homem, então sabereis que "EU SOU" (Jo 8,28).
(Parágrafo
relacionado: 604)
SÓ DEUS É
- Ao longo dos séculos, a fé de Israel pôde
desenvolver e aprofundar as riquezas contidas na revelação do nome divino.
Deus é único, fora dele não há deuses. Transcende o mundo e a história.
Foi Ele quem fez o céu e a terra: "Eles perecem, mas tu permaneces;
todos ficam gastos como a roupa... mas tu existes, e teus anos jamais
findarão!" (S1102,27-28). Nele "não h mudança, nem sombra de
variação" (Tg 1,17). Ele é "AQUELE QUE É", desde sempre e
para sempre, e é assim que permanece sempre fiel a si mesmo e às suas
promessas.
(Parágrafos
relacionados: 42,469,2086)
- A revelação do nome inefável "EU SOU
AQUELE QUE SOU" contém, pois, a verdade de que só Deus é. E neste
sentido que a tradução dos Setenta e, na esteira deles, a Tradição da
Igreja compreenderam o nome divino: Deus é a plenitude do Ser e de toda
perfeição, sem origem e sem fim. Ao passo que o das as criaturas receberam
dele todo o seu ser e o seu ter, só ele é seu próprio ser, e é por si
mesmo tudo o que é.
(Parágrafo relacionado: 41)
III. Deus, "AQUELE QUE É", é Verdade e Amor
- Deus, "Aquele que é", revelou-se
a Israel como Aquele que e rico em amor e em fidelidade" (Ex 34,6).
Esses dois termos exprimem de forma condensada as riquezas do nome divino.
Em todas as suas obras Deus mostra sua benevolência, bondade, graça, amor,
mas também sua confiabilidade, constância, fidelidade, verdade.
"Celebro teu nome por teu amor e verdade" (Sl 138,2). Ele é a
Verdade, pois "Deus é Luz, nele não há trevas" (1Jo 1,5), e
"Amor", como ensina o apóstolo João (1Jo 4,8).
(Parágrafo relacionado: 1062)
DEUS É A VERDADE
- "O princípio de tua palavra é a
verdade, tuas normas são justiça para sempre" (Sl 119,160).
"Sim, Senhor Deus, és tu que és Deus, tuas palavras são verdade"
(2Sm 7,28); é por isso que as promessas de Deus sempre se realizam. Deus é
a própria Verdade, suas palavras não podem enganar. É por isso que podemos
entregar-nos com toda a confiança à verdade e à fidelidade de sua palavra
em todas as coisas. O começo do pecado e da queda do homem foi uma mentira
do tentador que induziu duvidar da palavra de Deus, de sua benevolência e
fidelidade.
(Parágrafos
relacionados: 2465,156,1063,397)
- A verdade de Deus é sua sabedoria que
comanda toda ordem da criação e do governo do mundo. Deus, que sozinho
criou o céu e a terra, e o único que pode dar o conhecimento verdadeiro de
toda coisa criada em sua relação com ele.
(Parágrafos
relacionados: 295,32)
- Deus é verdadeiro também quando se verela:
o ensinamento que vem de Deus é "uma doutrina de verdade" (Ml
2,6). Quando enviar seu Filho ao mundo, ser "para dar testemunho da
Verdade" (Jo 18,37): "Nós sabemos que veio o Filho de Deus e nos
deu a inteligência para conhecermos o Verdadeiro".
(Parágrafos
relacionados: 851,2466)
DEUS É AMOR
- Ao longo de sua história, Israel pôde
descobrir que Deus tinha uma única razão para revelar-se a ele e para
tê-lo escolhido dentre todos os povos para ser dele: seu amor gratuito. E
Israel entendeu, graças a seus profetas, que foi também por amor que Deus
não cessou de salvá-1o e de perdoar-lhe sua infidelidade e seus pecados.
(Parágrafo
relacionado: 295)
- O amor de Deus por Israel é comparado ao
amor de um pai por seu filho. Este amor é mais forte que o amor de uma mãe
por seus filhos. Deus ama seu Povo mais do que um esposo ama sua
bem-amada; este amor se sobrepor até às piores infidelidades; ir até a
mais preciosa doação: "Deus amou tanto o mundo, que entregou seu
Filho único" (Jo 3,16).
(Parágrafos
relacionados: 239,796,458)
- O amor de Deus é "eterno" (Is
54,8): "Os montes podem mudar de lugar e as colinas podem abalar-se,
mas o meu amor não mudará" (Is 54,10). "Eu te amei com um amor
eterno, por conservei por ti o amor" (Jr 31,3).
- Mas São João ir ainda mais longe ao
afirmar: "Deus é Amor" (1Jo 4,8.16); o próprio Ser de Deus é
Amor. Ao enviar, na plenitude dos tempos, seu Filho único e o Espírito de
Amor, Deus revela seu segredo mais íntimo: Ele mesmo é eternamente
intercâmbio de amor: Pai, Filho e Espírito Santo, e destinou-nos a
participar deste intercâmbio.
(Parágrafos relacionados: 733,851,257)
IV. O alcance da fé no Deus Único
- Crer em Deus, o Único, e amá-lo com todo o
próprio ser em conseqüências imensas para toda a nossa vida.
- Significa conhecer a grandeza e a
majestade de Deus.
"Deu, é grande demais para que o possamos conhecer" (Jó 36,26).
E por isso que Deus deve ser o "primeiro a ser servido".(Santa
Joana d’Arc, dictum).
(Parágrafo
relacionado: 400)
- Significa viver em ação de graças. Se Deus é o Único, tudo o que
somos e tudo o que possuímos vem dele: "Que é que possuis, que não
tenhas recebido?" (1Cor 4,7). "Como retribuirei ao Senhor todo o
bem que me fez?" (Sl 116,12).
(Parágrafo
relacionado: 2637)
- Significa conhecer a unidade e a
verdadeira dignidade de todos os homens. Todos eles são feitos "à imagem e à
semelhança de Deus" (Gn 1,27).
(Parágrafos
relacionados: 356,360,1700,1934)
- Significa usar corretamente das coisas
criadas. A
fé no Deus único nos leva a usar de tudo o que não é Ele, na medida em que
isso nos aproxima dele, e a desapegar-nos das coisas, na medida em que nos
desviam dele:
(Parágrafos relacionados: 339,242,2415)
Meu Senhor e meu Deus, tirai-me tudo o que me afasta
de vós.
Meu Senhor e meu Deus, dai-me tudo o que me aproxima de vós.
Meu Senhor e meu Deus, desprendei-me de mim mesmo pai
doar-me por inteiro a vós.
- Significa confiar em Deus em qualquer
circunstancia, mesmo na adversidade. Uma oração de Sta. Teresa de Jesus
(Poes. 9) exprime-o de maneira admirável:
(Parágrafos relacionados: 313,2090)
Nada te perturbe
Nada te assuste
Tudo passa
Deus não muda
A paciência tudo alcança
Quem a Deus tem
Nada lhe falta.
Só Deus basta
(Parágrafos relacionados: 2830,1723).
RESUMINDO
- "Ouve, ó Israel, o Senhor nosso Deus
é o Único Senhor...". (Dt 6,4; Mc 12,29). "É preciso
necessariamente que o supremo seja único, isto é, sem igual... Se
Deus não for único não é Deus"
- A fé em Deus leva-nos a nos voltar só para
Ele como nossa primeira origem e nosso fim último, e a nada preferir nem
substitui-lo por nada.
- Ao revelar-se, Deus permanece Mistério
inefável: "Se o compreendesses, ele não seria Deus ".
- O Deus de nossa fé revelou-se como Aquele
que é; deu-se a conhecer como "cheio de amor e fidelidade" (Ex
34,6). Seu próprio ser é Verdade e Amor.
PRIMEIRA PARTE - SEGUNDA SEÇÃO - A PROFISSÃO DA FÉ
CRISTÃ
OS SÍMBOLOS DA FÉ -
PARÁGRAFO 2 - O PAI
I. "Em nome do Pai, do Filho e do
Espírito Santo"
- Os cristãos são batizados "em nome do
Pai, do Filho e dó Espírito Santo" (Mt 28,19). Antes disso, eles
respondem "Creio" à tríplice pergunta que os manda confessar sua
fé no Pai, no Filho e no Espírito: "Fides omnium christianorum in
Trinitate consistit - A fé de todos os cristãos consiste na Trindade"
(Parágrafos
relacionados: 189,1223)
- Os cristãos são batizados "em
nome" do Pai e do Filho e do Espírito Santo, e não "nos
nomes" destes três, pois só existe um Deus, o Pai Todo-Poderoso, seu
Filho Único e o Espírito Santo: a Santíssima Trindade.
- O mistério da Santíssima É, portanto, a
fonte de todos os outros mistérios da fé, é a luz que os ilumina. É o
ensinamento mais fundamental e essencial na "hierarquia das verdades
de fé". "Toda a história da salvação não é senão a história da
via e dos meios pelos quais o Deus verdadeiro e Único, Pai, Filho e
Espírito Santo, se revela, reconcilia consigo e une a si os homens que se
afastam do pecado"
(Parágrafos
relacionados: 2157,90,1449)
- Neste parágrafo se exporá brevemente de
que modo é revelado o mistério da Santíssima Trindade (I), de que maneira
a Igreja formulou a doutrina da fé sobre este mistério (II), e,
finalmente, de que modo, mediante as missões divinas do Filho e do
Espírito Santo, Deus Pai realiza seu "desígnio benevolente" de
criação, de redenção e de santificação (III).
- Os Padres da Igreja distinguem entre a
"Theologia" e a "Oikonomia", designando com o primeiro
termo o mistério da vida íntima do Deus-Trindade e com o segundo todas as
obras de Deus por meio das quais ele se revela e comunica sua vida. E
mediante a "Oikonomia" que nos é revelada a "Theologia";
mas, inversamente, é a "Theologia" que ilumina toda a
"Oikonomia". As obras de Deus revelam quem Ele é em si mesmo e,
inversamente, o mistério de seu Ser íntimo ilumina a compreensão de todas
as suas obras. Acontece O mesmo, analogicamente, entre as pessoas humanas.
A pessoa mostra-se em seu agir e, quanto melhor conhecermos uma pessoa,
tanto melhor compreenderemos seu agir.
(Parágrafos
relacionados: 1066,259)
- A Trindade é um mistério de fé no sentido
estrito, um do "mistérios escondidos em Deus que não podem ser
conhecidos se não forem revelados do alto". Sem dúvida, Deus deixou
vestígios de seu ser trinitário em sua obra de Criação e em sua Revelação
ao longo do Antigo Testamento. Mas a intimidade de seu Ser como Santíssima
Trindade constitui um mistério inacessível à pura razão e até mesmo à fé
de Israel antes da Encarnação do Filho de Deus e da missão do Espírito
Santo
(Parágrafo relacionado: 50)
II. A revelação de Deus como Trindade
O PAI REVELADO PELO FILHO
- A invocação de Deus como "Pai" é
conhecida em muitas religiões. A divindade é muitas vezes considerada
"pai dos deuses e dos homens". Em Israel, Deus é chamado de Pai
enquanto Criador do mundo. Deus é Pai, mais ainda, em razão da
Aliança, e do dom da Lei a Israel, seu "filho primogênito" (Ex
4,22). E também chamado
de Pai do rei de Israel. Muito particularmente Ele é "o Pai dos
pobres", do órfão e da viúva que estão sob sua proteção de amor.
(Parágrafo
relacionado: 2443)
- Ao designar a Deus com o nome de
"Pai", a linguagem da fé indica principalmente dois aspectos:
que Deus é origem primeira de tudo autoridade transcendente, e que ao
mesmo tempo é bondade e solicitude de amor para todos os seus filhos. Esta
ternura paterna de Deus pode também ser expressa pela imagem da
maternidade, que indica mais imanência de Deus, a intimidade entre Deus e
sua criatura. A linguagem da fé inspira-se, assim, na experiência humana
dos pais (genitores), que são de certo modo os primeiros representantes de
Deus para o homem. Mas esta experiência humana ensina também que os pais
humanos são falíveis e que podem desfigurar o rosto da paternidade e da
maternidade. Convém então lembrar que Deus transcende a distinção humana
dos sexos. Ele não é nem homem nem mulher, é Deus. Transcende também a
paternidade e a maternidade humanas embora seja a sua origem e a medida:
ninguém é pai como Deus o é.
(Parágrafos
relacionados: 370,2779)
- Jesus revelou que Deus é
"Pai" num sentido inaudito: não o é somente enquanto Criador,
mas é eternamente Pai em relação a seu Filho único, que só é eternamente
Filho em relação a seu Pai: "Ninguém conhece o Filho senão o Pai, e
ninguém conhece O Pai senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser
revelar" (Mt 11,27).
(Parágrafos
relacionados: 2780,441-445)
- E por isso que Os apóstolos confessam
Jesus como "o Verbo" que "no início estava junto de
Deus" e que "é Deus" (Jo 1,1), como "a imagem do Deus
invisível" (Cl 1,15), como "o resplendor de sua glória e a
expressão do seu ser" (Hb 1,3).
- Na esteira deles, seguindo a Tradição
apostólica, a Igreja, no ano de 325, no primeiro Concílio Ecumênico de
Nicéia, confessou que o Filho é "consubstancial" ao Pai, isto é,
um só Deus com Ele. O segundo Concílio Ecumênico, reunido em
Constantinopla em 381, conservou esta expressão em sua formulação do Credo
de Nicéia e confessou "o Filho Único de Deus, gerado do Pai antes de
todos os séculos, luz de luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado,
não criado, consubstancial ao Pai"
(Parágrafo relacionado: 465)
O PAI E O FILHO REVELADOS PELO ESPÍRITO
- Antes de sua Páscoa, Jesus anuncia o envio
de "outro Paráclito" (Defensor), o Espírito Santo Em ação desde
a criação, depois de ter outrora "falado pelos profetas ele estar
agora junto dos discípulos e neles, a fim de ensiná-1os e conduzi-los
"a verdade inteira" (Jo 16,13). O Espírito Santo é assim
revelado como outra pessoa divina em relação a Jesus e ao Pai.
(Parágrafos
relacionados: 683,2780,687)
- A origem eterna do Espírito revela-se em
sua missão tem temporal. O Espírito Santo é enviado aos apóstolos e à
Igreja tanto pelo Pai, em nome do Filho, como pelo Filho em pessoa, depois
que este tiver voltado para junto do Pai. O envio da pessoa do Espírito
após a glorificação de Jesus revela em plenitude o mistério da Santíssima
Trindade.
(Parágrafo
relacionado: 732)
- A fé apostólica no tocante ao Espírito foi
confessada pelo segundo Concílio Ecumênico, em 381, em Constantinopla:
"Cremos no Espírito Santo, que é Senhor e que dá a vida; ele procede
do Pai". Com isso a Igreja reconhece o Pai como "a fonte e a
origem de toda a divindade". Mas a origem eterna do Espírito Santo
não deixa de estar vinculada à do Filho: "O Espírito Santo que é a
Terceira Pessoa da Trindade, é Deus, uno e igual ao Pai e ao Filho, da
mesma substância e também da mesma natureza....Contudo, não se diz que Ele
é somente o Espírito do Pai, mas ao mesmo tempo o Espírito do Pai e do
Filho". O Credo da Igreja do Concilio de Constantinopla, confessa:
"Com o Pai e o Filho ele recebe a mesma adoração e a mesma
glória"
(Parágrafos
relacionados: 152,685)
- A tradição latina do Credo confessa que o
Espírito "procede do Pai e do Filho (Filio que)". O Concílio de
Florença, em 1438, explicita: "O Espírito Santo tem sua essência e
seu ser subsistente ao mesmo tempo do Pai e do Filho e procede eternamente
de Ambos como de um só Princípio e por uma única expiração...E uma vez que
tudo O que é do Pai o Pai mesmo o deu ao seu Filho Único ao gerá-lo,
excetuado seu ser de Pai, esta própria processão do Espírito Santo a
partir do Filho, ele a tem eternamente de Seu Pai que o gerou eternamente".
- A afirmação do filioque não figurava no
símbolo professado em 381 em Constantinopla. Mas, com base em uma antiga
tradição latina e alexandrina, o papa São Leão o havia já confessado
dogmaticamente e em 447, antes que Roma conhecesse e recebesse, em 451, no
Concílio de Calcedônia, o símbolo de 381. O uso desta fórmula no Credo foi
sendo admitido pouco a pouco na liturgia latina (entre os séculos VIII e
XI). Todavia, a introdução do filioque no Símbolo
niceno-constantinopolitano pela liturgia latina constitui, ainda hoje, um
ponto de discórdia em relação ás Igrejas ortodoxas.
- A tradição oriental põe primeiramente em
relevo o caráter de origem primeira do Pai em relação ao Espírito. Ao
confessar o Espírito como "procedente do Pai" (Jo 15,26), ela
afirma que o Espírito procede do Pai pelo Filho. A tradição ocidental põe
primeiramente em relevo a comunhão consubstancial entre o Pai e o Filho,
afirmando que o Espírito procede do Pai e do Filho (Filioque). Ela o
afirma "de forma legítima e racional", pois a ordem eterna das
pessoas divinas em sua comunhão consubstancial implica não só que o Pai
seja a origem primeira do Espírito enquanto "princípio sem princípio,
mas também, enquanto Pai do Filho Único, que seja com ele "o único
princípio do qual procede o Espírito Santo". Esta legítima
complementaridade, se não for radicalizada, não afeta a identidade da fé
na realidade do mesmo mistério confessado.
III. A Santíssima Trindade na doutrina da
fé
A FORMAÇÃO DO DOGMA TRINITÁRIO
- A verdade revelada da Santíssima Trindade
esteve desde as origens na raiz da fé viva da Igreja, principalmente por
meio do Batismo. Ela encontra sua expressão na regra da fé batismal,
formulada na pregação, na catequese e na oração da Igreja. Tais
formulações encontram-se já nos escritos apostólicos, como na seguinte
saudação, retomada na liturgia eucarística: "A graça do Senhor Jesus
Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos
vós" (2Cor 13,13).
(Parágrafos
relacionados: 683,189)
- No decurso dos primeiros séculos, a Igreja
procurou formular mais explicitamente sua fé trinitária, tanto para
aprofundar sua própria compreensão da fé como para defendê-la de erros que
a estavam deformando. Isso foi obra dos Concílios antigos, ajudados pelo
trabalho teológico dos Padres da Igreja e apoiados pelo senso da fé do
povo cristão.
(Parágrafo
relacionado: 94)
- Para a formulação do dogma da Trindade, a
Igreja teve de desenvolver uma terminologia própria, recorrendo a noções
de origem filosófica: "substância", "pessoa" ou
"hipóstase", "relação" etc. Ao fazer isso, não
submeteu a fé a uma sabedoria humana, mas imprimiu um sentido novo,
inaudito, a esses termos, chamados a significar a partir daí também um
Mistério inefável, que "supera infinitamente tudo o que nó podemos
compreender dentro do limite humano".
(Parágrafo
relacionado: 170)
- A Igreja utiliza o termo
"substância" (traduzido também, às vezes, por
"essência" ou por "natureza") para designar ser divino
em sua unidade, o termo "pessoa" ou "hipóstase" para
designar o Pai, o Filho e o Espírito Santo em sua distinção real entre si,
e o termo "relação" para designar o fato de a distinção entre
eles residir na referência de uns aos outros.
DOGMA DA SANTÍSSIMA TRINDADE
- A Trindade é Una. Não professamos três
deuses, mas só Deus em três pessoas: "a Trindade
consubstancial". As pessoas divinas não dividem entre si a única
divindade, mas cada uma delas é Deus por inteiro: "O Pai é aquilo que
é o Filho, o Filho é aquilo que é o Pai, O Espírito Santo é aquilo que são
o Pai e o Filho, isto é, um só Deus por natureza". "Cada uma das
três pessoas é esta realidade, isto é, a substância, a essência ou a
natureza divina"
(Parágrafos
relacionados: 2789,590)
- As pessoas divinas são realmente distintas
entre si. "Deus é único, mas não solitário". "Pai",
"Filho", "Espírito Santo" não são simplesmente nomes
que designam modalidades do ser divino, pois são realmente distintos entre
si: "Aquele que é o Pai não é o Filho, e aquele que é o Filho não é o
Pai, nem o Espírito Santo é aquele que é o Pai ou o Filho". São
distintos entre si por suas relações de origem: "E o Pai que gera, o
Filho que é gerado, o Espírito Santo que procede".
(Parágrafos relacionados: 468,689)
A Unidade divina é Trina.
- As pessoas divinas são relativas umas às
outras. Por não dividir a unidade divina, a distinção real das pessoas
entre si reside unicamente nas relações que as referem umas às outras:
"Nos nomes relativos das pessoas, o Pai é referido ao Filho, o filho
ao Pai, o Espírito Santo aos dois; quando se fala destas três pessoas considerando
as relações, crê-se todavia em uma só natureza ou substância'. Pois
"tudo é uno [neles] l onde não se encontra a oposição de relação.
"Por causa desta unidade, o Pai está todo inteiro no Filho, todo
inteiro no Espírito Santo; o Filho está todo inteiro no Pai, todo inteiro
no Espírito Santo; o Espírito Santo, todo inteiro no Pai, todo inteiro no
Filho".
(Parágrafo
relacionado: 240)
- Aos Catecúmenos de Constantinopla, São
Gregório Nazianzeno, denominado também "o Teólogo", confia o
seguinte resumo da fé trinitária:
(Parágrafos relacionados: 236,684)
Antes de todas as coisas, conservai-me este bom
depósito, pelo qual vivo e combato, com o qual quero morrer, que me faz
suportar todos os males e desprezar todos os prazeres: refiro-me à profissão de
fé no Pai e no Filho e no Espírito Santo Eu vo-la confio hoje. É por ela que
daqui a pouco vou mergulhar-vos na água e vos tirar dela. Eu vo-la dou como
companheira e dona de toda a vossa vida. Dou-vos uma só Divindade e Poder, que
existe Una nos Três, e que contém os Três de maneira distinta. Divindade sem
diferença de substância ou de natureza, sem grau superior que eleve ou grau
inferior que rebaixe... A infinita conaturalidade é de três infinitos. Cada um
considerado em si mesmo é Deus todo inteiro... Deus os Três considerados
juntos. Nem comecei a pensar na Unidade, e a Trindade me banha em seu
esplendor. Nem comecei a pensar na Trindade, e a unidade toma conta de mim.
(Parágrafo relacionado: 84)
IV. As obras divinas e as missões trinitárias
- "O lux beata Trinitas etprincipalis
Unitas - à luz, Trindade bendita. O primordial Unidade"! Deus é
beatitude eterna, vida imortal, luz sem ocaso. Deus é amor: Pai, Filho e
Espírito Santo Livremente, Deus quer comunicar a glória de sua vida
bem-aventurada. Este é o "desígnio" de benevolência (Ef 1,9) que
ele concebeu desde antes da criação do mundo no seu Filho bem-amado
predestinando-nos à adoção filial neste" Ef 1,5), isto é, "a
reproduzir a imagem do seu Filho" (Rm 8,29) graças ao "Espírito
de adoção filial" (Rm 8,5). Esta decisão prévia é uma "graça
concedida antes de todos os séculos" (2Tm 1,9), proveniente
diretamente do amor trinitário. Ele se desdobra na obra da criação, em
toda história da salvação após a queda, nas missões do Filho e do Espírito,
prolongadas pela missão da Igreja.
(Parágrafos
relacionados: 221,758,292,850)
- Toda a economia divina é obra comum das
três pessoas divinas. Pois da mesma forma que a Trindade não tem senão uma
única e mesma natureza, assim também não tem senão uma única e mesma operação.
