CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA
TERCEIRA PARTE - A VIDA EM CRISTO
INTRODUÇÃO
- "Cristão, reconhece a tua dignidade.
Por participares agora da natureza divina, não te degeneres, retornando à
decadência de tua vida passada. Lembra-te da Cabeça a que pertences e do
Corpo de que és membro. Lembra-te de que foste arrancado do poder das
trevas e transferido para a luz e o Reino de Deus."'
- O Símbolo da fé professou a grandeza dos
dons de Deus ao homem na obra de sua criação e, mais ainda, pela redenção
e santificação. O que a fé confessa os sacramentos comunicam: pelos
"sacramentos que os fizeram renascer", os cristãos se tornaram
"filhos de Deus" (1Jo 3,1), "participantes da natureza
divina" (Pd 1,4). Reconhecendo na fé sua nova dignidade, os cristãos
são chamados a levar a partir de então uma "vida digna do Evangelho
de Cristo". Pelos sacramentos e pela oração, recebem a graça de
Cristo e os dons de seu Espírito, que os tomam capazes disso.
- Jesus Cristo sempre fez o que era do
agrado do Pai. Sempre viveu em perfeita comunhão com Ele. Também os discípulos são
convidados a viver sob o olhar do Pai, "que vê o que esta
oculto" (Mt 6,6), para se tomarem "perfeitos como o vosso Pai
celeste é perfeito" Mt 5,48).
- Incorporados a Cristo pelo Batismo, os
cristãos estão "mortos para o pecado e vivos para Deus em Cristo
Jesus", participando assim da vida do Ressuscitado. Seguindo a Cristo
e em união com ele, podem procurar "tornar-se imitadores de Deus como
filhos amados e andar no amor", conformando seus pensamentos,
palavras e ações aos "sentimentos de Cristo to Jesus e seguindo seus
exemplos".
- "Justificados em nome do Senhor Jesus
Cristo e pelo Espírito de nosso Deus" (1Cor 5,11),
"santificados... chamados a ser santos", os cristãos se tornaram
"templo do Espírito Santo" (1Cor 6,19). Esse "Espírito do
Filho" os ensina a orar ao Pai e, tendo-se tornado vida deles, os faz
agir para carregarem em si "os frutos do Espírito" pela caridade
operante. Curando as feridas do pecado, o Espírito Santo nos "renova pela
transformação espiritual de nossa mente", ele nos ilumina e fortifica
para vivermos como "filhos da luz" (Ef 5,8), na "bondade,
justiça e verdade" em todas as coisas (Ef 5,9).
- O caminho de Cristo "conduz à
vida", um caminho contrário "leva à perdição". A parábola
evangélica dos dois caminhos está sempre presente na catequese da Igreja.
Significa a importância das decisões morais para nossa salvação. "Há
dois caminhos, um da vida e outro da morte; mas entre os dois há grande
diferença.
- Importa, na catequese, revelar com toda clareza
a alegria e as exigências do caminho de Cristo. A catequese da
"vida nova" (Rm 6,4) em Cristo será:
- uma catequese do Espírito Santo, Mestre
interior da vida segundo Cristo, doce hóspede e amigo que inspira, conduz,
retifica e fortifica esta vida;
-
uma catequese da graça, pois é pela graça que somos salvos, e é pela graça que
nossas obras podem produzir frutos para a vida eterna;
-
uma catequese das bem-aventuranças, pois o caminho de Cristo se resume às
bem-aventuranças, único caminho para a felicidade eterna, à qual o coração do
homem aspira;
-
uma catequese do pecado e do perdão, pois, sem reconhecer-se pecador, o homem
não pode conhecer a verdade sobre si mesmo, condição do reto agir, e sem a
oferta do perdão não poderia suportar essa verdade;
-
uma catequese das virtudes humanas, que faz abraçar beleza e a atração das
retas disposições em vista do bem;
-
uma catequese das virtudes cristãs da fé, esperança e caridade, que se inspira
com prodigalidade no exemplo dos santos;
-
uma catequese do duplo mandamento da caridade desenvolvido no Decálogo;
-
uma catequese eclesial, pois é nos múltiplos intercâmbios dos "bens
espirituais" na "comunhão dos santos" que a vida cristã pode
crescer, desenvolver-se e comunicar-se.
- A referência primeira e última dessa
catequese será sempre Jesus Cristo, que é "o caminho, a verdade e a
vida" (Jo 14,6). Contemplando-o na fé, os fiéis podem esperar que
Cristo realize neles suas promessas e, amando-o com o amor com que Ele os
amou, façam as obras que correspondem à sua dignidade:
Peço
que considereis que Jesus Cristo nosso Senhor é vossa verdadeira Cabeça e que
vós sois um de seus membros. Ele é para vós o que a Cabeça é para os membros;
tudo o que é dele é vosso, seu espírito, coração, corpo, alma e todas as suas
faculdades, e deveis fazer uso disso como coisa vossa para servir, louvar, amar
e glorificar a Deus. Vós sois em relação a Ele o que os membros são em relação
à cabeça. Assim, Ele deseja ardentemente fazer uso de tudo o que está em vós
para o serviço e a glória de seu Pai, como coisa sua.
Para
mim , viver é Cristo (Fl 1,21)
PRIMEIRA SEÇÃO
A VOCAÇÃO DO HOMEM:
A VIDA NO ESPÍRITO
- A vida no Espírito realiza a vocação do
homem (capítulo I) Constitui-se de caridade divina e de solidariedade
humana (capítulo II). É concedida de graça como uma Salvação
(capítulo III)
CAPÍTULO I
A DIGNIDADE DA
PESSOA HUMANA
- A dignidade da pessoa
humana se fundamenta em sua criação à imagem e semelhança de Deus (artigo
1); realiza-se em sua vocação à bem-aventurança divina (artigo 2). Cabe ao ser humano a livre
iniciativa de sua realização (artigo 3). Por seus atos deliberados (artigo
4), a pessoa humana se conforma ou não ao bem prometido por Deus e
atestado por sua consciência moral (artigo 5). As pessoas humanas se
edificam e crescem interiormente: fazem de toda sua vida sensível e
espiritual matéria de crescimento (artigo 6). Com a ajuda da graça,
crescem na virtude (artigo 7), evitam o pecado e, se o tiverem cometido,
voltam como o filho pródigo, para a misericórdia de nosso Pai do Céus
(artigo 8). Chegam, assim, à perfeição da caridade.
ARTIGO 1
O HOMEM IMAGEM
DE DEUS
- "Novo Adão, na mesma
revelação do mistério do Pai e de seu amor, Cristo manifesta plenamente o
homem ao próprio homem e lhe descobre a sua altíssima vocação." Em Cristo, "imagem do (
Deus invisível" (Cl 1,15), foi o homem criado à "imagem e
semelhança" do Criador. Em Cristo, redentor e salvador, a imagem
divina, deformada no homem pelo primeiro pecado, foi restaurada em sua
beleza original e enobrecida pela graça de Deus.
- A imagem divina está presente em cada
pessoa. Resplandece na comunhão das pessoas, à semelhança da unidade das
pessoas divinas entre si (cf. capítulo II).
- Dotada de alma "espiritual e
imortal", a pessoa humana é "a única criatura na terra que Deus
quis por si mesma". Desde sua concepção, é destinada à
bem-aventurança eterna.
- A pessoa humana participa da luz e da
força do Espírito divino. Pela razão, é capaz de compreender a ordem das
coisas estabelecida pelo Criador. Por sua vontade, ela é capaz de ir, por
si, ao encontro de seu verdadeiro bem. Encontra sua perfeição na
"busca e no amor da verdade e do bem".
- Em virtude de sua alma e de seus poderes
espirituais de inteligência e vontade, o homem é dotado de liberdade,
"sinal eminente da imagem de Deus"
- Por sua razão, o homem conhece a voz de
Deus, que o insta a "fazer o bem e a evitar o mal". Cada qual é
obrigado a seguir esta lei que ressoa na consciência e se cumpre no amor a
Deus e ao próximo. O exercício da vida moral atesta a dignidade da
pessoa.
- "Instigado pelo Maligno, desde o
inicio da história o homem abusou da própria liberdade." Sucumbiu à
tentação e praticou o mal. Conserva o desejo do bem, mas sua natureza traz
a ferida do pecado original. Tornou-se inclinado ao mal e sujeito
ao erro:
O
homem está dividido em si mesmo. Por esta razão, toda a vida humana, individual
e coletiva, apresenta-se como uma luta dramática entre o bem e o mal, entre a
luz e as trevas.
- Por sua paixão, Cristo livrou-nos de
Satanás e do pecado. Ele nos mereceu a vida nova no Espírito Santo. Sua
graça restaura o que o pecado deteriorou em nós.
- Quem crê em Cristo torna-se filho de Deus.
Esta adoção filial o transforma, propiciando-lhe seguir o exemplo de
Cristo. Ela torna-o capaz de agir corretamente e de praticar o Em união
com seu Salvador, o discípulo alcança a perfeição da caridade, a
santidade. Amadurecida na graça, a vida moral desabrocha em vida eterna na
glória do céu.
RESUMINDO
- "Cristo manifesta
plenamente o homem ao próprio homem lhe descobre sua altíssima vocação."
- Dotada de alma espiritual, inteligência e
vontade, a pessoa humana, desde sua concepção, é ordenada para Deus e
destinada à bem-aventurança eterna. Busca sua perfeição na
"procura e no amor da verdade e do bem"
- A verdadeira liberdade é no homem
"sinal eminente da imagem de Deus"
- O homem é obrigado a seguir a lei moral
que o chama a fazer o bem e evitar o mal". Esta lei ressoa em
sua consciência.
- O homem, ferido em sua natureza pelo
pecado original, está sujeito ao erro e inclinado ao mal no exercício de
sua liberdade.
- Quem crê em Cristo tem a vida nova no
Espírito Santo. A vida moral, desenvolvida e amadurecida na graça,
deve completar-se na glória do céu.
ARTIGO 2
NOSSA VOCAÇÃO À
BEM-AVENTURANÇA
I. As bem-aventuranças
- As bem-aventuranças estão no cerne da
pregação de Jesus. Seu anúncio retoma as promessas feitas ao povo eleito
desde Abraão. Jesus as completa, ordenando-as não mais simples bem-estar
gozoso na terra, mas ao Reino dos Céus:
Bem-aventurados
os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus.
Bem-aventurados
os mansos, porque herdarão a terra.
Bem-aventurados
os aflitos, porque serão consolados.
Bem-aventurados
os que tem fome e sede de justiça, porque serão saciados.
Bem-aventurados
os rnisericordiosos, porque alcançarão misericórdia.
Bem-aventurados
os puros de coração, porque verão a Deus.
Bem-aventurados
os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus.
Bem-aventurados
os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus.
Bem-aventurados
sois, quando vos injuriarem e vos perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal
contra vós por causa de mim.
Alegrai-vos
e regozijai-vos, porque será grande a vossa recompensa nos céus (Mt 5,3-12a).
- As bem-aventuranças traçam a imagem de
Cristo e descrevem sua caridade; exprimem a vocação dos fiéis associados à
glória de sua Paixão e Ressurreição; iluminam as ações e atitudes
características da vida cristã; são promessas paradoxais que sustentam a
esperança nas tribulações; anunciam as bênçãos e recompensas já
obscuramente adquiridas pelos discípulos; são iniciadas na vida da Virgem
Maria e de todos os santos.
II. O desejo de felicidade
- As bem-aventuranças respondem ao desejo
natural de felicidade. Este desejo é de origem divina: Deus o colocou no
coração do homem, a fim de atraí-lo a si, pois só ele pode satisfazê-lo.
Todos
certamente queremos viver felizes, e não existe no gênero humano pessoa que não
concorde com esta proposição, mesmo antes de ser formulada por inteiro.
Então,
como vos hei de procurar, Senhor? Visto que, procurando a vós, meu Deus, eu
procuro a vida bem-aventurada, fazei que vos procure para que minha alma viva,
pois meu corpo vive de minha alma, e minha alma vive de vós.
Só Deus satisfaz.
- As bem-aventuranças desvendam o objetivo
da existência humana, o fim último dos atos humanos. Deus nos chama à sua
própria bem-aventurança. Este chamado se dirige a cada um pessoalmente,
mas também a toda a Igreja, povo novo formado por aqueles que acolheram a
promessa e nela vivem na fé.
III. A bem-aventurança cristã
- O Novo Testamento usa várias expressões
para caracterizar a bem-aventurança à qual Deus chama o homem: a vinda do
(Reino de Deus; a visão de Deus: "Bem-aventurados os puros de
coração, porque verão a Deus" (Mt 5,8); entrada na alegria do Senhor;
entrada no repouso de Deus:
Aí
descansaremos e veremos, veremos e amaremos, amaremos e louvaremos. Eis a
essência do fim sem fim. E que outro fim mais nosso que chegarmos ao reino que
não terá fim?
- Deus nos colocou no mundo para conhecê-lo,
servi-lo e amá-lo e, assim, chegar ao paraíso. A bem-aventurança nos faz
participar da natureza divina (l Pd 1,4) e da vida eterna. Com ela, o
homem entra na glória de Cristo e no gozo da vida trinitária.
- Tal bem-aventurança ultrapassa a
inteligência e as forças exclusivamente humanas. Resulta de um dom
gratuito de Deu. É por isso que se diz ser sobrenatural, como também a
graça que dispõe o homem a entrar no gozo divino.
"Bem-aventurados
os puros de coração, porque verão a Deus." Por certo, de acordo com sua grandeza
e glória indizível, "ninguém verá a Deus e viverá", pois o Pai é
inacessível; mas, devido a seu amor, sua bondade para com os homens e sua
onipotência, chega até a conceder àqueles que o amam o privilégio de ver a
Deus... "pois o que é impossível aos homens é possível a Deus."
- A prometida bem-aventurança nos coloca
diante de escolhas morais decisivas. Convida-nos a purificar nosso coração
de seus maus instintos e a procurar o amor de Deus acima de tudo. Ensina
que a verdadeira felicidade não está nas riquezas ou no bem-estar, nem na
glória humana ou no poder, nem em qualquer obra humana, por mais útil que
seja, como as ciências, a técnica e as artes, nem em outra criatura
qualquer, mas apenas em Deus, fonte de todo bem e de todo amor.
A
riqueza é o grande deus atual; a ela prestam homenagem instintiva a multidão e
toda a massa dos homens. Medem a felicidade pelo tamanho da fortuna e, segundo
a. fortuna, medem também a honradez... Tudo isto provém da convicção de que,
tendo riqueza, tudo se consegue. A riqueza é, pois, um dos ídolos atuais, da
mesma forma que a fama... A fama, o fato de alguém ser conhecido e fazer
estardalhaço na sociedade (o que poderíamos chamar de notoriedade da imprensa),
chegou a ser considerada um bem em si mesma, um sumo bem, um objeto, também
ela, de verdadeira veneração.
- O Decálogo, o Sermão da Montanha e a
catequese apostólica nos descrevem os caminhos que levam ao Reino dos
Céus. Neles nos engajamos, passo a passo, pelas ações de todos os dias,
sustentados pela graça do Espírito Santo. Fecundados pela Palavra de
Cristo, daremos, aos poucos, frutos na Igreja para a glória de Deus.
RESUMINDO
- As bem-aventuranças retomam e completam as
promessas de Deus desde Abraão, ordenando-as para o Reino dos Céus.
Respondem ao desejo de felicidade que Deus colocou no coração do homem.
- As bem-aventuranças nos ensinam o fim
último ao qual Deus nos chama: o Reino, a visão de Deus, a participação na
natureza divina, a vida eterna, a filiação divina, o repouso em Deus.
- A bem-aventurança da vida eterna é um dom
gratuito de Deus; ela é sobrenatural como a graça que a ela conduz.
- As bem-aventuranças nos deixam diante de
escolhas decisivas com relação aos bens terrenos; purificam nosso coração
para que aprendamos a amar a Deus sobre todas as coisas.
- A bem-aventurança do Céu determina os
critérios de discernimento no uso dos bens terrestres, de acordo com a Lei
de Deus.
ARTIGO 3
A LIBERDADE DO
HOMEM
- Deus criou o homem dotado de razão e lhe
conferiu dignidade de uma pessoa agraciada com a iniciativa e o domínio de
seus atos. "Deus deixou o homem nas mãos de sua própria decisão"
(Eclo 15,14), para que pudesse ele mesmo procurar seu Criador e, aderindo
livremente a Ele, chegar à plena e feliz perfeição
O
homem é dotado de razão e por isso é semelhante a Deus: foi criado livre e
senhor de seus atos.
I. Liberdade e responsabilidade
- A liberdade é o poder, baseado na razão e
na vontade, de agir ou não agir, de fazer isto ou aquilo, portanto, de
praticar atos deliberados. Pelo livre-arbítrio, cada qual dispõe sobre si
mesmo. A liberdade é, no homem, uma força de crescimento e amadurecimento
na verdade e na bondade. A liberdade alcança sua perfeição quando está
ordenada para Deus, nossa bem-aventurança.
- Enquanto não se tiver fixado
definitivamente em seu bem último, que é Deus, a liberdade comporta a
possibilidade de escolher entre o bem e o mal, portanto, de crescer em
perfeição ou de definhar e pecar. Ela caracteriza os atos propriamente
humanos. Toma-se fonte de louvor ou repreensão, de mérito ou demérito.
- Quanto mais pratica o bem,
mais a pessoa se toma livre. Não há verdadeira liberdade a não ser a serviço do bem e da
justiça. A escolha da desobediência e do mal é um abuso de liberdade e
conduz à "escravidão do pecado".
- A liberdade torna o homem
responsável por seus atos, na medida em que forem voluntários. O
progresso na virtude, o conhecimento do bem e a ascese aumentam o domínio
da vontade sobre seus atos.
- A imputabilidade e a
responsabilidade de uma ação podem ficar diminuídas ou suprimidas
pela ignorância, inadvertência, violência, medo, hábitos, afeições
imoderadas e outros fatores psíquicos ou sociais.
- Todo ato diretamente querido é imputável a
seu autor:
Assim,
o Senhor pergunta a Adão, após o pecado no jardim: "O que fizeste?"
(Gn 3,13). O mesmo pergunta a Caim. A mesma pergunta faz o profeta Natã ao rei
Davi, após o adultério com a mulher de Urias e o assassinato deste.
Uma
ação pode ser indiretamente voluntária quando resulta de uma negligência quanto
a alguma coisa que deveríamos saber ou fazer, por exemplo, um acidente ocorrido
por ignorância do código de trânsito.
- Um efeito pode ser tolerado sem ser
querido pelo agente, por exemplo, o esgotamento da mãe à cabeceira de seu
filho doente. O efeito ruim não é imputável se não foi querido nem como
fim nem como meio de ação, como poderia ser o caso de morte sofrida por
alguém quando tentava socorrer uma pessoa em perigo. Para que o efeito
ruim seja imputável, é preciso que seja previsível e que o agente tenha a
possibilidade de evitá-lo, como, por exemplo, no caso de um homicídio
cometido por motorista embriagado.
- A liberdade se exerce no relacionamento
entre os seres humanos. Toda pessoa humana, criada à imagem de Deus, tem o
direito natural de ser reconhecida como ser livre e responsável. Todos devem
a cada um esta obrigação de respeito. O direito ao exercício da liberdade
é uma exigência inseparável da dignidade da pessoa humana, sobretudo em
matéria moral e religiosa. Este direito deve ser reconhecido civilmente e
protegido nos limites do bem comum e da ordem pública.
II. A liberdade humana na economia da
salvação
- Liberdade e pecado. A liberdade do homem é finita
e falível. De fato, o homem falhou. Pecou livremente. Recusando o projeto
do amor de Deus, enganou-se a si mesmo, tornou-se escravo do pecado. Esta
primeira alienação gerou outras, em grande número. Desde suas origens, a
história comprova os infortúnios e opressões nascidos do coração do homem
por causa do mau uso da liberdade.
- Ameaças à liberdade. O exercício da liberdade não
implica o direito de dizer e fazer tudo. É falso pretender que "o
homem, sujeito da liberdade, baste a si mesmo, tendo por fim a satisfação
de seu próprio interesse no gozo dos bens terrenos. Por sua vez, as
condições de ordem econômica e social, política e cultural requeridas para
um justo exercício da liberdade são muitas vezes desprezadas e violadas.
Estas situações de cegueira e injustiça prejudicam a vida moral e levam
tanto os fortes como os fracos à tentação de pecar contra a caridade.
Fugindo da lei moral, o homem prejudica sua própria liberdade,
acorrenta-se a si mesmo, rompe a fraternidade com seus semelhantes e
rebela-se contra a verdade divina.
- Liberdade e salvação. Por sua gloriosa cruz, Cristo
obteve a salvação de todos os homens. Resgatou-os do pecado que os
mantinha na escravidão. "É para a liberdade que Cristo nos
libertou" (Gl 5,1). Nele comungamos da "verdade que nos torna
livres". O Espírito Santo nos foi dado e, como ensina o apóstolo,
"onde se acha o Espírito do Senhor, aí está a liberdade" (2 Cor
3,17). Desde agora participamos da "liberdade da glória dos filhos de
Deus".
- Liberdade e graça. A graça de Cristo não entra em
concorrência com nossa liberdade quando esta corresponde ao sentido da
verdade e do bem que Deus colocou no coração do homem. Ao contrário, como
a experiência cristã o atesta, sobretudo na oração, quanto mais dóceis
formos aos impulsos da graça, tanto mais crescem nossa liberdade intima e
nossa segurança nas provações e diante das pressões e coações do mundo
externo. Pela obra da graça, o Espírito Santo nos educa à liberdade
espiritual, para fazer de nós livres colaboradores de sua obra na Igreja e
no mundo.
"Deus de poder e misericórdia, afastai de
nós todo obstáculo, para que, inteiramente disponíveis, nos dediquemos a vosso
serviço."
RESUMINDO
- "Deus deixou o
homem nas mãos de sua própria decisão" (Eclo 15,14), para que pudesse
livremente aderir a seu Criador e chegar, assim, à feliz perfeição.
- A liberdade é o poder de
agir ou não agir, praticando, então, a pessoa atos deliberados. Ela
alcança a perfeição de seu ato quando está ordenada para Deus, o sumo Bem.
- A liberdade caracteriza
os atos propriamente humanos. Torna o ser humano responsável pelos atos
dos quais é voluntariamente autor. Seu agir deliberado é algo propriamente
seu.
- A imputabilidade ou
responsabilidade de uma ação pode ser diminuída ou suprimida pela
ignorância, violência, medo e outros fatores psíquicos ou sociais.
- O direito ao exercício
da liberdade é uma exigência inseparável da dignidade do homem, sobretudo
em matéria religiosa e moral. Mas o exercício da liberdade não implica o
suposto direito de tudo dizer e fazer.
- "É para a liberdade
que Cristo nos libertou" (Gl 5,1).
ARTIGO 4
A MORALIDADE
DOS ATOS HUMANOS
- A liberdade faz do homem um
sujeito moral. Quando age de forma deliberada, o homem é, per assim dizer,
o pai de seus atos. Os atos humanos, isto é, livremente escolhidos após um
juízo da consciência, são qualificáveis moralmente. São bons ou maus.
I. As fontes da moralidade
- A moralidade dos atos humanos
depende:
- do objeto escolhido;
- do fim visado ou da intenção;
- das circunstâncias da ação.
- O objeto, a intenção e as
circunstâncias constituem as "fontes" ou elementos constitutivos
da moralidade dos atos humanos. O objeto escolhido é um bem para o qual se
dirige deliberadamente a vontade. É a matéria de um ato humano. O objeto
escolhido especifica moralmente o ato de querer, conforme razão o
reconheça e julgue estar de acordo ou não com o bem verdadeiro. As regras
objetivas da moralidade enunciam a ordem racional do bem e do mal,
atestada pela consciência.
- Perante o objeto, a
intenção se coloca do lado do sujeito agente. Pelo fato de ater-se à fonte
voluntária da ação e determiná-la pelo objetivo, a intenção é um elemento
essencial na qualificação moral da ação. A finalidade é o primeiro termo
da intenção e designa a meta visada na ação. A intenção é um movimento da
vontade em direção ao objetivo; ela diz respeito ao fim visado pela ação.
É a meta do bem que se espera da ação praticada. Não se limita à direção
de nossas ações singulares, mas pode orientar para um mesmo objetivo ações
múltiplas; pode orientar toda vida para o fim último. Por exemplo, um
serviço prestado tem por fim ajudar o próximo, mas pode também ser
inspirado pelo amor a Deus, fim último de todas as nossas ações. Uma mesma
ação também pode ser inspirada por várias intenções, como, por exemplo,
prestar um serviço para obter um favor ou para vangloriar-se.
- Uma intenção boa (por
exemplo, ajudar o próximo) não torna bom nem justo um comportamento
desordenado em si mesmo (como a mentira e a maledicência). O fim não
justifica os meios. Assim, não se pode justificar a condenação de um
inocente como meio legítimo de salvar o povo. Por sua vez, acrescentada
uma intenção má (como, por exemplo, a vanglória), o ato em si bom (como a
esmola) torna-se mau.
- As circunstâncias,
incluídas as conseqüências, são os elementos secundários de um ato moral.
Contribuem para agravar ou diminuir a bondade ou maldade moral dos atos
humanos (por exemplo, o montante de um furto). Podem também atenuar ou
aumentar a responsabilidade do agente (agir, por exemplo, por temor da
morte). As circunstâncias não podem por si modificar a qualidade moral dos
próprios atos, não podem tomar boa ou justa uma ação má em si.
II. Atos bons e atos maus
- O ato moralmente bom supõe
a bondade do objeto, da finalidade e das circunstâncias. Uma finalidade má
corrompe a ação, mesmo que seu objeto seja bom em si (como, por exemplo,
rezar e jejuar "para ser visto pelos homens").
O objeto da escolha por si só pode viciar o
conjunto de determinado agir. Existem comportamentos concretos - como a
fornicação - cuja escolha é sempre errônea, pois escolhê-los significa uma
desordem da vontade, isto é, um mal moral.
- É errado, pois, julgar a
moralidade dos atos humanos considerando só a intenção que os inspira ou
as circunstâncias (meio ambiente, pressão social, constrangimento ou
necessidade de agir etc.) que compõem o quadro. Existem atos que por si
mesmos e em si mesmos, independentemente das circunstâncias e intenções,
são sempre gravemente ilícitos, em virtude de seu objeto: a blasfêmia e o
perjúrio, o homicídio e o adultério. Não é permitido praticar um mal para
que dele resulte um bem.
RESUMINDO
- O objeto, a intenção e as
circunstâncias constituem as três "fontes" da moralidade dos
atos humanos.
- O objeto escolhido
especifica moralmente o ato do querer conforme a razão o reconheça e
julgue bom ou mau.
- "Não se pode
justificar uma ação má, embora feita com boa intenção." O fim não
justifica os meios.
- O ato moralmente bom supõe,
ao mesmo tempo, a bondade do objeto, da finalidade e das circunstâncias.
- Existem comportamentos
concretos cuja escolha é sempre errônea, porque escolhê-los significa uma
desordem da vontade de, isto é, um mal moral. Não é permitido fazer o mal
para que daí resulte um bem.
ARTIGO 5
A MORALIDADE
DAS PAIXÕES
- O ser humano se ordena para
a bem-aventurança por meio de seus atos deliberados: as paixões ou
sentimentos que experimenta podem dispô-lo e contribuir para isso.
I. As paixões
- O termo "paixões"
pertence ao patrimônio cristão. Os sentimentos ou paixões designam as
emoções ou movimentos da sensibilidade que inclinam alguém a agir ou não
agir em vista do que é experimentado ou imaginado como bom ou mau.
- As paixões são componentes
naturais do psiquismo humanos; constituem o lugar de passagem e garantem a
ligação entre a vida sensível e a vida do espírito. Nosso Senhor indica o
coração do homem como a fonte de onde brota o movimento das paixões.
- As paixões são numerosas. A
paixão mais fundamental é o amor provocado pela atração do bem. O amor
causa o desejo do bem ausente e a esperança de consegui-lo. Este movimento
se completa no prazer e na alegria do bem possuído. A percepção do mal
provoca ódio, aversão e medo do mal que está por chegar. Este movimento se
completa na tristeza do mal presente ou na cólera que a ele se opõe.
- "Amar é querer algo de
bom para alguém." Todos os demais afetos têm sua fonte no movimento
original do coração do homem para o bem. Só existe o bem que é amado.
"As paixões são más se o amor é mau, boas se o amor é bom."
II. Paixões e vida moral
- Em si mesmas, as paixões
não são boas nem más. Só recebem qualificação moral na medida em que
dependem efetivamente da razão e da vontade. As paixões são chamadas
voluntárias "ou porque são comandadas pela vontade ou porque a
vontade não lhes opõe obstáculo". Faz parte da perfeição do bem moral
ou humano que as paixões sejam reguladas pela razão.
- Os grandes sentimentos não
determinam a moralidade nem a santidade das pessoas; são reservatório
inesgotável das imagens e afeições em que se exprime a vida moral. As
paixões são moralmente boas quando contribuem para uma ação boa, e más
quando se dá o contrário. A vontade reta ordena para o bem e para a
bem-aventurança os movimentos sensíveis que ela assume; a vontade má
sucumbe às paixões desordenadas e as exacerba. As emoções e sentimentos
podem ser assumidos em virtudes ou pervertidos em vícios.
- Na vida cristã, o próprio
Espírito Santo realiza sua obra mobilizando o ser inteiro, inclusive suas
dores, medos e tristezas, como aparece na Agonia e Paixão do Senhor. Em
Cristo, os sentimentos humanos podem receber sua consumação na caridade e
na bem-aventurança divina.
- A perfeição moral consiste
em que o homem não seja movido ao bem exclusivamente por sua vontade, mas
também por seu apetite sensível, segundo a palavra do Salmo: "Meu
coração e minha carne exultam pelo Deus vivo" (Sl 84,3).
RESUMINDO
- O termo "paixões"
designa as afeições ou os sentimentos. Por meio de suas emoções, o homem
pressente o bem e suspeita da presença do mal.
- As principais paixões são o
amor, o ódio, o desejo, o medo, a alegria, a tristeza e a cólera.
- Nas paixões, como
movimentos da sensibilidade, não há bem ou mal moral. Mas, enquanto
dependem da razão e da vontade, há nelas bem ou mal moral.
- As emoções e os sentimentos
podem ser assumidos em virtudes ou pervertidos em vícios.
- A perfeição do bem moral
consiste em que o homem não seja movido ao bem exclusivamente pela
vontade, mas também pelo "coração".
ARTIGO 6
A CONSCIÊNCIA
MORAL
- "Na intimidade da
consciência, o homem descobre uma lei. Ele não a dá a si mesmo. Mas a ela
deve obedecer. Chamando-o sempre a amar e fazer o bem e a evitar o mal, no
momento oportuno a voz desta lei ressoa no íntimo de seu coração... É uma
lei inscrita por Deus no coração do homem.. A consciência é o núcleo
secretíssimo e o sacrário do homem, onde ele está sozinho com Deus e onde
ressoa sua voz. "
I. O juízo da consciência
- Presente no coração da
pessoa, a consciência moral lhe impõe, no momento oportuno, fazer o bem e
evitar o mal. Julga, portanto, as escolhas concretas, aprovando as boas e
denunciando as más. Atesta a autoridade da verdade referente ao Bem
supremo, de quem a pessoa humana recebe a atração e acolhe os mandamentos.
Quando escuta a consciência moral, o homem prudente pode ouvir a Deus, que
fala.
- A consciência moral é um
julgamento da razão pelo qual a pessoa humana reconhece a qualidade moral
de um ato concreto que vai planejar, que está a ponto de executar ou que
já praticou. Em tudo o que diz e faz, o homem é obrigado a seguir
fielmente o que sabe ser justo e correto. E pelo julgamento de sua
consciência que o homem percebe e reconhece as prescrições da lei divina:
A consciência é uma lei de nosso espírito que
ultrapassa nosso espírito, nos faz imposições, significa responsabilidade e
dever, temor e esperança... E a mensageira daquele que, no mundo da natureza
bem como no mundo da graça, nos fala através de um véu, nos instrui e nos
governa. A consciência é o primeiro de todos os vigários de Cristo.
- É importante que cada qual
esteja bastante presente a si mesmo para ouvir e seguir a voz de sua
consciência. Esta exigência de interioridade é muito necessária, pelo fato
de a vida nos deixar freqüentemente em situações que nos afastam:
Volta à tua consciência, interroga-a... Voltai,
irmãos, ao interior e em tudo o que fizerdes atentai para a testemunha, Deus.
- A dignidade da pessoa
humana implica e exige a retidão da consciência moral. A consciência moral
compreende a percepção dos princípios da moralidade
("sindérese"), sua aplicação a circunstâncias determinadas por
um discernimento prático das razões e dos bens e, finalmente, o juízo
feito sobre atos concretos a praticar ou já praticados. A verdade sobre o
bem moral, declarada na lei da razão, é reconhecida prática e
concretamente pelo juízo prudente da consciência. Chamamos de prudente o
homem que faz suas opções de acordo com este juízo.
- A consciência permite
assumir a responsabilidade dos atos praticados. Se o homem comete o mal, o
julgamento justo da consciência pode continuar nele como testemunho da
verdade universal do bem e ao mesmo tempo da malícia de sua escolha
singular. O veredicto do juízo de consciência continua sendo um penhor de
esperança e misericórdia. Atestando a falta cometida lembra a necessidade
de pedir perdão, de praticar novamente o bem e de cultivar sem cessar a
virtude com a graça de Deus.
Diante dele tranqüilizaremos nosso coração, se
nosso coração nos acusa, porque Deus é maior que nosso coração e conhece todas
as coisas (1 Jo 3,19-20).
- O homem tem o direito de
agir com consciência e liberdade, a fim de tomar pessoalmente as decisões
morais. "O homem não pode ser forçado a agir contra a própria
consciência. Mas também não há de ser impedido de proceder segundo a
consciência, sobretudo em matéria religiosa."
II. A formação da consciência
- A consciência deve ser
educada e o juízo moral, esclarecido. Uma consciência bem formada é reta e
verídica. Formula seus julgamentos seguindo a razão, de acordo com o bem
verdadeiro querido pela sabedoria do Criador. A educação da consciência e
indispensável aos seres humanos submetidos a influências negativas e
tentados pelo pecado a preferir seu julgamento próprio e a recusar os
ensinamentos autorizados.
- A educação da consciência é
uma tarefa de toda a vida. Desde os primeiros anos, alerta a criança para
o conhecimento e a prática da lei interior reconhecida pela consciência
moral. Uma educação prudente ensina a virtude, preserva ou cura do medo, do
egoísmo e do orgulho, dos sentimentos de culpabilidade e dos movimentos de
complacência, nascidos da fraqueza e das faltas humanas. A educação da
consciência garante a liberdade e gera a paz do coração.
- Na formação da consciência,
a Palavra de Deus é a luz de nosso caminho; é preciso que a assimilemos na
fé e na oração e a ponhamos em prática. É preciso ainda que examinemos
nossa consciência, confrontando-nos com a Cruz do Senhor. Somos assistidos
pelos dons do Espírito Santo, ajudados pelo testemunho e conselhos dos
outros e guiados pelo ensinamento autorizado da Igreja.
III. Escolher segundo a consciência
- Posta diante de uma escolha
moral, a consciência pode emitir um julgamento correto, de acordo com a
razão e a lei divina, ou, ao contrário, um julgamento errôneo, que se
afasta da razão e da lei divina.
- Às vezes o homem depara com
situações que tornam o juízo moral menos seguro e a decisão difícil. Mas
ele deverá sempre procurar o que é justo e bom e discernir a vontade de
Deus expressa na lei divina.
- Para tanto, o homem deve se
esforçar por interpretar os dados da experiência e os sinais dos tempos
graças à virtude da prudência, aos conselhos de pessoas avisadas e à ajuda
do Espírito Santo e de seus dons.
- Algumas regras se aplicam a
todos os casos:
- Nunca é permitido praticar um mal para que daí
resulte um bem.
- A "regra de ouro": "Tudo aquilo
que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles".
- A caridade respeita sempre o próximo e sua
consciência: "Pecando contra vossos irmãos e ferindo sua consciência...
pecais contra Cristo" (1 Cor 8,12). "E bom se abster... de tudo o que
seja causa de tropeço, de queda ou enfraquecimento para teu irmão" (Rm
14,21).
IV. O juízo errôneo
- O ser humano deve sempre
obedecer ao juízo certo de sua consciência. Se agisse deliberadamente
contra este último, estaria condenando a si mesmo. Mas pode acontecer que
a consciência moral esteja na ignorância e faça juízos errôneos sobre atos
a praticar ou já praticados.
- Muitas vezes esta
ignorância pode ser imputada à responsabilidade pessoal. É o que acontece
"quando o homem não se preocupa suficientemente com a procura da
verdade e do bem, e a consciência pouco a pouco, pelo hábito do pecado, se
torna quase obcecada". Neste caso, a pessoa é culpável pelo mal que
comete.
- A ignorância de Cristo e de
seu Evangelho, os maus exemplos de outros, o servilismo às paixões, a
pretensão de uma mal-entendida autonomia da consciência, a recusa da
autoridade da Igreja e de seus ensinamentos, a falta de conversão ou de
caridade podem estar na origem dos desvios do julgamento na conduta moral.
- Se - ao contrário - a
ignorância for invencível ou o julgamento errôneo não for da
responsabilidade do sujeito moral, o mal cometido pela pessoa não lhe
poderá ser imputado. Mas nem por isso deixa de ser um mal, uma privação,
uma desordem. É preciso trabalhar, pois, para corrigir a consciência moral
de seus erros.
- A consciência boa e pura é
esclarecida pela fé verdadeira, pois a caridade procede ao mesmo tempo
"de um coração puro de uma boa consciência e de uma fé sem
hipocrisia" (l Tm 1,5).
"Quanto mais prevalece a consciência reta,
tanto mais as pessoas e os grupos se afastam de um arbítrio cego e se esforçam
por conformar-se às normas objetivas da moralidade."
RESUMINDO
- "A consciência é o núcleo
secretíssimo e o sacrário do homem, onde ele está sozinho com Deus e onde
ressoa sua voz. "
- A consciência moral é um
julgamento da razão pelo qual a pessoa humana reconhece a qualidade moral
de um ato concreto.
- Para o homem que cometeu o
mal, o veredicto de sua consciência permanece um penhor de conversão e de
esperança.
- Uma consciência bem formada
é reta e verídica. Formula seus julgamentos seguindo a razão, de acordo
com o bem verdadeiro querido pela sabedoria do Criador. Cada qual deve
usar os meios adequados para formar sua consciência.
- Colocada diante de uma
escolha moral, a consciência pode emitir um julgamento correto de acordo
com a razão e a lei divina ou, ao contrário, um julgamento errôneo, que se
afasta da razão e da lei divina.
- O ser humano deve obedecer
sempre ao julgamento certo de sua consciência.
- A consciência moral pode
estar na ignorância ou fazer julgamentos errôneos. Essa ignorância e esses
erros nem sempre são isentos de culpa.
- A Palavra de Deus é luz
para nossos passos. É preciso que a assimilemos na fé e na oração e a
coloquemos em pratica. Assim se forma a consciência moral.
ARTIGO 7
AS VIRTUDES
- "Ocupai-vos com tudo o
que é verdadeiro, nobre, justo, puro, amável, tudo o que há de louvável,
honroso, virtuoso ou de qualquer modo mereça louvor" (Fl 4,8).
A virtude é uma disposição habitual e firme para
fazer o bem. Permite à pessoa não só praticar atos bons, mas dar o melhor de
si. Com todas as suas forças sensíveis e espirituais, a pessoa virtuosa tende
ao bem, procura-o e escolhe-o na prática.
"O objetivo da vida virtuosa é tornar-se
semelhante a Deus."
I As virtudes humanas
- As virtudes humanas são
atitudes firmes, disposições estáveis, perfeições habituais da
inteligência e da vontade que regulam nossos atos, ordenando nossas
paixões e guiando-nos segundo a razão e a fé. Propiciam, assim,
facilidade, domínio e alegria para levar uma vida moralmente boa. Pessoa
virtuosa é aquela que livremente pratica o bem.
As virtudes morais são adquiridas humanamente.
São os frutos e os germes de atos moralmente bons; dispõem todas as forças do
ser humano para entrar em comunhão com o amor divino.
DISTINÇÃO DAS VIRTUDES CARDEAIS
- Quatro virtudes têm um
papel de "dobradiça" (que, em latim, se diz "cardo,
cardinis"). Por esta razão são chamadas "cardeais": todas
as outras se agrupam em torno delas. São a prudência, a justiça, a
fortaleza e a temperança. "Ama-se a retidão? As virtudes são seus
frutos; ela ensina a temperança e a prudência a justiça e a
fortaleza" (Sb 8,7). Estas virtudes são louvadas em numerosas
passagens da Escritura sob outros nomes.
- A prudência é a virtude que
dispõe a razão prática a discernir, em qualquer circunstância, nosso
verdadeiro bem e a escolher os meios adequados para realizá-lo. "O
homem sagaz discerne os seus passos" (Pr 14,15). "Sede prudentes
e sóbrios para entregardes às orações" (1 Pd 4,7). A prudência é a
"regra certa da ação", escreve Sto. Tomás citando Aristóteles.
Não se confunde com a timidez ou o medo, nem com a duplicidade ou
dissimulação. E chamada "auriga virtutum" ("cocheiro",
isto é "portadora das virtudes"), porque, conduz as outras
virtudes, indicando-lhes a regra e a medida. E a prudência que guia
imediatamente o juízo da consciência. O homem prudente decide e ordena sua
conduta seguindo este juízo. Graças a esta virtude, aplicamos sem erro os
princípios morais aos casos particulares e superamos as dúvidas sobre o
bem a praticar e o mal a evitar.
- A justiça é a virtude moral
que consiste na vontade constante e firme de dar a Deus e ao próximo o que
lhes é devido. A justiça para com Deus chama-se "virtude de
religião". Para com os homens, ela nos dispõe a respeitar os direitos
de cada um e a estabelecer nas relações humanas a harmonia que promove a
equidade em prol das pessoas e do bem comum. O homem justo, muitas vezes
mencionado nas Escrituras, distingue-se pela correção habitual de seus
pensamentos e pela retidão de sua conduta para com o próximo. "Não
favoreças o pobre, nem prestigies o poderoso. Julga o próximo conforme a
justiça" (Lv 19,15). "Senhores, dai aos vossos servos o justo e
eqüitativo, sabendo que vós tendes um Senhor no céu" (Cl 4,1).
- A fortaleza é a virtude
moral que dá segurança nas dificuldades, firmeza e constância na procura
do bem. Ela firma a resolução de resistir às tentações e superar os
obstáculos na vida moral. A virtude da fortaleza nos torna capazes de
vencer o medo, inclusive da morte, de suportar a provação e as
perseguições. Dispõe a pessoa a aceitar até a renúncia e o sacrifício de
sua vida para defender uma causa justa. "Minha força e meu canto é o
Senhor" (Sl 118,14). "No mundo tereis tribulações, mas tende
coragem: eu venci o mundo" (Jo 16,33).
- A temperança é a virtude
moral que modera a atração pelos prazeres e procura o equilíbrio no uso
dos bens criados. Assegura o domínio da vontade sobre os instintos e
mantém os desejos dentro dos limites da honestidade. A pessoa temperante
orienta para o bem seus apetites sensíveis, guarda uma santa discrição e
"não se deixa levar a seguir as paixões do coração". A temperança
é muitas vezes louvada no Antigo Testamento: "Não te deixes levar por
tuas paixões e refreia os teus desejos" (Eclo 18,30). No Novo
Testamento, é chamada de "moderação" ou "sobriedade".
Devemos "viver com moderação, justiça e piedade neste mundo" (Tt
2,12).
Viver bem não é outra coisa senão amar a Deus de
todo o coração, de toda a alma e em toda forma de agir. Dedicar-lhe um amor
integral (pela temperança) que nenhum infortúnio poderá abalar (o que depende
da fortaleza), que obedece exclusivamente a Ele (e nisto consiste a justiça),
que vela para discernir todas as coisas com receio de deixar-se surpreender
pelo ardil e pela mentira (e isto é a prudência).
As VIRTUDES E A GRAÇA
- As virtudes humanas
adquiridas pela educação, por atos deliberados e por uma perseverança
sempre retomada com esforço são purificadas e elevadas pela graça divina.
Com o auxílio de Deus, forjam o caráter e facilitam a prática do bem. O
homem virtuoso sente-se feliz em praticá-las.
- Não é fácil para o homem
ferido pelo pecado manter o equilíbrio moral. O dom da salvação, trazida
por Cristo, nos concede a graça necessária para perseverar na conquista
das virtudes. Cada um deve sempre pedir esta graça de luz e de fortaleza,
recorrer aos sacramentos, cooperar com o Espírito Santo, seguir seus
apelos de amar o bem e evitar o mal.
II. As virtudes teologais
- As virtudes humanas se
fundam nas virtudes teologais que adaptam as faculdades do homem para que
possa participar da natureza divina. Pois as virtudes teologais se referem
diretamente a Deus. Dispõem os cristãos a viver em relação com a
Santíssima Trindade e têm a Deus Uno e Trino por origem, motivo e objeto.
- As virtudes teologais
fundamentam, animam e caracterizam o agir moral do cristão. Informam e
vivificam todas as virtudes morais. São infundidas por Deus na alma dos
fiéis para torná-los capazes de agir como seus filhos e merecer a vida
eterna. São o penhor da presença e da ação do Espírito Santo nas
faculdades do ser humano. Há três virtudes teologais: a fé, a esperança e
a caridade.
A FÉ
- A fé é a virtude teologal
pela qual cremos em Deus e em tudo o que nos disse e revelou, e que a
Santa Igreja nos propõe para crer, porque Ele é a própria verdade. Pela
fé, "o homem livremente se entrega todo a Deus. Por isso o fiel
procura conhecer e fazer a vontade de Deus. "O justo viverá da
fé" (Rm 1,17). A fé viva "age pela caridade" (Gl 5,6).
- O dom da fé permanece
naquele que não pecou contra ela. Mas "é morta a fé sem obras"
(Tg 2,26): privada da esperança e do amor, a fé não une plenamente o fiel
a Cristo e não faz dele um membro vivo de seu Corpo.
- O discípulo de Cristo não
deve apenas guardar a fé e nela viver, mas também professá-la,
testemunhá-la com firmeza e difundi-la: "Todos devem estar prontos a
confessar Cristo perante os homens e segui-lo no caminho da Cruz, entre
perseguições que nunca faltam à Igreja. O serviço e o testemunho da fé são
requisitos da salvação: "Todo aquele que se declarar por mim diante
dos homens também eu me declararei por ele diante de meu Pai que está nos
céus. Aquele, porém, que me renegar diante dos homens também o renegarei
diante de meu Pai que está nos céus" (Mt 10,32-33).
A ESPERANÇA
- A esperança é a virtude
teologal pela qual desejamos como nossa felicidade o Reino dos Céus e a
Vida Eterna, pondo nossa confiança nas promessas de Cristo e apoiando-nos
não em nossas forças, mas no socorro da graça do Espírito Santo.
"Continuemos a afirmar nossa esperança, porque é fiel quem fez a
promessa" (Hb 10,23). "Este Espírito que ele ricamente derramou
sobre nós, por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador, a fim de que fôssemos
justificados por sua graça e nos tornássemos herdeiros da esperança da
vida eterna" (Tt 3,6-7).
- A virtude da esperança
responde à aspiração de felicidade colocada por Deus no coração de todo
homem; assume as esperanças que inspiram as atividades dos homens;
purifica-as, para ordená-las ao Reino dos Céus; protege contra o desânimo;
dá alento em todo esmorecimento; dilata o coração na expectativa da
bem-aventurança eterna. O impulso da esperança preserva do egoísmo e
conduz à felicidade da caridade.
- A esperança cristã retoma e
realiza a esperança do povo eleito, que tem sua origem e modelo na
esperança de Abraão, cumulada em Isaac, das promessas de Deus, e
purificada pela prova do sacrifício. "Ele, contra toda a esperança,
acreditou na esperança de tornar-se pai de muitos povos" (Rm 4,18).
- A esperança cristã se
manifesta desde o inicio da pregação de Jesus no anúncio das
bem-aventuranças. As bem-aventuranças elevam nossa esperança ao céu, como
para a nova Terra prometida; traçam o caminho por meio das provação
reservadas aos discípulos de Jesus. Mas, pelos méritos de Jesus Cristo e
de sua Paixão, Deus nos guarda na "esperança que não decepciona"
(Rm 5,5). A esperança é a "âncora da alma) segura e firme,
"penetrando... onde Jesus entrou por nós, como precursor" (Hb
6,19-20). Também é uma arma que nos protege no combate da salvação:
"Revestidos da couraça da fé e da caridade e do capacete da esperança
da salvação" (l Ts 5,8) Ela nos traz alegria mesmo na provação:
"alegrando-vos na esperança, perseverando na tribulação" (Rm
12,12). Ela se exprime e se alimenta na oração, especialmente no Pai-Nosso
resumo de tudo o que a esperança nos faz desejar.
- Podemos esperar, pois, a
glória do céu prometida por Deus aos que o amam e fazem sua vontade. Em
qualquer circunstância, cada qual deve esperar, com a graça de Deus,
"perseverar até o fim" e alcançar a alegria do céu comi
recompensa eterna de Deus pelas boas obras praticadas com graça de Cristo.
Na esperança, a Igreja pede que "todos ó homens sejam salvos"
(1Tm 2,4). Ela aspira a estar unida a Cristo, seu Esposo, na glória do
céu.
Espera, ó minha alma, espera. Ignoras o dia e a
hora. Vigia cuidadosamente, tudo passa com rapidez, ainda que tua impaciência
torne duvidoso o que é certo, e longo um tempo bem curto. Considera que, quanto
mais pelejares, mais provarás o amor que tens a teu Deus e mais te alegrarás um
dia com teu Bem-Amado numa felicidade e num êxtase que não poderão jamais
terminar.
A CARIDADE
- A caridade é a virtude
teologal pela qual amamos a Deus sobre todas as coisas, por si mesmo, e a
nosso próximo como a nós mesmos, por amor de Deus.
- Jesus fez da caridade o
novo mandamento. Amando os seus "até o fim" (Jo 13,1), manifesta
o amor do Pai que Ele recebe. Amando-se uns aos outros, os discípulos
imitam o amor de Jesus que eles também recebem. Por isso diz Jesus:
"Assim como o Pai me amou, também eu vos amei. Permanecei em meu
amor" (Jo 15,9). E ainda: "Este é o meu preceito: Amai-vos uns aos
outros como eu vos amei" (Jo 15,12).
- Fruto do Espírito e da
plenitude da lei, a caridade guarda os mandamentos de Deus e de seu
Cristo: "Permanecei em meu amor. Se observais os meus mandamentos,
permanecereis no meu amor" (Jo 15,9-10).
- Cristo morreu por nosso
amor quando éramos ainda "inimigos" (Rm 5,10). O Senhor exige
que amemos, como Ele, mesmo os nossos inimigos, que nos tornemos o próximo
do mais afastado, que amemos como Ele as crianças e os pobres.
O apóstolo S. Paulo traçou um quadro incomparável
da caridade: "A caridade é paciente, a caridade é prestativa, não é
invejosa, não se ostenta, não se incha de orgulho. Nada faz de inconveniente,
não procura o seu próprio interesse, não se irrita, não guarda rancor. Não se
alegra com a injustiça, mas se regozija com a verdade. Tudo desculpa, tudo crê,
tudo espera, tudo suporta" (l Cor 13,4-7).
- Diz ainda o apóstolo:
"Se não tivesse a caridade, nada seria...". E tudo o que é
privilégio, serviço e mesmo virtude... "se não tivesse a caridade,
isso nada me adiantaria". A caridade superior a todas as virtudes. E
a primeira das virtudes teologais "Permanecem fé, esperança,
caridade, estas três coisas. A maior delas, porém, é a caridade" (1
Cor 13,13).
- O exercício de todas as
virtudes é animado e inspirado pela caridade, que é o "vinculo da
perfeição" (Cl 3,14); é a forma das virtudes, articulando-as e
ordenando-as entre si; é fonte e termo de sua prática cristã. A caridade
assegura purifica nossa capacidade humana de amar, elevando-a à feição
sobrenatural do amor divino.
- A prática da vida moral,
animada pela caridade, dá ao cristão a liberdade espiritual dos filhos de
Deus. Já não está diante de Deus como escravo em temor servil, nem como
mercenário à espera do pagamento, mas como um filho que responde ao amor
daquele "que nos amou primeiro" (1 Jo 4,19):
Ou nos afastamos do mal por medo do castigo,
estando assim na posição do escravo; ou buscamos o atrativo da recompensa,
assemelhando-nos aos mercenários; ou é pelo bem em si mo e por amor de quem
manda que nós obedecemos... e estaremos então na posição de filhos.
- A caridade tem como frutos
a alegria, a paz e a misericórdia exige a beneficência e a correção
fraterna; é benevolência; suscita a reciprocidade; é desinteressada e
liberal; é amizade e comunhão:
A finalidade de todas as nossas obras é o amor.
Este é o fim, é para alcançá-lo que corremos, é para ele que corremos; uma vez
chegados, é nele que repousaremos.
III. Os dons e frutos do Espírito Santo
- A vida moral dos cristãos é
sustentada pelos dons do Espírito Santo. Estes são disposições permanentes
que tornam o homem dócil para seguir os impulsos do mesmo Espírito.
- Os sete dons do Espírito
Santo são: sabedoria, inteligência, conselho, fortaleza, ciência, piedade
e temor de Deus. Em plenitude, pertencem a Cristo, Filho de Davi.
Completam e levam ã perfeição as virtudes daqueles que os recebem. Tornam
os fiéis dóceis para obedecer prontamente às inspirações divinas.
Que o teu bom espírito me conduza por uma terra
aplanada (Sl 143,10)
Todos os que são conduzidos pelo Espírito Santo
são filhos de Deus são filhos de Deus... Filhos e, portanto, herdeiros;
herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo (Rm 8,14.17).
- Os frutos do Espírito são
perfeições que o Espírito Santo forma em nós como primícias da glória
eterna. A Tradição da Igreja enumera doze: "caridade, alegria, paz,
paciência, longanimidade, bondade, benignidade, mansidão, fidelidade,
modéstia, continência e castidade" (Gl 5,22-23 vulg.).
RESUMINDO
- A virtude é uma disposição
habitual e firme de fazer o bem.
- As virtudes humanas são
disposições estáveis da inteligência e da vontade que, regulam nossos
atos, ordenando nossas paixões e guiando-nos segundo a razão e a fé. Podem
ser agrupadas em torno de quatro virtudes cardeais: a prudência, a
justiça, a fortaleza e a temperança.
- A prudência dispõe a razão
prática a discernir, em qualquer circunstância, nosso verdadeiro bem e a
escolher os meios adequados para realizá-lo.
- A justiça consiste na
vontade constante e firme de dar a Deus e ao próximo o que lhes é devido.
- A fortaleza garante, nas
dificuldades, a firmeza e a constância na busca do bem.
- A temperança modera a
atração dos prazeres sensíveis e procura o equilíbrio no uso dos bens
criados.
- As virtudes morais crescem
pela educação, pelos atos deliberados e pela perseverança no esforço. A
graça divina purifica e as eleva.
- As virtudes teologais
dispõem os cristãos a viver em relação com a Santíssima Trindade. Têm a
Deus por origem, motivo e objeto, Deus conhecido pela fé, esperado e amado
por casa de si mesmo.
- Há três virtudes teologais:
a fé, a esperança e a caridade. Estas informam e vivificam todas as
virtudes morais.
- Pela fé, nós cremos em Deus
e em tudo o que Ele nos revelou e que a Santa Igreja nos propõe para crer.
- Pela esperança, desejamos e
aguardamos de Deus, com firme confiança, a vida eterna e as graças para
merecê-la.
- Pela caridade, amamos a
Deus sobre todas as coisas e a nosso próximo como a nós mesmos por amor a
Deus. Ela é o "vínculo da perfeição" (Cl 3,14) e a forma de
todas as virtudes.
- Os sete dons do Espírito
Santo concedidos ao cristão sabedoria, inteligência, conselho, fortaleza,
ciência, piedade e temor de Deus.
ARTIGO 8
O PECADO
I. A misericórdia e o pecado
- O Evangelho é a revelação,
em Jesus Cristo, da misericórdia de Deus para com os pecadores. O anjo
anuncia a José: "Tu chamarás com o nome de Jesus, pois ele salvará
seu povo de seus pecados" (Mt 1,21). O mesmo se dá com a Eucaristia,
sacramento da redenção: "Isto é o meu sangue, o sangue da aliança,
que é derramado por muitos, para remissão dos pecados" (Mt 26,28).
- "Deus nos criou sem
nós, mas não quis salvar-nos sem nós." Acolher sua misericórdia exige
de nossa parte a confissão de nossas faltas. "Se dissermos: 'Não
temos pecado', enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade não está em nós. Se
confessarmos nossos pecados, Ele, que é fiel e justo, perdoará nossos
pecados e nos purificará de toda injustiça" (1Jo 1,8-9).
- Como afirma S. Paulo:
"Onde avultou o pecado, a graça superabundou" (Rm 5,20). Mas,
para realizar seu trabalho, deve a graça descobrir o pecado, a fim de
converter nosso coração e nos conferir "a justiça para a vida eterna,
por meio de Jesus Cristo, nosso Senhor" (Rm 5,21). Como o médico que
examina a ferida antes de curá-la, assim Deus, por sua palavra e por seu
Espírito, projeta uma luz viva sobre o pecado.
A conversão requer que se lance luz sobre o
pecado; ela contém em si mesma o julgamento interior da consciência. Pode-se
ver nisso a prova da ação do Espírito de verdade no mais íntimo do homem, e
isso se torna ao mesmo tempo o início de um novo dom da graça e do amor:
"Recebei o Espírito Santo". Assim, nesta ação de "lançar luz
sobre o pecado" descobrimos um duplo dom: o dom da verdade da consciência
e o dom da certeza da redenção. O Espírito de verdade é o Consolador.
II. A definição do pecado
- O pecado é uma falta contra
a razão, a verdade, a consciência reta; é uma falta ao amor verdadeiro
para com Deus e para com o próximo, por causa de um apego perverso a
certos bens. Fere a natureza do homem e ofende a solidariedade humana. Foi
definido como "uma palavra, um ato ou um desejo contrários à lei
eterna".
- O pecado é ofensa a Deus:
"Pequei contra ti, contra ti somente; pratiquei o que é mau aos teus
olhos" (Sl 51,6). O pecado ergue-se contra o amor de Deus por nós e
desvia dele os nossos corações. Como o primeiro pecado, é uma
desobediência, uma revolta contra Deus, por vontade de tornar-se
"como deuses", conhecendo e determinando o bem e o mal (Gn 3,5).
O pecado é, portanto, "amor de si mesmo até o desprezo de Deus".
Por essa exaltação orgulhosa de si, o pecado é diametralmente contrário à
obediência de Jesus, que realiza a salvação.
- É justamente na paixão, em
que a misericórdia de Cristo vai vencê-lo, que o pecado manifesta o grau
mais alto de sua violência e de sua multiplicidade: incredulidade, ódio
assassino, rejeição e zombarias da parte dos chefes e do povo, covardia de
Pilatos e crueldade dos soldados, traição de Judas, tão dura para Jesus,
negação de Pedro e abandono da parte dos discípulos. Mas, na própria hora
das trevas e do príncipe deste mundo, o sacrifício de Cristo se toma
secretamente a fonte de onde brotará inesgotavelmente o perdão de nossos
pecados.
III. A diversidade dos pecados
- A variedade dos pecados é
grande. As Escrituras nos fornecem várias listas. A Carta aos gálatas opõe
as obras da carne ao fruto do Espírito: "As obras da carne são
manifestas: fornicação, impureza, libertinagem, idolatria, feitiçaria,
ódio, rixas, ciúmes, ira, discussões, discórdia, divisões, invejas,
bebedeiras, orgias e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu
vos previno, como já vos preveni: os que tais coisas praticam não herdarão
o Reino de Deus" (Gl 5,19-21)".
- Pode-se distinguir os
pecados segundo seu objeto, como em todo ato humano, ou segundo as
virtudes a que se opõem, por excesso ou por defeito, ou segundo os
mandamentos que eles contrariam. Pode-se também classificá-los conforme
dizem respeito a Deus, ao próximo ou a si mesmo; pode-se dividi-los em
pecados espirituais e carnais, ou ainda em pecados por pensamento, palavra,
ação ou omissão. A raiz do pecado está no coração do homem, em sua livre
vontade, segundo o ensinamento do Senhor: "Com efeito, é do coração
que procedem más inclinações, assassínios, adultérios, prostituições,
roubos, falsos testemunhos e difamações. São estas as coisas que tomam o
homem impuro" (Mt 15,19-20). No coração reside também a caridade,
princípio das obras boas e puras, que o pecado fere.
IV. A gravidade do pecado: pecado mortal e
venial
- Convém avaliar os pecados
segundo sua gravidade. Perceptível já na Escritura, a distinção entre
pecado mortal e pecado venial se impôs na tradição da Igreja. A
experiência humana a corrobora.
- O pecado mortal destrói a
caridade no coração do homem por uma infração grave da lei de Deus; desvia
o homem de Deus, que é seu fim último e sua bem-aventurança, preferindo um
bem inferior.
O pecado venial deixa subsistir a caridade,
embora a ofenda e fira.
- O pecado mortal, atacando
em nós o princípio vital, que é a caridade, exige uma nova iniciativa da
misericórdia de Deus e uma conversão do coração, que se realiza
normalmente no sacramento da Reconciliação:
Quando a vontade se volta para uma coisa
contrária â caridade pela qual estamos ordenados ao fim último, há no pecado,
por seu próprio objeto, matéria para ser mortal... quer seja contra o amor a
Deus, como a blasfêmia, o perjúrio etc., quer seja contra o amor ao próximo,
como o homicídio, o adultério etc. Por outro lado, quando a vontade do pecador
se dirige às vezes a um objeto que contém em si uma desordem, mas não é
contrário ao amor a Deus e ao próximo, como por exemplo palavra ociosa, riso
supérfluo etc., tais pecados são veniais'
- Para que um pecado, seja
mortal requerem-se três condições ao mesmo tempo: "E pecado mortal
todo pecado que tem como objeto uma matéria grave, e que é cometido com
plena consciência e deliberadamente".
- A matéria grave é precisada
pelos Dez mandamentos, segundo a resposta de Jesus ao jovem rico:
"Não mates, não come-tas adultério, não roubes, não levantes falso
testemunho, não dó fraudes ninguém, honra teu pai e tua mãe" (Mc
10,19). A gravidade dos pecados é maior ou menor: um assassinato é mais
grave que um roubo. A qualidade das pessoas lesadas é levada também em
consideração. A Violência exercida contra os pais é em mais grave que
contra um estranho.
- O pecado mortal requer
pleno conhecimento e pleno consentimento. Pressupõe o conhecimento do
caráter pecaminoso do ato, de sua oposição à lei de Deus. Envolve também
um consentimento suficientemente deliberado para ser uma escolha pessoal.
A ignorância afetada e o endurecimento do coração não diminuem, antes
aumentam, o caráter voluntário do pecado.
- A ignorância involuntária
pode diminuir ou até escusar a imputabilidade de uma falta grave, mas
supõe-se que ninguém ignora os princípios da lei moral inscritos na
consciência de todo ser humano. Os impulsos da sensibilidade, as paixões
podem igualmente reduzir o caráter voluntário e livre da falta, como
também pressões exteriores e perturbações patológicas. O pecado por
malícia, por opção deliberada do mal, é o mais grave.
- O pecado mortal é uma
possibilidade radical da liberdade humana, como o próprio amor. Acarreta a
perda da caridade e a privação da graça santificante, isto é, do estado de
graça. Se este estado não for recuperado mediante o arrependimento e o
perdão de Deus, causa a exclusão do Reino de Cristo e a morte eterna no
inferno, já que nossa liberdade tem o poder de fazer opções para sempre,
sem regresso. No entanto, mesmo podendo julgar que um ato é em si falta
grave, devemos confiar o julgamento sobre as pessoas à justiça e à
misericórdia de Deus.
- Comete-se um pecado venial
quando não se observa, em matéria leve, a medida prescrita pela lei moral,
ou então quando se desobedece à lei moral em matéria grave, mas sem pleno
conhecimento ou sem pleno consentimento.
- O pecado venial enfraquece
a caridade; traduz uma afeição desordenada pelos bens criados; impede o
progresso da alma no exercício das virtudes e a prática do bem moral;
merece penas temporais. O pecado venial deliberado e que fica sem
arrependimento dispõe-nos pouco a pouco a cometer o pecado mortal. Mas o
pecado venial não quebra a aliança com Deus. É humanamente reparável com a
graça de Deus. "Não priva da graça santificante, da amizade com Deus,
da caridade nem, por conseguinte, da bem-aventurança eterna."
O homem não pode, enquanto está na carne, evitar
todos os pecados, pelo menos os pecados leves. Mas esses pecados que chamamos
leves, não os consideras insignificantes: se os consideras insignificantes ao
pesá-los, treme ao contá-los. Um grande número de objetos leves faz uma grande
massa; um grande número de gotas enche um rio; um grande número de grãos faz um
montão. Qual é então nossa esperança? Antes de tudo, a confissão...
- "Todo pecado, toda
blasfêmia será perdoada aos homens, mas a blasfêmia contra o Espírito não
será perdoada" (Mt 12,31). Pelo contrário, quem a profere é culpado
de um pecado eterno. A misericórdia de Deus não tem limites, mas quem se
recusa deliberadamente a acolher a misericórdia de Deus pelo
arrependimento rejeita o perdão de seus pecados e a salvação oferecida
pelo Espírito Santo. Semelhante endurecimento pode levar à impenitência
final e à perdição eterna.