"O Pai, o Filho e o Espírito Santo não são três princípios das
criaturas, mas um só princípio". Contudo cada pessoa divina cumpre a
obra comum segundo sua propriedade pessoal. Assim a Igreja confessa, na
linha do Novo Testamento: "Um Deus e Pai do qual são todas as coisas,
um Senhor Jesus Cristo mediante o qual são todas as coisas, um Espírito
Santo em quem são todas as coisas". São sobretudo as missões divinas
da Encarnação do Filho e do dom do Espírito Santo que manifestam as
propriedades das pessoas divinas.
(Parágrafo
relacionado: 686)
- Obra ao mesmo tempo comum e pessoal, toda
a Economia divina dá a conhecer tanto a propriedade das pessoas divinas
como sua única natureza. Outrossim, toda a vida cristã é comunhão com cada
uma das pessoas divinas, sem de modo algum separá-las. Quem rende glória
ao Pai o faz pelo Filho no Espírito Santo; quem segue a Cristo, o faz
porque o Pai atrai e o Espírito o impulsiona.
(Parágrafos
relacionados: 236)
- O fim último de toda a Economia divina é a
entrada das criaturas na unidade perfeita da Santíssima Trindade. Mas
desde já somos chamados a ser habitados pela Santíssima Trindade: "Se
alguém me ama - diz o Senhor -, guardará a minha palavra, e meu Pai o
amará e viremos a ele, e faremos nele a nossa morada" (Jo 14,23):
(Parágrafos relacionados: 1050,1721,1997)
Ó
meu Deus, Trindade que adoro, ajudai-me a esquecer-me inteiramente para
firmar-me em Vós, imóvel e pacifica, como se a minha alma já estivesse na
eternidade: que nada consiga perturbar a minha paz nem fazer-me sair de Vós, ó
meu Imutável, mas que cada minuto me leve mais longe na profundidade do vosso
Mistério! Pacificai a minha alma! Fazei dela o vosso céu, vossa amada morada e
o lugar do vosso repouso. Que nela eu nunca vos deixe só, mas que eu esteja aí,
toda inteira, completamente vigilante na minha fé, toda adorante, toda entregue
à vossa ação criadora.
RESUMINDO
- O mistério da Santíssima Trindade é o
mistério central da fé e da vida cristã. Só Deus no-lo pode dar a
conhecer, revelado-se como Pai, Filho e Espírito Santo
- A Encarnação do Filho de Deus revela que
Deus é o Pai eterno, e que o Filho é consubstancial ao Pai, isto é, que
ele é no Pai e com o Pai o mesmo Deus único.
- A missão do Espírito Santo, enviado pelo
Pai em nome do Filho e pelo Filho "de junto do Pai" (Jo 15,26),
revela que o Espírito é com eles o mesmo Deus único. "Com o
Pai e o Filho é adorado e glorificado."
- "O Espírito Santo
procede do Pai enquanto fonte primeira e, pela doação eterna deste último
ao Filho, do Pai e do Filho em comunhão".
- Pela graça do Batismo
"em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo" (Mt 28,19) somos
chamados a compartilhar da vida da Santíssima Trindade, aqui na terra, na
obscuridade da fé, e para além da morte, na luz eterna.
- "Fides autem
catholica haec est, ut unum Deum in Trinitate, et Trinitatem in unitate
veneremur, neque confundentes personas, neque substantiam separantes: alia
enim est persona Patris, alia Filii, alia Spiritus Sancti; sed Patris et
Fuji et Spiritus Sancti est una divinitas, aequalis gloria, coaeterna
majestas – A fé católica é esta: que veneremos o único Deus na Trindade, e
a Trindade na unidade, não confundindo as pessoas, nem separando a
substância: pois uma é a pessoa do Pai, outra, a do Filho, outra, a do
Espírito Santo; mas uma só é a divindade do Pai, do Filho e do Espírito
Santo, igual a glória, co-eterna a majestade"
- Inseparáveis naquilo que são, da mesma
forma o são naquilo que fazem. Mas na única operação divina cada uma delas
manifesta o que lhe é próprio na Trindade, sobretudo nas missões divinas
da Encarnação do Filho e do dom do Espírito Santo.
PRIMEIRA PARTE -
SEGUNDA SEÇÃO - A PROFISSÃO DA FÉ CRISTÃ
OS SÍMBOLOS DA FÉ
PARÁGRAFO 3 - O TODO-PODEROSO
- De todos os atributos divinos, só a
onipotência de Deus é mencionada no Símbolo: confessá-la é de grande
importância para nossa vida. Nós cremos que ela é universal, pois Deus que
criou tudo, governa tudo e pode tudo, é também de amor, pois Deus é nosso
Pai; e é misteriosa, pois somente a fé pode discerni-la, quando (a
onipotência divina) "se manifesta na fraqueza" (2Cor 12,9).
(Parágrafo relacionado: 222)
"ELE FAZ TUDO O QUE QUER" (Sl 115,3)
- As Sagradas Escrituras professam
reiteradas vezes o poder universal de Deus. Ele é chamado "o Poderoso
de Jacó" (Gn 49,24; Is 1,24 e.o.), "o Senhor dos
exércitos", "o Forte, o Valente" (Sl 24,8-10). Se Deus é
Todo-Poderoso "no céu e na terra" (Sl 135,6), é porque os fez.
Por isso, nada lhe é impossível, e Ele dispõe à vontade de sua obra; Ele é
o Senhor do universo, cuja ordem estabeleceu, ordem esta que lhe permanece
inteiramente submissa e disponível; Ele é o Senhor da história: governa os
corações e os acontecimentos à vontade. "Teu grande poder está sempre
a teu serviço, e quem pode resistir à força de teu braço?" (Sb
11,21).
(Parágrafo relacionado:
303)
"TU TE COMPADECES DE TODOS, PORQUE TUDO PODES" (SB 11,23)
- Deus é o Pai Todo-Poderoso. Sua
paternidade e seu poder iluminam-se mutuamente. Com efeito, ele mostra sua
onipotência paternal pela maneira como cuida de nossas necessidades, pela
adoção filial que nos outorga ("Serei para vós um pai, e sereis para
mim filhos e filhas, diz o Senhor Todo-Poderoso": 2Cor 6,18), e
finalmente por sua misericórdia infinita, pois mostra seu poder no mais
alto grau, perdoando livremente os pecados.
(Parágrafos
relacionados: 2777,1441)
- A onipotência divina de modo algum é
arbitrária. "Em Deus o poder e a essência, a vontade e a
inteligência, a sabedoria e a justiça são uma só e mesma coisa, de sorte
que nada pode estar no poder divino que não possa estar na vontade justa
de Deus ou em sua inteligência sábia".
MISTÉRIO DA APARENTE IMPOTÊNCIA DE DEUS
- A fé em Deus Pai Todo-Poderoso pode ser
posta à prova pela experiência do mal e do sofrimento. Por vezes, Deus
pode parecer ausente e incapaz de impedir o mal. Ora, Deus Pai revelou sua
Onipotência da maneira mais misteriosa no rebaixamento voluntário e na
Ressurreição de seu Filho, pelos quais venceu o mal. Assim, Cristo
crucificado é "poder de Deus e sabedoria de Deus. Pois o que é
loucura de Deus é mais sábio do que os homens, e o que é fraqueza de Deus
é mais forte do que os homens" (1Cor 1,25). Foi na Ressurreição e na
exaltação de Cristo que o Pai "desdobrou o vigor de sua força" e
manifestou "que extraordinária grandeza reveste seu poder para nós,
os que cremos" (Ef 1,19-22).
(Parágrafos
relacionados: 309,412,609,648)
- Somente a fé pode aderir aos caminhos
misteriosos onipotência de Deus. Esta fé gloria-se de suas fraquezas a fim
de atrair sobre si o poder de Cristo, Desta fé, a Virgem Maria é o modelo
supremo, ela que acreditou que "nada impossível a Deus" (Lc
1,37) e que pôde engrandecer o Senhor. "O Todo-Poderoso fez grandes
coisas em meu favor, seu nome é Santo" (Lc 1,49).
(Parágrafo
relacionado: 148)
- "Por isso, nada é mais adequado para
consolidar nossa Fé e nossa esperança do que a convicção profundamente
gravada em nossas almas de que nada é impossível a Deus. Pois tudo o que
[o Credo] a seguir nos propor a crer - as maiores coisas, as mais
incompreensíveis, bem como as que mais ultrapassam as leis ordinárias da
natureza, desde que nossa: razão tenha pelo menos idéia da onipotência
divina, ela admitirá facilmente e sem qualquer hesitação".
(Parágrafos
relacionados: 1814,1817)
RESUMINDO
- Juntamente com Jó, o justo, nós
confessamos: "Reconheço que tudo podes e que nenhum dos teus
desígnios fica frustado" (Jó 42,2).
- Fiel ao testemunho da Escritura, a Igreja
dirige com freqüência sua prece ao "Deus Todo-Poderoso e eterno"
("omnipotens sempiterne Deus..."), crendo firmemente que
"nada é impossível a Deus" (Lc 1,37)
- Deus manifesta sua onipotência
convertendo-nos dos nossos pecados e restabelecendo-nos em sua amizade
pela graça ("Deus, qui omnipotentiam tuam parcendo maxime et
miserando manifestas... - O Deus, que manifestais o vosso poder sobretudo
na misericórdia.".
- Se não crermos que o amor de Deus é
Todo-Poderoso, como crer que o Pai pôde nos criar, o Filho, remir-nos, o
Espírito, santificar-nos?
PARÁGRAFO 4 - O CRIADOR
- "No princípio, Deus criou o céu e a
terra" (Gn 1,1). Com essas solenes palavras inicia-se a Sagrada
Escritura. O Símbolo da fé retoma estas palavras confessando Deus Pai
Todo-Poderoso como "O Criador do céu e da terra", "de todas
as coisas visíveis e invisíveis". Por isso, falaremos primeiro do
Criador, em seguida de sua criação e, finalmente, da queda no pecado, do
qual Jesus Cristo, o Filho de Deus, veio resgatar-nos.
- A criação é o fundamento de "todos os
desígnios salvíficos de Deus", "o começo da história da
salvação", que culmina em Cristo. Inversamente, o mistério de Cristo
é a luz decisiva sobre o mistério da criação; ele revela o fim em vista do
qual, "no princípio, Deus criou o céu e a terra" (Gn 1,1): desde
o início, Deus tinha em vista a glória da nova criação em Cristo.
(Parágrafos
relacionados: 268,1043)
- É por isso que as leituras
da Vigília Pascal, celebração da criação nova em Cristo, começam pelo
relato da criação; da mesma forma, na liturgia bizantina, o relato da
criação constitui sempre a primeira leitura das vigílias das grandes
festas do Senhor. Segundo
o testemunho dos antigos, a instrução dos catecúmenos para o batismo segue
o mesmo caminho.
(Parágrafo relacionado: 1095)
I. A catequese sobre a criação
- A catequese sobre a criação se reveste de
uma importância capital. Ela diz respeito aos próprios fundamentos da vida
humana e cristã, pois explicita a resposta da fé cristã à pergunta
elementar feita pelos homens de todas as épocas: "De onde
viemos?" "Para onde vamos?" "Qual é a nossa
origem?" "Qual é o nosso fim?" "De onde vem e para
onde vai tudo o que existe?" As duas questões, a da origem e a do
fim, são inseparáveis. São decisivas para o sentido e a orientação de
nossa vida e de nosso agir.
(Parágrafo
relacionado: 1730)
- A questão das origens do mundo e do homem
é objeto de numerosas pesquisas científicas que enriqueceram
magnificamente nossos conhecimentos sobre a idade e as dimensões do cosmo,
o devir das formas vivas, o aparecimento do homem. Essas descobertas nos
convidam a admirar tanto mais a grandeza do Criador, a render-lhe graças
por todas as suas obras, pela inteligência e pela sabedoria que dá aos
estudiosos e aos pesquisadores. Com Salomão, estes últimos podem dizer:
"Ele me deu um conhecimento infalível dos seres para entender a
estrutura do mundo, a atividade dos elementos... pois a Sabedoria, artífice
do mundo, mo ensinou" (Sb 7,17.22).
(Parágrafos
relacionados: 159,341)
- O grande interesse reservado a essas
pesquisas é fortemente estimulado por uma questão de outra ordem e que
ultrapassa o âmbito próprio das ciências naturais. Não se trata somente de
saber quando e como surgiu materialmente o cosmo, nem quando o homem
apareceu, mas, antes, de descobrir qual é o sentido de tal origem: se ela
é governada pelo acaso, um destino cego, uma necessidade anônima, ou por
um Ser transcendente, inteligente e bom, chamado Deus. E, se o mundo
provém da sabedoria e da bondade de Deus, por que existe o mal? De onde
vem? Quem é o responsável por ele? Haverá como libertar-se dele?
- Desde os inícios, a fé‚ cristã tem-se
confrontado com respostas diferentes da sua no que diz respeito à questão
das origens. Assim, encontram-se nas religiões e nas culturas antigas
numerosos mitos acerca das origens. Certos filósofos afirmaram que tudo‚ é
Deus, que o mundo é Deus, ou que o devir do mundo é o devir de Deus
(panteísmo); outros afirmaram que o mundo é uma emanação necessária de
Deus, emanação esta que deriva dessa fonte e volta a ela; outros ainda
afirmaram a existência de dois princípios eternos, o Bem e o Mal, a Luz e
as Trevas, em luta permanente entre si (dualismo, maniqueísmo); segundo
algumas dessas concepções, o mundo (pelo menos o mundo material) seria
mau, produto de uma queda, e portanto deve ser rejeitado ou superado
(gnose); outros admitem que o mundo tenha sido feito por Deus, mas à
maneira de um relojoeiro que, uma vez terminado o serviço, o teria
abandonado a si mesmo (deísmo); outros, finalmente, não aceitam nenhuma
origem transcendente do mundo, vendo neste o mero jogo de uma matéria que
teria existido sempre (materialismo). Todas essas tentativas dão prova da permanência
e da universalidade da questão das origens. Esta busca é própria do homem.
(Parágrafos
relacionados: 295,28)
- Sem dúvida, a inteligência humana já pode
encontrar uma resposta para a questão das origens. Com efeito, a
existência de Deus Criador pode ser conhecida com certeza por meio de suas
obras, graças à luz da razão humana, ainda que este conhecimento seja
muitas vezes obscurecido e desfigurado pelo erro. É por isso que a fé vem
confirmar e iluminar a razão na compreensão correta desta verdade:
"Foi pela fé que compreendemos que os mundos foram formados por uma
palavra de Deus. Por isso é que o mundo visível não tem sua origem em
coisas manifestas" (Hb 11,3).
(Parágrafos
relacionados: 32,37)
- A verdade da criação é tão importante para
toda a vida humana que Deus, em sua ternura, quis revelar a seu Povo tudo
o que é útil conhecer a este respeito. Para além do conhecimento natural
que todo homem pode ter do Criador, Deus revelou progressivamente a Israel
o mistério da criação. Ele, que escolheu os patriarcas, que fez Israel
sair do Egito e que, ao escolher Israel, o criou e o formou, se revela
como Aquele a quem pertencem todos os povos da terra, e a terra inteira,
como o único que "fez o céu e a terra" (Sl 115,15; 124,8;
134,3).
(Parágrafo relacionado:
107)
- Assim, a revelação da
criação é inseparável da revelação e da realização da Aliança de Deus, o
Único, com o seu Povo. A
criação é revelada como sendo o primeiro passo rumo a esta Aliança, como o
testemunho primeiro e universal do amor Todo-Poderoso de Deus. Além disso,
a verdade da criação se exprime com um vigor crescente na mensagem dos
profetas, na oração dos salmos e da liturgia, na reflexão da sabedoria do
Povo eleito.
(Parágrafos
relacionados: 280,2569)
- Entre todas as palavras da Sagrada
Escritura sobre a criação, os três primeiros capítulos do Gênesis ocupam
um lugar único. Do ponto de vista literário, esses textos podem ter
diversas fontes. Os autores inspirados puseram-nos no começo da Escritura,
de sorte que eles exprimem, em sua linguagem solene, as verdades da
criação, da origem e do fim desta em Deus, de sua ordem e de sua bondade,
da vocação do homem e finalmente do drama do pecado e da esperança da
salvação. Lidas à luz de Cristo, na unidade da Sagrada Escritura e na
Tradição viva da Igreja, essas palavras são a fonte principal para a
catequese dos Mistérios "princípio": criação, queda, promessa da
salvação.
(Parágrafos relacionados: 390,111)
II. A criação - obra da Santíssima Trindade
- "No princípio, Deus criou o céu e a
terra" (Gn 1,1). Três coisas são afirmadas nestas primeiras palavras
da Escritura: o Deus eterno pôs um começo a tudo o que existe fora dele.
Só ele é Criador (o verbo "criar" - em hebraico, ''bara'' sempre
tem como sujeito Deus). Tudo o que existe (expresso pela fórmula "o
céu e a terra") depende daquele que lhe dá o ser.
(Parágrafo
relacionado: 326)
- "No princípio era o
Verbo... e o Verbo era Deus... Tudo foi feito por ele, e sem ele nada foi
feito"(Jo 1,1-3). O
Novo Testamento revela que Deus criou tudo por meio do Verbo Eterno, seu
Filho bem-amado. Nele "foram criadas todas coisas, nos céus e na
terra... tudo foi criado por Ele e para Ele é antes de tudo e tudo nele
subsiste" (Cl 1,16-17). A fé da Igreja afirma outrossim a ação
criadora do Espírito Santo: Ele é o "doador de vida" "o
Espírito Criador" ("Veni, Creator Spiritus"), a "Fonte
de todo bem".
(Parágrafos
relacionados: 241,331,703)
- Insinuada no Antigo Testamento, revelada
na Nova Aliança, a ação criadora do Filho e do Espírito, inseparavelmente
una com a do Pai, é claramente afirmada pela regra de fé da Igreja:
"Só existe um Deus...: ele é o Pai, é Deus, é o Criador, é o Autor, é
o Ordenador. Ele fez todas as coisas por si mesmo, isto é, pelo seu Verbo
e Sabedoria", "pelo Filho e pelo Espírito", que são como
"suas mãos". A criação é a obra comum da Santíssima
Trindade.
(Parágrafos
relacionados: 699,257)
III. "O mundo foi criado para a glória de Deus"
- Eis uma verdade fundamental que a
Escritura e a Tradição não cessam de ensinar e de celebrar: "O mundo
foi criado para a glória de Deus". Deus criou todas as coisas,
explica São Boaventura, "non propter gloriam augendam, sed propter
gloriam manifestandam et propter gloriam suam communicandam - não para
aumentar a [sua] glória, mas para manifestar a glória e para comunicar a
sua glória". Pois Deus não tem outra razão para criar a não ser seu
amor e sua bondade: "Aperta manu clave amoris creaturae prodierunt -
Aberta a mão pela chave do amor, as criaturas surgiram". E o
Concílio Vaticano I explica:
(Parágrafos
relacionados: 337,344,1361)
Este único e verdadeiro Deus, por sua bondade e por
sua "virtude onipotente", não para aumentar sua felicidade nem para
adquirir sua perfeição, mas para manifestar essa perfeição por meio dos bens
que prodigaliza às criaturas, com vontade plenamente livre, criou
simultaneamente no início do tempo ambas as criaturas do nada: a espiritual e a
corporal.
(Parágrafo
relacionado: 759)
- A glória de Deus consiste em que se
realize esta manifesta o e esta comunicação de sua bondade em vista
das quais o mundo foi criado. Fazer de nós "filhos adotivos por Jesus
Cristo: conforme o beneplácito de sua vontade para louvor à glória da sua
graça" (Ef 1,5-6): "Pois a glória de Deus é o homem vivo, e a
vida do homem é a visão de Deus: se já a revelação de Deus por meio da
criação proporcionou a vida a todos os seres que vivem na terra, quanto
mais a manifestação do Pai pelo Verbo proporciona a vida àqueles que vêem
a Deus". O fim último da criação é que Deus, "Criador do
universo, tornar-se-á "tudo em todas as coisas' (1Cor 15,28),
procurando, ao mesmo tempo, a sua glória e a nossa felicidade".
(Parágrafos relacionados: 2809,1722,1992)
IV. O mistério da criação
DEUS CRIA POR SABEDORIA E POR AMOR
- Cremos que Deus criou o mundo segundo sua
sabedoria. O mundo não é o produto de uma necessidade qualquer, de um
destino cego ou do acaso. Cremos que o mundo procede da vontade livre de
Deus, que quis fazer as criaturas participarem de seu ser, de sua
sabedoria e de sua bondade: "Pois tu criaste todas as coisas; por tua
vontade é que elas existiam e foram criadas". (Ap 4,11). "Quão
numerosas são as tuas obras, Senhor, e todas fizeste com sabedoria!"
(Sl 104,24). "O Senhor é bom para todos, compassivo com todas as suas
obras" (Sl 145,9).
(Parágrafos relacionados: 216,1951)
DEUS CRIA "DO NADA"
- Cremos que Deus não precisa de nada
preexistente nem de nenhuma ajuda para criar. A criação também não
é uma emanação necessária da substância divina. Deus cria livremente
"do nada":
(Parágrafo
relacionado: 285)
Que haveria de extraordinário se Deus tivesse tirado o
mundo de uma matéria preexistente? Um artífice humano, quando se lhe dá um
material, faz dele tudo o que quiser. Ao passo que o poder de Deus se mostra
precisamente quando parte do nada para fazer tudo o que quer.
- A fé na criação a partir "do
nada" é atestada na Escritura como uma verdade cheia de promessa e de
esperança. Assim a mãe dos sete filhos os encoraja ao martírio:
Não sei como é que viestes a aparecer no meu seio, nem
fui eu que vos dei o espírito e a vida, nem também fui eu que dispus
organicamente os elementos de cada um de vós. Por conseguinte, foi o Criador do
mundo que formou o homem em seu nascimento e deu origem a todas as coisas, quem
vos retribuirá, na sua misericórdia, o espírito e a vida, uma vez que agora
fazeis pouco caso de vós mesmos, por amor às leis dele... Eu te suplico, meu
filho, contempla o céu e a terra e observa tudo o que neles existe. Reconhece
que não foi de coisas existentes que Deus os fez, e que também o gênero humano
surgiu da mesma forma (2Mc 7,22-23.28).
(Parágrafo
relacionado: 338)
- Uma vez que Deus pôde criar do nada, pode,
pelo Espírito Santo, dar a vida da alma a pecadores, criando neles um
coração puro, e a vida do corpo aos falecidos, pela ressurreição, Ele, "que
faz viver os mortos e chama à existência as coisas que não existem"
(Rm 4,17). E uma vez que, pela sua Palavra, pôde fazer resplandecer a luz
a partir das trevas, pode também dar a luz da fé àqueles que a
desconhecem.
(Parágrafos relacionados: 1375,992)
DEUS CRIA UM MUNDO ORDENADO E BOM
- Já que Deus cria com sabedoria, a criação
é ordenada: "Tu dispuseste tudo com medida número e peso" (Sb
11,20). Feita no e por meio do Verbo eterno, "imagem do Deus
invisível" (Cl 1,15), a criação está destinada, dirigida ao homem,
imagem de Deus, chamado a uma relação pessoal com Ele. Nossa inteligência,
que participa da luz do Intelecto divino, pode entender o que Deus nos diz
por sua criação, sem dúvida não sem grande esforço e num espírito de
humildade e de respeito diante do Criador e de sua obra. Originada da
bondade divina, a criação participa desta bondade: "E Deus viu que
isto era bom... muito bom" (Gn 1,4.10.12.18.21.31). Pois a criação é
querida por Deus como um dom dirigido ao homem, como uma herança que lhe é
destinada e confiada. Repetidas vezes a Igreja teve de defender a bondade
da criação, inclusive do mundo material.
(Parágrafos relacionados: 339,41,1147,358,2415)
DEUS TRANSCENDE A CRIAÇÃO E ESTÁ PRESENTE NELA
- Deus é infinitamente maior que todas as suas
obras: "Sua majestade é mais alta do que os céus" (Sl 8,2),
"é incalculável a sua grandeza" (S1 145,3). Mas, por ser o
Criador soberano e livre, causa primeira de tudo o que existe, Ele está
presente no mais íntimo das suas criaturas: "Nele vivemos, nos
movemos e existimos" (At 17,28). Segundo as palavras Santo Agostinho,
ele é "superior summo meo et interior intimo meo - maior do que o que
há de maior em mim e íntimo do que o que há de mais íntimo em mim".
(Parágrafos relacionados: 42,223)
DEUS MANTÉM E SUSTENTA A CRIAÇÃO
- Com a criação, Deus não abandona sua
criatura a ela mesma. Não somente lhe dá o ser e a existência, mas também
a sustenta a todo instante no ser, dá-lhe o dom de agir e a conduz a seu
termo. Reconhecer esta dependência completa em relação ao Criador é uma
fonte de sabedoria e liberdade, alegria e confiança:
(Parágrafos relacionados: 1951,396)
Sim, tu amas tudo o que criaste, não te aborreces com
nada do que fizeste; se alguma coisa tivesses odiado, não a terias feito. E
como poderia subsistir alguma coisa se não a tivesses querido? Como conservaria
a sua existência se não a tivesses chamado? Mas a todos perdoas, porque são
teus: Senhor, amigo da vida! (Sb
11,24-26)
V. Deus realiza o seu projeto: a divina
providência
- A criação tem sua bondade e sua perfeição
próprias, mas não saiu completamente acabada das mãos do Criador. Ela é
criada "em estado de caminhada" ("in statu viae") para
uma perfeição última a ser ainda atingida, para a qual Deus a destinou.
Chamamos de divina providência as disposições pelas quais Deus conduz sua
criação para esta perfeição:
Deus
conserva e governa com sua providência tudo o que criou; ela se estende
"com vigor de um extremo ao outro e governa o universo com suavidade"
(Sb 8,1). Pois "tudo está nu e descoberto aos seus olhos" (Hb 4,13),
mesmo os atos dependentes da ação livre das criaturas.
- O testemunho da Escritura é unânime: a
solicitude da divina providência é concreta e direta, toma cuidado de
tudo, desde as mínimas coisas até os grandes acontecimentos do mundo e da
história. Com vigor, os livros sagrados afirmam a soberania absoluta de
Deus no curso dos acontecimentos: "O nosso Deus está no céu e faz
tudo o que deseja" (S1 115,3); e de Cristo se diz: "O que abre e
ninguém mais fecha, e, fechando, ninguém mais abre" (Ap 3,7).
"Muitos são os projetos do coração humano, mas é o desígnio do Senhor
que permanece firme" (Pr 19,21).
(Parágrafo
relacionado: 269)
- Assim vemos o Espírito Santo, autor
principal da Escritura, atribuir muitas vezes ações a Deus, sem mencionar
causas segundas. Esta não é uma "maneira de falar" primitiva,
mas uma forma profunda de lembrar o primado de Deus e o seu senhorio
absoluto sobre a história e o mundo e de assim educar para a confiança
nele. A oração dos Salmos é a grande escola desta confiança.
(Parágrafo
relacionado: 2568)
- Jesus pede uma entrega filial à
providência do Pai Celeste, que cuida das mínimas necessidades de seus
filhos: "Por isso, não andeis preocupados, dizendo: Que iremos comer?
Ou, que iremos beber?... Vosso Pai celeste sabe que tendes necessidade de
todas essas coisas. Buscai, em primeiro lugar, o Reino de Deus sua
justiça, e todas essas coisas vos serão acrescentadas" (Mt 6,31-33).
(Parágrafo relacionado: 2115)
A PROVIDÊNCIA E AS CAUSAS SEGUNDAS
- Deus é o Senhor soberano de seus
desígnios. Mas, para a realização dos mesmos, serve-se também do concurso
das criaturas. Isso não é um sinal de fraqueza, mas da grandeza e da
bondade do Deus Todo-Poderoso. Pois Deus não somente dá às suas criaturas
o existir, mas também a dignidade de agirem elas mesmas, de serem causas e
princípios umas das outras e de assim cooperarem no cumprimento de seu
desígnio.
(Parágrafos
relacionados: 1884,1951)
- Aos homens, Deus concede até de poderem
participar livremente de sua providência, confiando-lhes a
responsabilidade de "submeter" a terra e de dominá-la. Deus
concede assim aos homens serem causas inteligentes e livres para completar
a obra da Criação, aperfeiçoar sua harmonia para o bem deles e de seus
próximos. Cooperadores muitas vezes inconscientes da vontade divina, os
homens podem entrar deliberadamente no plano divino, por suas ações, por
suas orações, mas também por seus sofrimentos. Tornam-se então plenamente
"cooperadores de Deus" (1Cor 3,9) e do seu Reino.
(Parágrafos relacionados:
106,373,1954,2427,2738,618,1505)
- Eis uma verdade inseparável da fé em Deus
Criador: Deus age em todo o agir de suas criaturas. E é a causa primeira
que opera nas causas segundas e por meio delas: "Pois é Deus quem
opera em vós o querer e o operar, segundo a sua vontade" (Fl 2,13).
Longe de diminuir a 4ignidade da criatura, esta verdade a realça. Tirada
do nada pelo poder, sabedoria, bondade de Deus, a criatura não pode nada
se for cortada de sua origem, pois "a criatura sem o Criador se
esvai"; muito menos pode atingir seu fim último sem a ajuda da graça.
(Parágrafo relacionado: 970)
A PROVIDÊNCIA E O ESCÂNDALO DO MAL
- Se Deus Pai Todo-Poderoso, Criador do
mundo ordenado e bom, cuida de todas as suas criaturas, por que então o
mal existe? Para esta pergunta tão premente quão inevitável, tão dolorosa
quanto misteriosa, não h uma resposta rápida. É o conjunto da fé cristã
que constitui a resposta a esta pergunta: a bondade da criação, o drama do
pecado, o amor paciente de Deus que se antecipa ao homem por suas
Alianças, pela Encarnação redentora de seu Filho, pelo dom do Espírito,
pelo congraçamento da Igreja, pela força dos sacramentos, pelo chamado a
uma vida bem-aventurada à qual as criaturas livres são convidadas
antecipadamente a assentir, mas da qual podem, por um terrível mistério,
abrir mão também antecipadamente. Não há nenhum elemento da
mensagem cristã que não seja, por uma parte, uma resposta à questão do
mal.
(Parágrafos
relacionados: 164,385,2805)
- Mas por que Deus não criou um mundo tão
perfeito que nele não possa existir mal algum? Segundo seu poder infinito,
Deus sempre poderia criar algo melhor. Todavia, em sua sabedoria e bondade
infinitas, Deus quis livremente criar um mundo "em estado de
caminhada" para sua perfeição última. Este devir permite, no desígnio
de Deus, juntamente com o aparecimento de determinados seres, também o
desaparecimento de outros, juntamente com o mais perfeito, também o menos
imperfeito, juntamente com as construções da natureza, também as
destruições. Juntamente com o bem físico existe, portanto, o mal físico,
enquanto a criação não houver atingido sua perfeição.
(Parágrafos
relacionados: 412,1042,105,342)
- Os anjos e os homens, criaturas
inteligentes e livres, devem caminhar para seu destino último por opção
livre e amor preferencial. Podem, no entanto, desviar-se. E, de fato,
pecaram. Foi assim que o mal moral entrou no mundo, incomensuravelmente
mais grave do que o mal físico. Deus não é de modo algum, nem direta nem
indiretamente, a causa do mal moral. Todavia, permite-o, respeitando a
liberdade de sua criatura e, misteriosamente, sabe auferir dele o bem:
(Parágrafos relacionados: 396,1849)
Pois o Deus Todo-Poderoso..., por ser soberanamente
bom, nunca deixaria qualquer mal existir em suas obras se não fosse bastante
poderoso e bom para fazer resultar o bem do próprio ma1.
- Assim, com o passar do tempo, pode-se
descobrir que Deus, em sua providência todo-poderosa, pode extrair um bem
das conseqüências de um mal, mesmo moral, causado por suas criaturas:
"Não fostes vós, diz José a seus irmãos, que me enviastes para cá,
foi Deus; - o mal que tínheis a intenção de fazer-me, o desígnio de Deus o
mudou em bem a fim de - salvar a vida de um povo numeroso" (Gn 45,8;
50,20). Do maior mal moral jamais cometido, a saber, a rejeição e
homicídio do Filho de Deus, causado pelos pecados de todos os homens,
Deus, pela superabundância de sua graça, tirou o maior dos bens: a
glorificação de Cristo e a nossa Redenção. Com isso, porém, o mal
não se converte em um bem.
(Parágrafos
relacionados: 598-600,1994)
- "Sabemos que, para os que amam a
Deus, tudo concorre para o bem" (Rm 8,28). O testemunho dos santos
não cessa de confirmar esta verdade.
Assim,
Sta. Catarina de Sena diz "àqueles que se escandalizam e se revoltam com o
que lhes acontece": "Tudo procede do amor tudo está ordenado à
salvação do homem, Deus não faz nada que não seja para esta finalidade"
(Parágrafo relacionado: 227)
E Santo Tomás More, pouco antes de seu martírio,
consola sua filha: "Não pode acontecer nada que Deus não tenha querido.
Ora, tudo o que ele quer, por pior que possa parecer-nos, é o que há de melhor
para nós"
E Lady Juliana de Norwich: "Aprendi, portanto,
pela graça de Deus, que era preciso apegar-me com firmeza à fé e crer com não
menor firmeza que todas as coisas irão bem.... "Tu mesmo verás que
qualquer tipo de circunstância servirá para o bem" - Thou shalt see
thyself that all MANNER of thing shall be well"
- Cremos firmemente que Deus é o Senhor do
mundo e da história. Mas os caminhos de sua providência muitas vezes nos
são desconhecidos. Só no final, quando acabar o nosso conhecimento
parcial, quando virmos Deus "face a face" (1 Cor 13,12), teremos
pleno conhecimento dos caminhos pelos quais, mesmo por meio dos dramas do
mal e do pecado, Deus terá conduzido sua criação até o descanso desse
Sábado definitivo, em vista do qual criou o céu e a terra.
(Parágrafos
relacionados: 1040,227,2550)
RESUMINDO
- Na criação do mundo e dos homens, Deus
colocou o primeiro e universal testemunho de seu amor Todo-Poderoso e de
sua sabedoria, o primeiro anúncio de seu "desígnio benevolente",
o qual encontra sua meta na nova criação em Cristo.
- Embora a obra da criação seja
particularmente atribuída ao Pai, é igualmente verdade de fé que o Pai, o
Filho e o Espírito Santo são o único e indivisível princípio da criação.
- Só Deus criou o
universo, livremente, diretamente, sem nenhuma ajuda.
- Nenhuma criatura tem o poder infinito que
é necessário para "criar" no sentido próprio da palavra, isto é,
produzir e dar o ser àquilo que não o tinha de modo algum (chamar à
existência "ex nihilo" "do nada").
- Deus criou o mundo para manifestar e para
comunicar sua glória. Que suas criaturas participem de sua verdade, de sua
bondade e de sua beleza, é a glória para a qual Deus as criou.
- Deus, que criou o universo o mantém na
existência por seu Verbo, "este Filho que sustenta o universo com o
poder de sua palavra" (Hb 1,3) e pelo seu Espírito Criador que dá a
vida.
- A Divina Providência são as disposições
pelas quais Deus conduz com sabedoria e amor todas as criaturas até seu
fim último.
- Cristo convida-nos à entrega filial à
Providência de nosso Pai celeste, e o Apóstolo São Pedro lembra:
"Lançai sobre ele toda a vossa preocupação porque é ele que cuida de
vós".
- A Providência divina age também por meio
da ação das criaturas. Aos seres humanos Deus concede cooperar livremente
para seus desígnios.
- A permissão divina do mal físico e do mal
moral é um mistério que Deus ilumina por seu Filho, Jesus Cristo, morto e
ressuscitado para vencer o mal. A fé nos dá a certeza de que Deus não
permitiria o mal se do próprio mal não tirasse o bem, por caminhos que só
conheceremos plenamente na vida eterna.
PRIMEIRA PARTE -
SEGUNDA SEÇÃO - A PROFISSÃO DA FÉ CRISTÃ
OS SÍMBOLOS DA FÉ
PARÁGRAFO 5 - O CÉU E A TERRA
- O Símbolo dos Apóstolos
professa que Deus é "o Criador do céu e da terra", e o Símbolo
niceno-constantinopolitano explicita: "... do universo visível e
invisível"
- Na Sagrada Escritura, a expressão
"céu e terra" significa tudo aquilo que existe, a criação
inteira. Indica também o nexo no interior da criação, que ao mesmo tempo
une e distingue céu e terra: "a terra" e o mundo dos homens;
"o céu" ou "os céus" pode designar o firmamento, mas
também o "lugar" próprio de Deus: "nosso Pai nos céus"
(Mt 5,16) e, por conseguinte, também o "céu" que e a glória
escatológica. Finalmente, a palavra "céu" indica o
"lugar" das criaturas espirituais - os anjos - que estão ao
redor de Deus.
(Parágrafos
relacionados: 290,1023,2794)
- A profissão de fé do IV Concilio de Latrão
afirma que Deus "criou conjuntamente, do nada, desde o início do
tempo, ambas as criaturas, a espiritual e a corporal, isto é, os anjos e o
mundo terrestre; em seguida, a criatura humana, que tem algo de ambas, por
compor-se de espírito e de corpo"
(Parágrafo relacionado: 296)
I. Os anjos
A EXISTÊNCIA DOS ANJOS - UMA VERDADE DE FÉ
- A existência dos seres espirituais,
não-corporais, que Sagrada Escritura chama habitualmente de anjos, é uma
verdade de fé. O testemunho da Escritura a respeito é tão claro
quanto a unanimidade da Tradição.
(Parágrafo
relacionado: 150)
QUEM SÃO OS ANJOS?
- Santo Agostinho diz a
respeito deles: "Angelus officii nomen est, non naturae. Quaeris
nomen huius naturae, spiritus est; quaeris officium, angelus est; quaeris officium,
angelus est, ex eo quod est, spiritus est, ex eo quod agit, angelus - Anjo
(mensageiro) é designação de encargo, não de natureza. Se perguntares pela designação da
natureza, é um espírito; se perguntares pelo encargo, é um anjo: é
espírito por aquilo que é, é anjo por aquilo que faz". Por todo o seu
ser, os anjos são servidores e mensageiros de Deus. Porque contemplam
"constantemente a face de meu Pai que está nos céus" (Mt 18,10),
são "poderosos executores de sua palavra, obedientes ao som de sua
palavra" (Sl 103,20).
- Como criaturas puramente espirituais, são
dotados de inteligência e de vontade: são criaturas pessoais e imortais.
Superam em perfeição todas as criaturas visíveis. Disto dá testemunho o
fulgor de sua glória.
CRISTO "COM TODOS OS SEUS ANJOS"
- Cristo é o centro do mundo angélico. São
seus os anjos: "Quando o Filho do homem vier em sua glória com todos
os seus anjos..." (Mt 25,31). São seus porque foram criados por e
para Ele: "Pois foi nele que foram criadas todas as coisas, nos céus e
na terra, as visíveis e as invisíveis: Tronos, Dominações, Principados,
Potestades; tudo foi criado por Ele e para Ele" (Cl 1,16). São seus,
mais ainda, porque Ele os fez mensageiros de seu projeto de salvação.
"Porventura não são todos eles espíritos servidores, enviados ao
serviço dos que devem herdar a salvação?" (Hb 1,14).
(Parágrafo
relacionado: 291)
- Eles aí estão, desde a criação e ao longo
de toda a História da Salvação, anunciando de longe ou de perto esta
salvação e servindo ao desígnio divino de sua realização: fecham o paraíso
terrestre, protegem Lot, salvam Agar e seu fi1ho, seguram a mão de Abraão,
comunicam a lei por seu ministério, conduzem o povo de Deus, anunciam
nascimentos e vocações, assistem os profetas, para citarmos apenas alguns
exemplos. Finalmente, é o anjo Gabriel que anuncia o nascimento do
Precursor e o do próprio Jesus.
- Desde a Encarnação até a Ascensão, a vida
do Verbo Encarnado é cercada da adoração e do serviço dos anjos. Quando
Deus "introduziu o Primogênito no mundo, disse: - Adorem-no todos os
anjos de Deus- " (Hb 1,6). O canto de louvor deles ao nascimento de
Cristo não cessou de ressoar no louvor da Igreja: "Glória a
Deus..." (Lc 2,14). Protegem a infância de Jesus, servem a Jesus no
deserto, reconfortam-no na agonia, embora tivesse podido ser salvo por
eles da mão dos inimigos, como outrora fora Israel. São ainda os anjos que
"evangelizam", anunciando a Boa Nova da Encarnação e da
Ressurreição de Cristo. Estarão presentes no retorno de Cristo, que eles
anunciam serviço do juízo que o próprio Cristo pronunciará.
(Parágrafo relacionado: 559)
OS ANJOS NA VIDA DA IGREJA
- Do mesmo modo, a vida da Igreja se
beneficia da ajuda misteriosa e poderosa dos anjos.
- Em sua Liturgia, a Igreja se associa aos
anjos para adora o Deus três vezes Santo; ela invoca a sua assistência
(assim em In Paradisum deducant te Angeli... - Para o Paraíso te levem os
anjos, da Liturgia dos defuntos, ou ainda no "hino querubínico"
da Liturgia bizantina). Além disso, festeja mais particularmente a memória
de certos anjos (São Miguel, São Gabriel, São Rafael, os anjos da guarda).
(Parágrafo
relacionado: 1138)
- Desde o início até a morte, a vida humana
é cercada por sua proteção e por sua intercessão. "Cada fiel é
ladeado por um anjo como protetor e pastor para conduzi-lo à vida."
Ainda aqui na terra, a vida cristã participa na fé da sociedade
bem-aventurada dos anjos e dos homens, unidos em Deus.
(Parágrafo relacionado: 1020)
II. O mundo visível
- Foi Deus mesmo quem criou o mundo visível
em toda a sua riqueza, diversidade e ordem. A Escritura apresenta a obra
do Criador simbolicamente como uma seqüência de seis dias "de
trabalho" divino que terminam com o "descanso" do sétimo
dia. O texto sagrado ensina, a respeito da criação, verdades reveladas por
Deus para nossa salvação que permitem "reconhecer a natureza profunda
da criação, seu valor e sua finalidade, que é a glória de Deus".
(Parágrafos
relacionados: 290,293)
- Não existe nada que não deva sua
existência a Deus criador. O mundo começou quando foi tirado do nada pela
Palavra de Deus; todos os seres existentes, toda a natureza, toda a
história humana têm suas raízes neste acontecimento primordial: é a
própria gênese pela qual o mundo foi constituído e o tempo começou.
(Parágrafo
relacionado: 297)
- Cada criatura possui sua
bondade e sua perfeição próprias. Para cada uma das obras dos "seis dias" se diz: "E
Deus viu que isto era bom". "Pela própria condição da criação,
todas as coisas são dotadas de fundamento próprio, verdade, bondade, leis
e ordens especificas." As diferentes criaturas, queridas em seu
próprio ser, refletem, cada uma a seu modo, um raio da sabedoria e da
bondade infinitas de Deus. É por isso que o homem deve respeitar a bondade
própria de cada criatura para evitar um uso desordenado das coisas, que
menospreze o Criador e acarrete conseqüências nefastas para os homens e
seu meio ambiente.
(Parágrafos
relacionados: 2501,299,226)
- A interdependência das criaturas é querida
por Deus. O sol e a lua, o cedro e a pequena flor, a águia e o pardal: as
inúmeras diversidades e desigualdades significam que nenhuma criatura se
basta a si mesma, que só existem em dependência recíproca, para se
completarem mutuamente, a serviço umas das outras.
(Parágrafo
relacionado: 1937)
- A beleza do universo. A ordem e a harmonia
do mundo criado resultam da diversidade dos seres e das relações que
existem entre eles. O homem as descobre progressivamente como leis da
natureza. Elas despertam a admiração dos sábios. A beleza da criação
reflete a infinita beleza do Criador. Ela deve inspirar o respeito e a
submissão da inteligência do homem e de sua vontade.
(Parágrafos
relacionados: 283,2500)
- A hierarquia das criaturas é expressa pela
ordem dos "seis dias", que vai do menos perfeito ao mais
perfeito. Deus ama todas as suas criaturas, cuida de cada uma, até mesmo
dos pássaros. Apesar disso, Jesus diz: "Vós valeis mais do que muitos
pardais" (Lc 12,7), ou ainda: "Um homem vale muito mais do que
uma ovelha" (Mt 12,12).
(Parágrafo
relacionado: 310)
- O homem é a obra-prima do obra do criação.
A narração bíblica exprime isto distinguindo nitidamente a criação
do homem da criação das outras criaturas.
(Parágrafo
relacionado: 335)
- Existe uma solidariedade entre todas as
criaturas pelo fato de terem todas o mesmo Criador e de todas estarem
ordenadas à sua glória:
(Parágrafos relacionados: 293,139,2416)
Louvado
sejas, meu Senhor.
Com todas as tuas criaturas,
Especialmente o senhor irmão Sol,
Que clareia o dia
E com sua LUZ nos alumia.
Louvado sejas, meu Senhor,
Pela irmã água,
Que é muito útil e humilde
E preciosa e casta...
Louvado sejas, meu Senhor,
Por nossa irmã, a mãe Terra,
Que nos sustenta e governa,
E produz frutos diversos
E coloridas flores e ervas.
Louvai e bendizei a meu Senhor,
E dai-lhe graças,
E servi-o com grande humildade.
(Parágrafo
relacionado: 1218)
- O Sábado - fim da obra dos "seis
dias". O texto sagrado diz que "Deus concluiu no sétimo dia a
obra que tinha feito", e assim "o céu e a terra foram
terminados", e no sétimo dia Deus "descansou", e santificou
e abençoou este dia (Gn 2,1-3). Essas palavras inspiradas são ricas
de ensinamentos salutares:
(Parágrafo
relacionado: 2168)
- Na criação, Deus depositou um fundamento e
leis que permanecem estáveis, nos quais o crente poder apoiar-se com
confiança e que para ele serão o sinal e a garantia da fidelidade
inabalável da Aliança de Deus. Por sua parte, o homem deverá ficar fiel a
este fundamento e respeitar as leis que o Criador inscreveu nele.
(Parágrafo
relacionado: 2169)
- A criação está em função do Sábado e
portanto do culto e da adoração de Deus. O culto está inscrito na ordem da
criação. "Nada se anteponha à obra de Deus", diz a regra de São
Bento, indicando assim a ordem correta das preocupações humanas.
(Parágrafos
relacionados: 1145,1152)
- O Sábado constitui o coração da lei de
Israel. Observar os mandamentos é corresponder à sabedoria e à vontade de
Deus expressa em sua obra de criação.
(Parágrafo
relacionado: 2172)
- O oitavo dia. Mas para nós
nasceu um dia novo: o dia da Ressurreição de Cristo. O sétimo dia encerra
a primeira criação. O oitavo dia dá início à nova criação. Assim, a obra
da criação culmina na obra maior da redenção. A primeira criação encontra
seu sentido e seu ponto culminante na nova criação em Cristo, cujo
esplendor ultrapassa o da primeira.
(Parágrafos
relacionados: 2174,1046)
RESUMINDO
- Os anjos são criaturas espirituais que
glorificam a Deus sem cessar e servem a seus desígnios salvíficos em
relação às demais criaturas: "Ad omnia bona nostra cooperantur
angeli. - Os anjos cooperam para todos os nossos bens"
- Os anjos cercam Cristo, seu Senhor.