V. A proliferação do pecado
- O pecado cria uma propensão
ao pecado; gera o vício pela repetição dos mesmos atos. Disso resultam
inclinações perversas que obscurecem a consciência e corrompem a avaliação
concreta do bem e do mal. Assim, o pecado tende a reproduzir-se e a
reforçar-se, mas não consegue destruir o senso moral até a raiz.
- Os vícios podem ser
classificados segundo as virtudes que contrariam, ou ainda ligados aos
pecados capitais que a experiência cristã distinguiu seguindo S. João
Cassiano e S. Gregório Magno. São chamados capitais porque geram outros
pecados, outros vícios. São o orgulho, a avareza, inveja, a ira, a
impureza, a gula, a preguiça ou acídia.
- A tradição catequética
lembra também que existem "pecados que bradam ao céu". Bradam ao
céu o sangue de Abel, o pecado dos sodomitas; o clamor do povo oprimido no
Egito; a queixa do estrangeiro, da viúva e do órfão; a injustiça contra o
assalariado.
- O pecado é um ato pessoal.
Além disso, temos responsabilidade nos pecados cometidos por outros,
quando neles cooperamos:
- participando neles direta e voluntariamente;
- mandando, aconselhando, louvando ou aprovando
esses pecados;
- não os revelando ou não os impedindo, quando a
somos obrigados;
- protegendo os que fazem o mal.
- Assim, o pecado toma os
homens cúmplices uns dos outros, faz reinar entre eles a concupiscência, a
violência e a injustiça. Os pecados provocam situações sociais e
instituições contrárias à bondade divina. As "estruturas de
pecado" são a expressão e o efeito dos pecados pessoais. Induzem suas
vítimas a cometer, por sua vez, o mal. Em sentido analógico, constituem um
"pecado social".
RESUMINDO
- "Deus encerrou
todos na desobediência, para a todos fazer misericórdia" (Rm 11,32).
- O pecado é "uma
palavra, um ato ou um desejo contrário à lei eterna". É uma ofensa a
Deus. Insurge-se contra Deus numa desobediência contrária à obediência de
Cristo.
- O pecado é um ato
contrário à razão. Fere a natureza do homem e ofende a solidariedade
humana.
- A raiz de todos os
pecados está no coração do homem. As espécies e a gravidade dos mesmos
medem-se principalmente segundo seu objeto.
- Escolher
deliberadamente, isto é, sabendo e querendo, uma coisa gravemente
contrária à lei divina e ao fim último do homem é cometer pecado mortal.
Este destrói em nós a caridade, sem a qual é impossível a bem-aventurança
eterna. Caso não haja arrependimento, o pecado mortal acarreta a morte
eterna.
- O pecado venial
constitui uma desordem moral reparável pela caridade, que ele deixa
subsistir em nós.
- A repetição dos pecados,
mesmo veniais, produz os vícios, entre os quais avultam os pecados capitais.
CAPÍTULO II
A COMUNIDADE
HUMANA
- A vocação da humanidade
consiste em manifestar a imagem de Deus e ser transformada à imagem do
Filho único do Pai. Esta vocação implica uma dimensão pessoal, pois cada
um é chamado a entrar na bem-aventurança divina, mas concerne também ao
conjunto da comunidade humana.
ARTIGO I
A PESSOA E A
SOCIEDADE
I. O caráter comunitário da vocação humana
- Todos os homens são
chamados ao mesmo fim, o próprio Deus. Existe certa semelhança entre a
unidade das pessoas divinas e a fraternidade que os homens devem
estabelecer entre si, na verdade e no amor. O amor ao próximo é
inseparável do amor a Deus.
- A pessoa humana tem
necessidade de vida social. Esta não constitui para ela algo acrescentado,
mas é uma exigência de sua natureza. Mediante o intercâmbio com os outros,
a reciprocidade dos serviços e o diálogo com seus irmãos, o homem
desenvolve as próprias virtualidades; responde, assim, à sua vocação.
- Uma sociedade é um conjunto
de pessoas ligadas de maneira orgânica por um princípio de unidade que
ultrapassa cada uma delas. Assembléia ao mesmo tempo visível e espiritual,
uma sociedade perdura no tempo; ela recolhe o passado e prepara o futuro.
Por ela, cada homem é constituído "herdeiro", recebe
"talentos" que enriquecem sua identidade e com os quais deve
produzir frutos. Com justa razão, deve cada qual dedicar-se às comunidades
de que faz parte e respeitar as autoridades encarregadas do bem comum.
- Cada comunidade se define
por seu fim e obedece, por conseguinte, a regras específicas, mas "a
pessoa humana é e deve ser o princípio, sujeito e fim de todas as
instituições sociais".
- Certas sociedades, como a
família e a cidade, correspondem mais imediatamente à natureza do homem.
São-lhe necessárias. A fim de favorecer a participação do maior número na
vida social, é preciso encorajar a criação de associações e instituições
de livre escolha, "com fins econômicos, culturais, sociais,
esportivos, recreativos, profissionais, políticos, tanto no âmbito interno
das comunidades políticas como no plano mundial". Esta
"socialização" exprime, igualmente, a tendência natural que
impele os seres humanos a se associarem para atingir objetivos que
ultrapassam as capacidades individuais. Desenvolve as qualidades da
pessoa, particularmente seu espírito de iniciativa e responsabilidade.
Ajuda a garantir seus direitos.
- A socialização apresenta
também perigos. Uma intervenção muito acentuada do Estado pode ameaçar a
liberdade e iniciativa pessoais. A doutrina da Igreja elaborou o chamado
princípio de subsidiariedade. Segundo este princípio, "uma sociedade
de ordem superior não deve interferir na vida interna de uma sociedade
inferior, privando-a de suas competências, mas deve, antes, apoiá-la em
caso de necessidade e ajudá-la a coordenar sua ação com as dos outros
elementos que compõem a sociedade, tendo em vista o bem comum".
- Deus não quis reter só para
si o exercício de todos os poderes. Confia a cada criatura as funções que
esta é capaz de exercer, segundo as capacidades da própria natureza. Este
modo de governo deve ser imitado na vida social. O comportamento de Deus
no governo do mundo, que demonstra tão grande consideração pela liberdade
humana, deveria inspirar a sabedoria dos que governam as comunidades
humanas. Estes devem comportar-se como ministros da providência divina.
- O princípio de
subsidiariedade opõe-se a todas as formas de coletivismo; traça os limites
da intervenção do Estado; tem em vista harmonizar as relações entre os
indivíduos e as sociedades; tende a instaurar uma verdadeira ordem internacional.
II. A conversão e a sociedade
- A sociedade é indispensável
à realização da vocação humana. Para alcançar este objetivo, é necessário
que seja respeitada a justa hierarquia dos valores que "subordina as
necessidades materiais e instintivas às interiores e espirituais.
A convivência humana deve ser considerada como
realidade eminentemente espiritual, intercomunicação de conhecimentos à luz da
verdade, exercício de direitos e cumprimentos de deveres, incentivo e apelo aos
bens morais, gozo comum do belo em todas as suas legítimas expressões,
disponibilidade permanente para comunicar a outrem o melhor de si mesmo e
aspiração comum a um constante enriquecimento espiritual. Tais são os valores
que devem animar e orientar a atividade cultural, a vida econômica, a
organização social, os movimentos e os regimes políticos, a legislação e todas
as outras expressões da vida social em contínua evolução.
- A inversão dos meios e dos
fins, que acaba por conferir valor de fim último àquilo que não passa de
meio para segui-lo, ou por considerar as pessoas como meros meios em vista
de um fim, produz estruturas injustas, que "tornam árdua e
praticamente impossível uma conduta cristã conforme mandamentos do Divino
Legislador"
- E preciso, então, apelar às
capacidades espirituais e morais da pessoa e à exigência permanente de sua
conversão interior, a fim de obter mudanças sociais que estejam realmente
a seu serviço. A prioridade reconhecida à conversão do coração não elimina
absolutamente, antes impõe, a obrigação de trazer instituições e às
condições de vida, quando estas provocam o pecado, o saneamento
conveniente, para que sejam conformes às normas da justiça e favoreçam o
bem, em vez de pôr-lhe obstáculos.
- Sem o auxílio da graça, os
homens seriam incapazes de "discernir a senda freqüentemente estreita
entre a covardia que cede ao mal e a violência que, na ilusão de o estar
combatendo, ainda o agrava mais". É o caminho da caridade, quer
dizer, do amor a Deus e ao próximo. A caridade representa o maior
mandamento social. Respeita o outro e seus direitos. Exige a prática da
justiça, e só ela nos torna capazes de praticá-la. Inspira uma vida de
autodoação: "Quem procurar ganhar sua vida vai perdê-la, e quem a
perder vai conservá-la" (Lc 17,33).
RESUMINDO
- Existe certa semelhança
entre a unidade das pessoas divinas e a fraternidade que os homens devem
estabelecer entre si.
- Para desenvolver-se em
conformidade com sua natureza, em a pessoa humana necessidade da vida
social. Certas sociedades, como a família e a cidade, correspondem mais
imediatamente à natureza do homem.
- "A pessoa humana é e
deve ser o princípio, sujeito e fim de todas as instituições
sociais."
- É preciso fomentar uma
ampla participação em associações e instituições de livre escolha.
- Segundo o princípio de subsidiariedade,
nem o Estado nem qualquer outra sociedade mais ampla devem substituir a
iniciativa e a responsabilidade das pessoas e dos órgãos intermediários.
- A sociedade deve favorecer
o exercício das virtudes, não pôr-lhe obstáculos. Deve inspirá-la uma
justa hierarquia de valores.
- Onde o pecado perverte o
clima social, é preciso apelar à conversão dos corações e à graça de Deus.
A caridade impele a justas reformas. Não existe solução da questão social
fora do Evangelho.
ARTIGO 2
A PARTICIPAÇÃO
NA VIDA SOCIAL
I. A autoridade
- "A sociedade humana
não estará bem constituída nem será fecunda a não ser que lhe presida uma
autoridade legítima que salvaguarde as instituições e dedique o necessário
trabalho e esforço ao bem comum."
Chama-se "autoridade" a qualidade em
virtude da qual pessoas ou instituições fazem leis e dão ordens a homens, e
esperam obediência da parte deles.
- Toda comunidade humana tem
necessidade de uma autoridade que a dirija. Tal autoridade encontra seu
fundamento na natureza humana. É necessária à unidade da cidade. Seu papel
consiste em assegurar enquanto possível o bem comum da sociedade.
- A autoridade exigida pela
ordem moral emana de Deus: "Todo homem se submeta às autoridades
constituídas, pois não há autoridade que não venha de Deus, e as que
existem foram estabelecidas por Deus. De modo que aquele que se revolta
contra a autoridade opõe-se à ordem estabelecida por Deus. E os que se
opõem atrairão sobre si a condenação" (Rm l3,l-2).
- O dever da obediência impõe
a todos prestar à autoridade as honras a ela devidas e cercar de respeito
e, conforme seu mérito de gratidão e benevolência as pessoas investidas de
autoridade.
Deve-se ao papa S. Clemente de Roma a mais antiga
oração Igreja pela autoridade política:
"Concedei-lhes, Senhor, a saúde, a paz, a
concórdia, a estabilidade para que exerçam sem entraves a soberania que lhes
concedestes. Sois vós, Mestre, rei celeste dos séculos, quem dá aos filhos dos
homens glória, honra e poder sobre as coisas da terra. Dirigi, Senhor, seu
conselho segundo o que é bom, segundo o que é agradável a vossos olhos, a fim
de que, exercendo com piedade, na paz e mansidão, o poder que lhes destes, Nos
encontrem propício.
- Se, por um lado, a
autoridade remete a uma ordem fixada por Deus, por outro, são entregues à
livre vontade dos cidadãos a escolha do regime e a designação dos
governantes.
- A diversidade dos regimes
políticos é moralmente admissível, contanto que concorram para o bem
legítimo da comunidade que os adota. Os regimes cuja natureza é contrária
à lei natural, à ordem pública e aos direitos fundamentais das pessoas não
podem realizar o bem comum das nações às quais são impostos. A autoridade
não adquire de si mesma sua legitimidade moral. Não deve comportar-se de
maneira despótica, mas agir para o bem comum, como uma "força moral
fundada na liberdade e no senso de responsabilidade":
A legislação humana não goza do caráter de lei
senão na medida em que se conforma à justa razão; de onde se vê que ela recebe
seu vigor da lei eterna. Na medida em que ela se afastasse da razão seria
necessário declará-la injusta, pois não realizaria a noção de lei; seria antes
uma forma de violência.
- A autoridade só será
exercida legitimamente se procurar o bem comum do grupo em questão e se,
para atingi-lo empregar meios moralmente lícitos. Se acontecer de os
dirigentes promulgarem leis injustas ou tomarem medidas contrárias à ordem
moral, estas disposições não poderão obrigar as consciências. "Neste
caso, a própria autoridade deixa de existir degenerando em abuso do poder."
- "É preferível que cada
poder seja equilibrado por outros poderes e outras esferas de competência
que o mantenham em seu justo limite. Este e o principio do 'estado de
direito', no qual é soberana a lei, e não a vontade arbitrária dos
homens."
II. O bem comum
- Em conformidade com a
natureza social do homem, o bem de cada um está necessariamente
relacionado com o bem comum. Este só pode ser definido em referência à
pessoa humana:
Não vivais isolados, retirados em vós mesmos como
se já estivésseis justificados, mas já estivésseis justificados, mas reuni-vos
para procurar juntos o que é o interesse comum.
- Por bem comum é preciso
entender "o conjunto daquelas condições da vida social que permitem
aos grupos e a cada um de seus membros atingirem de maneira mais completa
e desembaraçadamente a própria perfeição. O bem comum interessa à vida de
todos. Exige a prudência da parte de cada um e mais ainda da parte dos que
exercem a autoridade. Comporta ele três elementos essenciais.
- Supõe, em primeiro lugar, o
respeito pela pessoa como tal. Em nome do bem comum, os poderes públicos
são obrigados a respeitar os direitos fundamentais e inalienáveis da
pessoa humana. A Sociedade é obrigada a Permitir que cada um de seus
membros realize sua vocação. Em particular, o bem comum consiste nas
condições para exercer as liberdades naturais indispensáveis ao
desabrochar da vocação humana: "Tais são o direito de agir segundo a
norma reta de sua consciência, o direito á proteção da vida particular e à
justa liberdade, também em matéria religiosa".
- Em segundo lugar, o bem
comum exige o bem-estar social e o desenvolvimento do próprio grupo o
desenvolvimento é o resumo de todos os deveres sociais. E claro, cabe à
autoridade servir de árbitro, em nome do bem comum, entre os diversos interesses
particulares. Mas ela deve tornar acessível a cada um aquilo de que
precisa para levar uma vida verdadeiramente humana: alimento, vestuário,
saúde, trabalho, educação e cultura, informação conveniente, direito de
fundar um lar etc.
- Por fim, o bem comum
envolve a paz, isto é, uma ordem justa duradoura e segura. Supõe,
portanto, que a autoridade assegure, por meios honestos, a segurança da
sociedade e a de seus membros, fundamentando o direito à legítima defesa
pessoal e coletiva.
- Se cada comunidade humana
possui um bem comum que lhe permite reconhecer-se como tal, é na
comunidade política que encontramos sua realização mais completa. Cabe ao
Estado defender e promover o bem comum da sociedade civil, dos cidadãos e
dos organismos intermediários.
- As dependências humanas se
intensificam. Estendem-se aos poucos à terra inteira. A unidade da família
humana, reunindo seres que gozam de uma dignidade natural igual, implica
um bem comum universal. Este exige uma organização da comunidade das
nações capaz de "atender às várias necessidades dos homens, tanto no
campo da vida social (alimentação, saúde, educação...) como em certas
condições particulares que podem surgir cá ou lá, tais como a necessidade
(...) de acudir aos sofrimentos dos refugiados (...),ou de ajudar os
emigrantes e suas famílias".
- O bem comum está sempre
orientado ao progresso das pessoas: "A organização das coisas deve
subordinar-se à ordem das pessoas e não ao contrário". Esta ordem tem
por base a verdade, edifica-se na justiça, é vivificada pelo amor.
III. Responsabilidade e participação
- A participação é o
envolvimento voluntário e generoso da pessoa nas relações sociais. É
necessário que todos participem cada um conforme o lugar que ocupa e o
papel que desempenha, na promoção do bem comum. Este dever é inerente à
dignidade da pessoa humana.
- A participação se realiza,
antes de tudo, assumindo os setores pelos quais se tem a responsabilidade
pessoal: pelo cuidado na educação da prole, por um trabalho consciencioso,
o homem participa no bem dos outros e da sociedade.
- Os cidadãos devem, na
medida do possível, tomar parte ativa na vida pública. As modalidades de
tal participação podem variar de um pais para outro ou de uma cultura para
outra. "Deve-se louvar a maneira de proceder daquelas nações em que a
maior parte dos cidadãos, com autêntica liberdade, participa da vida
pública."
- A participação de todos na
realização do bem comum implica, como todo dever ético, uma conversão
sempre renovada dos parceiros sociais. A fraude e outros subterfúgios
pelos quais alguns escapam às malhas da lei e às prescrições do dever
social devem ser firmemente condenados, por serem incompatíveis com as
exigências da justiça. É necessário ocupar-se do florescimento das
instituições que possam melhorar as condições da vida humana.
- Cabe aos que exercem a
função de autoridade fortalecer os valores que atraem a confiança dos
membros do grupo e os incitam a se colocar a serviço dos semelhantes. A
participação começa pela educação e pela cultura. "Podemos pensar com
razão em depositar o futuro da humanidade nas mãos daqueles que são
capazes de transmitir às gerações do amanhã razões de viver e de
esperar."
RESUMINDO
- "Não há autoridade que
não venha de Deus, e as existentes foram instituídas por Deus" (Rm
13,1).
- Toda comunidade humana tem
necessidade de uma autoridade para se manter e desenvolver.
- "É evidente que a
comunidade política e a autoridade pública se fundamentam na natureza
humana, e por isso pertencem à ordem predeterminada por Deus."
- A autoridade é exercida de
maneira legítima se estiver ligada à busca do bem comum da sociedade. Para
atingi-lo, deve utilizar meios moralmente aceitáveis.
- É legítima a diversidade
dos regimes políticos, contanto que concorram para o bem da comunidade.
- A autoridade política deve
desenvolver-se dentro dos limites da ordem moral e garantir as condições
para o exercício da liberdade.
- O bem comum compreende
"o conjunto daquelas condições da vida social que permitem aos grupos
e a cada um de seus membros atingirem de maneira mais completa e
desembaraçadamente a própria perfeição"
- O bem comum comporta três
elementos essenciais: o respeito e a promoção dos direitos fundamentais da
pessoa; a prosperidade ou o desenvolvimento dos bens espirituais e
temporais da sociedade; a paz e a segurança do grupo e de seus membros.
- A dignidade da pessoa
humana implica a procura do bem comum. Cada pessoa deve preocupar-se em
suscitar e conservar as instituições que aprimoram as condições da vida
humana.
- Cabe ao Estado defender e
promover o bem comum da sociedade civil. O bem comum de toda a família
humana pede uma organização da sociedade internacional.
ARTIGO 3
A JUSTIÇA
SOCIAL
- A sociedade garante a
justiça social quando realiza as condições que permitem às associações e a
cada membro seu obter o que lhes é devido conforme sua natureza e sua
vocação. A justiça social está ligada ao bem comum e ao exercício da
autoridade.
I. O respeito à pessoa humana
- Só se pode conseguir a
justiça social no respeito à dignidade transcendente do homem. A pessoa representa
o fim último da sociedade, que por sua vez lhe está ordenada.
A defesa e a promoção da dignidade da pessoa
humana nos foram confiadas pelo Criador. Em todas as circunstâncias da
história, os homens e as mulheres são rigorosamente responsáveis e obrigados a
esse dever.
- O respeito à pessoa humana
implica que se respeitem os direitos que decorrem de sua dignidade de
criatura. Esses direitos são anteriores à sociedade e se lhe impõem. São
eles que fundam a legitimidade moral de toda autoridade; conculcando-os ou
recusando-se a reconhecê-los em sua lei positiva, uma sociedade mina sua
própria legitimidade moral. Sem esse respeito, uma autoridade só pode
apoiar-se na força ou na violência para obter a obediência de seus
súditos. Cabe à Igreja lembrar esses direitos aos homens de boa vontade e
distingui-los das reivindicações abusivas ou falsas.
- O respeito pela pessoa
humana passa pelo respeito deste princípio: "Que cada um respeite o
próximo, sem exceção, como 'outro eu', levando em consideração antes de
tudo sua vida e os meios necessários para mantê-la dignamente".
Nenhuma lei seria capaz, por si só, de fazer desaparecer os temores, os
preconceitos, as atitudes de orgulho e egoísmo que constituem obstáculos
para o estabelecimento de sociedades verdadeiramente fraternas. Esses
comportamentos só podem cessar com a caridade, que vê em cada homem um
"próximo", um irmão.
- O dever de tomar-se o
próximo do outro e servi-lo ativamente se torna ainda mais urgente quando
este se acha mais carente, em qualquer setor que seja. "Todas as
vezes que fizestes a um destes meus irmãos menores, a mim o fizestes"
(Mt 25,40).
- Este mesmo dever se estende
àqueles que pensam ou agem diferentemente de nós. A doutrina de Cristo vai
até o ponto de exigir o perdão das ofensas. Estende o mandamento do amor,
que é o da nova lei, a todos os inimigos. A libertação no espírito do
Evangelho é incompatível com o ódio ao inimigo, como pessoas mas não com o
ódio ao mal que este pratica, como inimigo.
II. Igualdade e diferenças entre os homens
- Criados à imagem do Deus
único, dotados de uma mesma alma racional, todos os homens têm a mesma
natureza e a mesma origem. Resgatados pelo sacrifício de Cristo, todos são
convidados a participar na mesma felicidade divina; todos gozam, portanto,
de igual dignidade.
- A igualdade entre os homens
diz respeito essencialmente à sua dignidade pessoal e aos direitos que daí
decorrem.
Qualquer forma de discriminação nos direitos
fundamentais da pessoa, seja (essa discriminação) social ou cultural, ou que se
fundamente no sexo, na raça, na cor, na condição social, na língua ou na
religião deve ser superada e eliminada, porque contrária ao plano de Deus.
- Quando nasce, o homem não
dispõe de tudo aquilo que é necessário ao desenvolvimento de sua vida
corporal e espiritual. Precisa dos outros. Aparecem diferenças ligadas à
idade, às capacidades físicas, às aptidões intelectuais ou morais, aos
intercâmbios de que cada um pôde se beneficiar, à distribuição das
riquezas. Os "talentos" não são distribuídos de maneira igual.
- Essas diferenças pertencem
ao plano de Deus; Ele quer que cada um receba do outro aquilo que precisa
e que os que dispõem de "talentos" específicos comuniquem seus
benefícios aos que deles precisam. As diferenças estimulam e muitas vezes
obrigam as pessoas à magnanimidade, à benevolência e à partilha; (essas
diferenças) motivam as culturas a se enriquecerem urnas às outras.
Eu não dou todas as virtudes na mesma medida a
cada um (...) Existem virtudes que eu distribuo desta maneira, ora a um ora a
outro. (...) A este a caridade; a outro a justiça; a este a humildade, àquele
uma fé viva. (...) Distribuí muitas graças e virtudes, espirituais e temporais,
com tal diversidade que a ninguém por si só concedi todo o necessário, para
serdes obrigados a usar de caridade uns para com os outros. (...) Quis que
todos tivessem necessidade uns dos outros e fossem meus ministros na
distribuição das graças e liberalidades que de mim receberam.
- Existem também
desigualdades iníquas que atingem milhões de homens e mulheres e se acham
em contradição aberta com o Evangelho:
A igual dignidade das pessoas postula que se
chegue a condições de vida mais justas e mais humanas. Pois as excessivas
desigualdades econômicas e sociais entre os membros e povos da única família
humana provocam escândalo e são contrárias à justiça social, à eqüidade, à
dignidade da pessoa humana e à paz social e internacional.
III. A solidariedade humana
- O princípio da
solidariedade, enunciado ainda sob o nome de ou "caridade social'', é
uma exigência direta da fraternidade humana e cristã:
Um erro, "hoje amplamente difundido, é o
esquecimento desta lei da solidariedade humana e da caridade, ditada e imposta
tanto pela comunidade de origem e pela igualdade da natureza racional em todos
os homens, seja qual for o povo a que pertençam, como também pelo sacrifício
redentor oferecido por Jesus Cristo no altar da cruz a seu Pai celeste, em prol
da humanidade pecadora"
- A solidariedade se
manifesta antes de mais nada na distribuição dos bens e na remuneração do
trabalho. Supõe também o esforço em favor de uma ordem social mais justa,
na qual as tensões possam ser mais bem resolvidas e os conflitos encontrem
mais facilmente sua solução por consenso.
- Os problemas sócio
econômicos só podem ser resolvidos com o auxílio de todas as formas de
solidariedade: solidariedade dos pobres entre si, dos ricos e dos pobres,
dos trabalhadores entre si, dos empregadores e dos empregados na empresa,
solidariedade entre as nações e entre os povos. A solidariedade
internacional é uma exigência de ordem moral. Em parte, é da solidariedade
que depende a paz mundial.
- A virtude da solidariedade
vai além dos bens materiais. Difundindo os bens espirituais da fé, a
Igreja favoreceu também o desenvolvimento dos bens temporais, aos quais muitas
vezes abriu novos caminhos. Assim foi-se verificando, ao longo dos
séculos, a palavra do Senhor: "Buscai, em primeiro lugar, o Reino de
Deus e sua justiça, e todas essas coisas serão acrescentadas" (Mt
6,33):
Há dois mil anos vive e persevera na alma da
Igreja este sentimento que levou e ainda leva as almas ao heroísmo caritativo
dos monges agricultores, dos libertadores de escravos, dos tratam dos enfermos,
dos mensageiros de fé, de civilização, ciência a todas as gerações e a todos os
povos, em vista de criar condições sociais capazes de possibilitar a todos uma
vida digna do homem e do cristão.
RESUMINDO
- A sociedade garante a
justiça social realizando as condições que permitam às associações e a
cada um obter o que lhes é devido.
- O respeito pela pessoa
humana considera o outro como um "outro eu mesmo". Supõe o
respeito pelos direitos fundamentais que decorrem da dignidade intrínseca
da pessoa.
- A igualdade entre os homens
assenta sobre sua dignidade pessoal e sobre os direitos que daí decorrem.
- As diferenças entre as
pessoas pertencem ao plano de Deus, o qual quer que todos nós tenhamos
necessidade uns dos outros. Essas diferenças devem estimular a caridade.
- A dignidade igual das
pessoas humanas exige o esforço para reduzir as desigualdades sociais e
econômicas excessivas e leva ao desaparecimento das desigualdades iníquas.
- A solidariedade é uma
virtude eminentemente cristã que pratica a partilha dos bens espirituais
mais ainda que dos materiais.
CAPÍTULO III.
A SALVAÇÃO DE
DEUS: A LEI E A GRAÇA
- Chamado à felicidade, mas
ferido pelo pecado, o homem tem necessidade da salvação de Deus. O socorro
divino lhe é dado, em Cristo, pela lei que o dirige e na graça que o
sustenta:
Trabalhai para vossa salvação com temor e tremor,
pois é Deus quem, segundo a sua vontade, realiza em vós o querer e o fazer (Fl
2,12-13).
ARTIGO I
A LEI MORAL
- A lei moral é obra da
Sabedoria divina. Pode-se definir a lei moral, no sentido bíblico, como
uma instrução paterna, uma pedagogia divina. Ela prescreve ao homem os
caminhos, as regras de comportamento que levam à felicidade prometida;
proscreve os caminhos do mal, que desviam de Deus e de seu amor. E ao
mesmo tempo firme em seus preceitos e amorosa em suas promessas.
- A lei é uma regra de
comportamento promulgada pela autoridade competente em vista do bem comum.
A lei moral supõe a ordem racional estabelecida entre as criaturas, para
seu bem e em vista de seu fim, pelo poder, pela sabedoria e pela bondade
do Criador. Toda lei encontra na lei eterna sua verdade primeira e última.
A lei é revelada e estabelecida pela razão como una participação na
providência do Deus vivo, Criador e Redentor de todos. "A esta
ordenação da razão dá-se o nome de lei":
Apenas o homem, entre todos os seres vivos, pode
gloriar-se de ter sido digno de receber de Deus uma lei. Animal dotado de
razão, capaz de entendimento e discernimento, regulará sua conduta dispondo de
liberdade e de razão, na submissão àquele que tudo lhe confiou.
- As expressões da lei moral
variam muito, e todas se acham coordenadas entre si: a lei eterna, fonte,
em Deus, de todas as leis; a lei natural; a lei revelada, compreendendo a
Lei Antiga e a Nova Lei (ou Lei evangélica); enfim, as leis civis e
eclesiásticas.
- A lei moral encontra em
Cristo sua plenitude e sua unidade. Jesus Cristo em pessoa é o caminho da
perfeição. Ele é o fim da lei, pois só ele ensina e dá a justiça de Deus.
"Porque a finalidade da lei é Cristo, para a justificação de todo o
que crê" (Rm 10,4).
I. A lei moral natural
- O homem participa da
sabedoria e da bondade do Criador, que lhe confere o domínio de seus atos
e a capacidade de se governar em vista da verdade e do bem. A lei natural
exprime o sentido moral original, que permite ao homem discernir, pela
razão, o que é o bem e o mal, a verdade e a mentira.
A lei natural se acha escrita e gravada na alma
de todos e de cada um dos homens, porque ela é a razão humana ordenando fazer o
bem e proibindo pecar. (...) Mas esta prescrição da razão não poderia ter força
de lei se não fosse a voz e o intérprete de uma razão mais alta, à qual nosso
espirito e nossa liberdade devem submeter-se.
- A lei "divina e
natural" mostra ao homem o caminho a seguir para praticar o bem e
atingir seu fim. A lei natural enuncia os preceitos primeiros e essenciais
que regem a vida moral. Tem como esteio a aspiração e a submissão a Deus,
fonte e juiz de todo bem, assim como sentir o outro como igual a si mesmo.
Está exposta, em seus principais preceitos, no Decálogo. Essa lei é
denominada natural não em referência à natureza dos seres irracionais, mas
porque a razão que a promulga pertence, como algo próprio, à natureza
humana:
Onde é, então, que se acham inscritas estas
regras, senão no livro desta luz que se chama a verdade? Aí está escrita toda a
lei justa, dali ela passa para o coração do homem que cumpre a justiça, não que
emigre para ele, mas sim deixando ai a sua marca, à maneira de um sinete que de
um anel passa para a cera, mas sem deixar o anel.
A lei natural outra coisa não é senão a luz da
inteligência posta em nós por Deus. Por ela, conhecemos o que se deve fazer e o
que se deve evitar. Esta luz ou esta lei, deu-a Deus a criação.
- Presente no coração de cada
homem e estabelecida pela razão, a lei natural é universal em seus
preceitos, e sua autoridade se estende a todos os homens. Ela exprime a
dignidade da pessoa e determina a base de seus direitos e de seus deveres
fundamentais:
Existe, sem dúvida, uma verdadeira lei: é a reta
razão. Conforme à natureza, difundida em todos os homens, ela é imutável e
eterna; suas ordens chamam ao dever; suas proibições afastam do pecado. (...) E
um sacrilégio substituí-la por uma lei contrária; é proibido não aplicar uma de
suas disposições; quanto a ab-rogá4a inteiramente, ninguém tem a possibilidade
de fazê-lo.
- A aplicação da lei natural
varia muito. Pode exigir uma reflexão adaptada à multiplicidade das
condições de vida, conforme os lugares, as épocas e as circunstâncias.
Todavia, na diversidade das culturas, a lei natural permanece como uma
regra que liga entre si os homens e lhes impõe, para além das inevitáveis
diferenças, princípios comuns.
- A lei natural é imutável e
permanente através das varias ações da história; ela subsiste sob o fluxo
das idéias e dos costumes e constitui a base para seu progresso. As regras
que a exprimem permanecem substancialmente válidas. Mesmo que alguém negue
até os seus princípios, não é possível destruí-la nem arrancá-la do
coração do homem. Sempre torna a ressurgir na vida dos indivíduos e das
sociedades:
O roubo é certamente punido por vossa lei,
Senhor, e pela lei escrita no coração do homem, (lei) que nem mesmo a
iniqüidade consegue apagar.
- Obra excelente do Criador,
a lei natural fornece os fundamentos sólidos sobre os quais pode o homem
construir o edifício das regras morais que orientarão suas opções. Ela
assenta igualmente a base moral indispensável para a construção da
comunidade dos homens. Proporciona, enfim, a base necessária à lei civil
que se relaciona com ela, seja por uma reflexão que tira as conclusões de
seus princípios, seja por adições de natureza positiva e jurídica.
- Os preceitos da lei natural
não são percebidos por todos de maneira clara e imediata. Na atual
situação, a graça e a revelação nos são necessárias, como pecadores que
somos, para que as verdades religiosas e morais possam ser conhecidas
"por todos e sem dificuldade, com firme certeza e sem mistura de
erro". A lei natural propicia à lei revelada e à graça um fundamento
preparado por Deus e em concordância com a obra do Espírito.