Servem-no particularmente, no cumprimento de sua missão salvífica para com
os homens.
- A Igreja venera os anjos que a ajudam em
sua peregrinação terrestre e protegem cada ser humano.
- Deus quis a diversidade de suas criaturas
e a bondade própria delas, sua interdependência e ordem. Destinou todas a
criaturas materiais ao bem do gênero humano. O homem, e por meio
dele a criação inteira, destina-se à glória de Deus.
- Respeitar as leis inscritas na criação e
as relações que derivam da natureza das coisas é princípio de sabedoria e
fundamento da moral.
PARÁGRAFO 6
O HOMEM
- "Deus criou o homem à sua imagem, à
imagem de Deus o criou, homem e mulher os criou" (Gn 1,27). O homem
ocupa um lugar único na criação: ele é "a imagem de Deus" (I);
em sua própria natureza une o mundo espiritual e o mundo material (II); é
criado "homem e mulher" (III); Deus o estabeleceu em sua amizade
(IV).
(Parágrafos relacionados: 1700,343)
I. "À imagem de Deus"
- De todas as criaturas visíveis, só o homem
é "capaz de conhecer e amar seu Criador"; ele é "a única
criatura na terra que Deus quis por si mesma"; só ele é chamado a
compartilhar, pelo conhecimento e pelo amor, a vida de Deus. Foi para este
fim que o homem foi criado, e aí reside a razão fundamental de sua
dignidade:
(Parágrafos relacionados: 1703,2258,225)
Que motivo vos fez constituir o homem em dignidade tão
grande? O amor inestimável pelo qual enxergastes em vós mesmo vossa criatura, e
vos apaixonastes por ela; pois foi por amor que a criastes, foi por amor que
lhe destes um ser capaz de degustar vosso Bem eterno.
(Parágrafo
relacionado: 295)
- Por ser à imagem de Deus, o indivíduo
humano tem a dignidade de pessoa: ele não é apenas alguma coisa, mas
alguém. É capaz de conhecer-se, de possuir-se e de doar-se livremente e
entrar em comunhão com outras pessoas, e é chamado, por graça, a uma
aliança com seu Criador, a oferecer-lhe uma resposta de é e de amor que
ninguém mais pode dar em seu lugar.
(Parágrafos relacionados:
1935,1877)
- Deus criou tudo para o homem, mas o homem
foi criado, para servir e amar a Deus e oferecer-lhe toda a criação:
(Parágrafos relacionados: 299,901)
Quem é, pois, o ser que vai vir à existência cercado
de tal consideração? E o homem, grande e admirável figura viva, mais precioso
aos olhos de Deus do que a criação inteira: é o homem, é para ele que existem o
céu e a terra e o mar e a totalidade da criação, e é à salvação dele que Deus
atribuiu tanta importância que nem sequer poupou seu Filho único em seu favor.
Pois Deus não cessou de tudo empreender para fazer o homem subir até ele e
fazê-lo sentar-se à sua direita.
- "Na realidade o mistério do homem só
se torna claro verdadeiramente no mistério do Verbo Encarnado."
(Parágrafo relacionado: 1701)
São Paulo ensina-nos que dois homens estão na origem
do gênero humano: Adão e Cristo... "O primeiro Adão", diz ele,
"foi criado como um ser humano que recebeu a vida; o segundo é um ser
espiritual que dá a vida." O primeiro foi criado pelo segundo, de quem
recebeu a alma que o faz viver... O segundo Adão estabeleceu sua imagem no
primeiro Adão quando o modelou. E assim se revestiu da natureza deste último e
dele recebeu o nome, a fim de não deixar perder aquilo que havia feito à sua
imagem. Primeiro Adão, segundo Adão: o primeiro começou, o segundo não acabará.
Pois o segundo é verdadeiramente o primeiro, como ele mesma disse: "Eu sou
o Primeiro e o último"
(Parágrafos
relacionados: 388,411)
- Graças à Origem comum, o gênero humano
forma uma unidade. Pois Deus "de um só fez toda a raça humana"
(At 1 7,26):
(Parágrafos relacionados: 225,404,775,831,842)
Maravilhosa visão que nos faz contemplar o gênero
humano na unidade de sua origem em Deus...; na unidade de sua natureza,
composta igualmente em todos de um corpo material e de uma alma espiritual; na
unidade de seu fim imediato e de sua missão no mundo; na unidade de seu
hábitat: a terra, de cujos bens todos os homens, por direito natural, podem
usar para sustentar e desenvolver a vida; na unidade de seu fim sobrenatural:
Deus mesmo, ao qual todos devem tender; na unidade dos meios para atingir este
fim;... na unidade do seu resgate, realizado em favor de todos por Cristo.
- "Esta lei de solidariedade humana e
de caridade", sem excluir a rica variedade das pessoas, das culturas
e dos povos, nos garante que todos os homens são verdadeiramente irmãos.
(Parágrafo
relacionado: 1939)
II. "Corpore et anima unus" (Uno
de alma e corpo)
- A pessoa humana, criada à imagem de Deus,
é um ser ao mesmo tempo corporal e espiritual. O relato bíblico exprime
esta realidade com uma linguagem simbólica, ao afirmar que "O Senhor
Deus modelou o homem com a argila do solo, insuflou em suas narinas um
hálito de vida e o homem se tornou um ser vivente" (Gn 2,7). Portanto,
o homem em sua totalidade é querido por Deus.
(Parágrafos
relacionados: 1146,2332)
- Muitas vezes o termo alma designa na
Sagrada Escritura a vida humana ou a pessoa humana inteira. Mas designa
também o que há de mais íntimo no homem e o que há nele de
maior valor, aquilo que mais particularmente o faz ser imagem de Deus:
"alma" significa o princípio espiritual no homem.
(Parágrafo
relacionado: 1703)
- O corpo do homem participa da dignidade da
"imagem de Deus": ele é corpo humano precisamente porque é
animado pela alma espiritual, e é a pessoa humana inteira que está
destinada a tornar-se, no Corpo de Cristo, o Templo do Espírito.
(Parágrafo relacionado: 1004)
Unidade de corpo e de alma, o homem, por sua própria
condição corporal, sintetiza em si os elementos do mundo material, que nele
assim atinge sua plenitude e apresenta livremente ao Criador uma voz de louvor.
Não é, portanto, lícito ao homem desprezar a vida corporal; ao contrario, deve
estimar e honrar seu corpo, porque criado por Deus e destinado à ressurreição
no último dia.
(Parágrafo
relacionado: 2289)
- A unidade da alma e do corpo é tão
profunda que se deve considerar a alma como a "forma" do corpo;
ou seja, é graças à alma espiritual que o corpo constituído de matéria é
um corpo humano e vivo; o espírito e a matéria no homem não são duas
naturezas unidas, mas a união deles forma uma única natureza.
- A Igreja ensina que cada alma espiritual é
diretamente criada por Deus - não é "produzida" pelos pais - e é
imortal: ela não perece quando da separação do corpo na morte e se
unirá novamente ao corpo na ressurreição final.
(Parágrafos
relacionados: 1005,997)
- Por vezes ocorre que a alma aparece
distinta do espírito. Assim, São Paulo ora para que nosso "ser
inteiro, o espírito, a alma e o corpo", seja guardado irrepreensível
na Vinda do Senhor (1 Ts 5,23). A Igreja ensina que esta distinção não
introduz uma dualidade na alma. "Espírito" significa que o homem
está ordenado desde a sua criação para seu fim sobrenatural, e que sua
alma é capaz de ser elevada gratuitamente à comunhão com Deus.
(Parágrafo
relacionado: 2083)
- A tradição espiritual da Igreja insiste
também no coração, no sentido bíblico de "fundo do ser" (Jr
31,33), onde a pessoa se decide ou não por Deus.
(Parágrafos relacionados: 478,582,1431,1764,2517,2562,2843,2331,2336)
III. "Homem e mulher os criou"
IGUALDADE E DIFERENÇA QUERIDAS POR DEUS
- O homem e a mulher são criados, isto é,
são queridos por Deus: por um lado, em perfeita igualdade como pessoas
humanas e, por outro, em seu ser respectivo de homem e de mulher.
"Ser homem, 'ser mulher" é uma realidade boa e querida por Deus:
o homem e a mulher têm uma dignidade inamissível que lhes vem diretamente
de Deus, seu Criador. O homem e a mulher são criados em idêntica
dignidade, "à imagem de Deus". Em seu "ser-homem" e
seu "ser-mulher" refletem a sabedoria e a bondade do Criador.
- Deus não é de modo algum à imagem do
homem. Não é nem
homem nem mulher. Deus
é puro espírito, não havendo nele lugar para a diferença dos sexos. Mas as
"perfeições" do homem e da mulher refletem algo da infinita
perfeição de Deus: as de uma mãe e as de um pai e esposo.
(Parágrafos relacionados: 42,239)
"UM PARA O OUTRO" "UMA UNIDADE A DOIS"
- Criados conjuntamente, Deus quer o homem e
a mulher um para o outro. A Palavra de Deus dá-nos a entender isto por
meio de diversas passagens do texto sagrado. "Não é bom que o homem
esteja só. Vou fazer uma auxiliar que lhe corresponda" (Gn 2,18).
Nenhum dos animais pode ser este "vis-à-vis" do varão. A mulher
que Deus "modela" da costela tirada do varão e que leva a ele
provoca da parte do homem um grito de admiração, uma exclamação de amor e
de comunhão: "É osso de meus e carne de minha carne" (Gn 2,23).
O homem descobre a mulher como um outro "eu" da mesma humanidade.
(Parágrafo relacionado:
1605)
- O homem e a mulher são feitos "um
para o outro": não que Deus os tivesse feito apenas "pela
metade" e "incompletos"; criou-os para uma comunhão de
pessoas, na qual cada um dos dois pode ser "ajuda" para o outro,
por serem ao mesmo tempo iguais enquanto pessoas ("osso de meus
ossos...") e complementares enquanto masculino e feminino. No
matrimônio, Deus os une de maneira que, formando "uma só carne"
(Gn 2,24), possam transmitir a vida humana: "Sede fecundos, multiplicai-vos,
enchei a terra" (Gn 1,28). Ao transmitir a seus descendentes a vida
humana, o homem e a mulher, como esposos e pais, cooperam de forma única
na obra do Criador.
(Parágrafo
relacionado: 1652,2366)
- No desígnio de Deus, o homem e a mulher
têm a vocação de "submeter" a terra como "intendentes"
de Deus. Esta soberania não deve ser uma dominação arbitrária e
destrutiva. À imagem do Criador "que ama tudo o que existe" (Sb
11,24), o homem e a mulher são chamados a participar da Providência divina
em relação às demais criaturas. Daí a responsabilidade deles para com o
mundo que Deus lhes confiou.
(Parágrafos relacionados: 307,2415)
IV. O homem no Paraíso
- O primeiro homem não só foi criado bom,
mas também foi constituído em uma amizade com seu Criador e em tal
harmonia consigo mesmo e com a criação que o rodeava que só serão
superadas pela glória da nova criação em Cristo.
(Parágrafo
relacionado: 54)
- Interpretando de maneira autêntica o
simbolismo da linguagem bíblica à luz do Novo Testamento e da Tradição, a
Igreja ensina que nossos primeiros pais, Adão e Eva, foram constituídos em
um estado "de santidade e de justiça original". Esta
graça da santidade original era uma participação da vida divina.
(Parágrafo
relacionado: 1997)
- Pela irradiação desta graça, todas as
dimensões da vida do homem eram fortalecidas. Enquanto permanecesse
na intimidade divina, o homem não devia nem morrer nem sofrer. A harmonia interior da pessoa
humana, a harmonia entre o homem e a mulher e, finalmente, a harmonia
entre o primeiro casal e toda a criação constituíam o estado denominado
"justiça original".
(Parágrafos
relacionados: 1008,1502)
- O "domínio" do mundo que Deus
havia outorgado ao homem desde o início realizava-se antes de tudo no
próprio homem como domínio de si mesmo. O homem estava intacto e ordenação
em todo o seu ser, porque livre da tríplice concupiscência que o submete
aos prazeres dos sentidos, à cobiça dos bens terrestres e à auto-afirmação
contra os imperativos da razão.
(Parágrafo
relacionado: 2514)
- O sinal da familiaridade com Deus é o fato
de Deus o colocar no jardim. Lá vive "para cultivá-lo e
guardá-lo" (Gn 2,15): o trabalho não é uma penalidade, mas sim a
colaboração do homem e da mulher com Deus no aperfeiçoamento da criação
visível.
(Parágrafos
relacionados: 2415,2417)
- E toda esta harmonia da justiça original,
prevista para o homem pelo desígnio de Deus, que será perdida pelo
pecado de nossos primeiros pais.
RESUMINDO
- "Pai Santo, criastes o homem e a
mulher à vossa imagem e lhes confiastes todo o universo, para que, servindo
a Vós, seu Criador, dominassem toda criatura"
- O homem é predestinado a reproduzir a
imagem do Filho de Deus feito homem "imagem do Deus invisível"
(Cl 1,15), a fim de que Cristo seja o primogênito de uma multidão de
irmãos e de irmãs.
- O homem é "corpore et anima
unus" (uno de corpo e alma). A doutrina da fé afirma que a alma
espiritual e imortal é criada diretamente por Deus.
- "Deus não criou o homem solitário.
Desde o início, 'Deus os criou varão e mulher' (Gn 1,27). Esta união
constituiu a primeira forma de comunhão de pessoas."
- A revelação dá-nos a conhecer o estado de
santidade e de justiça originais do homem e da mulher antes do pecado: da
amizade deles com Deus advinha a felicidade da existência deles no
Paraíso.
PRIMEIRA PARTE -
SEGUNDA SEÇÃO: A PROFISSÃO DA FÉ CRISTÃ
OS SÍMBOLOS DA FÉ
PARÁGRAFO 7 - A QUEDA
- Deus é infinitamente bom e todas as suas
obras são boas. Todavia, ninguém escapa à experiência do sofrimento, dos
males existentes na natureza que aparecem ligados às limitações próprias das
criaturas e, sobretudo, à questão do mal moral. De onde vem o mal?
"Eu perguntava de onde vem o mal e não encontrava saída", diz
Santo Agostinho, e sua própria busca sofrida não encontrará saída, a
não ser em sua conversão ao Deus vivo. Pois "o mistério da
iniquidade" (2 Ts 2,7) só se explica à luz do "Mistério da
piedade". A revelação do amor divino em Cristo manifestou ao mesmo
tempo a extensão do mal e a superabundância da graça. Precisamos, pois,
abordar a questão da origem do mal fixando o olhar de nossa fé naquele
que, e só Ele, é o Vencedor do mal.
(Parágrafos relacionados: 309, 457,1848,539)
I. Onde o pecado abundou, a graça superabundou
A REALIDADE DO PECADO
- O pecado está presente na história
do homem: seria inútil tentar ignorá-lo ou dar a esta realidade obscura
outros nomes. Para tentarmos compreender o que é o pecado, é preciso antes
de tudo reconhecer a ligação profunda do homem com Deus, pois fora desta
relação o mal do pecado não é desmascarado em sua verdadeira identidade de
recusa e de oposição a Deus, embora continue a pesar sobre a vida do homem
e sobre a história.
(Parágrafo
relacionado: 1847)
- A realidade do pecado, e mais
particularmente a do pecado das origens, só se entende à luz da Revelação
divina. Sem o conhecimento de Deus que ela nos dá não se pode
reconhecer com clareza o pecado, e somos tentados a explicá-lo unicamente
como uma falta de crescimento, como uma fraqueza psicológica, um erro a
conseqüência necessária de uma estrutura social inadequada etc. Somente à
luz do desígnio de Deus sobre o homem compreende-se que o pecado é um
abuso da liberdade que Deus dá às pessoas criadas para que possam
amá-lo e amar-se mutuamente.
(Parágrafos relacionados: 1848,1739)
O PECADO ORIGINAL UMA VERDADE ESSENCIAL DA FE
- Com o progresso da Revelação, é
esclarecida também a realidade do pecado. Embora o Povo de Deus do Antigo
Testamento tenha conhecido a dor da condição humana à luz da história da
queda narrada no Gênesis, não era capaz de entender o significa do último
desta história, que só se manifesta plenamente à luz da Morte e
Ressurreição de Jesus Cristo. É preciso conhecer a Cristo como fonte da
graça para conhecer Adão como fonte do pecado. E ó Espírito-Paráclito,
enviado por Cristo ressuscitado que veio estabelecer "a culpabilidade
do mundo a respeito do pecado" (Jo 16,8), ao revelar Aquele que é o
Redentor do mundo.
(Parágrafos
relacionados: 431,208,359,729)
- A doutrina do pecado original é, por assim
dizer, "o reverso" da Boa Notícia de que Jesus é o Salvador de
todos os homens, de que todos têm necessidade da salvação e de que a
salvação é oferecida a todos graças a Cristo. A Igreja, que tem o senso de
Cristo, sabe perfeitamente que não se pode atentar contra a revelação do
pecado original sem atentar contra o mistério de Cristo.
(Parágrafo relacionado: 422)
PARA LER O RELATO DA QUEDA
- O relato da queda (Gn 3) utiliza uma
linguagem feita de imagens, mas afirma um acontecimento primordial, um
fato que ocorreu no início da história do homem. A Revelação dá-nos a
certeza de fé de que toda a história humana está marcada pelo pecado
original cometido livremente por nossos primeiros pais.
(Parágrafo relacionado: 289)
II. A queda dos anjos
- Por trás da opção de desobediência de
nossos primeiros pais há uma voz sedutora que se opõe a Deus e que,
por inveja, os faz cair na morte. A Escritura e a Tradição da Igreja vêem
neste ser um anjo destronado, chamado Satanás ou Diabo. A Igreja ensina
que ele tinha sido anteriormente um anjo bom, criado por Deus.
"Diabolus enim et alii daemones a Deo quidem natura creati sunt boni,
sed ipsi per se facti sunt mali - Com efeito, o Diabo e outros demônios
foram por Deus criados bons em (sua) natureza, mas se tornaram maus por
sua própria iniciativa."
(Parágrafo
relacionado: 2538)
- A Escritura fala de um pecado desses
anjos. Esta "queda" consiste na opção livre desses espíritos
criados, que rejeitaram radical e irrevogavelmente a Deus e seu Reino.
Temos um reflexo desta rebelião nas palavras do Tentador ditas a nossos
primeiros pais: "E vós sereis como deuses" (Gn 3,5). O Diabo é
"pecador desde o princípio" (1Jo 3,8), "pai da
mentira" (Jo 8,44).
(Parágrafos
relacionados: 1850,2482)
- É o caráter irrevogável de sua opção, e
não uma deficiência da infinita misericórdia divina, que faz com que o
pecado dos anjos não possa ser perdoado. "Não existe arrependimento
para eles depois da queda, como não existe para os homens após a
morte."
(Parágrafos
relacionados: 1033,1037,1022)
- A Escritura atesta a influência nefasta
daquele que Jesus chama de "o homicida desde o princípio" (Jo
8,44) e que até chegou a tentar desviar Jesus da missão recebida do Pai.
"Para isto é que o Filho de Deus se manifestou: para destruir as
obras do Diabo" (1Jo 3,9). A mais grave dessas obras, devido às suas
conseqüências, foi a sedução mentirosa que induziu o homem a desobedecer a
Deus.
(Parágrafos
relacionados: 538,540,550,2846,2849)
- Contudo, o poder de Satanás não é
infinito. Ele não passa de uma criatura, poderosa pelo fato de ser puro
espírito, mas sempre criatura: não é capaz de impedir a edificação do
Reino de Deus. Embora Satanás atue no mundo por ódio contra Deus e seu
Reino em Jesus Cristo, e embora a sua ação cause graves danos – de
natureza espiritual e, indiretamente, até de natureza física - para cada
homem e para a sociedade, esta ação é permitida pela Divina Providência,
que com vigor e doçura dirige a história do homem e do mundo. A permissão
divina da atividade diabólica é um grande mistério, mas "nós sabemos
que Deus coopera em tudo para o bem daqueles que o amam" (Rm 8,28).
(Parágrafos relacionados:
309,1673,412,2850-2854)
III. O pecado original
A LIBERDADE POSTA À PROVA
- Deus criou o homem à sua
imagem e o constituiu em sua amizade. Criatura espiritual, o homem só pode viver esta amizade como livre
submissão a Deus. E o que exprime a proibição, feita ao homem, de comer da
árvore do conhecimento do bem e do mal, "pois, no dia em que
dela comeres, terás de morrer" (Gn 2,17). "A árvore do
conhecimento do bem e do mal" (Gn 2,l7) evoca simbolicamente o limite
intransponível que o homem, como criatura, deve livremente reconhecer e
respeitar com confiança. O homem depende do Criador, está submetido
às leis da criação e às normas morais que regem o uso da liberdade.
(Parágrafos relacionados: 1730,311,301)
O PRIMEIRO PECADO DO HOMEM
- O homem, tentado pelo Diabo, deixou morrer
em seu coração a confiança em seu Criador e, abusando de sua liberdade,
desobedeceu ao mandamento de Deus. Foi nisto que consistiu o primeiro
pecado do homem. Todo pecado, daí em diante, ser uma desobediência a
Deus e uma falta de confiança em sua bondade.
(Parágrafos
relacionados: 1707,2541,1850,215)
- Neste pecado, o homem preferiu a si mesmo
a Deus, e com isso menosprezou a Deus: optou por si mesmo contra Deus,
contrariando as exigências de seu estado de criatura e consequentemente de
seu próprio bem. Constituído em um estado de santidade, o homem estava
destinado a ser plenamente "divinizado" por Deus na glória. Pela
sedução do Diabo, quis "ser como Deus", mas "sem Deus, e antepondo-se
a Deus, e não segundo Deus".
(Parágrafos
relacionados: 2084,2113)
- A Escritura mostra as conseqüências
dramáticas desta primeira desobediência. Adão e Eva perdem de imediato a
graça da santidade original. Têm medo deste Deus, do qual fizeram uma
falsa imagem, a de um Deus enciumado de suas prerrogativas.
- A harmonia na qual estavam, estabelecida
graças à justiça original, está destruída; o domínio das faculdades
espirituais da alma sobre o corpo é rompido; a união entre o homem e a
mulher é submetida a tensões; suas relações serão marcadas pela cupidez e
pela dominação (cf. Gn 3, 16). A harmonia com a criação está rompida: a
criação visível tornou-se para o homem estranha e hostil. Por causa do
homem, a criação está submetida "à servidão da corrupção".
Finalmente, vai realizar-se a conseqüência explicitamente anunciada para o
caso de desobediência: o homem "voltará ao pó do qual é
formado" A morte entra na história da humanidade.
(Parágrafos
relacionados: 1607,2514,602,1008)
- A partir do primeiro pecado, uma
verdadeira "invasão" do pecado inunda o mundo: o fratricídio
cometido por Caim contra Abel; a corrupção universal em decorrência do
pecado; na história de Israel, o pecado se manifesta freqüentemente e
sobretudo como uma infidelidade ao Deus da Aliança e como transgressão da
Lei de Moisés; e mesmo após a Redenção de Cristo, entre os cristãos, o
pecado se manifesta de muitas maneiras. A Escritura e a Tradição da Igreja
não cessam de recordar a presença e a universalidade do pecado na história
do homem:
(Parágrafos relacionados: 1865,2259,1739)
O que nos é manifestado pela Revelação divina concorda
com a própria experiência. Pois o homem, olhando para seu coração, descobre-se
também inclinado ao mal e mergulhado em múltiplos males que não podem provir de
seu Criador, que é bom. Recusando-se muitas vezes a reconhecer Deus como seu
princípio, o homem destruiu a devida ordem em relação ao fim último e, ao mesmo
tempo, toda a sua harmonia consigo mesmo, com os outros homens e com as coisas
criadas.