II. A Lei Antiga
- Deus, nosso criador e nosso
redentor, escolheu para si Israel como seu povo e lhe revelou sua Lei,
preparando, assim, a vinda de Cristo. A Lei de Moisés exprime diversas
verdades naturalmente acessíveis à razão. Estas se acham declaradas e
autenticadas no interior da aliança da salvação.
- A Lei Antiga é o primeiro
estágio da Lei revelação. Suas prescrições morais estão resumidas nos Dez
Mandamentos. Os preceitos do Decálogo assentam as bases da vocação do
homem, feito à imagem de Deus; proíbem aquilo que é contrário ao amor de
Deus e do próximo e prescrevem o que lhe é essencial. O Decálogo é uma luz
oferecida à consciência de todo homem, para lhe manifestar o chamamento e
os caminhos de Deus e protegê-lo do mal:
Deus escreveu nas tábuas da lei aquilo que os
homens não conseguiam ler em seus corações.
- Segundo tradição cristã, a
lei santa, espiritual e boa ainda é imperfeita. Como um pedagogo, ela
mostra o que se deve fazer, mas não dá por si mesma a força, a graça do
Espírito para cumpri-la. Por causa do pecado que não pode tirar, é ainda uma
lei de servidão. Conforme S. Paulo, ela tem principalmente como função
denunciar e manifestar o pecado que forma uma "lei de
concupiscência" no coração do homem. No entanto, a lei permanece como
a primeira etapa no caminho do Reino. Prepara e dispõe o povo eleito e
cada cristão à conversão e à fé no Deus salvador. Oferece um ensinamento
que subsiste para todo o sempre, como a Palavra de Deus.
- A Lei Antiga é uma
preparação para o Evangelho. "A lei é profecia e pedagogia das
realidades futuras." Profetiza e pressagia a obra da libertação do
pecado, que se realizará com Cristo, e fornece ao Novo Testamento as
imagens, os "tipos", os símbolos, para exprimir a vida segundo o
Espírito. A Lei se completa, enfim, pelo ensinamento dos livros sapienciais
e dos profetas que a Orientam para a nova aliança e o Reino dos Céus.
Houve (...), sob o regime da Antiga Aliança,
pessoas que possuíam a caridade e a graça do Espírito Santo e aspiravam
sobretudo às promessas espirituais e eternas, e deste modo se ligavam à nova
lei. Inversamente, existem também sob a nova aliança homens carnais, ainda
longe da perfeição da nova Lei. Para os estimular às obras virtuosas, foram
necessários o temor do castigo e diversas promessas temporais, até sob a Nova
Aliança. Em todo caso, mesmo que a Lei Antiga prescrevesse a caridade, ela não
dava o Espírito Santo pelo qual "o amor de Deus derramado em nossos
corações" (Rm 5,5).
III. A Nova Lei ou Lei evangélica
- A Nova Lei ou Lei
evangélica é a perfeição, na terra, da lei divina, natural e revelada. Ela
é a obra do Cristo e se exprime particularmente no Sermão da Montanha. E
também obra do Espírito Santo e, por ele, vem a ser a lei interior da
caridade: "Concluirei com a casa de Israel uma nova aliança. (...)
Colocarei minhas leis em sua mente e as inscreverei em seu coração; e eu
serei o seu Deus, e eles serão o meu povo" (Hb 8,8.10).
- A Nova Lei é a graça do
Espirito Santo dada aos fiéis pela fé em Cristo. É operante pela caridade,
serve-se do Sermão do Senhor para nos ensinar o que é preciso fazer e dos
sacramentos para nos comunicar a graça de fazê-lo.
Aquele que quiser meditar com piedade e
perspicácia o Sermão que Nosso Senhor pronunciou no monte, tal como o lemos no
Evangelho de São Mateus, aí encontrará, sem sombra de dúvida, a carta magna da
vida cristã. (...) Este Sermão contém todos os preceitos apropriados para guiar
a vida cristã.
- A Lei evangélica "dá
pleno cumprimento" à Lei Antiga, afina-a, ultrapassa-a e
aperfeiçoa-a. Nas "bem-aventuranças", ela realiza plenamente as
promessas divinas, elevando-as e ordenando-as ao "Reino dos
Céus". Dirige-se àqueles que se mostram dispostos a acolher com fé
esta esperança nova - os pobres, os humildes, os aflitos, os de coração
puro, os perseguidos por causa de Cristo -, traçando assim os surpreendentes
caminhos do Reino.
- A Lei evangélica dá pleno
cumprimento aos mandamentos da Lei. O Sermão do Senhor, longe de abolir ou
desvalorizar as prescrições morais da Lei Antiga, dela haure as
virtualidades ocultas, faz surgir novas exigências e revela sua verdade
divina e humana. Não lhe acrescenta novos preceitos exteriores, mas vai
até o ponto de reformar a raiz dos atos, o coração, onde o homem faz a
opção entre o puro e o impuro, onde se formam a fé, a esperança e a
caridade e, com elas, as outras virtudes. O Evangelho, deste modo, leva a
lei à plenitude, imitando a perfeição do Pai celeste, pelo perdão dos
inimigos e pela oração pelos perseguidores, seguindo o modelo da divina
generosidade.
- A Nova Lei pratica os atos
da religião - a esmola, a oração e o jejum -, ordenando-os ao "Pai
que vê no segredo", em contraste com o desejo "de ser visto
pelos homens". Sua oração é o "Pai-Nosso."
- A Lei evangélica comporta a
opção decisiva entre "os dois caminhos" e a prática das palavras
do Senhor; resume-se na regra de ouro: "Tudo aquilo, portanto, que
quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles, pois esta é a lei e
os profetas" (Mt 7,12).
Toda a Lei evangélica se compendia no
"mandamento novo" de Jesus, de nos amarmos uns aos outros como Ele
nos amou.
- Ao sermão do Senhor convém
acrescentar a catequese moral dos ensinamentos apostólicos, como Rm 12-15;
1 Cor 12-13; Cl 3-4; Ef 4-6 etc. Esta doutrina transmite o ensinamento do
Senhor com a autoridade dos Apóstolos, particularmente pela exposição das
virtudes que decorrem da fé em Cristo e são animadas pela caridade, o
principal dom do Espírito Santo. "Que vosso amor seja sem hipocrisia
(...) com amor fraterno, tendo carinho uns para com os outros (...)
alegrando-vos na esperança, perseverando na tribulação, assíduos na
oração, tomando parte nas necessidades dos santos, buscando proporcionar a
hospitalidade" (Rm 12,9-13). Esta catequese também nos ensina a
tratar os casos de consciência à luz de nossa relação com Cristo e a
Igreja.
- A Nova Lei é também denominada
lei de amor, porque ela leva a agir pelo amor infundido pelo Espírito
Santo e não pelo temor; uma lei de graça, por conferir a força da graça
para agir por meio da fé e dos sacramentos; uma lei de liberdade, pois nos
liberta das observância rituais e jurídicas da Antiga Lei, nos inclina a
agir espontaneamente sob o impulso da caridade, enfim, nos faz passar do
estado de servo, não sabe o que seu senhor faz", para o de amigo de
Cristo, "porque tudo o que eu ouvi de meu Pai eu vos dei a conhecer
(Jo 15,15), ou ainda para o de filho-herdeiro.
- Além de seus preceitos, a
Nova Lei comporta também os conselhos evangélicos. A distinção tradicional
entre os mandamentos de Deus e os conselhos evangélicos se estabelece em
relação à caridade, perfeição da vida cristã. Os preceitos se destinam a
afastar tudo o que é incompatível com a caridade. Os conselhos têm como
meta afastar o que, mesmo sem lhe ser contrário, pode constituir um
obstáculo para o desenvolvimento da caridade.
- Os conselhos evangélicos
manifestam a plenitude viva da caridade que jamais se mostra satisfeita,
por não poder dar mais. Atestam seu dinamismo e solicitam nossa prontidão
espiritual. A perfeição da Nova Lei consiste essencialmente preceitos do
amor a Deus e ao próximo. Os conselhos indicam caminhos mais diretos,
meios mais fáceis, e devem ser praticados conforme a vocação de cada um:
(Deus) não quer que cada pessoa observe todos os
conselhos mas apenas aqueles que são convenientes, conforme a diversidade das
pessoas, dos tempos, das ocasiões e das forças, com o exige a caridade; pois
ela, como a rainha de todas as virtudes, de todos os mandamentos, de todos os
conselhos, em suma, de todas as leis e de todas as ações cristãs, a todos e
todas dá seu grau, sua ordem, o tempo e o valor.
RESUMINDO
- Segundo a Escritura, a lei
é uma instrução paterna de Deus que prescreve ao homem os caminhos que
levam à felicidade prometida e proscreve os caminhos do mal.
- "A lei é uma ordenação
da razão para o bem comum, promulgada por aquele a quem cabe o governo da comunidade."
- Cristo é a finalidade da
1ei. Somente Ele ensina e concede a justiça de Deus.
- A lei natural é uma
participação na sabedoria e na bondade de Deus, pelo homem formado à
imagem de seu criador. A lei natural exprime a dignidade da pessoa humana e
constitui a base de seus direitos e deveres fundamentais.
- A lei natural é imutável,
permanente através da história. As regras que a exprimem são
substancialmente sempre válidas. Ela é uma base necessária para a
edificação das regras morais e para a lei civil.
- A Antiga Lei é o primeiro
estágio da Lei revelada. Suas prescrições morais se acham resumidas nos
Dez Mandamentos.
- A Lei de Moisés contém
diversas verdades naturalmente acessíveis à razão. Deus as revelou porque
os homens não as conseguiam ler em seu coração.
- A Antiga Lei é uma
preparação para o Evangelho.
- A Nova Lei é a graça do
Espírito Santo, recebida pela fé em Cristo, operando pela caridade.
Exprime-se particularmente no Sermão do Senhor na montanha e usa os
sacramentos para comunicar-nos a graça.
- A Lei evangélica leva a
pleno cumprimento, ultrapassa e conduz à perfeição a Antiga Lei: suas
promessas, por meio das bem-aventuranças do Reino dos Céus; seus
mandamentos, por meio da transformação da fonte de suas ações, ou seja, o
coração.
- A Nova Lei é uma lei de
amor, uma lei de graça, uma lei de liberdade.
- Além de seus preceitos, a
Nova Lei comporta os conselhos evangélicos. "De modo especial
favorecem igualmente a santidade da Igreja os múltiplos conselhos que no
Evangelho Senhor propõe à observância de seus discípulos."
ARTIGO 2
GRAÇA E
JUSTIFICAÇÃO
I. A justificação
- A graça do Espírito Santo
tem o poder de nos justificar, isto é, purificar-nos de nossos pecados e
comunicar-nos "a justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo" e pelo
batismo.
Mas, se morremos com Cristo, temos fé de que
também viveremos com Ele, sabendo que Cristo, uma vez ressuscitado dentre os
mortos, já não morre, a morte não tem mais domínio sobre Ele. Porque, morrendo,
Ele morreu para o pecado uma vez por todas; vivendo, Ele vive para Deus. Assim
também vós considerai-vos mortos para o pecado e vivos para Deus em Cristo
Jesus (Rm 6,8-11).
- Pelo poder do Espírito
Santo, participamos da Paixão de Cristo, morrendo para o pecado, e da
ressurreição, nascendo para uma vida nova; somos os membros de seu Corpo,
que é a Igreja , os sarmentos enxertados na Videira, que é Ele mesmo:
Pelo Espírito, temos parte com Deus. (...) Pela
participação Espírito, nós nos tornamos participantes da natureza divina. (...)
Por isso, aqueles em quem o Espírito habita são divinizados.
- A primeira obra da graça do
Espírito Santo é a conversão que opera a justificação segundo o anúncio de
Jesus no princípio do Evangelho: "Arrependei-vos (convertei-vos),
porque está próximo o Reino dos Céus" (Mt 4,17). Sob a moção da
graça, o homem se volta para Deus e se aparta do pecado, acolhendo, assim,
o perdão e a justiça do alto. "A justificação comporta a remissão dos
pecados, a santificação e a renovação do homem interior."
- A justificação aparta o
homem do pecado, que contradiz o amor de Deus, e lhe purifica o coração. A
justificação ocorre graças à iniciativa da misericórdia de Deus, que
oferece o perdão. A justificação reconcilia o homem com Deus; liberta-o da
servidão do pecado e o cura.
- A justificação é, ao mesmo tempo,
o acolhimento da justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo. A justiça
designa aqui a retidão do amor divino. Com a justificação, a fé, a
esperança e a caridade se derramam em nossos corações e é-nos concedida a
obediência à vontade divina.
- A justificação nos foi
merecida pela paixão de Cristo, que se ofereceu na cruz como hóstia viva,
santa e agradável a Deus, e cujo sangue se tornou instrumento de
propiciação pelos pecados de toda a humanidade. A justificação é concedida
pelo Batismo, sacramento da fé. Toma-nos conformes à justiça de Deus, que
nos faz interiormente justos pelo poder de sua misericórdia. Tem como alvo
a glória de Deus e de Cristo, e o dom da vida eterna:
Agora, porém, independentemente da lei, se
manifestou a justiça de Deus, testemunhada pela lei e pelos profetas, justiça
de Deus que opera pela fé em Jesus Cristo, em favor de todos os que crêem pois
não há diferença, sendo que todos pecaram e todos estão privados da glória de
Deus e são justificados gratuitamente, por sua graça, em virtude da redenção
realizada em Cristo Jesus. Deus o expôs como instrumento de propiciação, por
seu próprio sangue, mediante a fé. Ele queria assim manifestar sua justiça,
pelo fato de ter deixado sem punição os pecados de outrora, no tempo da
paciência de Deus; ele queria manifestar sua justiça no tempo presente, para
mostrar-se justo e para justificar aquele que tem fé em Jesus (Rm 3,21-26).
- A justificação estabelece a
colaboração entre a graça de Deus e a liberdade do homem. Do lado humano,
ela se exprime no assentimento da fé à palavra de Deus, que convida o
homem à conversão, e na cooperação da caridade, no impulso do Espírito
Santo, que o previne e guarda.
Quando Deus toca o coração do homem pela
iluminação do Espírito Santo, o homem não é insensível a tal inspiração, que
pode, aliás, rejeitar; e, no entanto, ele não pode tampouco, sem a graça
divina, chegar pela vontade livre à justiça diante dele
- A justificação é a obra
mais excelente do amor de Deus, manifestado em Cristo Jesus e concedido
pelo Espírito Santo. Sto. Agostinho pensa que "a justificação do
ímpio é uma obra maior que a criação dos céus e da terra", pois
"os céus e a terra passarão, ao passo que a salvação e a justificação
dos eleitos permanecerão para sempre". Pensa até que a justificação
dos pecadores é uma obra maior que a criação dos anjos na justiça, pelo
fato de testemunhar uma misericórdia maior.
- O Espírito Santo é o mestre
interior. Gerando "o homem interior , a justificação implica a
santificação de todo o ser:
Como outrora entregastes vossos membros à
escravidão da impureza e da desordem para viver desregradamente, assim entregai
agora vossos membros a serviço da justiça, para a santificação. (...) Mas
agora, libertos do pecado e postos a serviço de Deus, tendes, como fruto, a santificação,
e o fim é a vida eterna (Rm 6,19-22).
II. A graça
- Nossa justificação vem da
graça de Deus. A graça é favor, o socorro gratuito que Deus nos dá para
responder a seu convite: tomar-nos filhos de Deus, filhos adotivos
participantes da natureza divina, da Vida Eterna.
- A graça é uma participação
na vida divina; introduz-nos na intimidade da vida trinitária. Pelo
Batismo, o cristão tem parte na graça de Cristo, cabeça da Igreja. Como
"filho adotivo", pode doravante chamar a Deus de
"Pai", em união com o Filho único. Recebe a vida do Espírito,
que nele infunde a caridade e forma a Igreja.
- Esta vocação para a vida
eterna é sobrenatural. Depende integralmente da iniciativa gratuita de
Deus, pois apenas Ele pode se revelar e dar-se a si mesmo. Esta vocação
ultrapassa as capacidades da inteligência e as forças da vontade do homem,
como também de qualquer criatura.
- A graça de Cristo é o dom
gratuito que Deus nos faz de sua vida infundida pelo Espírito Santo em
nossa alma, para curá-la do pecado e santificá-la; trata-se da graça
santificante ou deificante, recebida no Batismo. Em nós, ela é a fonte da
obra santificadora:
Se alguém está em Cristo, é nova criatura.
Passaram-se as coisas antigas; eis que se fez uma realidade nova. Tudo isto vem
de Deus, que nos reconciliou consigo por Cristo (2Cor 5,17-18).
- A graça santificante é um
dom habitual, uma disposição estável e sobrenatural para aperfeiçoar a
própria alma e torná-la capaz de viver com Deus, agir por seu amor.
Deve-se distinguir a graça habitual, disposição permanente para viver e
agir conforme o chamado divino, e as graças atuais, que designam as
intervenções divinas, quer na origem da conversão, quer no decorrer da
obra da santificação.
- A preparação do homem para
acolher a graça é já uma obra da graça. Esta é necessária para suscitar e
manter nossa colaboração na justificação pela fé e na santificação pela
caridade. Deus acaba em nós aquilo que Ele mesmo começou, "pois
começa, com sua intervenção, fazendo com que nós queiramos e acaba
cooperando com as moções de nossa vontade já convertida":
Sem dúvida, operamos também nós, mas o fazemos
cooperando com Deus, que opera predispondo-nos com a sua misericórdia. E o faz
para nos curar, e nos acompanhará para que, quando já curados, sejamos
vivificados; predispõe-nos para que sejamos chamados e acompanha-nos para que
sejamos glorificados; predispõe-nos para que vivamos segundo a piedade e
segue-nos para que, com Ele, vivamos para todo o sempre, pois sem Ele nada
podemos fazer.
- A livre iniciativa de Deus
pede a livre resposta do homem pois Deus criou o homem à sua imagem,
conferindo-lhe, com a liberdade, o poder de conhecê-Lo e amá-Lo. A alma só
pode entrar livremente na comunhão do amor. Deus toca imediatamente e move
diretamente o coração do homem. Ele colocou no homem uma aspiração à
verdade e ao bem que somente Ele pode satisfazer plenamente. As promessas
da "vida eterna" respondem, além de a toda a nossa esperança, a
esta aspiração:
Se Vós, ao cabo de vossas obras excelentes (...)
repousastes no sétimo dia, foi para nos dizer de antemão pela voz de vosso
livro que, ao cabo de nossas obras ("que são muito boas", pelo fato
mesmo de terdes sido Vós que no-las destes), também nós no sábado da vida
eterna em Vós repousaremos.
- A graça é antes de tudo e
principalmente o dom do Espírito que nos justifica e nos santifica. Mas a
graça compreende igualmente os dons que o Espírito nos concede, para nos a
associar à sua obra, para nos tornar capazes de colaborar com a salvação
dos outros e com o crescimento do corpo de Cristo, a Igreja. São as graças
sacramentais dons próprios dos diferentes sacramentos. São, além disso, as
graças especiais, chamadas também "carismas", segundo a palavra
grega empregada por S. Paulo e que significa favor, dom gratuito, benefício.
Seja qual for seu caráter, às vezes extraordinário, como o dom dos
milagres ou das línguas, os carismas se ordenam à graça santificante e têm
como meta o bem comum da Igreja. Acham-se a serviço da caridade, que
edifica a Igreja.
- Entre as graças especiais,
convém mencionar as graças de estado, que acompanham o exercício das
responsabilidades da vida cristã e dos ministérios no seio da Igreja:
Tendo, porém, dons diferentes, segundo a graça
que nos foi dada, aquele que tem o dom da profecia, que o exerça segundo a proporção
de nossa fé; aquele que tem o dom do serviço, que o exerça servindo; quem tem o
dom do ensino, ensinando; quem tem o dom da exortação, exortando. Aquele que
distribui seus bens, que o faça com simplicidade; aquele que preside, com
diligência; aquele que exerce misericórdia, com alegria (Rm 12,6-8).
- Sendo de ordem
sobrenatural, a graça escapa à nossa experiência e só pode ser conhecida
pela fé. Não podemos, portanto, nos basear em nossos sentimentos ou em
nossas obras para dai deduzir que estamos justificados e salvos. No
entanto, segundo a palavra do Senhor: "É pelos seus frutos que os
reconhecereis" (Mt 7,20), a consideração dos benefícios de Deus em
nossa vida e na dos santos nos oferece uma garantia de que a graça está
operando em nós e nos incita a uma fé sempre maior e a uma atitude de
pobreza confiante:
Acha-se uma das mais belas ilustrações desta
atitude na resposta de Sta. Joana d'Arc a uma pergunta capciosa de seus juizes
eclesiásticos: "Interrogada se sabe se está na graça de Deus, responde:
"Se não estou, que Deus me queira pôr nela; se estou, que Deus nela me
conserve".
III. O mérito
Na assembléia dos santos, vós sois glorificados
e, coroando os seus méritos, exaltais os vossos próprios dons.
- O termo "mérito"
designa, em geral, a retribuição devida por uma comunidade ou uma
sociedade à ação de um de seus membros, sentida como boa ou má, digna de
recompensa ou castigo. O mérito se relaciona com a virtude da justiça, em
conformidade com o princípio da igualdade que a rege.
- Diante de Deus, em sentido
estritamente jurídico, não mérito da parte do homem. Entre Ele e nós a
diferença é infinita, pois dele tudo recebemos, dele, que é nosso criador.
- O mérito do homem diante de
Deus, na vida cristã, provém do fato de que Deus livremente determinou associar
o homem à obra de sua graça. A ação paternal de Deus vem em primeiro lugar
por seu impulso, e o livre agir do homem, em segundo lugar, colaborando
com Ele, de sorte que os méritos das boas obras devem ser atribuídos à
graça de Deus, primeiramente, e só em segundo lugar ao fiel. O próprio
mérito do homem cabe, aliás, a Deus pois suas boas ações procedem, em
Cristo, das inspirações do auxilio do Espírito Santo.
- A adoção filial,
tomando-nos participantes, por graça, da natureza divina, pode conferir-nos,
segundo a justiça gratuita de Deus, um verdadeiro mérito. Trata-se de um
direito por graça, o pleno direito amor, que nos toma
"co-herdeiros" de Cristo e dignos de obter "a herança
prometida da vida eterna. Os méritos de nossas boas obras são dons da bondade
divina. "A graça veio primeiro; agora se entrega aquilo que é devido.
(...)Os méritos são dons de Deus."
- Como a iniciativa pertence
a Deus na ordem da graça, ninguém pode merecer a graça primeira, na origem
da versão, do perdão e da justificação. Sob a moção do Espírito Santo e da
caridade, podemos em seguida merecer para nós mesmos e para os outros as
graças úteis à nossa santificação crescimento da graça e da caridade, e
também para ganhar a vida eterna. Os próprios bens temporais, como a saúde,
a amizade, podem ser merecidos segundo a sabedoria divina. Essas graças e
esses bens são o objeto da oração cristã. Esta atende à nossa necessidade
da graça para as ações meritórias.
- A caridade de Cristo em nós
constitui a fonte de todos os nossos méritos diante de Deus. A graça,
unindo-nos a Cristo com amor ativo, assegura a qualidade sobrenatural de
nossos atos e, por conseguinte, seu mérito (desses nossos atos) diante de
Deus, como também diante dos homens. Os santos sempre tiveram viva
consciência de que seus méritos eram pura graça.
Após o exílio terrestre, espero ir deleitar-me de
vós na Pátria, mas não quero acumular méritos para o céu, quero trabalhar
somente por vosso amor. (...). Ao entardecer desta vida, comparecerei diante de
vós com as mãos vazias, pois não vos peço, Senhor, que contabilizeis as minhas
obras. Todas as nossas justiças têm manchas a vossos olhos. Quero, portanto,
revestir-me de vossa própria justiça e receber de vosso amor a posse eterna de
vós mesmo...
IV. A santidade cristã
- "E nós sabemos que
Deus coopera em tudo para o bem daqueles que o amam. (...) Porque os que
de antemão Ele conheceu, esses também predestinou a serem conformes à
imagem de seu Filho, a fim de ser Ele o primogênito entre muitos irmãos. E
os que predestinou, também os chamou, e os que chamou, também os
justificou, e os que justificou, também os glorificou" (Rm 8,28-30).
- "Todos os fiéis
cristãos, de qualquer estado ou ordem, são chamados à plenitude da vida
cristã e à perfeição da caridade." Todos são chamados à santidade:
"Deveis ser perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito" (Mt
5,48):
Com o fim de conseguir esta perfeição, façam os
fiéis uso das forças recebidas (...), a fim de que, cumprindo em tudo a vontade
do Pai, se dediquem inteiramente à glória de Deus e ao serviço do próximo.
Assim, a santidade do povo de Deus se expandirá em abundantes frutos, como se
demonstra luminosamente na história da Igreja pela vida de tantos santos.
- O progresso espiritual
tende à união sempre mais íntima com Cristo. Esta união recebe o nome de
"mística", pois ela participa no mistério de Cristo pelos
sacramentos "os santos mistérios" e, nele, no mistério da
Santíssima Trindade, Deus nos chama a todos a esta íntima união com Ele,
mesmos que graças especiais ou sinais extraordinários desta vida mística
sejam concedidos apenas a alguns, em vista de manifestar o dom gratuito
feito a todos.
- O caminho da perfeição
passa pela cruz. Não existe santidade sem renúncia e sem combate
espiritual. O progresso espiritual envolve ascese e mortificação, que
levam gradualmente a viver na paz e na alegria das bem-aventuranças:
Aquele que vai subindo jamais cessa de progredir
de começo em começo, por começos que não têm fim. Aquele que jamais cessa de
desejar aquilo que já conhece.
- Os filhos da Santa Igreja,
nossa Mãe, esperam justamente a graça da perseverança final e a recompensa
de Deus, seu Pai pelas boas obras realizadas com sua graça, em comunhão
com Jesus. Observando a mesma regra de vida, os fiéis cristãos partilham
"a feliz esperança" daqueles que a misericórdia divina reúne na
"Cidade santa, uma Jerusalém nova que desce do céu de junto de Deus,
preparada como uma esposa" (Ap 21,2).
RESUMINDO
- A graça do Espírito Santo
nos dá a justiça de Deus. Unindo-nos pela fé e pelo Batismo à Paixão e à
Ressurreição de Cristo, o Espírito nos faz participar de sua vida.
- A justificação, como a
conversão, apresenta duas faces. Sob a moção da graça, o homem se volta
para Deus e se afasta do pecado, acolhendo, assim, o perdão e a justiça
que vêm do alto.
- A justificação comporta a
remissão dos pecados, a santificação e a renovação do homem interior.
- A justificação nos foi
merecida pela Paixão de Cristo e nos é concedida por meio do Batismo.
Faz-nos conformes à justiça de Deus, que nos torna justos. Tem como meta a
glória de Deus e de Cristo e o dom da Vida Eterna. É a obra mais excelente
da misericórdia de Deus.
- A graça é o auxílio que
Deus nos concede para responder à nossa vocação de nos tornar seus filhos
adotivos. Ela nos introduz na intimidade da vida trinitária.
- A iniciativa divina na obra
da graça precede, prepara e suscita a livre resposta do homem. A graça
responde às aspirações profundas da liberdade humana; chama-a a cooperar
consigo e a aperfeiçoa.
- A graça santificante é o
dom gratuito que Deus nos faz de sua vida, infundida pelo Espírito Santo
em nossa alma, para curá-la do pecado e santificá-la.
- A graça santificante nos
faz "agradáveis a Deus". Os carismas, graças especiais do
Espírito Santo, são ordenados à graça santificante e têm como alvo o bem
comum da Igreja. Deus opera também por graças atuais múltiplas, que se
distinguem da graça habitual, permanente em nós.
- Nosso mérito em face de
Deus consiste apenas em seguir seu livre desígnio de associar o homem à
obra de sua graça. O mérito pertence à graça de Deus em primeiro lugar, à
colaboração do homem em segundo lugar. Cabe a Deus o mérito humano.
- A graça do Espírito Santo,
em virtude de nossa filiação adotiva, pode conferir-nos um verdadeiro
mérito segundo a justiça gratuita de Deus. A caridade constitui, em nós, a
fonte principal do mérito diante de Deus.
- Ninguém pode merecer a
graça primeira que se acha na origem da conversão. Sob a moção do Espírito
Santo, podemos merecer, para nós mesmos e para os outros, todas as graças
Úteis para chegar à vida eterna, como também os bens temporais
necessários.
- "O apelo à plenitude
da vida cristã e à perfeição da caridade. Se dirige a todos os fiéis
cristãos. " "A perfeição cristã só tem um limite: ser
ilimitada."
- "Se alguém quer vir
após mim, negue-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-me" (Mt 16,24).
ARTIGO 3
A IGREJA, MÃE E
EDUCADORA
- É em Igreja, em comunhão
com todos os batizados, que o cristão realiza sua vocação. Da Igreja
recebe a palavra de Deus, que contém os ensinamentos da "lei de
Cristo". Da Igreja recebe a graça dos sacramentos, que o sustenta
"no caminho". Da Igreja aprende o exemplo da santidade;
reconhece a figura e a fonte (da Igreja) em Maria, a Virgem Santíssima;
discerne-a no testemunho autêntico daqueles que a vivem, descobre-a na
tradição espiritual e na longa história dos santos que o precederam que a
Liturgia celebra no ritmo do Santoral.
- A vida moral é um culto
espiritual. "Oferecemos nossos corpos como hóstia viva, santa e
agradável a Deus", no seio do corpo de Cristo que formamos, e em
comunhão com a oferta de sua Eucaristia. Na Liturgia e na celebração dos
sacramentos, oração e doutrina se conjugam com a graça de Cristo, para
iluminar e alimentar o agir cristão. Como o conjunto da vida cristã, da
mesma forma a vida moral encontra sua fonte e seu ponto culminante no
sacrifício eucarístico.
I. Vida moral e magistério da Igreja
- A Igreja, "coluna e
sustentáculo da verdade" 1 Tm 3,15) "recebeu dos Apóstolos o
solene mandamento de Cristo de pregar a verdade da salvação".
"Compete à Igreja anunciar sempre e por toda parte os princípios
morais, mesmo referentes à ordem social, e pronunciar-se a respeito de
qualquer questão humana, enquanto o exigirem os direitos fundamentais da
pessoa ou a salvação das almas."
- O magistério dos pastores
da Igreja em matéria moral se exerce ordinariamente na catequese e na
pregação, com o auxílio das obras dos teólogos e dos autores espirituais.
Assim se foi transmitindo, de geração em geração, sob a égide e a
vigilância dos pastores, o "depósito" da moral cristã, composto
de um conjunto característico de regras, mandamentos e virtudes que
procedem da fé em Cristo e são vivificados pela caridade. Esta catequese
tem tradicionalmente tomado por base, ao lado do "Credo" e do
"Pai-nosso", o Decálogo, que enuncia os princípios da vida
moral, válidos para todos os homens.
- O romano pontífice e os
Bispos "são os doutores autênticos dotados da autoridade de Cristo,
que pregam ao povo a eles confiado a fé que deve ser crida e
praticada". O magistério ordinário e universal do Papa e dos Bispos
em comunhão com ele ensina aos fiéis a verdade em que se deve crer; a
caridade que se deve praticar, a felicidade que se deve esperar.
- O grau supremo da
participação na autoridade de Cristo é assegurado pelo carisma da infalibilidade.
Esta tem a mesma extensão que o depósito da revelação divina; estende-se
ainda a todos os elementos de doutrina, incluindo a moral, sem os quais as
verdades salutares da fé não podem ser preservadas, expostas ou
observadas.
- A autoridade do magistério
se estende também aos preceitos específicos da lei natural, porque sua
observância, exigida pelo Criador, é necessária para a salvação.
Recordando as prescrições da lei natural, o magistério da Igreja exerce
parte essencial de sua função profética de anunciar aos homens o que (os
homens) são de verdade e recordar-lhes o que devem ser diante de Deus.
- A lei de Deus confiada à
Igreja é ensinada aos fiéis como caminho de vida e verdade. Os fiéis têm,
portanto, o direito de ser instruídos nos preceitos divinos salvíficos que
purificam o juízo e, com a graça, curam a razão humana ferida. Têm o dever
de observar as constituições e os decretos promulgados pela legitima
autoridade da Igreja. Mesmo que sejam disciplinares, tais determinações
exigem a docilidade na caridade.
- Na obra de ensinar e
aplicar a moral cristã, a Igreja necessita do devotamento dos pastores, da
ciência dos teólogos, da contribuição de todos os cristãos e dos homens de
boa vontade. A fé e a prática do Evangelho proporcionam a cada fiel uma
experiência da vida "em Cristo" que o ilumina e o torna capaz de
apreciar as realidades divinas e humanas segundo o Espírito de Deus. Assim
é que o Espírito Santo pode servir-se dos mais humildes para iluminar os
sábios e os constituídos na dignidade mais alta.
- Os ministérios devem ser
exercidos em um espírito de serviço fraterno e dedicação à Igreja, em nome
do Senhor. Ao mesmo tempo, a consciência de cada fiel, em seu julgamento
moral sobre seus atos pessoais, deve evitar encerrar-se em uma consideração
individual. Do melhor modo possível ela deve abrir-se à consideração do
bem de todos, tal como se exprime na lei moral, natural e revelada, e por
conseguinte na lei da Igreja e no ensino autorizado do magistério sobre
questões morais. Não convém opor a consciência pessoal e a razão à lei
moral ou ao magistério da Igreja.
- Assim se pode desenvolver
entre os fiéis cristãos um verdadeiro espírito filial para com a Igreja.
Ele é o resultado normal do crescimento da graça batismal, que nos gerou
no seio Igreja e nos fez membros do Corpo de Cristo. Em sua solicitude
materna, a Igreja nos concede a misericórdia de Deus, que triunfa sobre
todos os nossos pecados e age de modo especial no sacramento da
Reconciliação. Como mãe solícita, ela nos prodigaliza também em sua
Liturgia, dia após dia, o alimento da Palavra e da Eucaristia do Senhor.
II. Os mandamentos da Igreja
- Os mandamentos da Igreja
situam-se nesta linha de uma vida moral ligada à vida litúrgica e que dela
se alimenta. O caráter obrigatória dessas leis positivas promulgadas pelas
autoridades pastorais tem como fim garantir aos fiéis o mínimo
indispensável no espírito de oração e no esforço moral, no crescimento do
amor de Deus e do próximo.
- O primeiro mandamento da
Igreja ("Participar da missa inteira nos domingos e outras festas de
guarda e abster-se de ocupações de trabalho") ordena aos fiéis que
santifiquem o dia em que se comemora a ressurreição do Senhor e as festas
litúrgicas em honra dos mistérios do Senhor, da santíssima Virgem Maria e
dos santos, em primeiro lugar participando da celebração eucarística, em
que se reúne a comunidade cristã, e se abstendo de trabalhos e negócios
que possam impedir tal santificação desses dias.
O segundo mandamento ("Confessar-se ao menos
uma vez por ano") assegura a preparação para a Eucaristia pela recepção do
sacramento da Reconciliação, que continua a obra de conversão e perdão do
Batismo.
O terceiro mandamento ("Receber o sacramento
da Eucaristia ao menos pela Páscoa da ressurreição") garante um mínimo na
recepção do Corpo e do Sangue do Senhor em ligação com as festas pascais,
origem e centro da Liturgia Cristã.
- O quarto mandamento
("Jejuar e abster-se de carne, conforme manda a Santa Mãe
Igreja") determina os tempos de ascese e penitência que nos preparam
para as festas litúrgicas; contribuem para nos fazer adquirir o domínio
sobre nossos instintos e a liberdade de coração.
O quinto mandamento ("Ajudar a Igreja em
suas necessidades") recorda aos fiéis que devem ir ao encontro das
necessidades materiais da Igreja, cada um conforme as próprias possibilidades.
III. Vida moral e testemunho missionário
- A fidelidade dos batizados
é condição primordial para o anúncio do Evangelho e para a missão da
Igreja no mundo. Para manifestar diante dos homens sua força de verdade e
de irradiação, a mensagem da salvação deve ser autenticada pelo testemunho
de vida dos cristãos: "O próprio testemunho da vida cristã e as boas
obras feitas em espírito sobrenatural possuem a força de atrair os homens
para a fé e para Deus.
- Por serem os membros do
Corpo cuja Cabeça é Cristo os cristãos contribuem, pela constância de suas
convicção de seus costumes, para a edificação da Igreja. A Igreja aumenta,
cresce e se desenvolve pela santidade de seus fiéis até que
"alcancemos todos nós (...) o estado de homem perfeito, a medida da
estatura da plenitude de Cristo" (Ef 4,13).
- Por sua vida segundo
Cristo, os cristãos apressam a vinda do Reino de Deus, do "Reino da
justiça, da verdade e da paz". Nem por isso se descuidam de suas
obrigações terrestres; fiéis a seu Senhor e Mestre, eles as cumprem com
dão, paciência e amor.
RESUMINDO
- A vida moral é um culto
espiritual. O agir cristão se nutre da Liturgia e da celebração dos
sacramentos.
- Os mandamentos da Igreja
se referem à vida moral e cristã unida à Liturgia, e dela se alimentam.
- O Magistério dos
pastores da Igreja em matéria moral se exerce ordinariamente na catequese
e na pregação, tendo como base o Decálogo, que enuncia os princípios da
vida válidos para todos os homens.
- O romano pontífice e os
bispos, como doutores autênticos, pregam ao povo de Deus a fé que deve ser
crida e praticada nos costumes. Cabe-lhes igualmente pronunciar-se sobre
as questões morais que caem dentro do âmbito da lei natural e da razão.
- A infalibilidade do
magistério dos pastores se estende a todos os elementos de doutrina,
incluindo a moral. Sem esses elementos, as verdades salutares da fé não
podem ser guardadas, expostas ou observadas.
OS DEZ
MANDAMENTOS
Êxodo 20,2-17
|
Deuteronômio 5,6-21
|
Fórmula catequética
|
Eu sou o Senhor, teu Deus, que te fez sair da terra do Egito, da casa
da servidão.
|
Eu sou o Senhor, teu Deus, aquele que te fez
sair da terra do Egito, da casa da
servidão.
|
|
Não terás outros deuses diante de mim.
|
Não terás outros deuses além de mim...
|
Amar a Deus sobre todas as coisas.
|
Não farás para ti imagem esculpida de nada que se assemelhe ao que
existe lá em cima, nos céus, ou embaixo da terra, ou nas águas que estão
debaixo da terra.
|
|
|
Não te prostrarás diante esses deuses e não os servirás, porque eu, o
Senhor, teu Deus, sou um Deus ciumento, que puno a iniquidade dos pais nos
filhos, até a terceira e quarta geração dos que me odeiam, e faço
misericórdia até a milésima geração àqueles que me amam e guardam meus
mandamentos.
|
|
|
Não pronunciarás em vão o nome do Senhor, teu Deus, porque o Senhor não
deixará impune aquele que pronunciar em vão O seu nome.
|
Não pronunciarás em vão o nome do Senhor
teu Deus...
|
Não tomar seu Santo Nome em vão.
|
Lembra-te do dia do Sábado para santificá-lo.
|
Guardarás o dia de sábado para santificá-lo.
|
Guardar domingos e
festas de guarda
|
Trabalharás durante seis dias, e farás todas as tuas obras. O sétimo
dia, porém, é o sábado do Senhor, teu Deus. Não farás nenhum trabalho, nem
tu, nem teu filho, nem tua filha, nem teu escravo, nem tua escrava, nem teu
animal, nem o estrangeiro que está em tuas portas. Porque em seis dias o
Senhor fez o céu, a terra, o mar e tudo o que eles contêm, mas repousou no
sétimo dia; por isso o Senhor abençoou o dia do sábado e o santificou.
|
|
|
Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra
que o Senhor, teu Deus, te dá.
|
Honrar teu pai e tua mãe...
|
Honra pai e mãe.
|
Não matarás.
|
Não matarás.
|
Não matar.
|
Não cometerás adultério.
|
Não cometerás adultério.
|
Não pecar contra a castidade.
|
Não roubarás.
|
Não roubarás.
|
Não furtar.
|
Não apresentarás um falso testemunho contra o teu próximo.
|
Não apresentarás um falso testemunho contra o teu próximo.
|
Não levantar falso testemunho.
|
Não cobiçarás a casa de teu próximo, não desejarás sua mulher, nem seu
servo, nem sua serva, nem seu boi, nem seu jumento, nem coisa alguma que
pertença a teu próximo.
|
Não cobiçarás a mulher de teu próximo.
Não desejarás coisa alguma que pertença a
teu próximo.
|
Não desejar a mulher do próximo.
Não cobiçar as coisas alheias.
|
SEGUNDA SEÇÃO
OS DEZ
MANDAMENTOS
Mestre, que devo fazer...?"
- "Mestre, que devo
fazer de bom para ter a vida eterna?" Ao jovem que lhe faz esta
pergunta, Jesus responde primeiro invocando a necessidade de reconhecer a
Deus como "o único bom", com o bem por excelência e como a fonte
de todo bem. Depois, Jesus diz: "Se queres entrar para a Vida, guarda
os mandamentos". E cita ao seu interlocutor os preceitos que se
referem ao amor do próximo: "Não matarás, não adulterarás, não
roubarás, não levantarás falso testemunho, honra pai e mãe".
Finalmente, Jesus resume estes mandamentos de maneira positiva:
"Amarás o teu próximo como a ti mesmo" (Mt 19,16-19).
- A esta primeira resposta é
acrescentada uma segunda: "Se queres ser perfeito, vai, vende os teus
bens e dá aos pobres, e terás um tesouro nos céus. Depois, vem e
segue-me" (Mt 19,21). Esta não anula a primeira. O seguimento de
Jesus Cristo inclui o cumprimento dos mandamentos. A Lei não foi abolida,
mas o homem é convidado a reencontrá-la na pessoa de seu Mestre, que é o
cumprimento perfeito dela. Nos três Evangelhos sinópticos, o apelo de
Jesus dirigido ao jovem rico, de segui-lo na obediência do discípulo e na
observância dos preceitos, é relacionado com o convite à pobreza e à
castidade. Os conselhos evangélicos são indissociáveis dos mandamentos.
- Jesus, com efeito, retomou
os Dez Mandamentos, mas manifestou a força do Espírito em ação na letra
deles. Pregou a "justiça que supera a dos escribas e fariseus",
como também a dos pagãos. Desenvolveu todas as exigências dos mandamentos.
"Ouvistes que foi dito aos antigos: 'não matarás'... Eu, porém, vos
digo: todo aquele que se encolerizar contra seu irmão terá de responder no
tribunal" (Mt 5,21-22).
- Quando lhe é feita a pergunta:
"Qual é o maior mandamento da lei?" (Mt 22,36), Jesus responde:
"Amarás ao Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua
alma e de todo o teu entendimento. Este é o maior e o primeiro mandamento.
O segundo é semelhante a esse: amarás o teu próximo como a ti mesmo.
Desses dois mandamentos dependem toda a lei e os profetas" (Mt
22,37-40). O Decálogo deve ser interpretado à luz desse duplo e único
mandamento da caridade, plenitude da lei:
Os preceitos - não cometerás adultério, não
matarás, não furtarás, não cobiçarás e todos os outros - se resumem nesta
sentença: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. A caridade não pratica o mal
contra o próximo. Portanto, a caridade é a plenitude da lei (Rm 13,9-10).
O DECÁLOGO NA SAGRADA ESCRITURA
- A palavra "Decálogo"
significa literalmente "dez palavras (Ex 34,28; Dt 4,13; 10,4). Deus
revelou essas "dez palavras" a seu povo no monte sagrado. Ele as
escreveu "com seu dedo", à diferença de outros preceitos
escritos por Moisés. São palavras de Deus de modo eminente. Foram
transmitidas no livro do Êxodo e no do Deuteronômio. Desde o Antigo
Testamento, os livros sagrados se referem às "dez palavras". Mas
é em Jesus Crista na nova aliança, que será revelado seu sentido pleno.
- O Decálogo deve ser
entendido em primeiro lugar no contexto do êxodo, que é o grande
acontecimento libertador de Deus no centro da Antiga Aliança. Formulados
como mandamentos negativos (proibições), ou à maneira de mandamento
positivos (como: "Honra teu pai e tua mãe"), as "dez palavras
indicam as condições de uma vida liberta da escravidão do pecado. O
Decálogo é um caminho de vida:
Se amares teu Deus, se andares em seus caminhos,
se observares seus mandamentos, suas leis e suas normas, viverás e te
multiplicarás (Dt 30,16).
Esta força libertadora do Decálogo aparece, por
exemplo, no mandamento sobre o descanso do sábado, destinado igualmente aos
estrangeiros e aos escravos:
Lembrai-vos de que fostes escravos numa terra
estrangeira. O Senhor vosso Deus vos fez sair de lá com mão forte e braço estendido
(Dt 5,15).
- As "dez palavras"
resumem e proclamam a lei de Deus: "Tais foram as palavras que, em
alta voz, o Senhor dirigiu a toda a vossa assembléia no monte, do meio do
fogo, em meio a trevas, nuvens e escuridão. Sem nada acrescentar,
escreveu--as sobre duas tábuas de pedra e as entregou a mim" (Dt
5,22). Eis por que estas duas tábuas são chamadas "O Testemunho"
(Ex 25,16). Elas contém as cláusulas da aliança entre Deus e seu povo.
Essas "tábuas do Testemunho" (Ex 31,18; 32,15; 34,19) devem ser
colocadas "na arca" (Ex 25,16; 40,1-3).
- As "dez palavras"
são pronunciadas por Deus no contexto de uma teofania ("Sobre a
montanha, no meio do fogo, o Senhor vos falou face a face": Dt 5,4).
Pertencem à revelação que Deus faz de si mesmo e de sua glória. O dom dos
mandamentos é dom do próprio Deus e de sua santa vontade. Ao dar a
conhecer as suas vontades, Deus se revela a seu povo.
- O dom dos mandamentos e da
Lei faz parte da Aliança selada por Deus com os seus. Segundo o livro do
Êxodo, a revelação das "dez palavras" é dada entre a proposta da
Aliança e sua conclusão, depois que o povo se comprometeu a
"fazer" tudo o que o Senhor dissera e a "obedecer". O
Decálogo sempre é transmitido depois de se lembrar a Aliança ("O
Senhor nosso Deus concluiu conosco uma aliança no Horeb": Dt 5,2).
- Os mandamentos recebem seu
pleno significado no íntimo da Aliança. Segundo a Escritura, o agir moral
do homem adquire todo o seu sentido na Aliança e por ela. A primeira das
"dez palavras" lembra o amor primeiro de Deus por seu povo:
Tendo o homem, por castigo do pecado, decaído do
paraíso da liberdade para a escravidão deste mundo, as primeiras palavras do
Decálogo, voz primeira dos divinos mandamentos, aludem à liberdade: "Eu
sou o Senhor, teu Deus, que te fez sair da terra do Egito, da casa da
escravidão" (Ex 20,2; Dt 5,6).
- Os mandamentos propriamente
ditos vêm em segundo lugar; exprimem as implicações da pertença a Deus,
instituída pela Aliança. A existência moral é resposta à iniciativa
amorosa do Senhor. E reconhecimento, homenagem a Deus e culto de ação de
graças. É cooperação com o plano que Deus executa na história.
- A Aliança e o diálogo entre
Deus e o homem são ainda confirmados pelo fato de que todas as obrigações
são enuncia das na primeira pessoa ("Eu sou o Senhor...") e
dirigidas a um outro sujeito ("tu...") Em todos os mandamentos
de Deus, é um pronome pessoal singular que designa o destinatário. Deus dá
a conhecer sua vontade a cada um em particular, ao mesmo tempo que o faz
ao povo inteiro:
O Senhor prescreveu o amor para com Deus e
ensinou a justiça para com o próximo, a fim de que o homem não fosse nem
injusto nem indigno de Deus. Assim, pelo Decálogo, Deus preparou o homem para
se tornar seu amigo e ter um só coração com o próximo... Da mesma maneira, as
palavras do Decálogo continuam válidas entre nós [cristãos]. Longe de serem
abolidas elas cresceram e se desenvolveram pelo fato da vinda do Senhor na
carne
O Decálogo na Tradição da Igreja
- Fiel à Escritura e de
acordo com o exemplo de Jesus, a Tradição da Igreja reconheceu ao Decálogo
uma importância e um significado primordiais.
- Desde Sto. Agostinho, os
"dez mandamentos" têm um lugar preponderante na catequese dos
futuros batizados e dos fiéis. No século XV, adotou-se o costume de
exprimir os preceitos do Decálogo em fórmulas rimadas, fáceis de
memorizar, e positivas, que ainda estão em uso hoje. Os catecismos da
Igreja com freqüência têm exposto a moral cristã seguindo a ordem dos
"dez mandamentos".
- A divisão e a numeração dos
mandamentos têm variado no decorrer da história. O presente catecismo
segue a divisão dos mardamentos estabelecida por Sto. Agostinho e que se
tornou tradicional na Igreja católica. É também a das confissões
luteranas. Os padres gregos fizeram uma divisão um tanto diferente, que se
encontra nas Igrejas ortodoxas e nas comunidades reformadas.
- Os dez mandamentos enunciam
as exigências do amor de Deus e do próximo. Os três primeiros se referem
mais ao amor de Deus, e os outros sete ao amor do próximo.
Como a caridade abrange dois preceitos com os
quais o Senhor relaciona toda a Lei e os profetas (...) assim os próprios dez
preceitos estão divididos em duas tábuas. Três foram escritos numa tábua e sete
na outra.
- O Concílio de Trento ensina
que os dez mandamentos obrigam os cristãos e que o homem justificado ainda
está obrigado a observá-los. E o Concílio Vaticano II afirma a mesma
doutrina:
"Como sucessores dos Apóstolos, os Bispos
recebem do Senhor (...)a missão de ensinar a todos os povos e pregar o
Evangelho a toda criatura, a fim de que os homens todos, pela fé, pelo Batismo
e pela observância dos mandamentos, alcancem a salvação"
A unidade do Decálogo
- O Decálogo forma um todo
inseparável. Cada "palavra" remete a cada uma das outras e a
todas; elas se condicionam 2 reciprocamente. As duas tábuas se esclarecem
mutuamente, formam uma unidade orgânica. Transgredir um mandamento, é
infringir todos os outros. Não se pode honrar os outros sem bendizer a
Deus, seu criador. Não se pode adorar a Deus sem amar a todos os homens,
suas criaturas. O Decálogo unifica a vida teologal e a vida social do
homem.
O Decálogo e a lei natural
- Os dez mandamentos
pertencem à revelação de Deus. Ao mesmo tempo, ensinam-nos a verdadeira
humanidade do homem. Iluminam os deveres essenciais e, portanto,
indiretamente, os direitos humanos fundamentais, inerentes à natureza da
pessoa humana. O Decálogo contém uma expressão privilegiada da "lei
natural":
Desde o começo, Deus enraizara no coração dos
homens os preceitos da lei natural. Inicialmente Ele se contentou em lhos
recordar. Foi o Decálogo.
- Embora acessíveis à razão,
os preceitos do Decálogo foram revelados. Para chegar a um Conhecimento
completo certo das exigências da lei natural, a humanidade pecador tinha
necessidade desta revelação:
Uma explicação completa dos mandamentos do
Decálogos e tornou necessária no estado de pecado, por causa do obscureci mento
da luz da razão e do desvio da vontade
Conhecemos os mandamentos de Deus pela Revelação
divina que nos é proposta na Igreja e por meio da consciência moral.
A obrigatoriedade do Decálogo
- Visto que exprimem os
deveres fundamentais do homem para com Deus e para com o próximo, os dez
mandamento revelam, em seu conteúdo primordial, obrigações graves. São
essencialmente imutáveis, e sua obrigação vale sempre e em toda parte.
Ninguém pode dispensar-se deles. Os dez mandamentos estão gravados por
Deus no coração do ser humano.
- A obediência aos
mandamentos implica, ainda, obrigações cuja matéria é, em si mesma, leve.
Assim, a injúria por palavra está proibida pelo quinto mandamento, mas só
poderia ser falta grave em função das circunstancias ou da intenção
daquele que a profere.
"Sem mim, nada podeis fazer"
- Jesus diz: "Eu sou a
videira, e vós, os ramos. Aquele que permanece em mim e eu nele produz
muito fruto, porque, sem mim, nada podeis fazer" (Jo 15,5). O fruto
indicado nesta palavra é a santidade de uma vida fecundada pela união a
Cristo. Quando cremos em Jesus Cristo, comungamos de seus mistérios e
guardamos seus mandamentos, o Salvador mesmo vem amar em nós seu Pai e
seus irmãos, nosso Pai e nossos irmãos. Sua pessoa se toma, graças ao
Espírito, a regra viva e interior de nosso agir. "Este é o meu
mandamento: Amai-vos uns aos outros como eu vos amei" (Jo 15,12).
RESUMINDO
- "Que devo fazer de
bom para ter a vida eterna?" - "Se queres entrar para a vida,
guarda os mandamentos" (Mt 19,16-17).
- Por sua prática e por
sua pregação, Jesus atestou a perenidade do Decálogo.
- O dom do Decálogo é
concedido no contexto da Aliança celebrada por Deus com seu povo. Os
mandamentos de Deus recebem seu verdadeiro significado nessa Aliança e por
meio dela.
- Fiel à Escritura, e de
acordo com o exemplo de Jesus, a Tradição da Igreja reconheceu ao Decálogo
uma importáncia e um significado primordiais.
- O Decálogo forma uma
unidade orgânica, em que cada "palavra ou mandamento" remete a
todo o conjunto. Transgredir um mandamento é infringir toda a Lei.
- O Decálogo contém uma
expressão privilegiada da lei natural. Conhecemo-lo pela revelação divina
e pela razão humana.
- Os Dez Mandamentos enunciam,
em seu conteúdo fundamental, obrigações graves. Todavia, a obediência a
esses preceitos implica também obrigações cuja matéria é, em si mesma,
leve.
- O que Deus manda,
torna-o possível por sua graça.
CAPÍTULO I
"AMARÁS O
SENHOR, TEU DEUS, DE TODO O CORAÇÃO, DE TODA A ALMA E DE TODO O
ENTENDIMENTO"
- Jesus resumiu os deveres do
homem para com Deus com estas palavras: "Amarás o Senhor, teu Deus,
de todo o coração, de toda a alma e de todo o entendimento" (Mt
22,37); Estas palavras são um eco imediato do apelo solene: "Escuta;
Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único" (Dt 6,4-5).
Deus amou primeiro. O amor do Deus único é
lembrado na primeira das "dez palavras". Em seguida, os mandamento.
explicitam a resposta de amor que o homem é chamado a da a seu Deus.
ARTIGO 1
O PRIMEIRO
MANDAMENTO
Eu sou o Senhor, teu Deus, que te fez sair da
terra do Egito, da casa da escravidão. Não terás outros deuses diante de mim.
Não farás para ti imagem esculpida de nada que se assemelhe ao que existe lá em
cima, nos céus, ou embaixo, na terra, ou nas águas que estão debaixo da terra.
Não te prostrarás diante desses deuses, e não os servirás. (Ex 20,25).
Está escrito: "Ao Senhor, teu Deus, adorarás
e só a Ele prestarás culto" (Mt 4,10).
I. "Adorarás o Senhor, teu Deus, e o
servirás"
- Deus se faz conhecer
recordando sua ação todo-poderosa, benigna e libertadora na história
daquele a quem se dirige: "Eu te fiz sair da terra do Egito, da casa
da escravidão" (Dt 6,13-14). A primeira palavra contém o primeiro
mandamento da lei: "Adorarás o Senhor, teu Deus, e o servirás. (...)
Não seguireis outros deuses" (Dt 6,13-14). O primeiro apelo e a
exigência justa de Deus é que o homem o acolha e o adore.
- O Deus único e verdadeiro
revela sua glória primeiramente a Israel. A revelação da vocação e da
verdade do homem está ligada à revelação de Deus. O homem tem a vocação de
manifestar Deus agindo em conformidade com sua criação "à imagem e
semelhança de Deus" (Gn 1,26):
Jamais haverá outro Deus, Trifão, nem houve
outro, desde sempre (...) além daquele que fez e ordenou o universo. Nós não
pensamos que nosso Deus seja diferente do vosso. É Ele o mesmo que fez vossos
pais saírem do Egito "com sua mão poderosa e seu braço estendido".
Não pomos as nossas esperanças em algum outro pois outro não existe , mas no
mesmo que vós, o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó.
- "O primeiro preceito
abrange a fé, a esperança e a caridade. Com efeito, quando se fala de
Deus, fala-se de um ser constante, imutável, sempre o mesmo, fiel,
perfeitamente justo. Daí decorre que nós devemos necessariamente aceitar
suas palavras e ter nele uma fé e uma confiança plenas. Ele é
Todo-Poderoso, clemente, infinitamente inclinado a fazer o bem. Quem
poderia deixar de pôr nele todas as suas esperanças? E quem poderia deixar
de amá-lo, contemplando os tesouros de bondade e de ternura que Ele
derramou sobre nós? Daí esta fórmula que Deus emprega na Sagrada
Escritura, quer no começo, quer no fim de seus preceitos: 'Eu sou o
Senhor'."
A FÉ
- Nossa vida moral encontra
sua fonte na fé em Deus, que nos revela seu amor. S. Paulo fala da
"obediência da fé" como da primeira obrigação. Ele vê no
"desconhecimento de Deus" o princípio e a explicação de todos os
desvios morais. Nosso dever em relação a Deus consiste em crer nele e em
dar testemunho dele.
- O primeiro mandamento
manda-nos alimentar e guardar com prudência e vigilância nossa fé e
rejeitar tudo o que se lhe opõe. Há diversas maneiras de pecar contra a
fé.
A dúvida voluntária sobre a fé negligencia ou
recusa ter como verdadeiro o que Deus revelou e que a Igreja propõe para crer.
A dúvida involuntária designa a hesitação em crer, a dificuldade de superar as
objeções ligadas à fé ou, ainda, a ansiedade suscitada pela obscuridade da fé.
Se for deliberadamente cultivada, a dúvida pode levar à cegueira do espírito.
- A incredulidade é a
negligência da verdade revelada ou a recusa voluntária de lhe dar o
próprio assentimento. "Chama-se heresia a negação pertinaz, após a
recepção do Batismo, de qualquer verdade que se deve crer com fé divina e
católica, ou a dúvida pertinaz a respeito dessa verdade; apostasia, o
repúdio total da fé cristã; cisma, a recusa de sujeição ao Sumo Pontífice
ou da comunhão com os membros da Igreja a ele sujeitos."
A ESPERANÇA
- Quando Deus se revela e
chama o homem, este não pode responder plenamente ao amor divino por suas
próprias forças. Deve esperar que Deus lhe dê a capacidade de corresponder
a este amor e de agir de acordo com os mandamentos da caridade. A
esperança é o aguardar confiante da bênção divina e da visão beatifica de
Deus; é também o temor de ofender c amor de Deus e de provocar o castigo.
- O primeiro mandamento visa
também aos pecados contra a esperança, que são o desespero e a presunção.
Pelo desespero, o homem deixa de esperar de Deus
sua salvação pessoal, os auxílios para alcançá-la ou o perdão de seus pecados.
O desespero opõe-se à bondade de Deus, à sua justiça porque o Senhor é fiel a
suas promessas e à sua misericórdia.
- Há duas espécies de
presunção. Ou o homem presume de suas capacidades (esperando poder
salvar-se sem a ajuda do alto), ou então presume da onipotência ou da
misericórdia de Deus (esperando obter seu perdão sem conversão e a glória
sem mérito).
A CARIDADE
- A fé no amor de Deus
envolve o apelo e a obrigação de responder à caridade divina por um amor
sincero. O primeiro mandamento nos ordena que amemos a Deus acima de tudo
e' acima de todas as criaturas, por Ele mesmo e por causa dele.
- Pode-se pecar de diversas
maneiras contra o amor de Deus: a indiferença negligencia ou recusa a
consideração da caridade divina, menospreza a iniciativa (de Deus em nos
amar) e nega sua força. A ingratidão omite ou se recusa a reconhecer a
caridade divina e a pagar amor com amor. A tibieza é uma hesitação ou uma
negligência em responder ao amor divino, podendo implicar a recusa de se
entregar ao dinamismo da caridade. A acídia ou preguiça espiritual chega a
recusar até a alegria que vem de Deus e a ter horror ao bem divino. O ódio
a Deus vem do orgulho. Opõe-se ao amor de Deus, cuja bondade nega, e
atreve-se a maldizê-lo como aquele que proíbe os pecados e inflige as
penas.
II. "Só a Ele prestarás culto"
- As virtudes teologais da
fé, esperança e caridade dão forma às virtudes morais e as vivificam.
Assim, a caridade nos leva a dar a Deus aquilo que em toda justiça lhe
devemos enquanto criaturas. A virtude da religião nos dispõe a esta
atitude.
A ADORAÇÃO
- A adoração é o primeiro ato
da virtude da religião. Adorar a Deus é reconhecê-lo como Deus, como o
Criador e o Salvador, o Senhor e o Dono de tudo o que existe, o Amor
infinito e misericordioso. "Adorarás o Senhor, teu Deus, e só a Ele
prestarás culto" (Lc 4,8), diz Jesus, citando o Deuteronômio (6,13).
- Adorar a Deus é, no
respeito e na submissão absoluta, reconhecer "o nada da
criatura", que não existe a não ser por Deus. Adorar a Deus é, como
Maria no Magnificat, louvá-lo, exaltá-lo e humilhar-se a si mesmo,
confessando com gratidão que Ele fez grandes coisas e que seu nome é
santo. A adoração do Deus único liberta o homem de se fechar em si mesmo,
da escravidão do pecado e da idolatria do mundo.
A ORAÇÃO
- Os atos de fé, de esperança
e de caridade ordenados pelo primeiro mandamento cumprem-se na oração. A
elevação do espírito para Deus é expressão da adoração que lhe rendemos:
prece de louvor e de ação de graças, de intercessão e de súplica. A oração
é uma condição indispensável para poder obedecer aos mandamentos de Deus.
"É preciso orar sempre. sem jamais esmorecer" (Lc 18,1).
O SACRIFÍCIO
- É justo oferecer a Deus
sacrifícios em sinal de adoração e de reconhecimento, de súplica e de
comunhão: "E verdadeiro sacrifício toda ação feita para se unir a
Deus em santa comunhão e poder ser feliz"
- Para ser verídico, o
sacrifício exterior deve ser a expressão do sacrifício espiritual:
"Meu sacrifício é um espírito compungido..." (Sl 51,19). Os
profetas da Antiga Aliança denunciaram com freqüência os sacrifícios
feitos sem participação interior ou sem ligação com o amor do próximo.
Jesus recorda a palavra do profeta Oséias: "E misericórdia que eu
quero, e não sacrifício" (Mt 9,13; 12,7). O único sacrifício perfeito
é o que Cristo ofereceu na cruz, em total oblação ao amor do Pai e para
nossa salvação. Unindo-nos a seu sacrifício, podemos fazer de nossa vida
um sacrifício a Deus.
PROMESSAS E VOTOS
- Em várias circunstâncias, o
cristão é convidado a fazer promessas a Deus. O Batismo e a Confirmação, o
Matrimônio e a Ordenação sempre as contêm. Por devoção pessoal, o cristão
pode também prometer a Deus este ou aquele ato, oração, esmola,
peregrinação etc. A fidelidade às promessas feitas a Deus é uma
manifestação do respeito devido à majestade divina e do amor para com o
Deus fiel.
- "O voto, isto é, a
promessa deliberada e livre de um bem possível e melhor feita a Deus, deve
ser cumprido a título da virtude de religião." O voto é um ato de
devoção no qual o cristão se consagra a Deus ou lhe promete uma obra boa.
Pelo cumprimento de seus votos, o homem dá a Deus o que lhe prometeu e
consagrou. Os Atos dos Apóstolos nos mostram S. Paulo preocupado em
cumprir os votos que fizera.
- A Igreja atribui um valor
exemplar aos votos de praticar os conselhos evangélicos:
A Mãe Igreja alegra-se ao encontrar em seu seio
muitos homens e mulheres que seguem mais estreitamente a exinanição do Salvador
e mais claramente a demonstram, aceitando a pobreza na liberdade dos filhos de
Deus e renunciando às próprias vontades; submetem-se eles aos homens por causa
de Deus, em matéria de perfeição, além da medida do preceito, para que mais
plenamente se conformem a Cristo obediente.
Em certos casos a Igreja pode, por motivos
adequados, dispensar dos votos e das promessas.
O DEVER SOCIAL DE RELIGIÃO E O DIREITO À
LIBERDADE RELIGIOSA
- "Todos os homens estão
obrigados a procurar a verdade, sobretudo naquilo que diz respeito a Deus
e à sua Igreja e, depois de conhecê-la, a abraçá-la e praticá-la."
Este dever decorre da "própria natureza dos homens" e não
contraria um "respeito sincero" para com as diversas religiões
que "refletem lampejos daquela verdade que ilumina a todos os homens",
nem a exigência da caridade que insta os cristãos a "tratar com amor,
prudência e paciência os homens que vivem no erro ou na ignorância acerca
da fé".
- O dever de prestar a Deus
um culto autêntico diz respeito ao homem individual e socialmente. Esta é
"a doutrina católica tradicional sobre o dever moral dos homens e das
sociedades em relação à verdadeira religião e à única Igreja de
Cristo". Evangelizando sem cessar os homens, a Igreja trabalha para
que estes possam "penetrar de espírito cristão as mentalidades e os
costumes, as leis e as estruturas da comunidade em que vivem". O
dever social dos cristãos é respeitar e despertar em cada homem o amor da
verdade e do bem. Exige que levem a conhecer o culto da única religião
verdadeira, que subsiste na Igreja católica e apostólica. Os cristãos são
chamados a ser a luz do mundo. Assim, a Igreja manifesta a realeza de
Cristo sobre toda a criação e particularmente sobre as sociedades humanas.