CONSEQÜÊNCIAS DO PECADO DE ADÃO PARA A HUMANIDADE
- Todos os homens estão implicados no pecado
de Adão. São Paulo o afirma: "Pela desobediência de um só homem,
todos se tornaram pecadores" (Rm 5,19). "Como por meio de um só
homem o pecado entrou no mundo e, pelo pecado, a morte, assim a morte
passou para todos os homens, porque todos pecaram..." (Rm 5,12). A
universalidade do pecado e da morte o Apóstolo opõe a universalidade da
salvação em Cristo: "Assim como da falta de um só resultou a
condenação de todos os homens, do mesmo modo, da obra de justiça de um só
(a de Cristo), resultou para todos os homens justificação que traz a
vida" (Rm 5,18).
(Parágrafos
relacionados: 430,605)
- Na linha de São Paulo, a Igreja sempre
ensinou que a imensa miséria que oprime os homens e sua inclinação para o
mal e para a morte são incompreensíveis, a não ser referindo-se ao pecado
de Adão e sem o fato de que este nos transmitiu um pecado que por nascença
nos afeta a todos e é "morte da alma". Em razão desta certeza de
fé, a Igreja ministra o batismo para a remissão dos pecados mesmo às
crianças que não cometeram pecado pessoal.
(Parágrafos
relacionados: 2606,1250)
- De que maneira o pecado de Adão se tornou
o pecado de todos os seus descendentes? O gênero humano inteiro é em Adão
"sicut unum corpus unius hominis - como um só corpo de um só
homem" Em virtude desta "unidade do gênero humano", todos
os homens estão implicados no pecado de Adão, como todos estão implicados
na justiça de Cristo. Contudo, a transmissão do pecado original é um
mistério que não somos capazes de compreender plenamente. Sabemos, porém,
pela Revelação, que Adão havia recebido a santidade e a justiça originais
não exclusivamente para si, mas para toda a natureza humana: ao ceder ao
Tentador, Adão e Eva cometem um pecado pessoal, mas este pecado afeta a
Natureza humana, que vão transmitir em um estado decaído. É um pecado que
será transmitido por propagação à humanidade inteira, isto é, pela
transmissão de uma natureza humana privada da santidade e da justiça
originais. E é por isso que o pecado original é denominado
"pecado" de maneira analógica: é um pecado "contraído"
e não "cometido", um estado e não um ato.
(Parágrafos
relacionados: 360,50)
- Embora próprio a cada um, o pecado
original não tem, em nenhum descendente de Adão, um caráter de falta
pessoal. É a privação da santidade e da justiça originais, mas a natureza
humana não é totalmente corrompida: ela é lesada em suas próprias forças
naturais, submetida à ignorância, ao sofrimento e ao império da morte, e
inclinada ao pecado (esta propensão ao mal é chamada
"concupiscência"). O Batismo, ao conferir a vida da graça de
Cristo, apaga o pecado original e faz o homem voltar para Deus. Porém, as
conseqüências de tal pecado sobre a natureza, enfraquecida e inclinada ao
mal, permanecem no homem e o incitam ao combate espiritual.
(Parágrafos
relacionados: 2515,1264)
- A doutrina da Igreja sobre a transmissão
do pecado original adquiriu precisão sobretudo no século V, em especial
sob o impulso da reflexão de Santo Agostinho contra o pelagianismo, e no
século XVI, em oposição à Reforma protestante. Pelágio sustentava que o
homem podia, pela força natural de sua vontade livre, sem a ajuda
necessária da graça de Deus, levar uma vida moralmente boa; limitava assim
a influência da falta de Adão à de um mau exemplo. Os primeiros
Reformadores protestantes, ao contrário, ensinavam que o homem estava
radicalmente pervertido e sua liberdade anulada pelo pecado original:
identificavam o pecado herdado por cada homem com a tendência ao mal
("concupiscentia"), que seria insuperável. A Igreja
pronunciou-se especialmente sobre o sentido do dado revelado no tocante ao
pecado original no segundo Concílio de Oranges, em 529, e no Concílio de
Trento em 1546.
UM DURO COMBATE...
- A doutrina sobre o pecado original ligada
à doutrina da Redenção por meio de Cristo propicia um olhar de
discernimento lúcido sobre a situação do homem e de sua ação no mundo.
Pelo pecado dos primeiros pais, o Diabo adquiriu certa dominação sobre o
homem, embora este último permaneça livre. O pecado original acarreta a
''servidão debaixo do poder daquele que tinha o império da morte, isto é,
do Diabo". Ignorar que o homem tem uma natureza lesada, inclinada ao
mal, dá lugar a graves erros no campo da educação, da política, da
ação social e, dos costumes.
(Parágrafos
relacionados: 2015,2852,1888)
- As conseqüências do pecado original e de
todos os pecados pessoais dos homens conferem ao mundo em seu conjunto uma
condição pecadora, que pode ser designada com a expressão de São João:
"O pecado do mundo" (Jo 1,29). Com esta expressão quer-se
exprimir também a influência negativa que exercem sobre as pessoas as
situações comunitárias e as estruturas sociais, que são o fruto dos
pecados dos homens.
(Parágrafo
relacionado: 1865)
- Esta situação dramática do mundo, que
"inteiro está sob o poder do Maligno" (1Jo 5,19), faz da
vida do homem um combate:
(Parágrafo relacionado: 2516)
Uma
luta árdua contra o poder das trevas perpassa a história universal da
humanidade. Iniciada desde a origem do mundo, vai durar até o último dia,
segundo as palavras do Senhor. Inserido nesta batalha, o homem deve lutar
sempre para aderir ao bem; não consegue alcançar a unidade interior senão com
grandes labutas e o auxílio da graça de Deus.
IV. "Não o abandonaste ao poder da
morte"
- Depois da queda, o homem não foi
abandonado por Deus. Ao contrário, Deus o chama e lhe anuncia de modo
misterioso a vitória sobre o mal e o soerguimento da queda. Esta passagem
do Gênesis foi chamada de "proto-evangelho", por ser o primeiro
anúncio do Messias redentor, a do combate entre a serpente e a Mulher e a
vitória final de um descendente desta última.
(Parágrafos
relacionados: 55,705,1609,2568,675)
- A tradição cristã vê nesta passagem um
anúncio do "novo Adão", que, por sua "obediência até a
morte de Cruz" (Fl 2,8), repara com superabundância a desobediência
de Adão. De resto, numerosos Padres e Doutores da Igreja vêem na mulher
anunciada no "proto-evangelho" a mãe de Cristo, Maria, como
"nova Eva". Foi ela que, primeiro e de uma forma única, se
beneficiou da vitória sobre o pecado conquistada por Cristo: ela foi
preservada de toda mancha do pecado original e durante toda a vida
terrestre, por uma graça especial de Deus, não cometeu nenhuma espécie de
pecado.
(Parágrafos
relacionados: 359,615,491)
- Mas por que Deus não impediu o primeiro
homem de pecar? São Leão Magno responde: "A graça inefável de Cristo
deu-nos bens melhores do que aqueles que a inveja do Demônio nos havia
subtraído". E Santo Tomás de Aquino: "Nada obsta' a que a natureza
humana tenha sido destinada a um fim mais elevado após o pecado. Com
efeito, Deus permite que os males aconteçam para tirar deles um bem maior.
Donde a palavra de São Paulo: 'Onde abundou o pecado superabundou a
graça" (Rm 5,20). E o canto do Exultet: "Ó feliz culpa, que
mereceu tal e tão grande Redentor".
(Parágrafos
relacionados: 310,395,272,1994)
RESUMINDO
- "Deus não fez a morte, nem tem prazer
em destruir os viventes... Foi pela inveja do Diabo que a morte entrou no
mundo" (Sb 1,13, 2,24).
- Satanás ou o Diabo, bem como os demais
demônios, são anjos decaídos por terem se recusado livremente a servir a
Deus a seu desígnio. Sua opção contra Deus é definitiva. Eles
tentam associar o homem à sua revolta contra Deus.
- "Constituído por Deus em estado de justiça,
o homem, instigado pelo Maligno, desde o início da história, abusou da
própria liberdade. Levantou-se contra Deus, desejando atingir seu objetivo
fora dele."
- Por seu pecado, Adão, na qualidade de
primeiro homem, perdeu a santidade e a justiça originais que havia
recebido de Deus não somente para si, mas para todos os seres humanos.
- À sua descendência, Adão e Eva
transmitiram a natureza humana ferida por seu primeiro pecado, portanto
privada da santidade e da justiça originais. Esta privação é denominada
"pecado original".
- Em conseqüência do pecado original, a
natureza humana está enfraquecida em suas forças, submetida à ignorância,
sofrimento e à dominação da morte, e inclinada ao pecado (inclinação
chamada de "concupiscência").
- "Afirmamos, portanto, com o Concílio
de Trento, que o pecado original é transmitido com a natureza humana, 'não
por imitação, mas por propagação', e que ele é, portanto, próprio de cada
um.
- A vitória sobre o pecado, conseguida por
Cristo, deu-nos bens melhores do que aqueles que o pecado nos havia
tirado: "Onde avultou o pecado, a graça superabundou" (Rm 5,20).
- "Segundo a fé dos cristãos, este
mundo foi criado e conservado pelo amor do Criador; na verdade, este mundo
foi reduzido à servidão do pecado, mas Cristo crucificado e ressuscitado
quebrou o poder do Maligno e libertou o mundo...".
PRIMEIRA PARTE -
SEGUNDA SEÇÃO: A PROFISSÃO DA FÉ CRISTÃ
OS SÍMBOLOS DA FÉ
CAPITULO II - CREIO
EM JESUS CRISTO, FILHO ÚNICO DE DEUS
A BOA NOVA: DEUS ENVIOU SEU FILHO
- "Quando, porém, chegou a plenitude do
tempo, enviou Deus seu Filho, nascido de uma mulher, nascido sob a Lei,
para remir os que estavam sob a Lei, a fim de que recebêssemos a adoção
filial" (Gl 4,4-5). Este é "o Evangelho de Jesus Cristo, Filho
de Deus": Deus visitou seu povo, cumpriu as promessas feitas a Abraão
e à sua descendência; fê-lo para além de toda expectativa: enviou seu
"Filho bem-amado".
(Parágrafos
relacionados: 389,2763)
- Cremos e confessamos que Jesus de Nazaré,
nascido judeu de uma filha de Israel, em Belém, no tempo do rei Herodes
Magno e do imperador César Augusto, carpinteiro de profissão, morto e
crucificado em Jerusalém, sob o procurador Pôncio Pilatos, durante o
reinado do imperador Tibério, é o Filho eterno de Deus feito homem; que
ele "veio de Deus" (Jo 13,3), "desceu do céu" (Jo
3,13; 6,33), "veio na carne", pois "o Verbo se fez carne e
habitou entre nós, e nós vimos sua glória, glória que ele tem junto ao
Pai, como Filho único, cheio de graça e de verdade... Pois de sua plenitude
nós recebemos graça por graça" (Jo 1,14-16).
- Movidos pela graça do Espírito Santo e
atraídos pelo Pai, cremos e confessamos acerca de Jesus: "Tu és o
Cristo, o Filho do Deus vivo" (Mt 16,16). Foi sobre a rocha desta fé,
confessada por São Pedro, que Cristo construiu sua Igreja.
(Parágrafos relacionados: 683,552)
"ANUNCIAR... A INSONDÁVEL RIQUEZA DE CRISTO" (Ef 3,8)
- A transmissão da fé cristã é primeiramente
o anúncio de Jesus Cristo, para levar à fé nele. Desde o começo, os
primeiros discípulos ardiam do desejo de anunciar Cristo: "Pois não
podemos, nós, deixar de falar das coisas que vimos e ouvimos" (At
4,20). E convidam os homens de todos os tempos a entrarem na alegria de
sua comunhão com Cristo:
(Parágrafos relacionados: 850,858)
O que ouvimos, o que vimos com nossos olhos, o que
contemplamos e o que nossas mãos apalparam do Verbo da vida – porque a Vida
manifestou-se: nós a vimos e lhe damos testemunho e vos anunciamos a Vida
Eterna, que estava voltada para o Pai e que no; apareceu -, o que vimos e
ouvimos, vo-lo anunciamos para que estejais também em comunhão conosco. E nossa comunhão é com o Pai e com seu Filho Jesus
Cristo. E
isto vos escrevemos para que nossa alegria seja completa (1Jo 1,1-4).
CRISTO É O CENTRO DA CATEQUESE
- No centro da catequese encontramos essencialmente
uma Pessoa, a de Jesus de Nazaré, Filho único do Pai..., que sofreu e
morreu por nós e agora, ressuscitado, vive conosco para sempre...
Catequizar... é desvendar na Pessoa de Cristo todo o desígnio eterno de
Deus que nela se realiza. E procurar compreender o significado dos gestos
e das palavras de Cristo e dos sinais realizados por Ele." A
finalidade definitiva da catequese é "levar à comunhão com Jesus
Cristo: só ele pode conduzir ao amor do Pai no Espírito e fazer-nos
participar da vida da Santíssima Trindade".
(Parágrafos
relacionados: 1698,513,260)
- "Na catequese, é Cristo, Verbo
Encarnado e Filho de Deus, que é ensinado - todo o resto está em
relação com ele; e somente Cristo ensina; todo outro que ensine, fá-lo na
medida em que é seu porta-voz, permitindo a Cristo ensinar por sua boca...
Todo catequista deveria poder aplicar a si mesmo a misteriosa palavra de
Jesus: 'Minha doutrina não é minha, mas daquele que me enviou' (Jo
7,16)."
(Parágrafos
relacionados: 2145,876)
- Aquele que é chamado a "ensinar o
Cristo" deve, portanto, procurar primeiro "este ganho
supereminente que é o conhecimento de Cristo"; é preciso
"aceitar perder tudo... a fim de ganhar a Cristo e ser achado
nele", e "conhecer o poder de sua Ressurreição e a participação
em seus sofrimentos, conformando-me com ele em sua Morte, para ver se
alcanço a ressurreição de entre os mortos" (Fl 3,8-11).
- É deste conhecimento amoroso de Cristo que
jorra o desejo de anunciá-lo, de "evangelizar" e de levar outros
ao "sim" da fé em Jesus Cristo. Mas ao mesmo tempo se faz sentir
a necessidade de conhecer cada vez melhor esta fé. Para este fim, segundo
a ordem do Símbolo da fé, primeiro serão apresentados os principais
títulos de Jesus: Cristo, o Filho de Deus, o Senhor (artigo 2). Em seguida,
o Símbolo confessa os principais Mistérios da vida de Cristo: os de sua
Encarnação (artigo 3), os de sua Páscoa (artigos 4 e 5) e, finalmente, os
de sua Glorificação (artigos 6 e 7).
(Parágrafo relacionado: 851)
ARTIGO 2
"E EM JESUS
CRISTO, SEU FILHO ÚNICO, NOSSO SENHOR"
I- JESUS
- Jesus quer dizer, em hebraico, "Deus
salva". No momento da Anunciação, o anjo Gabriel dá-lhe como nome
próprio o nome de Jesus, que exprime ao mesmo tempo sua identidade e
missão. Uma vez que "só Deus pode perdoar os pecados" (Mc 2,7),
é Ele que, em Jesus, seu Filho eterno feito homem, "salvará seu povo
dos pecados" (Mt 1,21). Em Jesus, portanto, Deus recapitula toda a
sua história de salvação em favor dos homens.
(Parágrafos
relacionados: 210,402)
- Na História da Salvação,
Deus não se contentou em libertar Israel da "casa da escravidão"
(Dt 5,6), fazendo-o sair do Egito. Salva-o também de seu pecado. Por ser o pecado sempre uma ofensa
feita a Deus, só ele pode perdoá-lo. Por isso Israel, tomando consciência
cada vez mais clara da universalidade do pecado, não poder mais
procurar a salvação a não ser na invocação do Nome do Deus Redentor.
(Parágrafos
relacionados: 1441,1850,388)
- O nome de Jesus significa que o próprio
nome de Deus está presente na pessoa de seu Filho feito homem para a
redenção universal e definitiva dos pecados. E o único nome divino que
traz a salvação e a partir de agora pode ser invocado por todos, pois se
uniu a todos os homens pela Encarnação, de sorte que "não existe
debaixo do céu outro nome dado aos homens pelo qual devamos ser
salvos" (At 4,12).
(Parágrafos
relacionados: 589,266,389,161)
- O nome do Deus Salvador era invocado uma
só vez por ano pelo sumo sacerdote para a expiação dos pecados de Israel,
depois de ele aspergir o propiciatório do Santo dos Santos com o sangue do
sacrifício. O propiciatório era o lugar da presença de Deus. Quando São
Paulo diz de Jesus que "Deus o destinou como instrumento de
propiciação, por seu próprio Sangue" (Rm 3,25), quer afirmar que na
humanidade deste último "era Deus que em Cristo reconciliava consigo
o mundo" (2Cor 5,19).
(Parágrafo
relacionado: 615)
- A Ressurreição de Jesus glorifica o nome
do Deus Salvador, pois a partir de agora é o nome de Jesus que manifesta
em plenitude o poder supremo do "nome acima de todo nome". Os
espíritos maus temem seu nome, e é em nome dele que os discípulos de Jesus
operam milagres, pois tudo o que pedem ao Pai em seu nome o Pai lhes
concede.
(Parágrafos
relacionados: 2812,2614)
- O nome de Jesus está no cerne da
oração cristã. Todas as orações litúrgicas são concluídas pela fórmula
"per Dominum nostrum Iesum Christum por Nosso Senhor Jesus
Cristo...". A "Ave-Maria" culmina no "e bendito
é o fruto do vosso ventre, Jesus". A oração oriental do coração denominada "oração a Jesus"
diz: "Jesus Cristo, Filho de Deus, Senhor, tem piedade de mim,
pecador". Numerosos cristãos, como Sta. Joana d'Arc, morrem tendo nos
lábios apenas o nome de Jesus.
(Parágrafos
relacionados: 2667,2668,2676)
II. Cristo
- Cristo vem da tradução grega do termo
hebraico "Messias", que quer dizer "ungido". Só se
toma o nome próprio de Jesus porque este leva à perfeição a missão divina
que significa. Com efeito, em Israel eram ungidos em nome de Deus os que
lhe eram consagrados para uma missão vinda dele. Era o caso dos reis, dos
sacerdotes e, em raras ocasiões, dos profetas. Esse devia ser por
excelência o caso do Messias que Deus enviaria para instaurar
definitivamente seu Reino. O Messias devia ser ungido pelo Espírito do
Senhor ao mesmo tempo como rei e sacerdote, mas também como profeta . Jesus
realizou a esperança messiânica de Israel em sua tríplice função de
sacerdote, profeta e rei.
(Parágrafos
relacionados: 690,695,711-716,783)
- O anjo anunciou aos pastores o nascimento
de Jesus como o do Messias prometido a Israel: "Hoje, na cidade de
Davi, nasceu-vos um Salvador que é o Cristo Senhor" (Lc 2,11). Desde
o inicio Ele é "aquele que o Pai consagrou e enviou ao mundo"
(Jo 10,36), concebido como "Santo" no seio virginal de Maria.
José foi chamado por Deus "a receber Maria, sua mulher", grávida
"daquele que foi gerado nela pelo Espírito Santo" (Mt 1,21),
para que Jesus, "que se chama Cristo", nascesse da esposa de
José na descendência messiânica de Davi (Mt 1,16).
(Parágrafos
relacionados: 486,525)
- A consagração messiânica de Jesus
manifesta sua missão divina. "É, aliás, o que indica seu próprio
nome, pois no nome de Cristo está subentendido Aquele que ungiu,
Aquele que foi ungido e a própria Unção com que ele foi ungido dado:
Aquele que ungiu é o Pai, Aquele que foi ungido é o Filho, e o foi no
Espírito, que é a Unção." Sua consagração messiânica eterna
revelou-se no tempo de sua vida terrestre, por ocasião de seu Batismo por
João, quando "Deus o ungiu com o Espírito Santo e poder" (At
10,38), "para que ele fosse manifestado a Israel" (Jo 1,31) como
seu Messias. Por suas obras e palavras será conhecido como "o
Santo de Deus".
(Parágrafos
relacionados: 727,535)
- Numerosos judeus e até certos
pagãos os que compartilhavam a esperança deles reconheceram em Jesus
os traços fundamentais tais do "Filho de Davi" messiânico,
prometido por Deus a Israel. Jesus aceitou o título de Messias ao qual
tinha direito, mas com reserva, pois este era entendido por uma parte de
seus contemporâneos segundo uma concepção demasiadamente humana,
essencialmente política.
(Parágrafos
relacionados: 528-529,547)
- Jesus acolheu a profissão de fé de Pedro,
que o reconhecia como o Messias anunciando a Paixão iminente do Filho do
Homem. Desvendou o conteúdo autêntico de sua realeza messiânica, seja na
identidade transcendente do Filho do Homem "que desceu do Céu"
(Jo 3,13) seja em sua missão redentora como Servo sofredor: "O Filho
do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em
resgate pela multidão" (Mt 20,28). Por isso o verdadeiro sentido de
sua realeza só se manifestou do alto da Cruz. É somente após sua
Ressurreição que sua realeza messiânica poderá ser proclamada por Pedro
diante do povo de Deus: "Que toda casa de Israel saiba com certeza:
Deus o constituiu Senhor e Cristo, este Jesus que vós crucificastes"
(At 2,36).
(Parágrafos relacionados: 552,550,445)
III. Filho Único de Deus
- Filho de Deus, no Antigo Testamento, é um
título aos anjos, ao povo da Eleição, aos filhos de Israel e a seus reis.
Significa então uma filiação adotiva que estabelece entre Deus e sua
criatura relações de uma intimidade especial. Quando o Rei-Messias
prometido é chamado "filho de Deus", isso não implica
necessariamente, segundo o sentido literal desses textos, que ele
ultrapasse o nível humano. Os que designaram Jesus como Messias de Israel
talvez não tenham tido a intenção de dizer mais do que isto.
- Não acontece o mesmo com Pedro, quando
confessa Jesus como "o Cristo, o Filho do Deus vivo", pois este
lhe responde com solenidade: "Não foi a carne e o sangue que te
revelaram isso, e sim meu Pai que está nos Céus" (Mt 16,17).
Paralelamente, Paulo dirá a propósito de sua conversão no caminho
para Damasco: Quando, porém, aquele que me separou desde o seio materno e
me chamou, por sua graça houve por bem revelar em mim o seu Filho, para
que eu o evangelizasse entre os gentios..." (Gl 1,15-16).
"Imediatamente, nas sinagogas, começou a proclamar Jesus, afirmando
que ele é o Filho de Deus" (At 9,20). Este será desde o início
o centro da fé apostólica professada primeiro por Pedro como fundamento da
Igreja.
(Parágrafos
relacionados: 552,424)
- Se Pedro pôde reconhecer o caráter
transcendente da filiação divina de Jesus Messias foi porque este o deu a
entender claramente. Diante do Sinédrio, a pergunta de seus acusadores:
"Tu és então o Filho de Deus?", Jesus respondeu: "Vós
dizeis que eu Sou" (Lc 22,70). Já bem antes, Ele se designara como
"o Filho" que conhece o Pai e que é diferente dos
"servos" que Deus enviou anteriormente a seu povo, superior aos
próprios anjos. Distinguiu sua filiação daquela de seus discípulos, não
dizendo nunca "nosso Pai", a não ser para ordenar-lhes:
"Portanto, orai desta maneira: Pai Nosso" (Mt 6,9); e sublinhou
esta distinção: "Meu Pai e vosso Pai" (Jo 20,17).