- "Em matéria religiosa,
ninguém seja obrigado a agir contra a própria consciência, nem impedido de
agir, dentro dos justos limites, de acordo com ela, em particular ou em
público, só ou associado a outrem." Este direito funda-se na própria
natureza da pessoa humana, cuja dignidade a faz aderir livremente à
verdade divina que transcende a ordem temporal. Por isso, este direito
"continua a existir ainda para aqueles que não satisfazem à obrigação
de procurar a verdade e de aderir a ela"
- "Se, em razão de
circunstâncias particulares dos povos, for conferida a uma única
comunidade religiosa o especial reconhecimento civil na organização
jurídica da sociedade, será necessário que ao mesmo tempo se reconheça e
se observe em favor de todos os cidadãos e das comunidades religiosas o
direito à liberdade em matéria religiosa."
- O direito à liberdade
religiosa não significa nem a permissão moral de aderir ao erro nem um
suposto direito ao erro, mas um direito natural da pessoa humana à
liberdade civil, quer dizer, à imunidade de coação externa nos justos
limites, em matéria religiosa, da parte do poder político. Este direito
natural deve ser reconhecido no ordenamento jurídico da sociedade, de tal
maneira que constitua um direito civil.
- O direito à liberdade
religiosa não pode ser em si ilimitado, nem limitado apenas por uma
"ordem pública" entendida de maneira positivista ou naturalista.
Os "justos limites" que lhe são inerentes devem ser determinados
para cada situação social pela prudência política, segundo as exigências
do bem comum, e ratificados pela autoridade civil segundo "normas
jurídicas, de acordo com a ordem moral objetiva".
III. "Não terás outros deuses diante
de mim"
- O primeiro mandamento
proíbe prestar honra a outros afora o único Senhor que se revelou a seu
povo. Proscreve a superstição e a irreligião. A superstição representa de
certo modo um excesso perverso de religião; a irreligião é um vício oposto
por deficiência à virtude da religião.
A SUPERSTIÇÃO
- A superstição é o desvio do
sentimento religioso e das práticas que ele impõe. Pode afetar também o
culto que prestamos ao verdadeiro Deus, por exemplo, quando atribuímos uma
importância de alguma maneira mágica a certas práticas, em si mesmas
legítimas ou necessárias. Atribuir eficácia exclusivamente à materialidade
das orações ou dos sinais sacramentais, sem levar em conta as disposições
interiores que elas exigem, é cair na superstição.
A IDOLATRIA
- O primeiro mandamento
condena o politeísmo. Exige que o homem não acredite em outros deuses
afora Deus, que não venere outras divindades afora a única. A escritura
lembra constantemente esta rejeição de "ídolos, ouro e prata, obras
das mãos dos homens", os quais "têm boca e não falam, têm olhos
e não vêem..." Esses ídolos vãos tornam as pessoas vãs:
"Como eles serão os que o fabricaram e quem
quer que ponha neles a sua fé" (Sl 115,4-5.8). Deus, pelo contrário, é o
"Deus vivo" (Jo 3,10) que faz viver e intervém na história.
- A idolatria não diz
respeito somente aos falsos cultos do paganismo. Ela é uma tentação
constante da fé. Consiste em divinizar o que não é Deus. Existe idolatria
quando o homem presta honra e veneração a uma criatura em lugar de Deus,
quer se trate de deuses ou de demônios (por exemplo, o satanismo), do
poder, do prazer, da raça, dos antepassados, do Estado, do dinheiro etc.
"Não podeis servir a Deus e ao dinheiro", diz Jesus (Mt 6,24).
Numerosos mártires morreram por não adorar "a Besta",
recusando-se até a simular seu culto. A idolatria nega o senhorio
exclusivo de Deus; é, portanto, incompatível com a comunhão divina.
- A vida humana unifica-se na
adoração do Único. O mandamento de adorar o único Senhor simplifica o
homem e o livra de uma dispersão infinita. A idolatria é uma perversão do
sentimento religioso inato do homem. O idólatra é aquele que "refere
a qualquer coisa que não seja Deus a sua indestrutível noção de
Deus".
ADIVINHAÇÃO E MAGIA
- Deus pode revelar o futuro
a seus profetas ou a outros santos. Todavia, a atitude cristã correta
consiste em entregar-se com confiança nas mãos da providência no que tange
ao futuro, e em abandonar toda curiosidade doentia a este respeito. A
imprevidência pode ser uma falta de responsabilidade.
- Todas as formas de
adivinhação hão de ser rejeitadas: recurso a Satanás ou aos demônios,
evocação dos mortos ou outras práticas que erroneamente se supõe
"descobrir" o futuro. A consulta aos horóscopos, a astrologia, a
quiromancia, a interpretação de presságios e da sorte, os fenômenos de
visão, o recurso a médiuns escondem uma vontade de poder sobre o tempo,
sobre a história e, finalmente, sobre os homens, ao mesmo tempo que um
desejo de ganhar para si os poderes ocultos. Essas práticas contradizem a
honra e o respeito que, unidos ao amoroso temor, devemos exclusivamente a
Deus.
- Todas as práticas de magia
ou de feitiçaria com as quais a pessoa pretende domesticar os poderes
ocultos, para colocá-los a seu serviço e obter um poder sobrenatural sobre
o próximo - mesmo que seja para proporcionar a este a saúde - são
gravemente contrárias à virtude da religião. Essas práticas são ainda mais
condenáveis quando acompanhadas de uma intenção de prejudicar a outrem, ou
quando recorrem ou não à intervenção dos demônios. O uso de amuletos
também é repreensível. O espiritismo implica freqüentemente práticas de
adivinhação ou de magia. Por isso a Igreja adverte os fiéis a evitá-lo. O
recurso aos assim chamados remédios tradicionais não legitima nem a
invocação dos poderes maléficos nem a exploração da credulidade alheia.
A IRRELIGIÃO
- O primeiro mandamento de
Deus reprova os principais pecados de irreligião: a ação de tentar a Deus
em palavras ou em atos, o sacrilégio e a simonia.
- A ação de tentar a Deus
consiste em pôr â prova, em palavras ou em atos, sua bondade e sua
onipotência. Foi assim que Satanás quis conseguir que Jesus se atirasse do
alto do templo e obrigasse Deus, desse modo, a agir. Jesus opõe-lhe a
Palavra de Deus: "Não tentarás o Senhor teu Deus" (Dt 6,16). O
desafio contido em tal "tentação de Deus" falta com o respeito e
a confiança que devemos a nosso Criador e Senhor. Inclui sempre uma dúvida
a respeito de seu amor, sua providência e seu poder.
- O sacrilégio consiste em
profanar ou tratar indignamente os sacramentos e as outras ações
litúrgicas, bem como as pessoas, as coisas e os lugares consagrados a
Deus. O sacrilégio é um pecado grave, sobretudo quando cometido contra a
Eucaristia, pois neste sacramento o próprio Corpo de Cristo se nos torna
substancialmente presente.
- A simonia é definida como a
compra ou a venda de realidades espirituais. A Simão, o mago, que queria
comprar o poder espiritual que via em ação nos Apóstolos, Pedro responde:
"Pereça o teu dinheiro, e tu com ele, porque julgaste poder comprar
com dinheiro o dom de Deus" (At 8,20). Desta maneira, Pedro obedecia
à Palavra de Jesus: "De graça rece1 bestes, dai de graça" (Mt
10,8). É impossível apropriar-se dos bens espirituais e comportar-se em relação
a eles como um possuidor ou um dono, pois a fonte deles é Deus. Só se pode
recebê-los gratuitamente dele.
- "Além das ofertas
estabelecidas pela autoridade competente, o ministro nada peça pela
administração dos sacramentos, tomando cuidado sempre que os necessitados
não sejam privados da ajuda dos sacramentos por causa de sua
pobreza." A autoridade competente fixa estas "ofertas" em
virtude do princípio de que o povo cristão deve cuidar do sustento dos
ministros da Igreja. "O operário é digno de seu sustento" (Mt
10,10).
O ATEÍSMO
- "Muitos de nossos
contemporâneos não percebem de modo algum esta união intima e vital com
Deus, ou explicitamente a rejeitam, a ponto de o ateísmo figurar entre os
mais graves problemas de nosso tempo."
- O termo ateísmo abrange
fenômenos muito diversos. Uma forma freqüente é o materialismo prático, de
quem limita suas necessidades e suas ambições ao espaço e ao tempo. O
humanismo ateu considera falsamente que o homem é "seu próprio fim e
o único artífice e demiurgo de sua própria história". Outra forma de
ateísmo contemporâneo espera a libertação do homem pela via econômica e
social, sendo que "a religião, por sua própria natureza, impediria
esta libertação, na medida em que, ao estimular a esperança do homem numa
quimérica vida futura, o desviaria da construção da cidade
terrestre".
- Na medida em que rejeita ou
recusa a existência de Deus, o ateísmo é um pecado contra a virtude da
religião. A imputabilidade desta falta pode ser seriamente diminuída em
virtude das intenções e das circunstâncias. Na gênese e difusão do
ateísmo, "grande parcela de responsabilidade pode caber aos crentes,
na medida em que, negligenciando a educação da fé, ou por uma exposição
enganosa da doutrina, ou por deficiência em sua vida religiosa, moral e
social, se poderia dizer deles que mais escondem do que manifestam o rosto
autêntico de Deus e da religião"
- Muitas vezes o ateísmo se
funda em uma concepção falsa da autonomia humana, que chega a recusar toda
dependência em relação a Deus. Contudo, "o reconhecimento de Deus não
se opõe de modo algum à dignidade do homem, já que esta dignidade se
fundamenta e se aperfeiçoa no próprio Deus". "A Igreja sabe
perfeitamente que sua mensagem se coaduna com as aspirações mais intimas
do coração humano."
O AGNOSTICISMO
- O agnosticismo se reveste
de muitas formas. Em certos casos, o agnóstico se recusa a negar a Deus;
ao contrário, postula a existência de um ser transcendente, que não
poderia revelar-se e sobre o qual ninguém seria capaz de dizer nada! Em
outros casos, o agnóstico não se pronuncia sobre a existência de Deus,
declarando que é impossível prová-la e até afirmá-la ou negá-lo.
- O agnosticismo pode, às
vezes, conter certa busca de Deus, mas pode igualmente representar um
indiferentismo, uma fuga da pergunta última sobre a existência e uma
preguiça da consciência moral. Com muita freqüência o agnosticismo
eqüivale a um ateísmo prático.
IV. "Não farás para ti imagem
esculpida de nada..."
- O mandamento divino incluía
a proibição de toda representação de Deus por mão do homem. O Deuteronômio
explica: "Uma vez que nenhuma forma vistes no dia em que Senhor vos
falou no Horeb, do meio do fogo, não vos pervertais, fazendo para vós uma
imagem esculpida em forma d ídolo..." (Dt 4,15-16). Eis aí o Deus absolutamente
transcendente que se revelou a Israel. "Ele é tudo", mas, ao
mesmo tempo, ele está "acima de todas as suas obras" (Eclo
43,27-28). Ele é "a própria fonte de toda beleza criada" (Sb 1
3,3).
- No entanto, desde o Antigo
Testamento, Deus ordenou ou permitiu a instituição de imagens que
conduziriam simbólica mente à salvação por meio do Verbo encarnado, como
são serpente de bronze, a Arca da Aliança e os querubins.
- Foi fundamentando-se no
mistério do Verbo encarnado que (sétimo Concílio ecumênico, em Nicéia (em 787),
justificou, contra os iconoclastas, o culto dos ícones: os de Cristo, mas
também os da Mãe de Deus, dos anjos e de todos os santos. Ao se encarnar,
o Filho de Deus inaugurou uma nova "economia" das imagens.
- O culto cristão das imagens
não é contrário ao primeiro mandamento, que proíbe os ídolos. De fato,
"a hora prestada a uma imagem se dirige ao modelo Original, e
"quem venera uma imagem venera a pessoa que nela está pintada. A
honra prestada às santas imagens é uma "veneração respeitosa", e
não uma adoração, que só compete a Deus:
Oculto da religião não se dirige às imagens em si
como realidades, mas as considera em seu aspecto próprio de imagens que nos
conduzem ao Deus encarnado. Ora, o movimento que se dirige à imagem enquanto
tal não termina nela, mas tende para a realidade da qual é imagem.
RESUMINDO
- "Amarás o Senhor,
teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas
forças" (Dt 6,5).
- O primeiro mandamento
convida o homem a crer em Deus, a esperar nele e a amá-lo acima de tudo.
- "Adorarás o Senhor
teu Deus" (Mt 4,]O). Adorar a Deus, orar a Ele, oferecer-lhe o culto
que lhe é devido, cumprir as promessas e os votos que foram fritos a Ele
são os atos da virtude de religião que nascem da obediência ao primeiro
mandamento.
- O dever de prestar um
culto autêntico a Deus incumbe ao homem, tanto individualmente como em
sociedade.
- O homem deve "poder
professar livremente a religião, tanto em particular como em público"
- A superstição é um
desvio do culto que rendemos ao verdadeiro Deus. Ela se mostra
particularmente na idolatria, assim como nas diferentes formas de
adivinhação e de magia.
- A ação de tentar a Deus,
em palavras ou em atos, o sacrilégio, a simonia são pecados de irreligião
proibidos pelo primeiro mandamento.
- Enquanto rejeita ou
recusa a existência de Deus, o ateísmo é um pecado contra o primeiro
mandamento.
- O culto às imagens
sagradas está fundamentado no mistério da encarnação do Verbo de Deus. Não
contraria o primeiro mandamento.
ARTIGO 2
O SEGUNDO
MANDAMENTO
Não pronunciarás o nome do Senhor, teu Deus, em
vão (Ex 20,7).
Foi dito aos antigos: "Não
perjurarás"... Eu, porém, vos digo não jureis em hipótese alguma (Mt
5,33-34).
I. O nome do Senhor é santo
- "Não pronunciarás o
nome do Senhor, teu Deus, em vão' (Ex 20,7). O segundo mandamento
pertence, como o primeiro ao âmbito da virtude da religião e regula mais
particularmente o uso que fazemos da palavra nas coisas santas.
- Entre todas as palavras da
revelação há uma, singular, que é a revelação do nome de Deus. Deus confia
seu nome àqueles que crêem nele; revela-se-lhes em seu mistério pessoal. O
dom do nome pertence à ordem da confiança e da intimidade. "O nome do
Senhor é santo." Eis por que o homem não pode abusar dele. Deve
guardá-lo na memória num silêncio de adoração amorosa. Não fará uso dele a
não ser para bendizê-lo, louvá-lo e glorificá-lo.
- A deferência para com o
nome de Deus exprime o respeito que é devido ao mistério do próprio Deus e
a toda a realidade sagrada que ele evoca. O sentido do sagrado faz parte
do âmbito da religião:
Os sentimentos de temor e do sagrado são ou não
sentimentos cristãos? Ninguém pode em sã razão duvidar disso. São sentimentos
que teríamos, em grau intenso, se tivéssemos a visão do Deus soberano. São
sentimentos que teríamos se nos apercebêssemos claramente de sua presença. Na
medida em que cremos que Ele está presente, devemos tê-los. Não tê-los é não
perceber, não crer que Ele está presente.
- O fiel deve testemunhar o
nome do Senhor, confessando sua fé sem ceder ao medo. O ato da pregação e
o ato da catequese devem estar penetrados de adoração e de respeito pelo
nome de Nosso Senhor, Jesus Cristo.
- O segundo mandamento proíbe
o abuso do nome de Deus, isto é, todo uso inconveniente do nome de Deus,
de Jesus Cristo, da Virgem Maria e de todos os santos.
- As promessas feitas a
outrem em nome de Deus empenham a honra, a fidelidade, a veracidade e a
autoridade divinas. Devem, pois, em justiça, ser respeitadas. Ser-lhes
infiel é abusar do nome de Deus e, de certo modo, fazer de Deus um mentiroso.
- A blasfêmia opõe-se
diretamente ao segundo mandamento. Ela consiste em proferir contra Deus
interior ou exteriormente - palavras de ódio, de ofensa, de desafio, em
falar mal de Deus, faltar-lhe deliberadamente com o respeito ao abusar do
nome de Deus. São Tiago reprova "os que blasfemam contra o nome
sublime (de Jesus) que foi invocado sobre eles" (Tg 2,7). A proibição
da blasfêmia se estende às palavras contra a Igreja de Cristo, os santos,
as coisas sagradas. É também blasfemo recorrer ao nome de Deus para
encobrir práticas criminosas, reduzir povos à servidão, torturar ou matar.
O abuso do nome de Deus para cometer um crime provoca a rejeição da
religião.
A blasfêmia é contrária ao respeito devido a Deus
e a seu santo nome. E em si um pecado grave.
- As pragas, que fazem
intervir o nome de Deus, sem intenção de blasfêmia, são uma falta de
respeito para com o Senhor.
O segundo mandamento proíbe também o uso mágico
do nome divino.
O nome de Deus é grande lá onde for pronunciado
com o respeito devido à sua grandeza e à sua majestade. O nome de Deus é santo
lá onde for proferido com veneração e com temor de ofendê-lo.
II. O nome do Senhor pronunciado em vão
- O segundo mandamento proíbe
o juramento falso. Fazer juramento ou jurar é invocar a Deus como
testemunha do que se afirma. E invocar a veracidade divina como garantia
de nossa própria veracidade. O juramento empenha o nome do Senhor. "E
ao Senhor teu Deus que temerás, a Ele servirás e pelo seu nome
jurarás" (Dt 6,13).
- Abster-se de jurar
falsamente é um dever para com Deus. Como Criador e Senhor, Deus é a regra
de toda verdade. A palavra humana está de acordo com Deus ou em oposição a
Ele, que é a própria verdade. Quando é verídico e legítimo, o juramento
põe à luz a relação da palavra humana com a verdade de Deus. O juramento
falso invoca Deus para ser testemunha de uma mentira.
- E perjuro aquele que, sob
juramento, faz uma promessa que não tem intenção de manter ou que, depois
de ter prometido algo sob juramento, não o cumpre. O perjúrio constitui
uma grave falta de respeito para com o Senhor de toda palavra.
Comprometer-se por juramento a praticar uma obra má contrário à santidade
do nome divino.
- Jesus expôs o segundo
mandamento no Sermão da Montanha: "Ouvistes o que foi dito aos
antigos: 'Não perjurarás, mas cumprirás os teus juramentos para com o
Senhor'. Eu, porém, vos digo: não jureis em hipótese nenhuma... Seja o
vosso 'sim', sim, e o vosso 'não', não. O que passa disso vem do
Maligno" (Mt 5,33~34.37). Jesus ensina que todo juramento implica uma
referência a Deus e que a presença de Deus e de sua verdade deve ser
honrada em toda palavra. A discrição em recorrer a Deus na linguagem
caminha de mãos dadas com a atenção respeitosa à sua presença,
testemunhada ou desprezada, em cada uma de nossas afirmações.
- Seguindo S. Paulo, a
Tradição da Igreja entendeu que as palavras de Jesus não se opõem ao
juramento quando é feito por uma causa grave e justa (por exemplo, perante
um tribunal). "O juramento, isto é, a invocação do nome de Deus com
testemunha da verdade, não se pode fazer, a não ser na verdade, no
discernimento e na justiça."
- A santidade do nome divino
exige que não se recorra a ele para coisas fúteis e não se preste
juramento em circunstâncias suscetíveis de interpretá-lo como uma
aprovação do poder que o exigisse injustamente. Quando o juramento é
exigido por autoridades civis ilegítimas, pode-se recusá-lo. Deve ser
recusado quando é pedido para fins contrários à dignidade das pessoas ou à
comunhão da Igreja.
III. O nome cristão
- O sacramento do Batismo é
conferido "em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo" (Mt
28,19). No Batismo, o nome do Senhor santifica o homem, e o cristão recebe
seu próprio nome na Igreja. Este pode ser o de um santo, isto é, de um
discípulo que viveu uma vida de fidelidade exemplar a seu Senhor. O
"nome de Batismo" pode também exprimir um mistério cristão ou
uma virtude cristã. "Cuidem os pais, os padrinhos e o pároco para que
não se imponham nomes alheios ao senso cristão."
- O cristão começa seu dia,
suas orações e suas ações com o sinal-da-cruz, "em nome do Pai, do
Filho e do Espírito Santo. Amém". O batizado dedica a jornada à
glória de Deus e invoca a graça do Salvador, que lhe possibilita agir no
Espírito como filho do Pai. O sinal-da-cruz nos fortifica nas tentações e
nas dificuldades.
- Deus chama a cada um por
seu nome. O nome de todo homem é sagrado. O nome é o ícone da pessoa.
Exige respeito, em sinal da dignidade de quem o leva.
- O nome recebido é um nome
eterno. No Reino, o caráter misterioso e único de cada pessoa marcada com
o nome de Deus resplandecerá em plena luz. "Ao vencedor... darei uma
pedrinha branca na qual está escrito um nome novo, que ninguém conhece,
exceto aquele que o recebe" (Ap 2,17). "Tive esta visão: eis que
o Cordeiro estava de pé sobre o Monte Sião com os cento e quarenta e
quatro mil que traziam escrito sobre a fronte o nome dele e o nome de seu
Pai" (Ap 14,1).
RESUMINDO
- "Senhor, nosso Deus,
quão poderoso é teu nome em toda terra" (Sl 8,11).
- O segundo mandamento
prescreve respeitar o nome do Senhor. O nome do Senhor é santo.
- O segundo mandamento proíbe
todo uso inconveniente do nome de Deus. A blasfêmia consiste em usar o
nome de Deus, de Jesus Cristo, da Virgem Maria e dos santos de maneira
injuriosa.
- O juramento falso invoca
Deus como testemunha de uma mentira. O perjúrio é uma falta grave contra o
Senhor, sempre fiel a suas promessas.
- "Não jurar nem pelo
Criador, nem pela criatura, se não for com verdade, necessidade e
reverência."
- No Batismo, o cristão
recebe seu nome na Igreja. Os pais, os padrinhos e o pároco cuidarão para
que lhe seja dado um nome cristão. O patrocínio de um santo oferece um
modelo de caridade e um intercessor seguro.
- O cristão começa suas
orações e suas ações pelo sinal-da-cruz, "em nome do Pai, do Filho e
do Espírito Santo. Amém"
- Deus chama cada um por seu
nome.
ARTIGO 3
O TERCEIRO
MANDAMENTO
Lembra-te do dia do sábado para santificá-lo.
Trabalharás durante seis dias e farás todas as tuas obras. O sétimo dia, porém,
é o sábado do Senhor, teu Deus. Não farás nenhum trabalho (Ex 20,8-l0). O
sábado foi feito para o homem, e não o homem para o sábado, de modo que o Filho
do Homem é senhor até do sábado (Mc 2,27-28).
I. O dia do sábado
- O terceiro mandamento do
Decálogo lembra a santidade do sábado: "O sétimo dia é sábado;
repouso absoluto em honra do Senhor" (Ex 31,15).
- A propósito dele, a
Escritura faz memória da criação: "Porque em seis dias o Senhor fez o
céu e a terra, o mar e tudo o que eles contêm, mas repousou no sétimo dia.
Por isso o Senhor abençoou o dia de sábado e o santificou" (Ex
20,11).
- No dia do Senhor, a
Escritura revela ainda um memorial da libertação de Israel da escravidão
do Egito: "Recorda que foste escravo na terra do Egito e que o
Senhor, teu Deus, te fez sair de lá com a mão forte e o braço estendido. E
por isso que o Senhor teu Deus te ordenou guardar o dia de sábado"
(Dt 5,15).
- Deus confiou o sábado a
Israel, para que ele pudesse guardá-lo em sinal da aliança inquebrantável.
O sábado é, para o Senhor, santamente reservado ao louvor de Deus, de sua
obra de criação e de suas ações salvíficas em favor de Israel.
- O agir de Deus é o modelo
do agir humano. Se Deus "retomou o fôlego" no sétimo dia (Ex
31,17), também o homem deve "folgar" e deixar que os outros,
sobretudo os pobres, "retomem fôlego". O sábado faz cessar os
trabalhos cotidianos e concede uma pausa. E um dia de protesto contra as
escravidões do trabalho e o culto do dinheiro
- O Evangelho relata
numerosos incidentes em que Jesus é acusado de violar a lei do sábado. Mas
Jesus nunca profana a santidade desse dia. Dá-nos com autoridade sua
autêntica interpretação: "O sábado foi feito para o homem e não o
homem para o sábado" (Mc 2,27). Movido por compaixão, Cristo se
permite, no "dia de sábado, fazer o bem de preferência ao mal, salvar
uma vida de preferência a matar. O sábado é o dia do Senhor das
misericórdias e da honra de Deus. "O Filho do Homem é senhor até do
sábado" (Mc 2,28).
II. O dia do Senhor
Este é o dia que o Senhor fez, exultemos e
alegremo-nos nele (Sl 117,24).
O DIA DA RESSURREIÇÃO: A NOVA CRIAÇÃO
- Jesus ressuscitou dentre os
mortos "no primeiro dia da semana" (Mc 16,2). Enquanto
"primeiro dia", o dia da Ressurreição de Cristo lembra a
primeira criação. Enquanto "oitavo dia", que segue ao sábado,
significa a nova criação inaugurada com a Ressurreição de Cristo. Para os
cristãos, ele se tomou o primeiro de todos os dias, a primeira de todas as
festas, o dia do Senhor ("Hé kyriaké hemera", "dies
dominica "), o "domingo":
Reunimo-nos todos no dia do sol, porque é o
primeiro dia (após sábado dos judeus, mas também o primeiro dia) em que Deus
extraindo a matéria das trevas, criou o mundo e, nesse mesmo dia Jesus Cristo,
nosso Salvador, ressuscitou dentre os mortos.
O DOMINGO - PLENITUDE DO SÁBADO
- O domingo se distingue
expressamente do sábado, ao qual sucede cronologicamente, a cada semana, e
cuja prescrição espiritual substitui, para os cristãos. Leva à plenitude,
na Páscoa de Cristo, a verdade espiritual do sábado judeu e anuncia o
repouso eterno do homem em Deus. Pois o culto da lei preparava o mistério
de Cristo e o que nele se praticava prefigurava, de alguma forma, algum
aspecto de Cristo:
Aqueles que viviam segundo a ordem antiga das
coisas voltaram-se para a nova esperança não mais observando o sábado, mas sim
o dia do Senhor, no qual a nossa vida é abençoada por Ele e por sua morte.
- A celebração do domingo
observa a prescrição moral naturalmente inscrita no coração do homem de
"prestar a Deus um culto exterior, visível, público e regular sob o
signo de seu beneficio universal para com os homens". O culto
dominical cumpre o preceito moral da Antiga Aliança, cujo ritmo e espírito
retoma ao celebrar cada semana o Criador e o Redentor de seu povo.
A EUCARISTIA DOMINICAL
- A celebração dominical do
Dia e da Eucaristia do Senhor está no coração da vida da Igreja. "O
domingo, dia em que por tradição apostólica se celebra o Mistério Pascal,
deve ser guardado em toda a Igreja como dia de festa de preceito por
excelência."
"Devem ser guardados igualmente o dia do
Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo, da Epifania, da Ascensão e do Santíssimo
Corpo e Sangue de Cristo, de Santa Maria, Mãe de Deus, de sua Imaculada
Conceição e Assunção, de São José, dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo e, por
fim, de Todos os Santos."
- Esta prática da assembléia
cristã data dos inícios da era apostólica. A Epístola aos Hebreus lembra:
"Não deixemos as nossas assembléias, como alguns costumam fazer.
Procuremos animar-nos sempre mais" (Hb 10,25).
A Tradição guarda a lembrança de uma exortação
sempre atual: "Vir cedo à Igreja, aproximar-se do Senhor e confessar seus
pecados, arrepender-se na oração...Participar da santa e divina liturgia
terminar a oração e não sair antes da despedida... Dissemos muitas vezes: este
dia vos é dado para a oração e o repouso. E o dia que o Senhor fez. Exultemos e
alegremo-nos nele"
- "Paróquia é uma
determinada comunidade de fiéis, constituída de maneira estável na Igreja
particular, e seu cuidado pastoral é confiado ao pároco, como a seu pastor
próprio, sob autoridade do bispo diocesano." E o lugar onde todos os
fiéis podem ser congregados pela celebração dominical da Eucaristia. A
paróquia inicia o povo cristão na expressão ordinária da vida litúrgica,
reúne-o nesta celebração, ensina a doutrina salvífica de Cristo, pratica a
caridade do Senhor nas obras boas e fraternas.
Não podes rezar em casa como na Igreja, onde se
encontra o povo reunido, onde o grito é lançado a Deus de um só coração. Há ali
algo mais, a união dos espíritos, a harmonia das almas o vínculo da caridade,
as orações dos presbíteros.
A OBRIGAÇÃO DO DOMINGO
- O mandamento da Igreja
determina e especifica a lei do Senhor: "Aos domingos e nos outros
dias de festa de preceito, os fiéis têm a obrigação de participar da
missa". "Satisfaz ao preceito de participar da missa quem
assiste à missa celebrada segundo o rito católico no próprio dia de festa
ou à tarde do dia anterior.
- A Eucaristia do domingo
fundamenta e sanciona toda a prática cristã. Por isso os fiéis são
obrigados a participar da Eucaristia nos dias de preceito, a não ser por
motivos muito sérios (por exemplo, uma doença, cuidado com bebês) ou se
forem dispensados pelo próprio pastor. Aqueles que deliberadamente faltam
a esta obrigação cometem pecado grave.
- A participação na
celebração comunitária da Eucaristia dominical é um testemunho de pertença
e de fidelidade a Cristo e à sua Igreja. Assim, os fiéis atestam sua
comunhão na fé e na caridade. Dão simultaneamente testemunho da santidade
de Deus e de sua esperança na salvação, reconfortando-se mutuamente sob a moção
do Espírito Santo.
- "Por falta de ministro
sagrado ou por outra causa grave, se a participação na celebração
eucarística se tornar impossível, recomenda-se vivamente que os fiéis
participem da liturgia da Palavra, se houver, na igreja paroquial ou em outro
lugar sagrado, celebrada segundo as prescrições do Bispo diocesano, ou
então se dediquem à oração durante um tempo conveniente, a sós ou em
família, ou em grupos de famílias, de acordo com a oportunidade."
DIA DE GRAÇA E DE INTERRUPÇÃO DO TRABALHO
- Como Deus "descansou
no sétimo dia, depois de toda a obra que fizera" (Gn 2,2), a vida
humana é ritmada pelo trabalho e pelo repouso. A instituição do dia do
Senhor contribui para que todos desfrutem do tempo de repouso e de lazer
suficiente que lhes permita cultivar sua vida familiar, cultural, social e
religiosa.
- Durante o domingo e os
outros dias de festa de preceito, os fiéis se absterão de se entregar aos
trabalhos ou atividades que impedem o culto devido a Deus, a alegria
própria ao dia do Senhor, a prática das obras de misericórdia e o descanso
conveniente do espírito e do corpo. As necessidades familiares ou uma
grande utilidade social são motivos legítimos para dispensa do preceito do
repouso dominical. Os fiéis cuidarão para que dispensas legítimas não
acabem introduzindo hábitos prejudiciais à religião, à vida familiar e à
saúde.
O amor da verdade busca o santo ócio, a
necessidade do amor acolhe o trabalho justo.
- Os cristãos que dispõem de
lazer devem lembrar-se de seus irmãos que têm as mesmas necessidades e os
mesmos direito mas não podem repousar por causa da pobreza e da miséria. O
domingo é tradicionalmente consagrado pela piedade cristã às boas obras e
aos humildes serviços de que carecem os doentes, os enfermos, os idosos.
Os cristãos santificarão ainda o domingo dispensando à sua família e aos
parentes o tempo e a atenção que dificilmente podem dispensar nos outros
dias da semana. O domingo é um tempo de reflexão, de silêncio, de cultura
e de meditação, que favorecem o crescimento da vida interior cristã.
- Santificar os domingos e
dias de festa exige um esforço o comum. Cada cristão deve evitar impor sem
necessidades a outrem o que o impediria de guardar o dia do Senhor. Quando
os costumes (esporte, restaurantes etc.) e as necessidades sociais
(serviços públicos etc.) exigem de alguns um trabalho dominical, cada um
assuma a responsabilidade de encontrar um tempo suficiente de lazer. Os
fiéis cuidarão, com temperança e caridade, de evitar os excessos e
violências causadas às vezes pelas diversões de massa. Apesar das
limitações econômicas, os poderes públicos cuidarão de assegurar aos
cidadãos um tempo destinado ao repouso e ao culto divino. Os patrões têm
uma obrigação análoga com respeito a seus empregados.
- Dentro do respeito à
liberdade religiosa e ao bem comum de todos, os cristãos precisam envidar
esforços no sentido de que os domingos e dias de festa da Igreja sejam
feriados legais. A todos têm de dar um exemplo público de oração, de
respeito e de alegria e defender suas tradições como uma contribuição
preciosa para a vida espiritual da sociedade humana. Se a legislação do
país ou outras razões obrigarem a trabalhar no domingo, que, apesar disso
este dia seja vivido como o dia de nossa libertação, que nos faz
participar desta "reunião de festa", desta "assembléia dos
primogênitos cujos nomes estão inscritos nos céus" (Hb 12,22-23).
RESUMINDO
- "Guardarás o dia de
sábado para santificá-lo" (Dt 5,12). "No sétimo dia se fará
repouso absoluto em honra do Senhor" (Ex 31,15).
- O sábado, que representava
o término da primeira criação, é substituído pelo domingo, que lembra a
criação nova, inaugurada com a Ressurreição de Cristo.
- A Igreja celebra o dia
da Ressurreição de Cristo no oitavo dia, que é corretamente chamado dia do
Senhor, ou domingo.
- "O domingo
(...)deve ser guardado em toda a Igreja como o dia de festa de preceito
por excelência." "No domingo e em outros dias de festa de
preceito, os fiéis têm a obrigação de participar da missa."
- "No domingo e nos
outros dias de festa de preceito, os fiéis se absterão das atividades e
negócios que impeçam o culto a ser prestado a Deus, a alegria própria do
dia do Senhor e o devido descanso da mente e do corpo."
- A instituição do domingo
contribui para que "todos tenham tempo de repouso e de lazer suficiente
para lhes permitir cultivar sua vida familiar, cultural, social e
religiosa.
- Todo cristão deve evitar
impor sem necessidade aos outros aquilo que os impediria de guardar o dia
do Senhor.
CAPÍTULO II
"AMARÁS O
PRÓXIMO COMO A TI MESMO"
Jesus disse a seus discípulos: "Amai-vos uns
aos outros como eu vos amei" (Jo 13,34).
- Em resposta à pergunta
feita acerca do primeiro dos mandamentos, Jesus diz: "O primeiro é:
'Ouve, ó Israel: o Senhor nosso Deus é o único Senhor, e amarás o Senhor,
teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, com todo o teu
espírito, e com toda a tua força'. O segundo é este: 'Amarás O teu próximo
como a ti mesmo'. Não existe outro mandamento maior do que estes" (Mc
12,29-31).
O apóstolo S. Paulo o recorda: "Quem ama o
outro cumpriu a lei. De fato, os preceitos 'não cometerás adultério, não
matarás, não furtarás, não cobiçarás' e todos os Outros se resumem nesta
sentença: amarás o teu próximo como a ti mesmo. A caridade não pratica o mal
contra o próximo. Portanto a caridade é a plenitude da lei" (Rm 13,8-10).
ARTIGO 4
O QUARTO
MANDAMENTO
Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem
os teus dias terra que o Senhor, teu Deus, te dá (Ex 20,12).
Era-lhes submisso (Lc 2,51).
O próprio Senhor Jesus recorda a força desse
"mandamento de Deus" O Apóstolo ensina: "Filhos, obedecei a
vossos pais no Senhor, pois isso é justo. 'Honra teu pai e tua mãe' é primeiro
mandamento com promessas: 'para seres feliz e teres uma longa vida sobre a
terra"' (Ef 6,1-3).
- O quarto mandamento
encabeça a segunda tábua. Indica ordem da caridade. Deus quis que, depois
dele mesmo, honrássemos nossos pais, a quem devemos a vida e que nos
transmitiram o conhecimento de Deus. Devemos honrar e respeitar todos
aqueles que Deus, para o nosso bem, revestiu de sua autoridade.
- Esse preceito está expresso
sob a forma positiva de deveres a cumprir. Anuncia os mandamentos que
seguem e que se referem a um respeito particular pela vida, pelo
casamento, pelos bens terrestres, pela palavra dada. Constitui um dos
fundamentos da doutrina social da Igreja.
- O quarto mandamento
dirige-se expressamente aos filhos em suas relações com seu pai e sua mãe,
porque esta relação é a mais universal. Diz respeito também as relações de
parentesco com Os membros do grupo familiar. Manda prestar honra, afeição
e reconhecimento aos avós e aos antepassados. Estende-se, enfim, aos
deveres dos alunos para com seu professor, dos empregados para com seus
patrões, dos subordinados para com seus chefes, dos cidadãos para com sua
pátria e para com os que a administram ou a governam.
Este mandamento implica e subentende os deveres
dos pais, tutores, professores, chefes, magistrados, governantes, de todos os
que exercem uma autoridade sobre outros ou sobre uma comunidade.
- A observância do quarto
mandamento acarreta sua recompensa: "Honra teu pai e tua mãe para
teres uma longa vida na terra, que o Senhor Deus te dá" (Ex 20,12). O
respeito a esse mandamento alcança, juntamente com os frutos espirituais,
frutos temporais de paz e de prosperidade. Ao contrário, a não observância
desse mandamento acarreta grandes danos para as comunidades e para as
pessoas.
I. A família no plano de Deus
NATUREZA DA FAMÍLIA
- A comunidade conjugal está
fundada no consentimento dos esposos. O casamento e a família estão
ordenados para o bem dos esposos, a procriação e a educação dos filhos. O
amor dos esposos e a geração dos filhos instituem entre os membros de uma
mesma família relações pessoais e responsabilidades primordiais.
- Um homem e uma mulher
unidos em casamento formam com seus filhos uma família. Esta disposição
precede todo reconhecimento por parte da autoridade pública; impõe-se a
ela (isto é, não depende da autoridade civil para se constituir) e deve
ser considerada como a referência normal, em função da qual devem ser avaliadas
as diversas formas de parentesco.
- Ao criar o homem e a
mulher, Deus instituiu a família humana e dotou-a de sua constituição
fundamental. Seus membros são pessoas iguais em dignidade. Para o bem
comum de seus membros e da sociedade, a família implica uma diversidade de
responsabilidades, de direitos e de deveres.
A FAMÍLIA CRISTÃ
- "Uma revelação e
atuação específica da comunhão eclesial é constituída pela família cristã,
que também, por isso, se pode e deve chamar igreja doméstica." E uma
comunidade de fé, de esperança e de caridade; na Igreja ela tem uma
importância singular, como se vê no Novo Testamento.
- A família cristã é uma
comunhão de pessoas, vestígio e imagem da comunhão do Pai, do Filho e do
Espírito Santo. Sua atividade procriadora e educadora é o reflexo da obra
criadora do Pai. Ela é chamada a partilhar da oração e do sacrifício de
Cristo. A oração cotidiana e a leitura da Palavra de Deus fortificam nela
a caridade. A família cristã é evangelizadora e missionária.
- As relações dentro da família
acarretam uma afinidade de sentimentos, de afetos e de interesses,
afinidade essa que provém sobretudo do respeito mútuo entre as pessoas. A
família é uma comunidade privilegiada, chamada a realizar "uma
carinhosa abertura recíproca de alma entre os cônjuges e também uma atenta
cooperação dos pais na educação dos filhos".
II. A família e a sociedade
- A família é a célula
originária da vida social. E a sociedade natural na qual o homem e a
mulher são chamados ao dom de si no amor e no dom da vida. A autoridade, a
estabilidade e a vida de relações dentro dela constituem os fundamentos da
liberdade, da segurança e da fraternidade no conjunto social. A família é
a comunidade na qual, desde a infância se podem assimilar os valores
morais, tais como honrar a Deus e usar corretamente a liberdade. A vida em
família é iniciação para a vida em sociedade.
- A família deve viver de
maneira que seus membros aprendam a cuidar e a responsabilizar-se pelos
jovens e pelos velhos pelos doentes ou deficientes e pelos pobres. São
numerosas as famílias que, em certos momentos, não são capazes de
proporcionar essa ajuda. Cabe então a outras pessoas, a outras famílias e,
subsidiariamente, à sociedade prover às suas necessidades: "A
religião pura e sem mácula diante de Deus, nosso Pai, consiste nisto:
visitar os órfãos e as viúvas em suas tribulações e guardar-se livre da
corrupção do mundo" (Tg 1,27).
- A família deve ser ajudada
e defendida pelas medidas sociais apropriadas. Quando as famílias não são
capazes de desempenhar suas funções, outros organismos sociais têm o dever
de ajudá-las e de apoiar a instituição familiar. De acordo com o princípio
da subsidiariedade, as comunidades mais amplas cuidarão de não usurpar
seus poderes ou de interferir na vida da família.
- A importância da família
para a vida e o bem-estar da sociedade acarreta uma responsabilidade
particular desta última no apoio e no fortalecimento do casamento e da
família. Que o poder civil considere como dever grave "reconhecer e
proteger a verdadeira natureza do casamento e da família, defender a
moralidade pública e favorecer a prosperidade dos lares".
- A comunidade política tem o
dever de honrar a família, de assisti-la, de lhe garantir sobretudo:
- O direito de se constituir, de ter filhos e de
educá-los de
- acordo com suas próprias convicções morais e
religiosas;
- a proteção da estabilidade do vínculo conjugal
e da instituição familiar;
- a liberdade de professar a própria fé, de
transmiti-la, de educar nela os filhos, com os meios e as Instituições necessárias;
- o direito à propriedade privada, à liberdade de
empreendimento, ao trabalho, à moradia, à emigração;
- de acordo com as instituições dos países, o
direito à assistência médica, à assistência aos idosos, aos abonos familiares;
- a proteção da segurança e da saúde, sobretudo
em relação aos perigos, como drogas, pornografia, alcoolismo etc.;
- a liberdade de formar associações com outras
famílias e, assim, serem representadas junto às autoridades civis.
- O quarto mandamento ilumina
as outras relações na sociedade. Em nossos irmãos e irmãs vemos os filhos
de nossos pais; em nossos primos, os descendentes de nossos avós; em
nossos concidadãos, os filhos de nossa pátria; nos batizados, os filhos de
nossa mãe, a Igreja; em toda pessoa humana, um filho ou filha daquele que
quer ser chamado "nosso Pai". Assim, nossas relações com o nosso
próximo são reconhecidas como de ordem pessoal. O próximo não é um
"indivíduo" da coletividade humana; ele é "alguém"
que, por suas origens conhecidas, merece atenção e respeito individuais.
- As comunidades humanas são
compostas de pessoas. Seu bom governo não se limita à garantia dos
direitos e ao cumpri mento dos deveres, assim como à fidelidade aos
contratos. Relações justas entre patrões e empregados, governantes e
cidadãos supõem o mútuo e natural bem-querer que convém à dignidade das
pessoas humanas preocupadas com a justiça e a fraternidade.
III. Deveres dos membros da família
DEVERES DOS FILHOS
- A paternidade divina é a
fonte da paternidade humana; é o fundamento da honra devida aos pais. O
respeito dos filhos, menores ou adultos, pelo pai e pela mãe alimenta-se
da afeição natural nascida do vínculo que os une e é exigido pelo preceito
divino.
- O respeito pelos pais
(piedade filial) é produto do reconhecimento para com aqueles que, pelo
dom da vida, por seu amor e por seu trabalho puseram seus filhos no mundo
e permitiram que crescessem em estatura, em sabedoria e graça. "Honra
teu pai de todo o coração e não esqueças as dores de tua mãe. Lembra-te
que foste gerado por eles. O que lhes darás pelo que te deram?" (Eclo
7,27-28).
- O respeito filial se revela
pela docilidade e pela obediência verdadeiras. "Meu filho, guarda os
preceitos de teu pai, não rejeites a instrução de tua mãe... Quando
caminhares, te guiarão; quando descansares, te guardarão; quando
despertares, te falarão" (Pr 6,20-22). "Um filho sábio ama a
correção do pai, e o zombador não escuta a reprimenda" (Pr 13,1).
- Enquanto o filho viver na
casa de seus pais, deve obedecer a toda solicitação dos pais que vise ao
seu bem ou ao da família. 'Filhos, obedecei em tudo a vossos pais, pois
isso é agradável ao Senhor" (Cl 3,20). Os filhos têm ainda de
obedecer às prescrições razoáveis de seus educadores e de todos aqueles
aos quais os pais os confiaram. Mas, se o filho estiver convicto em
consciência de que é moralmente mau obedecer a tal ordem, que não a siga.
Quando crescerem, os filhos continuarão a
respeitar seus pais. Antecipar-se-ão aos desejos deles, solicitarão de bom
grado seus conselhos e aceitarão suas justas admoestações. A obediência aos
pais cessa com a emancipação dos filhos, mas o respeito, que sempre lhes é
devido, não cessará de modo algum, pois (tal respeito) tem sua raiz no temor de
Deus, um dos dons do Espírito Santo.
- O quarto mandamento lembra
aos filhos adultos suas responsabilidades para com os pais. Enquanto
puderem, devem dar-lhes ajuda material e moral nos anos da velhice e
durante o tempo de doença, de solidão ou de angústia. Jesus lembra este
dever de reconhecimento.
O Senhor glorificou o pai nos filhos e fortaleceu
a autoridade da mãe sobre a prole. Aquele que respeita o pai obtém o perdão dos
pecados; o que honra sua mãe é como quem junta um tesouro. Aquele que respeita
o pai encontrará alegria nos filhos e no dia de sua oração será atendido.
Aquele que honra o pai viverá muito, e o que obedece ao Senhor alegrará sua mãe
(Eclo 3,2-6).
Filho, cuida de teu pai na velhice, não o
desgostes em vida. Mesmo se seu entendimento faltar, sê indulgente com ele, não
o menosprezes, tu que estás em pleno vigor... E como um blasfemador aquele que
despreza seu pai, e um amaldiçoado pelo Senhor aquele que irrita sua mãe (Eclo
3,12.16).
- O respeito filial favorece
a harmonia de toda a vida familiar e diz respeito também às relações entre
irmãos e irmãs. O respeito aos pais ilumina todo o ambiente familiar.
"Coroa dos anciãos são os netos" (Pr 17,6). "Suportai-vos
uns aos outros na caridade, em toda humildade, doçura e paciência"
(Ef 4,2).
- Os cristãos devem uma
gratidão especial àqueles de quem receberam o dom da fé, a graça do
Batismo e a vida na Igreja Pode tratar-se dos pais, de outros membros da
família, dos avós. dos pastores, dos catequistas, de outros professores ou
amigos. "Evoco a lembrança da fé sem hipocrisia que há em ti, a mesma
que habitou primeiramente em tua avó Lóide e em tua mãe Eunice e que,
estou convencido, reside também em ti" (2 Tm 1,5).
DEVERES DOS PAIS
- A fecundidade do amor
conjugal não se reduz só à procriação dos filhos, mas deve se estender à
sua educação moral e formação espiritual. "O papel dos pais na
educação é tão importante que é quase impossível substituí-los." O
direito e o devei de educação são primordiais e inalienáveis para os pais.
- Os pais devem considerar
seus filhos como filhos de Deus e respeitá-los como pessoas humanas. Educar
os filhos no cumprimento da Lei de Deus, mostrando-se eles mesmos
obedientes à vontade do Pai dos Céus.
- Os pais são os primeiros
responsáveis pela educação de seus filhos. Dão testemunho desta
responsabilidade em primeiro lugar pela criação de um lar no qual a
ternura, o perdão, o respeito, a fidelidade e o serviço desinteressado são
a regra. O lar é um lugar apropriado para a educação das virtudes. Esta
requer a aprendizagem da abnegação, de um reto juízo, do domínio de si,
condições de toda liberdade verdadeira. Os pais ensinarão os filhos a
subordinar "as dimensões físicas e instintivas às dimensões
interiores e espirituais." Dar bom exemplo aos filhos é uma grave
responsabilidade para os pais. Sabendo reconhecer diante deles seus próprios
defeitos, ser-lhes-á mais fácil guiá-los e corrigi-los:
"Aquele que ama o filho usará com freqüência
o chicote; aquele que educa seu filho terá motivo de satisfação" (Eclo
30,1-2). "E vós, pais, não deis a vossos filhos motivo de revolta contra
vós, mas criai-os na disciplina e correção do Senhor" (Ef 6,4).
- O lar constitui um ambiente
natural para a iniciação do ser humano na solidariedade e nas
responsabilidades comunitárias. Os pais ensinarão os filhos a se
precaverem dos comprometimentos e das desordens que ameaçam as sociedades
humanas.
- Pela graça do sacramento do
matrimônio, os pais receberam a responsabilidade e o privilégio de
evangelizar os filhos. Por isso os iniciarão desde tenra idade nos
mistérios da fé, da qual são para os filhos os "primeiros arautos".
Associá-los-ão desde a primeira infância à vida da Igreja. A experiência
da vida em família pode alimentar as disposições afetivas que por toda a
vida constituirão autênticos preâmbulos e apoios de uma fé viva.
- A educação para a fé por
parte dos pais deve começar desde a mais tenra infância. Ocorre já quando
os membros da família se ajudam a crescer na fé pelo testemunho de uma
vida cristã de acordo com o Evangelho. A catequese familiar precede,
acompanha e enriquece as outras formas de ensinamento da fé. Os pais têm a
missão de ensinar os filhos a orar e a descobrir sua vocação de filhos de
Deus. A paróquia é a comunidade eucarística e o centro da vida litúrgica
das famílias cristãs; ela é um lugar privilegiado da catequese dos filhos
e dos pais.
- Os filhos, por sua vez,
contribuem para o crescimento de seus pais em santidade. Todos e cada um
se darão generosamente e sem se cansar o perdão mútuo exigido pelas
ofensas, pelas rixas, pelas injustiças e pelos abandonos. Sugere-o a mútua
afeição. Exige-o a caridade de Cristo.
- Durante a infância, O
respeito e a afeição dos pais se traduzem inicialmente pelo cuidado e pela
atenção que dedicam em educar seus filhos, em prover suas necessidades
físicas e espirituais. Na fase de crescimento, o mesmo respeito e a mesma
dedicação levam os pais a educá-los no reto uso da razão e da liberdade.
- Como primeiros responsáveis
pela educação dos filhos, os pais têm o direito de escolher para eles uma
escola que corresponda as suas próprias convicções. Este direito é
fundamental. Os pais têm, enquanto possível, o dever de escolher as
escolas que melhor possam ajudá-los em sua tarefa de educadores cristãos.
Os poderes públicos têm o dever de garantir esse direito dos pais e de
assegurar as condições reais de seu exercício.
- Quando se tornam adultos,
os filhos têm o dever e o direito de escolher sua profissão e seu estado
de vida. Assumirão essas novas responsabilidades na relação confiante com
os pais, cujas opiniões e conselhos pedirão e receberão de boa vontade. Os
pais cuidarão de não constranger seus filhos nem na escolha de uma
profissão nem na de um consorte. Este dever de discrição não os impede,
muito ao contrário, de ajudá-los com conselhos prudentes, particularmente
quando estes têm em vista constituir uma família.
- Alguns não se casam, para
cuidar dos pais ou dos irmãos e irmãs, para se dedicar mais exclusivamente
a uma profissão ou por outros motivos louváveis. Podem contribuir muito
para o bem da família humana.
IV. A família e o Reino
- Embora os vínculos
familiares sejam importantes, não são absolutos. Da mesma forma que a
criança cresce para sua maturidade e autonomia humanas e espirituais,
assim também sua vocação singular, que vem de Deus, se consolida com mais
clareza e força. Os pais respeitarão este chamamento e favorecerão a
resposta dos filhos em segui-lo. É preciso convencer-se de que a primeira
vocação do cristão é a de seguir Jesus. "Aquele que ama pai ou mãe
mais do que a mim não é digno de mim. E aquele que ama filho ou filha mais
do que a mim não é digno de mim" (Mt 10,37).
- Tornar-se discípulo de
Jesus é aceitar o convite de pertencer à família de Deus, de viver
conforme a sua maneira de viver: "Aquele que fizer a vontade de meu
Pai que está nos Céus, esse é meu irmão, irmã e mãe" (Mt 12,50).
Os pais aceitarão e respeitarão com alegria e
ação de graças o chamamento do Senhor a um de seus filhos de segui-lo na
virgindade pelo Reino, na vida consagrada ou no ministério sacerdotal.
V. As autoridades na sociedade civil
- O quarto mandamento ordena
também que honremos todos aqueles que, para nosso bem, receberam de Deus
uma autoridade na sociedade. Este mandamento ilumina os deveres daqueles
que exercem a autoridade, bem como os daqueles que por esta são
beneficiados.
DEVERES DAS AUTORIDADES CIVIS
- Aqueles que são investidos
de autoridade devem exercê-la como um serviço. "Aquele que quiser
tornar-se grande entre vós, seja aquele que serve" (Mt 20,26). O
exercício de uma autoridade é moralmente limitado por sua origem divina,
por sua natureza racional e por seu objeto específico. Ninguém pode mandar
ou instituir o que é contrário à dignidade das pessoas e à lei natural.
- O exercício da autoridade
visa tornar manifesta uma justa hierarquia de valores, a fim de facilitar
o exercício da liberdade e da responsabilidade de todos. Que os superiores
exerçam a justiça distributiva com sabedoria, levando em conta as
necessidades e a contribuição de cada um e tendo em vista a concórdia e a
paz. Zelem para que as regras e disposições que tomarem não induzam em
tentação, opondo o interesse pessoal ao da comunidade
- Os poderes políticos devem
respeitar os direitos fundamentais da pessoa humana. Exercerão humanamente
a justiça no respeito pelo direito de cada um, principalmente das famílias
e dos deserdados.
Os direitos políticos ligados à cidadania podem e
devem ser concedidos segundo as exigências do bem comum. Não podem ser
suspensos pelos poderes públicos sem motivo legítimo e proporcionado. O
exercício dos direitos políticos destinado ao bem comum da nação e da
comunidade humana.
DEVERES DOS CIDADÃOS
- Aqueles que estão sujeitos
à autoridade considerarão seus superiores como representantes de Deus, que
os instituiu ministros de seus dons: "Sujeitai-vos a toda instituição
humana por causa do Senhor... Comportai-vos como homens livres não usando
a liberdade como cobertura para o mal, mas c servos de Deus" (1 Pd
2,13.16). A leal colaboração dos cidadãos inclui o direito, e às vezes o
dever, de apresentar suas justas reclamações contra o que lhes parece
prejudicial à dignidade das pessoas e ao bem da comunidade.
- É dever dos cidadãos
colaborar com os poderes civis para o bem da sociedade, num espírito de
verdade, de justiça, de solidariedade e de liberdade. O amor e o serviço à
pátria derivam do dever de gratidão e da ordem de caridade. A submissão às
autoridades legítimas e o serviço do bem comum exigem que os cidadãos
cumpram seu papel na vida da comunidade política.
- A submissão à autoridade e
a co-responsabilidade pelo bem comum exigem moralmente o pagamento de
impostos, o exercício do direito de voto, a defesa do país:
Dai a cada um o que lhe é devido: o imposto a
quem é devido; a taxa a quem é devida; a reverência a quem é devida; a honra a
quem é devida (Rm 13,7).
Os cristãos residem em sua própria pátria, mas
como residentes estrangeiros. Cumprem todos os seus deveres de cidadãos e
suportam todas as suas obrigações, mas de tudo desprendidos, como
estrangeiros... Obedecem às leis estabelecidas, e sua maneira de viver vai
muito além das leis... Tão nobre é o posto que lhes foi por Deus outorgado, que
não lhes é permitido desertar.
O Apóstolo nos exorta a fazer orações e ações de
graça pelos reis e por todos os que exercem autoridade, "a fim de que
levemos uma vida calma e serena, com toda piedade e dignidade" (1 Tm 2,2).
- As nações mais favorecidas
devem acolher, na medida do possível, o estrangeiro em busca da segurança
e dos recursos vitais que não pode encontrar em seu país de origem. Os
poderes públicos zelarão pelo respeito do direito natural que põe o
hóspede sob a proteção daqueles que o recebem.
Em vista do bem comum de que estão encarregadas,
as autoridades políticas podem subordinar o exercício do direito de imigração a
diversas condições jurídicas, principalmente com respeito aos deveres dos
migrantes para com o país de adoção. O migrante é obrigado a respeitar com
gratidão o patrimônio material e espiritual do país que o acolhe, a obedecer às
suas leis e a dar sua contribuição financeira.
- O cidadão é obrigado em
consciência a não seguir as prescrições das autoridades civis quando estes
preceitos são contrários às exigências da ordem moral, aos direitos
fundamentais das pessoas ou aos ensinamentos do Evangelho. A recusa de
obediência às autoridades civis, quando suas exigências são contrárias às
da reta consciência, funda-se na distinção entre o serviço a Deus e o
serviço à comunidade política, "Dai a César o que é de César e a Deus
o que é de Deus" (Mt 22,21). 'E preciso obedecer antes a Deus que aos
homens" (At 5,29):
Se a autoridade pública, exorbitando de sua
competência, oprimir os cidadãos, estes não recusem o que é objetivamente
exigido pelo bem comum; contudo, é lícito defenderem os seus direitos e os de
seus concidadãos contra os abusos do poder, guardados os limites traçados pela
lei natural e pela lei evangélica.
- A resistência à opressão do
poder político não recorrerá legitimamente às armas, salvo se ocorrerem
conjuntamente as seguintes condições: 1) em caso de violações certas,
graves prolongadas dos direitos fundamentais; 2) depois de ter esgotado
todos os outros recursos; 3) sem provocar desordens piores; 4) que haja
uma esperança fundada de êxito; 5) se for impossível prever razoavelmente
soluções melhores.
A COMUNIDADE POLÍTICA E A IGREJA
- Toda instituição se
inspira, ainda que implicitamente, numa visão do homem e de seu destino,
da qual deduz os critérios de seus juízos, sua hierarquia de valores, sua
linha de conduta. A maior parte das sociedades tem referido suas
instituições a um certa preeminência do homem sobre as coisas. Só a
religião divinamente revelada reconheceu claramente em Deus, Criador e
Redentor, a origem e o destino do homem. A Igreja convida os poderes
políticos a referir seu julgamento e suas decisões a esta inspiração da
verdade sobre Deus e sobre o homem:
As sociedades que ignoram esta inspiração ou a
recusam em nome de sua independência em relação a Deus são levadas a procurar
em si mesmas ou a tomar de uma ideologia os seus referenciais e os seu
objetivos e, não admitindo que se defenda um critério objetivo do bem e do mal,
arrogam a si, sobre o homem e sobre seu destino, um poder totalitário,
declarado ou dissimulado, como mostra a história.
- A Igreja, que em razão de
seu múnus e de sua competência, não se confunde de modo algum com a
comunidade política, é ao mesmo tempo sinal e salvaguarda do caráter
transcendente da pessoa humana. "A Igreja respeita e promove a
liberdade política e a responsabilidade dos cidadãos."
- Faz parte da missão da
Igreja "emitir juízo moral também sobre as realidades que dizem
respeito à ordem política, quando o exijam os direitos fundamentais da
pessoa ou a salvação das almas, empregando todos os recursos - e somente
estes - que estão de acordo com o Evangelho e com o bem de todos, conforme
a diversidade dos tempos e das situações.
RESUMINDO
- "Honra teu pai e
tua mãe" (Dt 5,16; Mc 7,8).
- De acordo com o quarto
mandamento, Deus quis que, depois dele, honrássemos nossos pais e os que
Ele, para nosso bem, investiu de autoridade.
- A comunidade conjugal
está fundada na aliança e no consentimento dos esposos. O casamento e a
família estão ordenados para o bem dos cônjuges, a procriação e a educação
dos filhos.
- "A salvação da
pessoa e da sociedade humana está estreitamente ligada ao bem-estar da
comunidade conjugal e familiar."
- Os filhos devem a seus
pais respeito, gratidão, justa obediência e ajuda. O respeito filial
favorece a harmonia de toda a vida familiar.
- Os pais são os primeiros
responsáveis pela educação de seus filhos na fé, na oração e em todas as
virtudes. Têm o dever de prover, na medida do possível, às necessidades
físicas e espirituais de seus filhos.
- Os pais devem respeitar
e favorecer a vocação de seus filhos. Lembrem e ensinem que a primeira
vocação do cristão consiste em seguir a Jesus.
- A autoridade pública
deve respeitar os direitos fundamentais da pessoa humana e as condições de
exercício de sua liberdade.
- É dever dos cidadãos
trabalhar com os poderes civis para a edificação da sociedade num espírito
de verdade, de justiça, de solidariedade e de liberdade.
- O cidadão está obrigado
em consciência a não seguir as prescrições das autoridades civis, quando
contrárias às exigências da ordem moral. "É preciso obedecer antes a
Deus que aos homens" (At 5,29).
- Toda sociedade baseia
seus juízos e sua conduta numa visão do homem e de seu destino. Sem as
luzes do Evangelho a respeito de Deus e do homem, as sociedades facilmente
se tornam totalitárias.
ARTIGO 5
O QUINTO
MANDAMENTO
Não matarás (Ex 20,13).
Ouvistes o que foi dito aos antigos: "Não
matarás. Aquele que matar terá de responder ao tribunal". Eu, porém, vos
digo: todo aquele que se encolerizar contra seu irmão terá de responder no
tribunal (Mt 5,21-22).
- "A vida humana é
sagrada porque desde sua origem ela encerra a ação criadora de Deus e
permanece para sempre numa relação especial com o Criador, seu único fim.
Só Deus é o dono da vida, do começo ao fim; ninguém, em nenhuma
circunstância, pode reivindicar para si o direito de destruir diretamente
um ser humano inocente."
I. O respeito â vida humana
O TESTEMUNHO DA HISTÓRIA SAGRADA
- A Escritura, no relato do
assassinato de Abel por seu irmão Caim, revela, desde o começo da história
humana, a presença da cólera e da cobiça no homem, conseqüências do pecado
original. O homem se tornou inimigo de seu semelhante. Deus expressa a
atrocidade deste fratricídio: "Que fizeste? Ouço o sangue de teu
irmão, do solo, clamar por mim. Agora, és maldito e expulso do solo fértil
que abriu a boca para receber de tua mão o sangue de teu irmão" (Gn
4,10-11).
- A aliança entre Deus e a
humanidade está cheia de lembranças do dom divino da vida humana e da
violência assassina do homem:
Pedirei contas do sangue de cada um de vós...Quem
derramar o sangue do homem, pelo homem terá seu sangue derramado. Pois à imagem
de Deus o homem foi feito (Gn 9,5-6).
O Antigo Testamento sempre considerou o sangue
como um sinal sagrado da vida. A necessidade deste ensinamento é para todos os
tempos.
- A Escritura determina com
precisão a proibição do quinto mandamento: "Não matarás o inocente
nem o justo" (Ex 23,7). O assassinato voluntário de um inocente é
gravemente contrário à dignidade do ser humano, à regra de ouro e à
santidade do Criador. A lei que o proscreve é universalmente válida, isto
é, obriga a todos e a cada um, sempre e em toda parte.
- No Sermão da Montanha, o
Senhor recorda o preceito: "Não matarás" (Mt 5,21), e acrescenta
a proibição da cólera, do ódio e da vingança. Mais ainda, Cristo diz a seu
discípulo que ofereça a outra face e ame seus inimigos. Ele mesmo não se
defendeu e disse a Pedro que deixasse a espada na bainha.
A LEGÍTIMA DEFESA
- A legítima defesa das
pessoas e das sociedades não é uma exceção à proibição de matar o
inocente, que constitui o homicídio voluntário. "A ação de
defender-se pode acarretar um duplo efeito: um é a conservação da própria
vida, o outro é a morte do agressor.. Só se quer o primeiro; o outro,
não."
- O amor a si mesmo permanece
um princípio fundamental da moralidade. Portanto, é legítimo fazer
respeitar seu próprio direito à vida. Quem defende sua vida não é culpável
de homicídio, mesmo se for obrigado a matar o agressor:
Se alguém, para se defender, usar de violência
mais do que o necessário, seu ato será ilícito. Mas, se a violência for
repelida com medida, será lícito... E não é necessário para a salvação omitir
este ato de comedida proteção para evitar matar o outro, porque, antes da de
outrem, se está obrigado a cuidar da própria vida.
- A legítima defesa pode ser
não somente um direito, mas um dever grave, para aquele que é responsável
pela vida de outros. Preservar o bem comum da sociedade exige que o
agressor seja impossibilitado de prejudicar a outrem. A este título os
legítimos detentores da autoridade têm o direito de repelir pelas armas os
agressores da comunidade civil pela qual são responsáveis.
- Corresponde a uma exigência
de tutela do bem comum c esforço do Estado destinado a conter a difusão de
comportamentos lesivos aos direitos humanos e às regras fundamentais de
convivência civil. A legítima autoridade pública tem o direito e o dever
de infligir penas proporcionais à gravidade do delito. A pena tem como
primeiro objetivo reparar a desordem introduzida pela culpa, Quando essa
pena é voluntariamente aceita pelo culpado tem valor de expiação. Assim, a
pena, além de defender a ordem pública c de tutelar a segurança das
pessoas, tem um objetivo medicinal: na medida do possível, deve contribuir
à correção do culpado.
- O ensino tradicional da
Igreja não exclui, depois de com provadas cabalmente a identidade e a
responsabilidade de culpado, o recurso à pena de morte, se essa for a
única via praticável para defender eficazmente a vida humana contra o
agressor injusto.