(Parágrafo relacionado:
2786)
- Os Evangelhos narram em dois momentos
solenes - o Batismo e a Transfiguração de Cristo - a voz do Pai a
designá-lo como seu "Filho bem-amado". Jesus designa-se a si
mesmo como "o Filho Único de Deus" (Jo 3,16) e afirma com este
título sua preexistência eterna. Exige a fé "em nome do Filho Único
de Deus" (Jo 3,18). Esta confissão cristã aparece já na
exclamação do centurião diante de Jesus na cruz: "Verdadeiramente
este homem era Filho de Deus" (Mc 15,39), pois somente no Mistério
Pascal o fiel cristão pode entender o pleno significado do título
"Filho de Deus".
(Parágrafos
relacionados: 536,554)
- É depois de sua Ressurreição que a
filiação divina de Jesus aparece no poder de sua humanidade glorificada:
"Estabelecido Filho de Deus com poder por sua Ressurreição dos
mortos" (Rm 1,4). Os apóstolos poderão confessar: "Nós vimos a
sua glória, glória que ele tem junto ao Pai como Filhos Único, cheio de
graça e de verdade" (Jo 1,14).
(Parágrafo
relacionado: 653)
IV. Senhor
- Na versão grega dos livros do Antigo
Testamento, o nome inefável com o qual Deus se revelou a Moisés, Iahweh,
traduzido por "Kýrios" ["Senhor"]. Senhor torna-se
desde então o nome mais habitual para designar a própria divindade do Deus
de Israel. É neste sentido forte que o Novo Testamento utiliza o título de
"Senhor" para o Pai, e também - e aí está a novidade - para
Jesus reconhecido assim como o próprio Deus.
(Parágrafo
relacionado: 209)
- Jesus mesmo atribui-se de maneira velada
este título quando discute com os fariseus sobre o sentido do Salmo 110,
mas também de modo explícito dirigindo-se a seus apóstolos. Ao longo de
toda a sua vida pública, seus gestos de domínio sobre a natureza, sobre as
doenças, sobre os demônios, sobre a morte e o pecado demonstravam sua
soberania divina.
(Parágrafo
relacionado: 548)
- Muito freqüentemente nos Evangelhos
determinadas pessoas se dirigem a Jesus chamando-o de "Senhor".
Este título exprime o respeito e a confiança dos que se achegam a Jesus e
esperam dele ajuda e cura. Sob a moção do Espírito Santo, ele exprime o
reconhecimento do Mistério Divino de Jesus. No encontro com Jesus
ressuscitado, ele se transforma em expressão de adoração: "Meu Senhor
e meu Deus!" (Jo 20,28). Assume então uma conotação de amor e afeição
que tornar-se-á peculiar à tradição cristã: "É o Senhor!" (Jo
21,7).
(Parágrafos
relacionados: 208,683,641)
- Ao atribuir a Jesus o título divino de
Senhor, as primeiras confissões de fé da Igreja afirmam, desde o início,
que o poder, a honra e a glória devidos a Deus Pai cabem também a Jesus,
por ser Ele "de condição divina" (Fl 2,6) e ter o Pai
manifestado esta soberania de Jesus ressuscitando-o dos mortos e
exaltando-o em sua glória.
(Parágrafo
relacionado: 461,653)
- Desde o principio da história cristã a
afirmação do senhorio de Jesus sobre o mundo e sobre a história significa
também o reconhecimento de que o homem não deve submeter sua liberdade de
pessoal, de maneira absoluta, a nenhum poder terrestre, mas somente a Deus
Pai e ao Senhor Jesus Cristo: César não é "o Senhor". "A
Igreja crê... que a chave, o centro e o fim de toda a história humana se
encontram em seu Senhor e Mestre."
(Parágrafos
relacionados: 668-672,2242)
- A oração cristã é marcava
pelo título "Senhor", quer se trate do convite à oração "o
Senhor esteja convosco" ou da conclusão da oração, "por Jesus
Cristo nosso Senhor", ou ainda do grito cheio de confiança e de
esperança: "Maran atha" ("o Senhor vem!") ou
"Marana tha" ("Vem, Senhor!") (1Cor 16,22): "Amém,
vem, Senhor Jesus!" (Ap 2,20).
(Parágrafos
relacionados: 2664-2665,2817)
RESUMINDO
- O nome de Jesus significa "Deus que
salva". A criança nascida da Virgem Maria é chamada
"Jesus", "pois Ele salvará seu povo de seus pecados"
(Mt 1,21): "Não existe debaixo do céu outro nome dado aos homens pelo
qual devamos ser salvos" (At 4,12).
- O nome Cristo significa
"Ungido", "Messias". Jesus é o Cristo pois "Deus o ungiu
com o Espírito Santo e com poder" (At 10,38). Ele era "aquele
que há de vir" (Lc 7,19), o objeto da "esperança de
Israel".
- O nome Filho de Deus significa a relação
única e eterna de Jesus Cristo com Deus, seu Pai: Ele é o Filho Único do
Pai e o próprio Deus. Crer que Jesus Cristo é o Filho de Deus é necessário
para ser cristão"
- O nome Senhor designa a
soberania divina. Confessar
ou invocar Jesus como Senhor é crer em sua divindade. "Ninguém pode
dizer 'Jesus é Senhor' a não ser no Espírito Santo" (1 Cor 12,3).
PRIMEIRA PARTE -
SEGUNDA SEÇÃO : A PROFISSÃO DA FÉ CRISTÃ
OS SÍMBOLOS DA FÉ -
CAPITULO II - ARTIGO 3
"JESUS CRISTO
FOI CONCEBIDO PELO PODER DO ESPÍRITO SANTO, NASCEU DA VIRGEM MARIA"
PARÁGRAFO 1 -O
FILHO DE DEUS SE FEZ HOMEM
I. Por que o Verbo se fez carne?
- Com o Credo niceno-constantinopolitano,
respondemos, confessando: "E por nós, homens, e para nossa salvação,
desceu dos céus e se encarnou pelo Espirito Santo, no seio da Virgem
Maria, e se fez homem"
- O Verbo se fez carne para salvar-nos,
reconciliando-nos com Deus: "Foi Ele que nos amou e enviou-nos seu
Filho como vítima de expiação por nossos pecados" (1Jo 4,10). "O
Pai enviou seu Filho como o Salvador do mundo" (1Jo 4,14). "Este
apareceu para tirar os pecados" (1Jo 3,5):
(Parágrafo
relacionado: 607,385)
Doente, nossa natureza precisava ser curada; decaída,
ser reerguida; morta, ser ressuscitada. Havíamos perdido a posse do bem, era
preciso no-la restituir. Enclausurados nas trevas, era preciso trazer-nos à
luz; cativos, esperávamos um salvador; prisioneiros, um socorro; escravos, um
libertador. Essas razões eram sem importância? Não eram tais que comoveriam a
Deus a ponto de fazê-lo descer até nossa natureza humana para visita-la, uma
vez que a humanidade se encontrava em um estado tão miserável e tão infeliz?
- O Verbo se fez carne para que, assim,
conhecêssemos o amor de Deus: "Nisto manifestou-se o amor de Deus por
nós: Deus enviou seu Filho Único ao mundo para que vivamos por Ele"
(1 Jo 4,9). "Pois Deus amou tanto o mundo, que deu seu Filho Único, a
fim de que todo o que crer nele não pereça, mas tenha a Vida Eterna"
(Jo 3,16).
(Parágrafo
relacionado: 219)
- O Verbo se fez carne para ser nosso modelo
de santidade: "Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim..."
(Mt 11,29). "Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida; ninguém vem ao Pai
a não ser por mim" (Jo 14,6). E o Pai, no monte da
Transfiguração, ordena: "Ouvi-o" (Mc 9,7). Pois Ele é o modelo das Bem-aventuranças e
a norma da Nova Lei: "Amai-vos uns aos outros como eu vos amei"
(Jo 15,12). Este amor implica a oferta efetiva de si mesmo em seu
seguimento.
(Parágrafos
relacionados: 520,823,2012,1717,1965)
- O Verbo se fez carne para tornar-nos
"participantes da natureza divina" (2Pd 1,4): "Pois esta é
a razão pela qual o Verbo se fez homem, e o Filho de Deus, Filho do homem:
é para que o homem, entrando em comunhão com o Verbo e recebendo, assim, a
filiação divina, se torne filho de Deus".
(Parágrafos relacionados: 1265,1391)
"Pois
o Filho de Deus se fez homem para nos fazer Deus. "Unigenitus Dei Filius,
suae divinitatis volens nos esse participes, naturam nostram assumpsit, ut
homines deos faceret factus homo. O Filho Unigênito de Deus, querendo-nos
participantes de sua divindade, assumiu nossa natureza para que aquele que se
fez homem dos homens fizesse deuses."
(Parágrafo
relacionado: 1988)
II. A Encarnação
- Retomando a expressão de São João ("O
Verbo se fez carne" Jo 1,14), a Igreja denomina "Encarnação"
o fato de Filho de Deus ter assumido uma natureza humana para realizar
nela a nossa salvação. Em um hino atestado por São Paulo, a Igreja canta o
mistério da Encarnação:
(Parágrafos relacionados: 653,661,449)
Tende em vós o mesmo sentimento de Cristo Jesus: Ele
tinha a condição divina, e não considerou o ser igual a Deus como algo a que se
apegar ciosamente. Mas esvaziou-se a si mesmo, assumiu a condição de servo,
tomando a semelhança humana. E, achado em figura de homem, humilhou-se e foi obediente
até a morte, e morte de cruz! (Fl 2,5-8).
- A Epístola aos Hebreus fala do mesmo
mistério:
Por isso, ao entrar no mundo, ele afirmou: Não
quiseste sacrifício e oferenda. Tu, porém, formaste-me um corpo. Holocaustos e
sacrifícios pelo pecado não foram de teu agrado. Por isso eu digo: Eis-me
aqui... para fazer a tua vontade (Hb 10,5-7, citando Sl 40,7-9 LXX)
- A fé na Encarnação verdadeira do Filho de
Deus é o sinal distintivo da fé cristã: "Nisto reconheceis o Espírito
de Deus. Todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio na carne é de
Deus" (1Jo 4,2). Esta é a alegre convicção da Igreja desde o seu
começo, quando canta "o grande mistério da piedade": "Ele
foi manifestado na carne" (1 Tm 3,16).
(Parágrafo relacionado: 90)
III. Verdadeiro Deus e verdadeiro homem
- O acontecimento único e totalmente
singular da Encarnação do Filho de Deus não significa que Jesus Cristo
seja em parte Deus e em parte homem, nem que ele seja o resultado da
mescla confusa entre o divino e o humano. Ele se fez verdadeiramente homem
permanecendo verdadeiro Deus. Jesus Cristo é verdadeiro Deus e verdadeiro
homem. A Igreja teve de defender e clarificar esta verdade de fé no
decurso dos primeiros séculos, diante das heresias que a falsificavam.
(Parágrafo
relacionado: 88)
- As primeiras heresias, mais do que a
divindade de Cristo, negaram sua humanidade verdadeira (docetismo
gnóstico). Desde os tempos apostólicos a fé cristã insistiu na verdadeira
Encarnação do Filho de Deus, "que veio na carne". Mas desde o
século III a Igreja teve de afirmar, contra Paulo de Samósata, em um
concílio reunido em Antioquia, que Jesus Cristo é Filho de Deus por
natureza e não por adoção. O I Concílio Ecumênico de Nicéia, em 325,
confessou em seu Credo que o Filho de Deus é "gerado, não criado,
consubstancial (homousios) ao Pai" e condenou Ário, que afirmava
que" o Filho de Deus veio do nada" e que ele seria "de uma
substância diferente da do Pai.
(Parágrafo
relacionado: 242)
- A heresia nestoriana via em
Cristo uma pessoa humana unida à pessoa divina do Filho de Deus. Diante
dela, São Cirilo de Alexandria e o III Concílio Ecumênico, reunido em
Éfeso em 431, confessaram que "o Verbo, unindo a si em sua pessoa uma
carne animada por uma alma racional, se tornou homem". A humanidade de Cristo não tem
outro sujeito senão a pessoa divina do Filho de Deus, que a assumiu e a
fez sua desde sua concepção. Por isso o Concílio de Éfeso proclamou, em
431, que Maria se tornou de verdade Mãe de Deus pela concepção humana do
Filho de Deus em seu seio: "Mãe de Deus não porque o Verbo de Deus
tirou dela sua natureza divina, mas porque é dela que ele tem o corpo
sagrado dotado de uma alma racional, unido ao qual, na sua pessoa, se diz
que o Verbo nasceu segundo a carne".
(Parágrafo
relacionado: 495)
- Os monofisistas afirmavam que a natureza
humana tinha cessado de existir como tal em Cristo ao ser assumida por sua
pessoa divina de Filho de Deus. Confrontado com esta heresia, IV
Concílio Ecumênico, em Calcedônia, confessou em 451:
Na linha dos santos Padres, ensinamos unanimemente a
confessar um só e mesmo Filho, Nosso Senhor Jesus Cristo, o mesmo perfeito em
divindade e perfeito em humanidade, o mesmo verdadeiramente Deus e
verdadeiramente homem, composto de um alma racional e de um corpo,
consubstancial ao Pai segundo a divindade, consubstancial a nós segundo a
humanidade, "semelhante a nós em tudo, com exceção do pecado"; gerado
do Pai antes de todos os séculos segundo a divindade, e nesses últimos dias,
para nós e para nossa salvação, nascido da Virgem Maria, Mãe de Deus, segundo a
humanidade. Um só e mesmo Cristo, Senhor, Filho Único, que devemos reconhecer
em duas naturezas, sem confusão, sem mudanças, sem divisão, sem separação. A
diferença das naturezas não é de modo algum suprimida por sua união, mas antes
as propriedades de cada uma são salvaguardadas e reunidas em uma só pessoa e
uma só hipóstase.
- Depois do Concílio de Calcedônia, alguns
fizeram da natureza humana de Cristo uma espécie de sujeito pessoal.
Contra eles, o V Concílio Ecumênico, em Constantinopla, em 553, confessou
a propósito de Cristo: "Não há senão uma única hipóstase [ou pessoa],
que é Nosso Senhor Jesus Cristo, Um da Trindade". Na humanidade de
Cristo, portanto, tudo deve ser atribuído à sua pessoa divina como ao seu
sujeito próprio; não somente os milagres, mas também os sofrimentos, e até
a morte: "Aquele que foi crucificado na carne, nosso Senhor Jesus
Cristo, é verdadeiro Deus, Senhor da glória e Um da Santíssima
Trindade".
(Parágrafos
relacionados: 254,616)
- A Igreja confessa, assim, que Jesus é
inseparavelmente verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Ele é verdadeiramente
o Filho de Deus que se fez homem, nosso irmão, e isto sem deixar de ser
Deus, nosso Senhor:
"Id
quod fuiit remansit et quod non fuiit assumpsit - Ele permaneceu o que era,
assumiu o que não era", canta a liturgia romana. E a liturgia de São João
Crisóstomo proclama e canta: "Ó Filho Único e Verbo de Deus, sendo
imortal, vos dignastes por nossa salvação encarnar-vos da Santa Mãe de Deus e
sempre Virgem Maria, vós que sem mudança vos tomastes homem e fostes
crucificado, ó Cristo Deus, que por vossa morte esmagastes a morte, sois Um da
Santíssima Trindade, glorificado com o Pai e o Espírito Santo,
salvai-nos!".
(Parágrafo relacionado: 212)
IV. De que maneira o Filho de Deus é homem
- Uma vez que na união misteriosa da
Encarnação "a natureza humana foi assumida, não aniquilada", a
Igreja tem sido levada, ao longo dos séculos, a confessar a plena
realidade da alma humana, com suas operações de inteligência e vontade, e
a do corpo humano de Cristo. Mas, paralelamente, teve de lembrar toda vez
que a natureza humana de Cristo pertence "in proprio" à pessoa
divina do Filho de Deus que a assumiu. Tudo o que Cristo é e o que faz
nela depende do "Um da Trindade". Por conseguinte, o Filho de
Deus comunica à sua humanidade seu próprio modo de existir pessoal na
Trindade. Assim, em sua alma como em seu corpo, Cristo exprime humanamente
os modos divinos de agir da Trindade:
(Parágrafos relacionados: 516,626)
[O Filho de Deus] trabalhou com mãos humanas, pensou
com inteligência humana, agiu com vontade humana, amou com coração humano.
Nascido da Virgem Maria, tomou-se verdadeiramente um de nós, semelhante a nós
em tudo, exceto no pecado.
(Parágrafo relacionado: 2599)
A ALMA E O CONHECIMENTO HUMANO DE CRISTO
- Apolinário de Laodicéia afirmava que em
Cristo o Verbo havia substituído a alma ou o espírito. Contra este erro a
Igreja confessou que o Filho assumiu também uma alma racional humana.
(Parágrafo
relacionado: 363)
- Esta alma humana que o Filho de Deus
assumiu é dotada de um verdadeiro conhecimento humano. Enquanto tal, este
não podia ser em si ilimitado: exercia-se nas condições históricas de sua
existência no espaço e no tempo. Por isso O Filho de Deus, ao tornar-se
homem, pôde aceitar "crescer em sabedoria, em estatura e em
graça" (Lc 2,52) e também informar-se sobre aquilo que na condição
humana se deve aprender de maneira experimental. Isto correspondia à
realidade de seu rebaixamento voluntário na "condição de
escravo".
- Mas, ao mesmo tempo, este conhecimento
verdadeiramente humano do Filho de Deus exprimia a vida divina de sua
pessoa. "A natureza humana do Filho de Deus, não por si mesma, mas
por sua união ao Verbo, conhecia e manifestava nela tudo o que convém a
Deus." Este é, em primeiro lugar, o caso do conhecimento íntimo e
direto que o Filho de Deus feito homem tem de seu Pai. O Filho mostrava
também em seu conhecimento humano a penetração divina que tinha
pensamentos secretos do coração dos homens.
(Parágrafo
relacionado: 240)
- Por sua união a Sabedoria divina na pessoa
do Verbo encarnado, o conhecimento humano de Cristo gozava em plenitude da
ciência dos desígnios eternos que viera revelar. O que ele reconhece
desconhecer neste campo declara alhures não ser sua missão revelá-lo.
A VONTADE HUMANA DE CRISTO
- Paralelamente, a Igreja confessou no VI
Concílio Ecumênico que Cristo possui duas vontades e duas operações
naturais, divinas e humanas, não opostas, mas cooperantes, de sorte que o
Verbo feito carne quis humanamente na obediência a seu Pai tudo o que
decidiu divinamente com o Pai e o Espírito Santo por nossa salvação. A
vontade humana de Cristo "segue a sua vontade divina sem estar em
resistência nem em oposição em relação a ela; mas antes sendo subordinada
a esta vontade todo-poderosa".
(Parágrafo relacionado: 2008,2824)
O VERDADEIRO CORPO DE CRISTO
- Visto que o Verbo se fez carne assumindo
uma verdadeira humanidade, o corpo de Cristo era delimitado. Em razão
disso, o rosto humano de Jesus pode ser "desenhado". No VII
Concílio Ecumênico, a Igreja reconheceu como legítimo que ele seja
representado em imagens sagradas.
(Parágrafos
relacionados: 1159-1162,2129-2132)
- Ao mesmo tempo, a Igreja sempre reconheceu
que, no corpo de Jesus, "Deus, que por natureza é invisível se tornou
visível aos nossos olhos". Com efeito as particularidades individuais
do corpo de Cristo exprimem a pessoa divina do Filho de Deus. Este fez
seus os traços de seu corpo humano a ponto de, pintados em uma imagem
sagrada, poderem ser venerados, pois o crente que venera sua imagem
"venera nela a pessoa que está pintada".
O CORAÇÃO DO VERBO ENCARNADO
- Jesus conheceu-nos e amou-nos a todos
durante sua Vida, sua Agonia e Paixão e entregou-se por todos e cada um de
nós: "O Filho de Deus amou-me e entregou-se por mim" (Gl 2,20).
Amou-nos a todos comum coração humano. Por esta razão, o sagrado Coração
de Jesus, traspassado por nossos pecados e para a nossa salvação,
"praecipuus consideratur index et symbolus... illius amoris, quo
divinus Rcdemptor aeternum Patrem hominesque universos continenter adamat
- é considerado o principal sinal e símbolo daquele amor com o qual o
divino Redentor ama ininterruptamente o Pai Eterno e todos os
homens".
(Parágrafos
relacionados: 487,368,2669,766)
RESUMINDO
- No tempo determinado por
Deus, o Filho Único do Pai, a Palavra Eterna, isto é, o Verbo e a Imagem
substancial do Pai, encarnou sem perder a natureza divina, assumiu a
natureza humana.
- Jesus Cristo é verdadeiro Deus e
verdadeiro homem, na unidade de sua Pessoa Divina: por isso Ele é o único
mediador entre Deus e os homens.
- Jesus Cristo possui duas naturezas, a
divina e a humana, não confundidas, mas unidas na única Pessoa do Filho de
Deus.
- Sendo verdadeiro Deus e verdadeiro homem,
Cristo tem uma inteligência e uma vontade humanas, perfeitamente
concordantes com e submetidas a sua inteligência e a sua vontade divinas
que tem em comum com o Pai e o Espírito Santo
- A Encarnação é, portanto, o Mistério da
admirável união da natureza divina e da natureza humana na única Pessoa do
Verbo.
PARÁGRAFO 2
"...CONCEBIDO
PELO PODER DO ESPÍRITO SANTO,
NASCIDO DA VIRGEM MARIA"
I Concebido pelo poder do Espírito Santo.
- A Anunciação a Maria inaugura a
"plenitude dos tempos" (Gl 4,4), isto é, o cumprimento das
promessas e das preparações. Maria é convidada a conceber aquele em quem
habitará "corporalmente a plenitude da divindade" (Cl 2,9). A
resposta divina à sua pergunta "Como se fará isto, se não conheço
homem algum?" (Lc 1,34) é dada pelo poder do Espírito: "O
Espírito Santo virá sobre ti" (Lc 1,35).
(Parágrafos
relacionados: 461,721)
- A missão do Espírito Santo está
sempre conjugada e ordenada à do Filho. O Espírito Santo é enviado para
santificar o seio da Virgem Maria e fecundá-la divinamente, ele que é
"o Senhor que da a Vida", fazendo com que ela conceba o
Filho Eterno do Pai em uma humanidade proveniente da sua.
(Parágrafos
relacionados: 689,723)
- Ao ser concebido como homem no seio da
Virgem Maria, o Filho Único do Pai é "Cristo", isto e, ungido
pelo Espirito Santo desde o início de sua existência humana, ainda que sua
manifestação só se realize progressivamente: aos pastores, aos magos, a
João Batista, aos discípulos. Toda a Vida de Jesus Cristo manifestará,
portanto, "como Deus o ungiu com o Espírito e com poder" (At
10,38).
(Parágrafo relacionado:
437)
II... Nascido da Virgem Maria
- O que a fé católica crê acerca de Maria
funda-se no que ela crê acerca de Cristo, mas o que a fé ensina sobre
Maria ilumina, por sua vez, sua fé em Cristo.
(Parágrafo relacionado: 963)
A PREDESTINAÇÃO DE MARIA
- "Deus enviou Seu Filho" (Gl
4,4), mas, para "formar-lhe um corpo" quis a livre cooperação de
uma criatura. Por isso, desde toda a eternidade, Deus escolheu, para ser a
Mãe de Seu Filho, uma filha de Israel, uma jovem judia de Nazaré na Galiléia,
"uma virgem desposada com um varão chamado José, da casa de Davi, e o
nome da virgem era Maria" (Lc 1,26-27):
Quis
o Pai das misericórdias que a Encarnação fosse precedida pela aceitação daquela
que era predestinada a ser Mãe de seu Filho, para que, assim como uma mulher
contribuiu para a morte, uma mulher também contribuísse para a vida.
- Ao longo de toda a Antiga Aliança, a
missão de Maria foi preparada pela missão de santas mulheres. No princípio
está Eva: a despeito de sua desobediência, ela recebe a promessa de uma
descendência que será vitoriosa sobre o Maligno e a de ser a mãe de
todos os viventes Em virtude dessa promessa, Sara concebe um filho, apesar
de sua idade avançada. Contra toda expectativa humana, Deus escolheu o era
tido como impotente e fraco para mostrar sua fidelidade à sua promessa:
Ana, a mãe de Samuel, Débora, Rute, Judite e Ester, e muitas outras
mulheres. Maria "sobressai entre (esses) humildes e pobres do Senhor,
que dele esperam e recebem com confiança a Salvação. Com ela, Filha de Sião
por excelência, depois de uma demorada espera da promessa, completam-se os
tempos e se instaura a nova economia"
(Parágrafos
relacionados: 722,410,145,64)
A IMACULADA CONCEIÇÃO
- Para ser a Mãe do Salvador, Maria
"'foi enriquecida por Deus com dons dignos para tamanha função".
No momento da Anunciação, o anjo Gabriel a saúda como "cheia de
graça". Efetivamente, para poder dar o assentimento livre de sua fé
ao anúncio de sua vocação era preciso que ela estivesse totalmente sob a
moção da graça de Deus.
(Parágrafos
relacionados: 2676,2853,2001)
- Ao longo dos séculos, a Igreja tomou
consciência de que Maria, "cumulada de graça" por Deus, foi
redimida desde a concepção. E isso que confessa o dogma da
Imaculada Conceição, proclamado em 1854 pelo papa Pio IX:
(Parágrafo
relacionado: 411)
A beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante de sua
Conceição, por singular graça e privilégio de Deus onipotente, em vista dos
méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano foi preservada imune de toda
mancha do pecado original.
- Esta "santidade resplandecente,
absolutamente única" da qual Maria é "enriquecida desde o
primeiro instante de sua conceição. lhe vem inteiramente de Cristo:
"Em vista dos méritos de seu Filho, foi redimida de um modo mais
sublime". Mais do que qualquer outra pessoa criada, o Pai a
"abençoou com toda a sorte de bênçãos espirituais, nos céus, em
Cristo" (Ef 1,3). Ele a "escolheu nele (Cristo), desde antes da
fundação do mundo, para ser santa e imaculada em sua presença, no
amor" (Ef 1,4).
(Parágrafos relacionados:
2011,1077)
- Os Padres da tradição oriental chamam a
Mãe de Deus "a toda santa" ("Pan-hagia"; pronuncie
"pan-haguía"), celebram-na como "imune de toda mancha de
pecado, tendo sido plasmada pelo Espirito Santo, e formada como uma nova
criatura". Pela graça de Deus, Maria permaneceu pura de todo pecado
pessoal ao longo de toda a sua vida.
"FAÇA-SE EM MIM SEGUNDO A TUA
PALAVRA...
- Ao anúncio de que, sem conhecer homem
algum, ela conceberia o Filho do Altíssimo pela virtude do Espírito Santo,
Maria respondeu com a "obediência da fé", certa de que
"nada é impossível a Deus": "Eu sou a serva do Senhor,
faça-se em mim segundo a tua palavra" (Lc 1,37-38). Assim, dando à
Palavra de Deus o seu consentimento, Maria se tomou Mãe de Jesus e,
abraçando de todo o coração, sem que nenhum pecado a retivesse, a vontade
divina de salvação, entregou-se ela mesma totalmente à pessoa e à obra de
seu Filho, para servir, na dependência dele e com Ele, pela graça de Deus,
ao Mistério da Redenção:
(Parágrafos relacionados: 2617,148,968)
Como diz Santo Irineu, "obedecendo, se fez causa
de salvação tanto para si como para todo o gênero humano". Do mesmo modo,
não poucos antigos Padres dizem com ele: "O nó da desobediência de Eva foi
desfeito pela obediência de Maria; o que a virgem Eva ligou pela incredulidade
a virgem Maria desligou pela fé". Comparando Maria com Eva, chamam Maria
de "mãe dos viventes" e com freqüência afirmam: "Veio a morte
por Eva e a vida por Maria".
(Parágrafo relacionado: 726)
A MATERNIDADE DIVINA DE MARIA
- Denominada nos Evangelhos "a Mãe de
Jesus" (João 2,1;19,25), Maria é aclamada, sob o impulso do Espírito,
desde antes do nascimento de seu Filho, como "a Mãe de meu
Senhor" (Lc 1,43). Com efeito, Aquele que ela concebeu Espírito Santo
como homem e que se tornou verdadeiramente seu Filho segundo a carne não é
outro que o Filho eterno do Pai, a segunda Pessoa da Santíssima Trindade.
A Igreja confessa que Maria é verdadeiramente Mãe de Deus (Theotókos).
(Parágrafos relacionados: 466,2677)
A VIRGINDADE DE MARIA
- Desde as primeiras formulações da fé, a
Igreja confessou que Jesus foi concebido exclusivamente pelo poder do
Espírito Santo no seio da Virgem Maria, afirmando também o aspecto
corporal deste evento: Jesus foi concebido "do Espírito Santo, sem sêmen".
Os Padres vêem na conceição virginal o sinal de que foi verdadeiramente o
Filho de Deus que veio numa humanidade como a nossa:
Assim,
Santo Inácio de Antioquia (início do século II): "Estais firmemente
convencidos acerca de Nosso Senhor, que é verdadeiramente da raça de Davi
segundo a carne, Filho de Deus segundo a vontade e o poder de Deus,
verdadeiramente nascido de uma virgem... ele foi verdadeiramente pregado, na
sua carne, {à cruz} por nossa salvação sob Pôncio Pilatos... ele sofreu
verdadeiramente, como também ressuscitou verdadeiramente".
- Os relatos evangélicos entendem a
conceição virginal como uma obra divina que ultrapassa toda compreensão e
toda possibilidade humanas: "O que foi gerado nela vem do Espírito
Santo", diz o anjo a José acerca de Maria, sua noiva (Mt 1,20). A
Igreja vê aí o cumprimento da promessa divina dada pelo profeta Isaias:
"Eis que a virgem conceber e dar à luz um filho" (Is
7,14, segundo a tradução grega de Mt 1,23).
- Por vezes tem-se estranhado o silêncio do
Evangelho de São Marcos e das epístolas do Novo Testamento sobre a
concepção virginal de Maria. Houve também quem se perguntasse se não se
trataria aqui de lendas ou de construções teológicas sem pretensões
históricas. A isto deve-se responder: a fé na concepção virginal de Jesus
deparou com intensa oposição, zombarias ou incompreensões da parte dos
não-crentes, judeus e pagãos. Ela não era motivada pela mitologia pagã ou
por alguma adaptação às idéias do tempo. O sentido deste acontecimento só
é acessível à fé, que o vê no "nexo que interliga os mistérios entre
si", no conjunto dos Mistérios de Cristo, desde a sua Encarnação até
a sua Páscoa. Santo Inácio de Antioquia já dá testemunho deste
nexo: "O príncipe deste mundo ignorou a virgindade de Maria e o seu
parto, da mesma forma que a Morte do Senhor: três mistérios proeminentes
que se realizaram no silêncio de Deus.
(Parágrafos relacionados: 90,2717)
MARIA - "SEMPRE VIRGEM"
- O aprofundamento de sua fé na maternidade
virginal levou a Igreja a confessar a virgindade real e perpétua de Maria,
mesmo no parto do Filho de Deus feito homem. Com efeito, o nascimento de
Cristo "não lhe diminuiu, mas sagrou a integridade virginal" de
sua mãe. A Liturgia da Igreja celebra Maria como a
"Aeiparthenos" (pronuncie " áeiparthénos"),
"sempre virgem".
- A isto objeta-se por vezes que a Escritura
menciona Irmãos e irmãs de Jesus. A Igreja sempre entendeu que essas
passagens não designam outros filhos da Virgem Maria: com efeito, Tiago e
José, "irmãos de Jesus" (Mt 13,55), são os filhos de uma Maria
discípula de Cristo que significativamente é designada como "a outra
Maria" (Mt 28,1). Trata-se de parentes próximos de Jesus, consoante
uma expressão conhecida do Antigo Testamento.
- Jesus é o Filho Único de Maria. Mas a
maternidade espiritual de Maria estende-se a todos os homens que Ele veio
salvar: "Ela gerou seu Filho, do qual Deus fez "o primogênito
entre uma multidão de irmãos" (Rm 8,29), isto é, entre os fiéis, em
cujo nascimento e educação Ela coopera com amor materno.
(Parágrafos relacionados: 969,970)
A MATERNIDADE VIRGINAL DE MARIA NO DESÍGNIO DE DEUS
- O olhar da fé pode descobrir, tendo em
mente o conjunto da Revelação, as razões misteriosas pelas quais Deus, em
seu desígnio salvífico, quis que seu Filho nascesse de uma virgem. Essas
razões tocam tanto a pessoa e a missão redentora de Cristo quanto o
acolhimento desta missão por Maria em favor de todos os homens.
(Parágrafo
relacionado: 90)
- A virgindade de Maria manifesta a
iniciativa absoluta de Deus Encarnação. Jesus tem um só Pai: Deus. "A
natureza humana que ele assumiu nunca o afastou do Pai...; por natureza,
Filho de seu Pai segundo a divindade; por natureza, Filho de sua Mãe,
segundo a humanidade; mas propriamente Filho de Deus em suas duas
naturezas."
(Parágrafo
relacionado: 422)
- Jesus é concebido pelo
poder do Espírito Santo no seio da Virgem Maria, pois ele é o Novo Adão
que inaugura a nova criação: "O primeiro homem, tirado da terra, é
terrestre; o segundo homem vem do Céu" (1Cor 15,47). A humanidade de Cristo é, desde
a sua concepção, repleta do Espírito Santo, pois Deus "lhe dá o
Espírito sem medida" (Jo 3,34). É da "plenitude dele",
cabeça da humanidade remida, que "nós recebemos graça sobre
graça" (Jo 1,16).
(Parágrafo
relacionado: 359)
- Jesus, o Novo Adão, inaugura por sua
concepção virginal o novo nascimento dos filhos de adoção no Espírito
Santo pela fé. "Como se fará isto?" (Lc 1,34). A
participação na vida divina não vem "do sangue, nem de uma vontade da
carne, nem de uma vontade do homem, mas de Deus" (Jo 1,13). O
acolhimento desta vida é virginal, pois esta é totalmente dada pelo
Espírito ao homem. O sentido esponsal da vocação humana em relação a Deus
é realizado perfeitamente na maternidade virginal de Maria.
(Parágrafo
relacionado: 1265)
- Maria é virgem porque sua virgindade é o
sinal de sua fé, absolutamente livre de qualquer dúvida", e de sua
doação sem reservas à vontade de Deus. É sua fé que lhe concede tomar-se a
Mãe do Salvador: "Beatior est Maria percipiendo fidem Christi quam
concipiendo carnem Christi - Maria é mais bem-aventurada recebendo a fé de
Cristo do que concebendo a carne de Cristo".
(Parágrafos
relacionados: 148,1814)
- Maria é ao mesmo tempo Virgem e Mãe por
ser a figura e a mais perfeita realização da Igreja "A Igreja...
torna-se também ela Mãe por meio da palavra de Deus que ela recebe na fé,
pois pela pregação e pelo Batismo ela gera para a vida nova e imortal os
filhos concebidos do Espírito Santo e nascidos de Deus. Ela é também a
virgem que guarda, íntegra e puramente, a fé dada a seu Esposo."
(Parágrafos
relacionados: 967,149)
RESUMINDO
- Na descendência de Eva, Deus escolheu a
Virgem Maria para ser a Mãe de seu Filho. "Cheia de graça", ela
é "o fruto mais excelente da Redenção". Desde o primeiro
instante de sua concepção, foi totalmente preservada da mancha do pecado
original e permaneceu pura de todo pecado pessoal ao longo de toda a sua
vida.
- Maria é verdadeiramente "Mãe de
Deus", visto ser a Mãe do Filho Eterno de Deus feito homem, que é ele
mesmo Deus.
- Maria "permaneceu Virgem concebendo
seu Filho, Virgem ao dá-lo à luz, Virgem ao carregá-lo, Virgem ao
alimentá-lo de seu seio, Virgem sempre" : com todo o seu ser Ela é
"a Serva do Senhor" (Lc 1,38).
- A Virgem Maria cooperou "para a
salvação humana com livre fé e obediência" Pronunciou seu 'fiat"
(faça-se) "em representação de toda a natureza humana" Por sua
obediência, tornou-se a nova Eva, Mãe dos viventes.
PRIMEIRA PARTE -
SEGUNDA SEÇÃO: A PROFISSÃO DA FÉ CRISTÃ
OS SÍMBOLOS DA FÉ
CAPITULO II -
ARTIGO 3 - PARÁGRAFO 3
OS MISTÉRIOS DA
VIDA DE CRISTO
- No tocante à vida de Cristo, o Símbolo da
Fé fala somente dos mistérios da Encarnação (Conceição e Nascimento)
Páscoa (Paixão, Crucifixão, Morte, Sepultamento, Descida aos Infernos,
Ressurreição, Ascensão). Não diz nada, explicitamente dos mistérios da
vida oculta e pública de Jesus. Mas os artigos da fé referentes à
Encarnação e à Páscoa de Jesus iluminam toda a vida terrestre de Cristo.
"Tudo o que Jesus fez e ensinou, desde o começo até o dia em que foi
arrebatado" (At 1,1-2), deve ser visto à luz dos mistérios do Natal e
da Páscoa.
(Parágrafo
relacionado: 1163)
- A Catequese, conforme as circunstâncias,
há desenvolver toda a riqueza dos Mistérios de Jesus. Aqui é suficiente
indicar alguns elementos comuns a todos os mistérios da vida de Cristo
(I), para em seguida esboçar os principais mistérios da vida oculta (II) e
pública (III) de Jesus.
(Parágrafos relacionados: 426,561)
I- Toda a vida de Cristo é mistério
- Muitas coisas que interessam à curiosidade
humana acerca de Jesus não figuram nos Evangelhos. Quase nada é dito sobre
sua vida em Nazaré, e mesmo uma grande parte de sua vida pública não é
relatada. O que foi escrito nos Evangelhos foi "para crerdes que
Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida em seu
nome" (Jo 20, 31).
- Os Evangelhos foram escritos por homens
que estiveram entre os primeiros a ter a fé e que queriam compartilhá-la
com outros. Depois de terem conhecido na fé quem é Jesus, puderam ver e
fazer ver os traços de seu mistério em toda a sua vida terrestre. Desde os
paninhos de sua natividade até o vinagre de sua Paixão e o sudário de sua
Ressurreição, tudo na vida de Jesus é sinal de seu Mistério. Por meio de
seus gestos, de seus milagres, de suas palavras, foi revelado que
"nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade" (Cl
2,9). Sua humanidade aparece, assim, como o "sacramento", isto
é, o sinal e o instrumento de sua divindade e da salvação que ele traz: o
que havia de visível em sua vida terrestre apontava para o mistério invisível
de sua filiação divina e de sua missão redentora.
(Parágrafos relacionados: 126,609,774,477)
OS TRAÇOS COMUNS DOS MISTÉRIOS DE JESUS
- Toda a vida de Cristo é Revelação do Pai:
suas palavras e seus atos, seus silêncios e seus sofrimentos, sua maneira de
ser e de falar. Jesus pode dizer: "Quem me vê, vê o Pai" (Jo
14,9); e o Pai pode dizer: "Este é o meu Filho, o Eleito;
ouvi-o" (Lc 9,35). Tendo Nosso Senhor se feito homem para cumprir a
vontade do Pai, Os mínimos traços de seus mistérios nos manifestam "o
amor de Deus por nos".
(Parágrafos
relacionados: 65,2708)
- Toda a vida de Cristo é mistério de
Redenção. A Redenção nos vem antes de tudo pelo sangue da Cruz, mas este
mistério está em ação em toda a vida de Cristo: já em sua
Encarnação, pela qual, fazendo-se pobre, nos enriqueceu por sua pobreza;
em sua vida oculta, que, por sua submissão, serve de reparação para nossa
insubmissão; em sua palavra, que purifica seus ouvintes; em suas curas e
em seus exorcismos, pelos quais "levou nossas fraquezas e carregou
nossas doenças" (Mt 8,17); em sua Ressurreição, pela qual nos
justifica.
(Parágrafos
relacionados: 606,1115)
- Toda a vida de Cristo é mistério de
Recapitulação. Tudo o que Jesus fez, disse e sofreu tinha por meta
restabelecer o homem caído em sua vocação primeira:
(Parágrafos relacionados: 668,2748)
Quando ele se encarnou e se fez homem, recapitulou em
si mesmo a longa história dos homens e, em resumo, nos proporcionou a salvação,
de sorte que aquilo que havíamos perdido em Adão, isto é, sermos à imagem e à
semelhança de Deus, o recuperamos em Cristo Jesus. É, aliás, por isso que
Cristo passou por todas as idades da vida, restituindo com isto a os homens a
comunhão com Deus
NOSSA COMUNHÃO COM OS MISTÉRIOS DE JESUS
- Toda a riqueza de Cristo "é destinada
a cada homem e constitui o bem de cada um". Cristo não viveu sua vida
para si mesmo, mas para nós, desde sua Encarnação "por nossos homens,
e por nossa salvação" até sua Morte "por nossos pecados"
(1Cor 15,3) e sua Ressurreição "para nossa justificação" (Rm
4,25). Ainda agora, Ele é "nosso advogado junto do Pai" (1Jo
2,1), "estando sempre vivo para interceder a nosso favor" (Hb
7,25). Com tudo o que viveu e sofreu por nós vez por todas, Ele permanece
presente para sempre "diante face de Deus a nosso favor" (Hb
9,24).
(Parágrafos
relacionados: 793,602,1085)
- Em toda a sua vida, Jesus mostra-se como
nosso modelo Ele é "o homem perfeito" que nos convida a
tomar-nos seus discípulos e a segui-lo: por seu rebaixamento, deu-nos um
exemplo a imitar; por sua oração, atrai à oração; por sua pobreza chama a
aceitar livremente o despojamento e as perseguições.
(Parágrafos
relacionados: 459,359,2609)
- Tudo o que Cristo viveu foi para que
pudéssemos vivê-lo nele e para que Ele o vivesse em nos. "Por sua
Encarnação, o Filho de Deus, de certo modo, se uniu a todo homem."
Nós somos chamados a ser uma só coisa com Ele; Ele nos faz partilhar
(comungar), como membros de seu corpo, de tudo o que (Ele), por nós e como
nosso modelo, viveu em sua carne.
(Parágrafos relacionados: 2715,1391)
Devemos continuar e realizar em nós os estados e os
mistérios de Jesus, e pedir-lhe muitas vezes que os complete e realize em nós e
em toda a sua Igreja... Pois o Filho de Deus deseja conceder uma certa
participação, e fazer como que uma extensão e continuação de seus mistérios em
nós e em toda a sua Igreja, pelas graças que quer comunicar-nos, e pelos
efeitos que quer operar em nós por esses mistérios. Por estes meios quer
realizá-los em nós.
II. Os mistérios da infância e da vida oculta de Jesus
A PREPARAÇÃO
- A vinda do Filho de Deus à terra é um
acontecimento de tal imensidão que Deus quis prepará-lo durante séculos.
Ritos e sacrifícios, figuras e símbolos da "Primeira Aliança",
tudo ele faz convergir para Cristo; anuncia-o pela boca dos profetas que
se sucedem em Israel. Desperta, além disso, no coração dos pagãos a
obscura expectativa desta vinda.
(Parágrafos
relacionados: 711,762)
- São João Batista é o precursor imediato do
Senhor, enviado para preparar-lhe o caminho. "Profeta do Altíssimo"
(Lc; 1,76), ele supera todos os profetas, deles é o último, inaugura o
Evangelho; saúda a vinda de Cristo desde o seio de sua mãe e encontra sua
alegria em ser "o amigo do esposo" (Jo 3,29), que designa como
"o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo" (Jo 1,29).
Precedendo a Jesus "com o espírito e o poder de Elias" (Lc
1,17), dá-lhe testemunho por sua pregação, seu batismo de conversão e,
finalmente, seu martírio.
(Parágrafos
relacionados: 712,720)
- Ao celebrar cada ano a liturgia do
Advento, a Igreja atualiza esta espera do Messias: comungando com a longa
preparação da primeira vinda do Salvador, os fiéis renovam o ardente
desejo de sua Segunda Vinda. Pela celebração da natividade e do martírio
do Precursor, a Igreja se une a seu desejo: "É preciso que Ele cresça
e que eu diminua" (Jo 3,30).
(Parágrafo relacionado: 1171)
O MISTÉRIO DO NATAL
- Jesus nasceu na humildade de um estábulo,
em uma família pobre; as primeiras testemunhas do evento são simples
pastores. É nesta pobreza que se manifesta a glória do Céu. A Igreja não
se cansa de cantar a glória dessa noite:
Hoje a Virgem traz ao mundo o Eterno
(Parágrafos relacionados: 437,2443)
E a terra oferece uma gruta ao Inacessível.
Os anjos e os pastores o louvam
E os magos caminham com a estrela.
Pois Vós nascestes por nós, Menino, Deus eterno!
- "Tornar-se criança" em relação a
Deus é a condição para entrar no Reino; para isso é preciso humilhar-se,
tornar-se pequeno; mais ainda: é preciso "nascer do alto" (Jo
3,7), "nascer de Deus" para tornar-nos filhos de Deus. O
mistério do Natal realiza-se em nós quando Cristo "toma forma"
em nós. O Natal é o mistério deste "admirável intercâmbio:
O admirabile commercium! Creator generis humani, anima
corpus sumens, de Vir gine nasci digna tus est; et procedens homo sine semine,
largitus est nobis suam deitatem - Admirável intercâmbio! O Criador da
humanidade, assumindo corpo e dignou-se nascer de uma Virgem; e, tomando-se
homem intervenção do homem, nos doou sua própria divindade!
(Parágrafo relacionado: 460)
Os MISTÉRIOS DA INFÂNCIA DE JESUS
- A circuncisão de Jesus, no oitavo dia
depois de seu nascimento, é sinal de sua inserção na descendência de
Abraão, no povo da Aliança, de sua submissão à Lei e de capacitação para o
culto de Israel, do qual participará durante sua toda a vida. Este sinal
prefigura "a circuncisão de Cristo", que é o Batismo.
(Parágrafos
relacionados: 580,1214)
- A epifania é a manifestação de Jesus como
Messias Israel, Filho de Deus e Salvador do mundo. Com o Batismo de Jesus
no Jordão e com as bodas de Caná, ela celebra a adoração de Jesus pelos
"magos" vindos do Oriente. Nesses "magos",
representantes das religiões pagãs circunvizinhas, o Evangelho vê as
primícias das nações que acolhem a Boa Nova da salvação pela Encarnação. A
vinda dos magos a Jerusalém para "adorar ao Rei dos Judeus"
mostra que eles procuram em Israel, à luz messiânica da estrela de Davi,
aquele que será o Rei das nações. Sua vinda significa que os pagãos
só podem descobrir Jesus e adorá-lo como Filho de Deus e Salvador do mundo
voltando-se para os judeus e recebendo deles sua promessa messiânica, tal
como está contida no Antigo Testamento. A Epifania manifesta que
"a plenitude dos pagãos entra na família dos patriarcas" e
adquire a "dignidade israelítica".
(Parágrafos relacionados:
439,711-716,122)
- A apresentação de Jesus no Templo mostra-o
como o Primogênito pertencente ao Senhor. Com Simeão e Ana, é toda a
espera de Israel que vem ao encontro de seu Salvador (a tradição bizantina
designa com este termo tal acontecimento). Jesus é reconhecido como o
Messias tão esperado, "luz das nações" e "Glória de
Israel", mas também "sinal de contradição". A espada de dor
predita a Maria anuncia esta outra oblação, perfeita e única, da Cruz, que
dará a salvação que Deus "preparou diante de todos os
povos".
(Parágrafos
relacionados: 583,439,614)
- A fuga para o Egito e o massacre dos
inocentes manifestam a oposição das trevas à luz: "Ele veio para o
que era seu e os seus não o receberam" (Jo 1,11). Toda a vida de
Cristo estará sob o signo da perseguição. Os seus compartilham com
Ele esta perseguição. Sua volta do Egito lembra o Êxodo e apresenta Jesus
como o libertador definitivo.
(Parágrafo relacionado: 574)
OS MISTÉRIOS DA VIDA OCULTA DE JESUS
- Durante a maior parte de sua vida, Jesus
compartilhou a condição da imensa maioria dos homens: uma vida cotidiana.
Sem grandeza aparente, vida de trabalho manual, vida religiosa judaica
submetida à Lei de Deus, vida na comunidade. De todo este período é-nos
revelado que Jesus era "submisso" a seus pais e que
"crescia em sabedoria, em estatura em graça diante de Deus e diante
dos homens" (Lc 2,52).
(Parágrafo
relacionado: 2427)
- A submissão de Jesus a sua
Mãe e a seu pai legal cumpre com perfeição o quarto mandamento. Ela é a
imagem temporal de sua obediência filial a seu Pai celeste. A submissão
diária de Jesus a José e a Maria anunciava e antecipava a submissão da
Quinta-feira Santa: "Não a minha vontade..." (Lc 22,42). A obediência de Cristo no
cotidiano da vida condida inaugurava já a obra de restabelecimento
daquilo a desobediência de Adão havia destruído.
(Parágrafos
relacionados: 2214,2220,612)
- A vida oculta de Nazaré permite a todo
homem estar unido a Jesus nos caminhos mais cotidianos da vida:
Nazaré é a escola na qual se começa a compreender a
vida de Jesus: a escola do Evangelho... Primeiramente, uma lição de silêncio.
Que nasça em nós a estima do silêncio, esta admirável e indispensável condição
do espírito... Uma lição de vida familiar. Que Nazaré nos ensine o que é a
família, sua comunhão de amor, sua beleza austera e simples, seu caráter
sagrado e inviolável... Uma lição de trabalho. Nazaré, ó casa do "Filho do
Carpinteiro", é aqui que gostaríamos de compreender e celebrar a lei
severa e redentora do trabalho humano...; assim como gostaríamos finalmente de
saudar aqui todos os trabalhadores do mundo inteiro e mostrar-lhes seu grande
modelo, seu Irmão divino.
(Parágrafos
relacionados: 2717,2427)
- O reencontro de Jesus no Templo é o único
acontecimento que rompe o silêncio dos Evangelhos sobre os anos ocultos de
Jesus. Nele Jesus deixa entrever o mistério de sua consagração total a uma
missão decorrente de sua filiação divina: "Não sabíeis que devo
ocupar-me com as coisas de meu Pai?" (Lc 2,49). Maria e José
"não compreenderam" esta palavra, mas a acolheram na fé, e Maria
"guardava a lembrança de todos esses fatos em seu coração" (Lc
2,51), ao longo dos anos em que Jesus permanecia mergulhado no silêncio de
uma vida ordinária.
(Parágrafos relacionados: 583,2599,964)
III. OS MISTÉRIOS DA VIDA PÚBLICA DE JESUS
O BATISMO DE JESUS
- A vida pública de Jesus tem início com seu
Batismo por João no rio Jordão. João Batista proclamava "um batismo
de arrependimento para a remissão dos pecados" (Lc 3,3). Uma multidão
de pecadores, de publicanos e soldados, fariseus e saduceus e prostitutas
vem fazer-se batizar por ele. Jesus aparece, o Batista hesita, mas Jesus
insiste. E Ele recebe o Batismo. Então o Espírito Santo, sob forma de
pomba, vem sobre Jesus, e a voz do céu proclama: "Este é o meu Filho bem-amado"
(Mt 3,13-17). É a manifestação ("Epifania") de Jesus como
Messias de Israel e Filho de Deus.
(Parágrafos
relacionados: 719-720,701,438)
- O Batismo de Jesus é, da parte dele, a
aceitação e a inauguração de sua missão de Servo sofredor. Deixa-se contar
entre os pecadores; é, já, "o Cordeiro de Deus que tira o pecado do
mundo" (Jo 1,29), antecipa já o "Batismo" de sua
morte sangrenta. Vem, já, "cumprir toda a justiça" (Mt 3,15), ou
seja, submete-se por inteiro à vontade de seu Pai: aceita por amor este
batismo de morte para a remissão de nossos pecados. A esta aceitação
responde a voz do Pai, que coloca toda a sua complacência em seu Filho. O
Espírito que Jesus possui em plenitude desde a sua concepção vem
"repousar" sobre Ele. Jesus ser a fonte do Espírito para
toda a humanidade. No Batismo de Jesus, "abriram-se os Céus" (Mt
3,16) que o pecado de Adão havia fechado; e as águas são
santificadas pela descida de Jesus e do Espírito, prelúdio da nova
criação.
(Parágrafos
relacionados: 606,1224,444,727,739)
- Pelo Batismo, o cristão é
sacramentalmente assimilado a Jesus, que antecipa em seu Batismo a sua
Morte e a sua Ressurreição; deve entrar neste mistério de rebaixamento
humilde e de arrependimento, descer à água com Jesus para subir
novamente com ele, renascer da água e do Espírito para tornar-se, no
Filho, filho bem-amado do Pai e "viver em uma vida nova" (Rm
6,4):
(Parágrafo relacionado: 1262)
Sepultemo-nos com Cristo pelo Batismo, para
ressuscitar com Ele; desçamos com Ele, para ser elevados com Ele; subamos
novamente com Ele, para ser glorificados nele.
(Parágrafo relacionado: 628)
Tudo o que aconteceu com Cristo dá-nos a conhecer que,
depois da imersão na água, o Espírito Santo voa sobre nós do alto do Céu
e que, adotados pela Voz do Pai, nos tornamos filhos de Deus.
A TENTAÇÃO DE JESUS
- Os Evangelhos falam de um tempo de solidão
de Jesus no deserto, imediatamente após seu Batismo por João: "Levado
pelo Espírito" ao deserto, Jesus ali fica quarenta dias sem comer,
vive com os animais selvagens e os anjos o servem. No final dessa
permanência, Satanás o tenta por três vezes procurando questionar sua
atitude filial para com Deus. Jesus rechaça esses ataques que recapitulam
as tentações de Adão no Paraíso e de Israel no deserto, e o Diabo afasta-se
dele "até o tempo oportuno" (Lc 4,13).
(Parágrafos
relacionados: 394,518)
- Os evangelistas assinalam o sentido
salvífico desse acontecimento misterioso. Jesus é o novo Adão, que ficou
fiel onde o primeiro sucumbiu à tentação. Jesus cumpre à perfeição a
vocação de Israel: contrariamente aos que provocai outrora a Deus durante
quarenta anos no deserto, Cristo se revela como o Servo de Deus totalmente
obediente à vontade divina. Nisso Jesus é vencedor do Diabo: ele
"amarrou o homem forte" para retomar-lhe a presa. A vitória de
Jesus sobre o tentador no deserto antecipa a vitória da Paixão, obediência
suprema de seu amor filial ao Pai.
(Parágrafos
relacionados: 397,385)
- A tentação de Jesus manifesta a maneira
que o Filho de Deus tem de ser Messias o oposto da que lhe propõe Satanás
e que os homens desejam atribuir-lhe. E por isso que Cristão venceu o
Tentador por nós: "Pois não temos um sumo sacerdote incapaz de
compadecer-se de nossas fraquezas, pois Ele mesmo foi provado em tudo como
nós, com exceção do pecado" (Hb 4,15). A Igreja se une a cada ano,
mediante os quarenta dias da Grande Quaresma, ao mistério de Jesus no
deserto.
(Parágrafos relacionados: 2119,519,2849,1438)
"O REINO DE DEUS ESTÁ BEM PRÓXIMO"
- "Depois que João foi preso, Jesus
veio para a Galiléia proclamando, nestes termos, o Evangelho de Deus:
"Cumpriu-se O tempo e o Reino de Deus está próximo.
Convertei-vos e crede no Evangelho"' (Mc 1,14-15). "Para cumprir
a vontade do Pai, Cristo inaugurou o Reino dos céus na terra." Ora, a
vontade do Pai é "elevar os homens à participação da Vida
Divina". Realiza tal intento reunindo os homens em torno de seu
Filho, Jesus Cristo. Esta reunião é a Igreja, que é na terra "O germe
e o começo do Reino de Deus"
(Parágrafos
relacionados: 2816,763,669,768,865)
- Cristo está no centro do
congraçamento dos homens na "família de Deus". Convoca-os junto
a si por sua palavra, por seus sinais que manifestam o reino de Deus, pelo
envio de seus discípulos. Realizar a vinda de seu Reino sobretudo pelo
grande mistério de sua Páscoa: sua morte na Cruz e sua Ressurreição.
"E eu, quando for elevado da terra, atrairei todos a mim" (Jo
12,32). A esta união com Cristo são chamados todos os homens.
(Parágrafos relacionados: 2233,789)
O ANUNCIO DO REINO DE DEUS
- Todos os homens são chamados a entrar no
Reino. Anunciado primeiro aos filhos de Israel, este Reino messiânico está
destinado a acolher os homens de todas as nações. Para ter acesso a ele, é
preciso acolher a palavra de Jesus:
(Parágrafo relacionado: 764)
Pois a palavra do Senhor é comparada à semente semeada
no campo: os que a ouvem com fé e são contados no número da pequena grei de
Cristo receberam o próprio Reino; depois, por sua própria força, a semente
germina e cresce até o tempo da messe.
- O Reino pertence aos pobres e aos
pequenos, isto é, aos que o acolheram com um coração humilde. Jesus é
enviado para "evangelizar os pobres" (Lc 4,18). Declara-os
bem-aventurados, pois "o Reino dos Céus é deles" (Mt 5,3); foi
aos "pequenos" que o Pai se dignou revelar o que permanece
escondido aos sábios e aos entendidos. Jesus compartilha a vida dos pobres
desde a manjedoura até a cruz; conhece a fome, a sede e a indigência. Mais
ainda: identifica-se com os pobres de todos os tipos e faz do amor ativo
para com eles a condição para se entrar em seu Reino.
(Parágrafos
relacionados: 709,2443,2546)
- Jesus convida os pecadores à mesa do
Reino: "Não vim chamar justos, mas pecadores" (Mc 2,17).
Convida-os à conversão, sem a qual não se pode entrar no Reino, mas
mostrando-lhes, com palavras e atos, a misericórdia sem limites do Pai por
eles e a imensa "alegria no céu por um único pecador que se
arrepende" (Lc 15,7). A prova suprema deste amor ser o
sacrifício de sua própria vida "em remissão dos pecados" (Mt 26.28).
(Parágrafos
relacionados: 1443,588,1846,1439)
- Jesus convida a entrar no Reino por meio
das parábolas, traço típico de seu ensinamento. Por elas, convida ao
festim do Reino, mas exige também uma opção radical: para adquirir o Reino
é preciso dar tudo; as palavras não bastam, são necessários atos As
parábolas são como espelhos para o homem: este acolhe a palavra como um
solo duro ou como uma terra boa? Que faz ele dos talentos recebidos? Jesus
e a presença do Reino neste mundo estão secretamente no coração das
parábolas. E preciso entrar no Reino, isto é, tomar-se discípulos de
Cristo para "conhecer os mistérios do Reino dos Céus" (Mt
13,11). Para os que ficam "de fora" (Mc 4,11), tudo permanece
enigmático.
(Parágrafos relacionados: 2613,542)
OS SINAIS DO REINO DE DEUS
- Jesus acompanha suas palavras com
numerosos "milagres, prodígios e sinais" (At 2,22) que
manifestam que o Reino está presente nele. Atestam que Jesus é o
Messias anunciado.
(Parágrafos
relacionados: 670,439)
- Os sinais operados por Jesus testemunham
que o Pai o enviou. Convidam a crer nele. Aos que a Ele se dirigem com fé,
concede o que pedem. Assim, os milagres fortificam a fé naquele que
realiza as obras de seu Pai: testemunham que Ele é o Filho de Deus. Eles
podem também ser "ocasião de escândalo". Não se destinam a
satisfazer a curiosidade e os desejos mágicos. Apesar de seus milagres tão
evidentes, Jesus é rejeitado por alguns; acusam-no até de agir por
intermédio dos demônios.
(Parágrafos
relacionados: 156,2616,574,447)
- Ao libertar certas pessoas dos males
terrestres da fome, da injustiça, da doença e da morte, Jesus operou
sinais messiânicos; não veio, no entanto, para abolir todos os males da
terra, mas para libertar os homens da mais grave das escravidões, a do
pecado, que os entrava em sua vocação de filhos de Deus e causa todas as
suas escravidões humanas.
(Parágrafos
relacionados: 1503,440)
- O advento do Reino de Deus é a derrota do
reino de Satanás: "Se é pelo Espírito de Deus que eu expulso os
demônios, então o Reino de Deus já chegou a vós" (Mt 12,28). Os
exorcismos de Jesus libertam homens do domínio dos demônios. Antecipam a
grande vitória de Jesus sobre "o príncipe deste mundo". E pela
Cruz de Cristo que o Reino de Deus ser definitivamente estabelecido:
"Regnavit a ligno Deus - Deus reinou do alto do madeiro".
(Parágrafos relacionados: 394,1673,440,2816)
"AS CHAVES DO REINO"
- Desde o início de sua vida pública, Jesus
escolhe homens em número de doze para estar com Ele e para participar de
sua missão; dá-lhes participação em sua autoridade "e enviou-os a
proclamar o Reino de Deus e a curar" (Lc 9,2). Permanecem eles para
sempre associados ao Reino de Cristo, pois Jesus dirige a Igreja por
intermédio deles:
(Parágrafos relacionados: 858,765)
Disponho para vós o Reino, como meu Pai o dispôs para
mim, a fim de que comais e bebais à minha mesa em meu Reino, e vos senteis em
tronos para julgar as doze tribos de Israel (Lc 22,29-30).
- No colégio dos Doze, Simão Pedro ocupa o
primeiro lugar. Jesus confiou-lhe uma missão única. Graças a uma revelação
vinda do Pai, Pedro havia confessado: "Tu és o Cristo, o Filho do
Deus vivo" (Mt 16,16). Nosso Senhor lhe declara na ocasião: "Tu
és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha Igreja, e as Portas do
Inferno nunca prevalecerão contra ela" (Mt 16,18). Cristo, "Pedra
viva"; garante a sua Igreja construída sobre Pedro a vitória sobre as
potências de morte. Pedro, em razão da fé por ele confessada, permanecerá
como a rocha inabalável da Igreja. Terá por missão defender esta fé
de todo desfalecimento e confirmar nela seus irmãos.
(Parágrafos
relacionados: 880,153,442,424)
- Jesus confiou a Pedro uma autoridade
específica: "Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: o que ligares
na terra será ligado nos Céus, e o que desligares na terra será
desligado nos Céus" (Mt 16,19). O "poder das chaves"
designa a autoridade para governar a casa de Deus, que é a Igreja. Jesus,
"o Bom Pastor" (Jo 10,11), confirmou este encargo depois de sua
Ressurreição: "Apascenta as minhas ovelhas" (Jo 21,15-17). O
poder de "ligar e desligar" significa a autoridade para absolver
os pecados, pronunciar juízos doutrinais e tomar decisões disciplinares na
Igreja. Jesus confiou esta autoridade à Igreja pelo ministério dos
apóstolos e particularmente de Pedro, o único ao qual confiou
explicitamente as chaves do Reino.
(Parágrafos relacionados: 381,1445,641,881)
UM ANTEGOZO DO REINO: A TRANSFIGURAÇÃO
- A partir do dia em que Pedro confessou que
Jesus é o Cristo, o Filho do Deus vivo, o Mestre "começou a mostrar a
seus discípulo que era necessário que fosse a Jerusalém e sofresse... que
fosse morto e ressurgisse ao terceiro dia" (Mt 16,21): Pedro rechaça
este anúncio, os demais também não o compreendem. É neste contexto que se
situa o episódio misterioso da Transfiguração de Jesus sobre um monte elevado,
diante de três testemunhas escolhidas por ele: Pedro, Tiago e João. O
rosto e as vestes de Jesus tornam-se fulgurantes de luz, Moisés e Elias
aparecem, "falavam de sua partida que iria se consumar em
Jerusalém" (Lc 9,31). Uma nuvem os cobre e uma voz do céu diz:
"Este é o meu Filho, o Eleito; ouvi-o" (Lc 9,35).
(Parágrafos
relacionados: 697,2600,444)
- Por um instante, Jesus mostra sua glória
divina, confirmando, assim, a confissão de Pedro. Mostra também que, para
"entrar em sua glória" (Lc 24,26), deve passar pela Cruz em
Jerusalém. Moisés e Elias haviam visto a glória de Deus sobre a Montanha;
a Lei e os profetas tinham anunciado os sofrimentos do Messias. A Paixão
de Jesus é sem dúvida a vontade do Pai: o Filho age como servo de Deus. A
nuvem indica a presença do Espírito Santo: "Tota Trinitas apparuit:
Pater in voce; Filius in homine, Spiritus in nube clara - A Trindade
inteira apareceu: o Pai, na voz; o Filho, no homem; o Espírito, na nuvem
clara":
(Parágrafos relacionados: 2576,2583,257)
Vós vos transfigurastes na montanha e, porquanto eram
capazes, vossos discípulos contemplaram vossa Glória, Cristo Deus, para que,
quando vos vissem crucificado, compreendessem que vossa Paixão era voluntária e
anunciassem ao mundo que vós sois verdadeiramente a irradiação do Pai.
- No limiar da vida pública, o Batismo; no
limiar da Páscoa, a Transfiguração. Pelo Batismo de Jesus "declaratum
fuit mysterium primae regenerationis - foi manifestado o mistério da
primeira regeneração": o nosso Batismo; a Transfiguração "est
sacramentum secundae regenerationis - é o sacramento da segunda
regeneração": a nossa própria ressurreição. Desde já
participamos da Ressurreição do Senhor pelo Espírito Santo que age nos
sacramentos do Corpo de Cristo A Transfiguração dá-nos um antegozo da
vinda gloriosa do Cristo, "que transfigurar nosso corpo
humilhado, conformando-o ao seu corpo glorioso" (Fl 3,21). Mas ela
nos lembra também "que é preciso passarmos por muitas tribulações
para entrarmos no Reino de Deus" (At 14,22):
(Parágrafos relacionados: 1003)
Pedro ainda não tinha compreendido isso ao desejar
viver com Cristo sobre a montanha. Ele reservou-te isto, Pedro, para depois da
morte. Mas agora Ele mesmo diz: Desce para sofrer na terra, para servir na
terra, para ser desprezado, crucificado na terra. A Vida desce para fazer-se
matar; o Pão desce para ter fome; o Caminho desce para cansar-se da caminhada;
a Fonte desce para ter sede; e tu recusas Sofrer?
A SUBIDA DE JESUS A JERUSALÉM
- "Ora, quando se completaram os dias
de sua elevação, Jesus tomou resolutamente o caminho de Jerusalém"
(Lc 9, 51). Com esta decisão, indicava que subia a Jerusalém pronto para
morrer. Por três vezes tinha anunciado sua Paixão e sua Ressurreição. Ao
dirigir-se para Jerusalém, disse: "Não convém que um profeta pereça
fora de Jerusalém" (Lc 13,33).
- Jesus lembra o martírio dos profetas que
tinham sido mortos em Jerusalém. Todavia, persiste em convidar Jerusalém a
congregar-se em torno dele: "Quantas vezes quis eu ajuntar os teus
filhos, como a galinha recolhe seus pintainhos debaixo das asas... e não o
quiseste" (Mt 23,37b). Quando Jerusalém está à vista, chora sobre ela
e exprime uma vez mais o desejo de seu coração: "Ah! Se neste dia
também tu conhecesses a mensagem de paz! Agora, porém, isto
está escondido a teus olhos" (Lc 19,42).
A ENTRADA MESSIÂNICA DE JESUS EM JERUSALÉM
- Como vai Jerusalém acolher seu Messias?
Embora sempre se tivesse subtraído às tentativas populares de fazê-lo rei.
Jesus escolhe o momento e prepara os detalhes de sua entrada messiânica na
cidade de "Davi, seu pai" (Lc 1,32). É aclamado como o filho de
Davi, aquele que traz a salvação ("Hosana" quer dizer
salva-nos!", "dá a salvação!") Ora, o "Rei de
Glória" (Sl 24,7-10) entra em sua cidade "montado em um
jumento" (Zc 9,9): não conquista a Filha de Sião figura de sua
Igreja, pela astúcia nem pela violência, mas pela humildade que dá
testemunho da Verdade. Por isso os súditos de seu Reino, nesse dia, são as
crianças e os "pobres de Deus" que o aclamam como os anjos o
anunciaram aos pastores. A aclamação deles - "Bendito seja o que vem
em nome do Senhor" (S1 118,26)- é retomada pela Igreja no
"Sanctus" da liturgia eucarística, para abrir o memorial da
Páscoa do Senhor.
(Parágrafos
relacionados: 333,1352)
- A entrada de Jesus em Jerusalém manifesta
a vinda do Reino que o Rei-Messias vai realizar pela Páscoa de sua Morte e
de sua Ressurreição. E com sua celebração, no Domingo de Ramos, que a
liturgia da Igreja abre a grande Semana Santa.
(Parágrafos
relacionados: 550,2816,1169)
RESUMINDO
- "Toda a vida de Cristo foi um
contínuo ensinamento: seus silêncios, seus milagres, seus gestos, sua
oração, seu amor ao homem, sua predileção pelos pequenos e pelos pobres, a
aceitação do sacrifício total na Cruz pela redenção do mundo, Sua
Ressurreição constituem a atuação de sua palavra e o cumprimento da
Revelação.
- Os discípulos de Cristo devem conformar-se
com Ele até Ele se formar neles" É por isso que somos inseridos nos
mistérios de sua vida, com Ele configurados, com Ele mortos e com Ele
ressuscitados, até que com Ele reinemos.
- "Seja pastor, seja mago, não se pode
atingir a Deus na terra senão ajoelhando-se diante da manjedoura de Belém
e adorando-o escondido na fraqueza de uma criança.
- Por sua submissão a Maria e José, assim
como por seu humilde trabalho durante longos anos em Nazaré, Jesus nos dá
o exemplo da santidade na vida cotidiana da família e do trabalho.
- Desde o início de sua vida pública, em seu
Batismo, Jesus é o "Servo", inteiramente consagrado à obra
redentora que se realizará pelo "Batismo" de sua paixão.
- A tentação no deserto mostra Jesus,
Messias humilde que triunfa sobre Satanás por sua total adesão ao desígnio
de salvação querido pelo Pai.
- O Reino dos céus foi inaugurado na terra
por Cristo. "Manifesta-se lucidamente aos homens na palavra, nas
obras e na presença de Cristo. "A Igreja é o germe e o começo desde
Reino. Suas chaves são confiadas a Pedro.
- A Transfiguração de Cristo tem por
finalidade fortificar a fé dos apóstolos em vista da Paixão: a subida à
"elevada montanha" prepara a subida ao Calvário. Cristo,
Cabeça da Igreja, manifesta o que seu Corpo contém e irradia nos
sacramentos "a esperança da Glória" (Cl 1,27).
- Jesus subiu voluntariamente a Jerusalém,
embora soubesse que lá morreria de morte violenta por causa da
contradição por parte dos pecadores.
- A entrada de Jesus em Jerusalém manifesta
a vinda do Reino que o Rei-Messias, acolhido em sua cidade pelas crianças
e pelos humildes de coração, vai realizar por meio da Páscoa de sua Morte
e Ressurreição.