Se os meios incruentos bastarem para defender as
vidas humanas contra o agressor e para proteger a ordem pública e a segurança
das pessoas, a autoridade se limitará a esses meios, porque correspondem melhor
às condições concretas do bem comum e estão mais conformes à dignidade da
pessoa humana.
O HOMICÍDIO VOLUNTÁRIO
- O quinto mandamento
proscreve como gravemente pecaminoso o homicídio direto e voluntário. O
assassino e os que cooperam voluntariamente com o assassinato cometem um
pecado que clama ao céu por vingança.
O infanticídio, o fratricídio, o parricídio e o
assassinato do cônjuge são crimes particularmente graves, devido aos laços
naturais que rompem. Preocupações de eugenismo ou de higiene pública não podem
justificar nenhum assassinato, mesmo a mando dos poderes públicos.
- O quinto mandamento proíbe
que se faça algo com a intenção de provocar indiretamente a morte de uma
pessoa. A lei moral proíbe expor alguém a um risco mortal sem razão grave,
bem como recusar ajuda a uma pessoa em perigo.
A aceitação pela sociedade humana de condições de
miséria que levem à própria morte sem se esforçar por remediar a situação
constitui uma injustiça escandalosa e uma falta grave. Todo aquele que em seus
negócios se der a práticas usurárias e mercantis que provoquem a fome e a morte
de seus irmãos (homens) comete indiretamente um homicídio, que lhe é imputável.
O homicídio involuntário não é moralmente
imputável. Mas não está isento de falta grave quem, sem razões proporcionais,
agiu de maneira a provocar a morte, ainda que sem a intenção de causá-la.
O ABORTO
- A vida humana deve ser
respeitada e protegida de maneira absoluta a partir do momento da
concepção. Desde o primeiro momento de sua existência, o ser humano deve
ver reconhecidos os seus direitos de pessoa, entre os quais o direito
inviolável de todo ser inocente à vida.
Antes mesmo de te formares no ventre materno, eu
te conheci; antes que saísses do seio, eu te consagrei (Jr 1,5).
Meus ossos não te foram escondidos quando eu era
feito, em segredo, tecido na terra mais profunda (Sl 139,15).
- Desde o século I, a Igreja
afirmou a maldade moral de todo aborto provocado. Este ensinamento não
mudou. Continua invariável. O aborto direto, quer dizer, querido como um
fim ou como um meio, é gravemente contrário à lei moral:
Não matarás o embrião por aborto e não farás
perecer o recém-nascido.
Deus, senhor da vida, confiou aos homens o nobre
encargo d preservar a vida, para ser exercido de maneira condigna ao homem Por
isso a vida deve ser protegida com o máximo cuidado desde a concepção. O aborto
e o infanticídio são crimes nefandos.
- A cooperação formal para um
aborto constitui uma falta grave. A Igreja sanciona com uma pena canônica
de excomunhão este delito contra a vida humana. "Quem provoca aborto,
seguindo-se o efeito, incorre em excomunhão latae sententiae"
"pelo próprio fato de cometer o delito" e nas condições
previstas pelo Direito. Com isso, a Igreja não quer restringir o campo da
misericórdia. Manifesta, sim, a gravidade do crime cometido, o prejuízo
irreparável causado ao 'inocente morto, a seus pais e a toda a sociedade.
O inalienável direito à vida de todo indivíduo
humano inocente é um elemento constitutivo da sociedade civil e de sua legislação:
"Os direitos inalienáveis da pessoa devem
ser reconhecidos e respeitados pela sociedade civil e pela autoridade política.
Os direitos do homem não dependem nem dos indivíduos, nem dos pais, e também
não representam uma concessão da sociedade e do Estado pertencem à natureza
humana e são inerentes à pessoa em razão do ato criador do qual esta se
origina. Entre estes direitos fundamentais é preciso citar o direito à vida e à
integridade física de todo se humano, desde a concepção até a morte."
- "No momento em que uma
lei positiva priva uma categoria de seres humanos da proteção que a
legislação civil lhes deve dar, o estado nega a igualdade de todos perante
a lei. Quando o Estado não coloca sua força a serviço dos direitos de
todos os cidadãos, particularmente dos mais fracos, os próprios
fundamentos de um estado de direito estão ameaçados... Como conseqüência
do respeito e da proteção que devem ser garantidos à criança desde o
momento de sua concepção, a lei deverá prever sanções penais apropriadas
para toda violação deliberada dos direitos dela."
Visto que deve ser tratado como uma pessoa desde
a concepção, o embrião deverá ser defendido em sua integridade, cuidado e
curado, na medida do possível, como qualquer outro ser humano.
- O diagnóstico pré-natal é
moralmente licito "se respeitar a vida e a integridade do embrião e
do feto humano, e se está orientado para sua salvaguarda ou sua cura
individual... Está gravemente em oposição com a lei moral quando prevê, em
função dos resultados, a eventualidade de provocar um aborto. Um
diagnóstico não deve ser o equivalente de uma sentença de morte".
"Devem ser consideradas lícitas as
intervenções sobre o embrião humano quando respeitam a vida e a integridade do
embrião e não acarretam para ele riscos desproporcionados, mas visam à sua
cura, à melhora de suas condições de saúde ou à sua sobrevivência
individual."
"É imoral produzir embriões humanos
destinados a serem explorados como material biológico disponível."
- "Certas tentativas de
intervenção sobre o patrimônio cromossômico ou genético não são
terapêuticas, mas tendem à produção de seres humanos selecionados segundo
o sexo ou outras qualidades preestabelecidas. Essas manipulações são
contrárias à dignidade pessoal do ser humano, à sua integridade e à sua
identidade" única, não reiterável.
A EUTANÁSIA
- Aqueles cuja vida está
diminuída ou enfraquecida necessitam de um respeito especial. As pessoas
doentes ou deficientes devem ser amparadas, para levar uma vida tão normal
quanto possível.
- Sejam quais forem os motivos
e os meios, a eutanásia direta consiste em pôr fim à vida de pessoas
deficientes, doentes ou moribundas. É moralmente inadmissível.
Assim, uma ação ou uma omissão que, em si ou na
intenção, gera a morte a fim de suprimir a dor constitui um assassinato
gravemente contrário à dignidade da pessoa humana e ao respeito pelo Deus vivo,
seu Criador. O erro de juízo no qual se pode ter caído de boa-fé não muda a
natureza deste ato assassino, que sempre deve ser condenado e excluído.
- A interrupção de procedimentos
médicos onerosos, perigosos, extraordinários ou desproporcionais aos
resultados esperados pode ser legítima. É a rejeição da "obstinação
terapêutica". Não se quer dessa maneira provocar a morte; aceita-se
não poder impedi-la. As decisão devem ser tomadas pelo paciente, se tiver
a competência e a capacidade para isso; caso contrário, pelos que têm
direitos legais, respeitando sempre a vontade razoável e os interesses
legítimos do paciente.
- Mesmo quando a morte é
considerada iminente, os cuidados comumente devidos a uma pessoa doente
não podem ser legitimamente interrompidos. O emprego de analgésicos para
aliviar os sofrimentos moribundo, ainda que com o risco de abreviar seus
dias, pode ser moralmente conforme à dignidade humana se a morte não é
desejada, nem como fim nem como meio, mas somente prevista e tolerada como
inevitável. Os cuidados paliativos constituem uma forma privilegiada de
caridade desinteressada. Por esta razão devem ser encorajados.
O SUICÍDIO
- Cada um é responsável por
sua vida diante de Deus, que "lha deu e que dela é sempre o único e
soberano Senhor. Devemos receber a vida com reconhecimento e preservá-la
para honra dele e salvação de nossas almas. Somos os administradores e não
os proprietários da vida que Deus nos confiou. Não podemos dispor dela.
- O suicídio contradiz a
inclinação natural do ser humano a conservar e perpetuar a própria vida. É
gravemente contrário ao justo amor de si mesmo. Ofende igualmente ao amor
do próximo, porque rompe injustamente os vínculos de solidariedade com as
sociedades familiar, nacional e humana, às quais nos ligam muitas
obrigações. O suicídio é contrário ao amor do Deus vivo.
- Se for cometido com a
intenção de servir de exemplo, principalmente para os jovens, o suicídio
adquire ainda a gravidade de um escândalo. A cooperação voluntária ao
suicídio é contrária à lei moral.
Distúrbios psíquicos graves, a angústia ou o medo
grave da provação, do sofrimento ou da tortura podem diminuir a
responsabilidade do suicida.
- Não se deve desesperar da
salvação das pessoas que se mataram. Deus pode, por caminhos que só Ele
conhece, dar-lhes ocasião de um arrependimento salutar. A Igreja ora pelas
pessoas que atentaram contra a própria vida.
II. O respeito â dignidade das pessoas
O RESPEITO À ALMA DO OUTRO: O ESCÂNDALO
- O escândalo é a atitude ou
o comportamento que leva outrem a praticar o mal. Aquele que escandaliza
torna-se o tentador do próximo. Atenta contra a virtude e a retidão; pode
arrastar seu irmão à morte espiritual. O escândalo constitui uma falta
grave se, por ação ou omissão, conduzir deliberadamente o outro a uma
falta grave.
- O escândalo se reveste de
uma gravidade particular em virtude da autoridade dos que o causam ou da
fraqueza dos que o sofrem. Foi o que inspirou a Nosso Senhor a seguinte
maldição "Caso alguém escandalize um destes pequeninos, melhor será
que lhe pendurem ao pescoço uma pesada mó e seja precipitado nas
profundezas do mar" (Mt ,18,6). O escândalo é grave quando é dado por
aqueles que, por natureza ou por função, devem ensinar e educar os outros.
Jesus censura os escribas e os fariseus, comparando-os a lobos disfarçados
de cordeiros
- O escândalo pode ser
provocado pela lei ou pelas instituições, pela moda ou pela opinião.
Tomam-se, portanto, culpados de escândalo aqueles
que instituem leis ou estruturas sociais que levam à degradação dos costumes e
à corrupção da vida religiosa ou a "condições sociais que, voluntariamente
ou não, tomam difícil e praticamente impossível uma conduta cristã conforme aos
mandamentos". O mesmo vale para chefes de empresas que fazem regulamentos
que incitam à fraude, para professores que "exasperam" os alunos ou
para aqueles que, manipulando a opinião pública, a afastam dos valores morais.
- Quem usa os poderes de que
dispõe de tal maneira que induzam ao mal torna-se culpado de escândalo e
responsável pelo mal que, direta ou indiretamente, favorece. "E
inevitável que haja escândalos, mas ai daquele que os causar" (Lc
17,1).
O RESPEITO Á SAÚDE
- A vida e a saúde física são
bens preciosos doados por Deus. Devemos cuidar delas com equilíbrio,
levando em conta as necessidades alheias e o bem comum.
O cuidado com a saúde dos cidadãos requer a ajuda
da sociedade para obter as condições de vida que permitam crescer e atingir a
maturidade: alimento, roupa, moradia, cuidado da saúde, ensino básico, emprego,
assistência social.
- Se a moral apela para o
respeito à vida corporal, não faz desta um valor absoluto, insurgindo-se
contra uma concepção neopagã que tende a promover o culto do corpo, a tudo
sacrificar-lhe, a idolatrar a perfeição física e o êxito esportivo. Em
razão da escolha seletiva que faz entre os fortes e os fracos, tal
concepção pode conduzir à perversão das relações humanas.
- A virtude da temperança
manda evitar toda espécie de exceção, o abuso da comida, do álcool, do
fumo e dos medicamentos. Aqueles que, em estado de embriaguez ou por gosto
imoderado pela velocidade, põem em risco a segurança alheia e a própria,
nas estradas, no mar ou no ar, tomam-se gravemente culpáveis.
- O uso da droga causa
gravíssimos danos à saúde e à vida humana. Salvo indicações estritamente
terapêuticas, constitui falta grave. A produção clandestina e o tráfico de
drogas são práticas escandalosas; constituem uma cooperação direta com o
mal, pois incitam a práticas gravemente contrárias à lei moral
O RESPEITO À PESSOA E À PESQUISA CIENTÍFICA
- As experiências
científicas, médicas ou psicológicas em pessoas ou grupos humanos podem
concorrer para a cura dos doentes e para o progresso da saúde pública.
- A pesquisa científica de
base, como a pesquisa aplicada, constituem uma expressão significativa do
domínio do homem sobre a criação. A ciência e a técnica são recursos
preciosos postos a serviço do homem e promovem seu desenvolvimento
integral em benefício de todos; contudo, não podem indicar sozinhas o
sentido da existência e do progresso humano. A ciência e a técnica estão
ordenadas para o homem, do qual provêm sua origem e seu crescimento;
portanto, encontram na pessoa e em seus valores morais a indicação de sua
finalidade e a consciência de seus limites.
- É ilusório reivindicar a
neutralidade moral da pesquisa científica e de suas aplicações. Além
disso, os critérios de orientação não podem ser deduzidos nem da simples
eficácia técnica nem da utilidade que possa derivar daí para uns em detrimento
dos outros, e muito menos das ideologias dominantes. A ciência e a técnica
exigem, por seu próprio significado intrínseco, o respeito incondicional
dos critérios fundamentais da moralidade; devem estar a serviço da pessoa
humana, de seus direitos inalienáveis, de seu bem verdadeiro e integral,
de acordo com o projeto e a vontade de Deus.
- As pesquisas ou
experiências no ser humano não podem legitimar atos em si mesmos
contrários à dignidade das pessoas e à lei moral. O consentimento eventual
dos sujeitos não justifica tais atos. A experiência em seres humanos não é
moralmente legítima se fizer a vida ou a integridade física e psíquica do
sujeito correrem riscos desproporcionais ou evitáveis. A experiência em
seres humanos não atende aos requisitos da dignidade da pessoa se ocorrer
sem o consentimento explícito do sujeito ou de seus representantes legais.
- O transplante de órgãos é
conforme à lei moral se os riscos e os danos físicos e psíquicos a que se
expõe o doador são proporcionais ao bem que se busca para o destinatário.
A doação de órgãos após a morte é um ato nobre e meritório e merece ser
encorajado como manifestação de generosa solidariedade. O transplante de
órgãos não é moralmente aceitável se o doador ou seus representante legais
não tiverem dado seu expresso consentimento para tal. Além disso, é
moralmente inadmissível provocar diretamente mutilação que venha a tornar
alguém inválido ou provocar diretamente a morte, mesmo que seja para
retardar a morte de outras pessoas.
O RESPEITO À INTEGRIDADE CORPORAL
- Os seqüestros e a tomada de
reféns fazem reinar o terror e, pela ameaça, exercem pressões intoleráveis
sobre as vítimas. São moralmente ilegítimos. O terrorismo ameaça, fere e
mata sem discriminação; isso é gravemente contrário à justiça e à
caridade. A tortura, que usa de violência física ou moral para arrancar
confissões, castigar culpados, amedrontar opositores, satisfazer o ódio, é
contrária ao respeito pela pessoa e pela dignidade humana. Fora das
indicações médicas de ordem estritamente terapêutica, as amputações,
mutilações de esterilizações diretamente voluntárias de pessoas inocentes
contrárias à lei moral.
- Em tempos passados,
práticas cruéis foram comumente utilizadas por governos legítimos para
manter a lei e a ordem, muitas vezes sem protesto dos pastores da Igreja,
os quais adotaram eles em mesmos, em seus próprios tribunais, prescrições
do direito romano sobre a tortura. Ao lado destes fatos lamentáveis, a
Igreja sempre ensinou o dever de demência e misericórdia: proibiu aos clérigos
derramarem sangue. Em tempos recentes, ficou evidente que essas práticas
cruéis não eram nem necessárias para a ordem pública nem estavam de acordo
com os direitos legítimos da pessoa humana. Ao contrário, essas práticas
conduzem às piores degradações. E preciso trabalhar por sua abolição. E
preciso orar pelas vitimas e por seus algozes.
O RESPEITO AOS MORTOS
- Deve-se dispensar atenção e
cuidado aos moribundos, para ajudá-los a viver seus últimos momentos na
dignidade e na paz. Devem também ser ajudados pela oração dos familiares.
Estes cuidarão para que os doentes recebam em tempo oportuno os
sacramentos que preparam para o encontro com o Deus vivo.
- Os corpos dos defuntos
devem ser tratados com respeito e caridade, na fé e na esperança da
ressurreição. O enterro dos mortos é uma obra de misericórdia corporal que
honra os filhos de Deus, templos do Espírito Santo.
- A autópsia de cadáveres
pode ser moralmente admitida por motivos de investigação legal ou de
pesquisa científica. A doação gratuita de órgãos após a morte é legítima e
pode ser meritória.
A Igreja permite a cremação, se esta não
manifestar uma posição contrária à fé na ressurreição dos corpos.
III. A salvaguarda da paz
A PAZ
- Ao lembrar o preceito
"Tu não matarás" (Mt 5,21), Nosso Senhor pede a paz do coração e
denuncia a imoralidade da cólera assassina e do ódio.
A cólera é um desejo de vingança. "Desejar a
vingança para o mal daquele que é preciso punir é ilícito, mas é louvável impor
uma reparação "para a correção dos vícios e a conservação da
justiça". Se a cólera chega ao desejo deliberado de matar o próximo ou de
feri-lo com gravidade, atenta gravemente contra a caridade, constituindo pecado
mortal. O Senhor disse: "Todo aquele que se encolerizar contra seu irmão
terá de responder no tribunal" (Mt 5,22).
- O ódio voluntário é
contrário à caridade. O ódio ao próximo é um pecado quando o homem quer
deliberadamente seu mal. O ódio ao próximo é um pecado grave quando se lhe
deseja deliberadamente um grave dano. "Eu, porém, vos digo: amai
VOSSOS inimigos e orai pelos que vos perseguem; desse modo vos tornareis
filhos de vosso Pai que esta nos céus..." (Mt 5 ,44-45).
- O respeito e o
desenvolvimento da vida humana exigem a paz. A paz não é somente ausência
de guerra e não se limita a garantir o equilíbrio das forças adversas. A
paz não pode ser obtida na terra sem a salvaguarda dos bens das pessoas,
sem a livre comunicação entre os seres humanos, o respeito pela dignidade
das pessoas e dos povos, a prática assídua da fraternidade. E a
"tranqüilidade da ordem", "obra da justiça" (Is 32,17)
e efeito da caridade.
- A paz terrestre é imagem e
fruto da paz de Cristo, o Príncipe da paz" messiânica (Is 9,5). Pelo
sangue de sua cruz, Ele "matou a inimizade na própria carne",
reconciliou os homens com Deus e fez de sua Igreja o sacramento da unidade
do gênero humano de sua união com Deus. "Ele é a nossa paz" (Ef
2,14). Declara "bem-aventurados os que promovem a paz" (Mt 5,9).
- Aqueles que renunciam à
ação violenta e para proteger os direitos do homem, recorrem a meios de
defesa ao alcance dos mais fracos testemunham a caridade evangélica,
contanto que isso seja feito sem lesar os direitos e as obrigações dos
outros homens e das sociedades. Atestam legitimamente a gravidade dos
riscos físicos e morais do recurso à violência, com seu cortejo de mortes
e ruínas
EVITAR A GUERRA
- O quinto mandamento proíbe
a destruição voluntária da vida humana. Por causa dos males e das
injustiças que toda guerra acarreta, a Igreja insta cada um a orar e agir
para que a Bondade divina nos livre da antiga escravidão da guerra.
- Cada cidadão e cada
governante deve agir de modo a evitar as guerras. Enquanto, porém,
"houver perigo de guerra, sem que exista uma autoridade internacional
competente e dotada de forças suficientes, e esgotados todos os meios de
negociação pacífica, não se poderá negar aos governos o direito de
legítima defesa.
- É preciso considerar com
rigor as condições estritas de uma legítima defesa pela força militar. A
gravidade de tal decisão a submete a condições rigorosas de legitimidade
moral. É preciso ao mesmo tempo que:
- o dano infligido pelo agressor à nação ou à
comunidade de nações seja durável, grave e certo;
- todos os outros meios de pôr fim a tal dano se
tenham revelado impraticáveis ou ineficazes;
- estejam reunidas as condições sérias de êxito;
- o emprego das armas não acarrete males e
desordens mais graves do que o mal a eliminar. O poderio dos meios modernos de
destruição pesa muito na avaliação desta condição.
Estes são os elementos tradicionais enumerados na
chamada doutrina da "guerra justa".
A avaliação dessas condições de legitimidade
moral cabe ao juízo prudencial daqueles que estão encarregados do bem comum.
- Os poderes públicos tomarão
as justas providências com relação ao caso daqueles que se dedicam ao
serviço da pátria na vida militar, isto e, estão a serviço da segurança e
da liberdade dos povos. Se desempenham corretamente sua tarefa, concorrem
verdadeiramente para o bem comum da nação e para manter a paz.
- Os poderes públicos devem
prever eqüitativamente o caso daqueles que recusam o emprego das armas por
motivos de consciência, mas que continuam obrigados a servir sob outra
forma à comunidade humana.
- A Igreja e a razão humana
declaram a validade permanente da lei moral durante os conflitos armados.
"Quando, por infelicidade, a guerra já se iniciou, nem tudo se torna
lícito entre as partes inimigas."
- E preciso respeitar e
tratar com humanidade os não-com-batentes, os soldados feridos e os
prisioneiros.
Os atos deliberadamente contrários ao direito dos
povos e a seus princípios universais, como as ordens que os determinam,
constituem crimes. Uma obediência cega não é suficiente para escusar os que se
submetem a esses atos e ordens. Portanto, o extermínio de um povo, de uma nação
ou uma de minoria étnica deve ser condenado como pecado mortal. Deve-se
moralmente resistir às ordens que impõem um genocídio.
- "Qualquer ação bélica
que tem em vista a destruição indiscriminadamente nada de cidades inteiras
ou de vastas regiões, com seus habitantes, é um crime contra Deus e contra
o próprio homem a ser condenado com firmeza e sem hesitações." Um dos
riscos da guerra moderna é dar ocasião aos possuidores de armas
científicas, principalmente atômicas, biológicas ou químicas, de cometerem
tais crimes.
- A acumulação de armas
parece a muitos urna maneira paradoxal de dissuadir da guerra os eventuais
adversários. Vêem nisso o mais eficaz dos meios suscetíveis de garantir a
paz entre as nações. Este procedimento de dissuasão impõe severas reservas
morais. A corrida aos armamentos não garante a paz. Longe de eliminar as
causas da guerra, corre o risco de agravá-las. O dispêndio de riquezas
fabulosas na fabricação de n ovas armas sempre impede de socorrer as
populações indigentes e entrava o desenvolvimento dos povos. O
superarmamento multiplica as razões de conflitos e aumenta o risco de
esses conflitos se multiplicarem.
- A produção e o comércio de
armas afetam o bem comum das nações e da comunidade internacional. Por
isso as autoridades públicas têm o direito e o dever de regulamentá-los. A
busca de interesses privados ou coletivos a curto prazo não pode legitimar
empreendimentos que fomentem a violência e os conflitos entre as nações e
que comprometam a ordem jurídica internacional.
- As injustiças, as
desigualdades excessivas de ordem econômica ou social, a inveja, a
desconfiança e o orgulho que grassam entre os homens e as nações ameaçam
sem cessar paz e causam as guerras. Tudo o que for feito para vencer essas
desordens contribui para edificar a paz e evitar a guerra:
Pecadores que são, os homens vivem em perigo de
guerra, e este perigo os ameaçará até a volta de Cristo. Mas, na medida em que,
unidos pela caridade, superem o pecado, superarão igualmente as violências, até
que se cumpra a palavra: "De suas espadas eles forjarão relhas de arado, e
de suas lanças, foices. Uma nação não levantará a espada contra a outra, e já
não se adestrarão para a guerra" (Is 2,4).
RESUMINDO
- "Deus tem em seu
poder a alma de todo ser vivo e o espírito de todo homem carnal" (Jó
12,10).
- Toda vida humana, desde
o momento da concepção até a morte, é sagrada, porque a pessoa humana foi
querida por si mesma à imagem e à semelhança do Deus vivo e santo.
- O assassinato de um ser
humano é gravemente contrário à dignidade da pessoa e à santidade do
Criador.
- A proibição de matar não
ab-roga o direito de tirar a um opressor injusto a possibilidade de
prejudicar. A legítima defesa é um dever grave para quem é responsável
pela vida alheia ou pelo bem comum.
- Desde a concepção, a
criança tem o direito à vida. O aborto direto, isto é, o que se quer como
um fim ou como um meio, é uma pratica infame" , gravemente contrária
à lei moral. A Igreja condena com pena canônica de excomunhão este delito
contra a vida humana.
- Visto que deve ser
tratado como uma pessoa desde a sua concepção, o embrião deve ser
defendido em sua integridade, cuidado e curado como qualquer outro ser
humano.
- A eutanásia voluntária,
sejam quais forem as formas e os motivos, constitui um assassinato. E
gravemente contrária à dignidade da pessoa humana e ao respeito do Deus
vivo, seu Criador.
- O suicídio é gravemente
contrario a Justiça, à esperança e à caridade. É proibido pelo quinto
mandamento.
- O escândalo constitui
uma falta grave quando, por ação ou por omissão, leva deliberadamente o
outro a pecar gravemente.
- Por causa dos males e
injustiças que toda guerra acarreta, devemos fazer tudo o que for
razoavelmente possível para evitá-la. A Igreja ora: "Da fome, da
peste e da guerra livrai-nos, Senhor".
- A Igreja e a razão
humana declaram a validade permanente da lei moral durante os conflitos
armados. As práticas de1iberadamente contrárias ao direito dos povos e a
seus princípios universais constituem crimes.
- "A corrida
armamentista é uma praga extremamente grave da humanidade e lesa os pobres
de maneira intolerável.
- "Bem-aventurados os
que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus" (Mt 5,9).
ARTIGO 6
O SEXTO
MANDAMENTO
"Não cometerás adultério" (Ex 20, 14)
Ouvistes o que foi dito: "Não cometerás
adultério". Eu, porém, vos digo: todo aquele que olha para uma mulher com
desejo libidinoso já cometeu adultério com ela em seu coração (Mt 5,27-28).
I. "Homem e mulher os criou..."
- "Deus é amor e vive em
si mesmo um mistério de comunhão pessoal de amor. Criando-a à sua
imagem... Deus inscreve na humanidade do homem e da mulher a vocação e,
assim a capacidade e a responsabilidade do amor e da comunhão."
"Deus criou o homem à sua imagem... homem e
mulher ele os criou" (Gn 1,27); "Crescei e multiplicai-vos" (Gn
1,28); "No dia em que Deus criou o homem, Ele o fez à semelhança de Deus.
Homem e mulher Ele os criou, abençoou-os e lhes deu o nome 'homem', no dia em
que foram criados" (Gn 5,1-2).
- A sexualidade afeta todos
os aspectos da pessoa humana, em sua unidade de corpo e alma. Diz respeito
particularmente à afetividade, à capacidade de amar e de procriar e, de
uma maneira mais geral, à aptidão a criar vínculos de comunhão com os
outros.
- Cabe a cada um, homem e
mulher, reconhecer e aceitar sua identidade sexual. A diferença e a complementaridade
físicas, morais e espirituais estão orientadas para os bens do casamento e
para o desabrochar da vida familiar. A harmonia do casal e da sociedade
depende, em parte, da maneira como se vivem entre os sexos a
complementaridade, a necessidade e o apoio mútuos.
- "Ao criar o ser
humano, homem e mulher, Deus dá a dignidade pessoal de modo igual ao homem
e à mulher." "O homem é uma pessoa, e isto na mesma medida para
o homem e para a mulher, pois ambos são criados à imagem e à semelhança de
um Deus pessoal."
- Cada um dos dois sexos é,
com igual dignidade, embora de maneira diferente, imagem do poder e da
ternura de Deus. A união do homem e da mulher no casamento é uma maneira
de imitar na carne a generosidade e a fecundidade do Criador: "O
homem deixa seu pai e sua mãe, se une à sua mulher, e eles se tomam uma só
carne" (Gn 2,24). Dessa união procedem todas as gerações humanas.
- Jesus veio restaurar a
criação na pureza de sua origem. No Sermão da Montanha, Ele interpreta de
maneira rigorosa o plano de Deus: "Ouvistes o que foi dito: 'Não
cometerás adultério'. Eu, porém, vos digo: todo aquele que olha para uma
mulher com desejo libidinoso já cometeu adultério com ela em seu
coração" (Mt 5,27-28). O homem não deve separar o que Deus uniu.
A Tradição da Igreja entendeu o sexto mandamento
como englobando o conjunto da sexualidade humana.
II. A vocação à castidade
- A castidade significa a
integração correta da sexualidade na pessoa e, com isso, a unidade
interior do homem em seu ser corporal e espiritual. A sexualidade, na qual
se exprime a pertença do homem ao mundo corporal e biológico, torna-se
pessoal e verdadeiramente humana quando é integrada na relação de pessoa a
pessoa, na doação mútua integral e temporalmente ilimitada do homem e da
mulher.
A virtude da castidade comporta, portanto, a
integridade da pessoa e a integralidade da doação.
A INTEGRIDADE DA PESSOA
- A pessoa casta mantém a
integridade das forças vitais de amor depositadas nela. Esta integridade
garante a unidade da pessoa e se opõe a todo comportamento que venha
feri-la; não tolera nem a vida dupla nem a linguagem dupla.
- A castidade comporta uma
aprendizagem do domínio de si que é uma pedagogia da liberdade humana. A
alternativa é clara ou o homem comanda suas paixões e obtém a paz, ou se
deixa subjugar por elas e se torna infeliz. "A dignidade do homem
exige que ele possa agir de acordo com uma opção consciente e livre, isto
é, movido e levado por convicção pessoal e não por força de um impulso
interno cego ou debaixo de mera coação externa. O homem consegue esta
dignidade quando, libertado de todo cativeiro das paixões, caminha para o
seu fim pela escolha livre do bem procura eficazmente os meios aptos com
diligente aplicação."
- Aquele que quer permanecer
fiel às promessas do Batismo e resistir às tentações empenhar-se-á em usar
os meios: o conhecimento de si, a prática de uma ascese adaptada às
situações em que se encontra, a obediência aos mandamentos divinos, a
prática das virtudes morais e a fidelidade à oração. "A castidade nos
recompõe, reconduzindo-nos a esta unidade que tínhamos perdido do quando
nos dispersamos na multiplicidade."
- A virtude da castidade é
comandada pela virtude cardeal da temperança, que tem em vista fazer
depender da razão a paixões e os apetites da sensibilidade humana.
- O domínio de si mesmo é um
trabalho a longo prazo. Nunca deve ser considerado definitivamente
adquirido. Supõe um esforço a ser retomado em todas as idades da vida. O
esforço necessário pode ser mais intenso em certas épocas, por exemplo,
quando se forma a personalidade, durante a infância e a adolescência.
- A castidade tem leis de
crescimento. Este crescimento passa por graus, marcados pela imperfeição e
muitas vezes pelo pecado. "Dia a dia o homem virtuoso e casto se
constrói por meio de opções numerosas e livres. Assim, ele conhece, ama e
realiza o bem moral seguindo as etapas de um crescimento."
- A castidade representa uma
tarefa eminentemente pessoal. Mas implica também um esforço cultural,
porque "o homem desenvolve-se em todas as suas qualidades mediante a
comunicação com os outros". A castidade supõe o respeito pelos
direitos da pessoa, particularmente o de receber uma informação e uma
educação que respeitem as dimensões morais e espirituais da vida humana.
- A castidade é uma virtude
moral. É também um dom de Deus, uma graça, um fruto da obra espiritual. O
Espírito Santo concede o dom de imitar a pureza de Cristo àquele que foi
regenerado pela água do Batismo.
A INTEGRALIDADE DA DOAÇÃO DE SI MESMO
- A caridade é a forma de
todas as virtudes. Influenciada por ela, a castidade aparece como uma
escola de doação da pessoa. O domínio de si mesmo está ordenado para a
doação de si mesmo. A castidade leva aquele que a pratica a tornar-se para
o próximo uma testemunha da fidelidade e da ternura de Deus.
- A virtude da castidade
desabrocha na amizade. Mostra ao discípulo como seguir e imitar Aquele que
nos escolheu como seus próprios amigos, se doou totalmente a nós e nos faz
Participar de sua condição divina. A castidade é promessa de imortalidade.
A castidade se expressa principalmente na amizade
ao próximo. Desenvolvida entre pessoas do mesmo sexo ou de sexos diferentes, a
amizade representa um grande bem para todos e conduz à comunhão espiritual.
AS DIVERSAS FORMAS DE CASTIDADE
- Todo batizado é chamado à castidade.
O cristão "se vestiu de Cristo", modelo de toda castidade. Todos
os fiéis de Cristo são chamados a levar uma vida casta segundo seu
específico estado de vida. No momento do Batismo, o cristão se comprometeu
a viver sua afetividade na castidade.
- "A castidade há de
distinguir as pessoas de acordo com seus diferentes estados de vida: umas
na virgindade ou no celibato consagrado, maneira eminente de se dedicar
mais facilmente a Deus com um coração indiviso; outras, da maneira como a
lei moral determina, conforme forem casados ou celibatários." As
pessoas casadas são convidadas a viver a castidade conjugal; os outros
praticam a castidade na continência:
Existem três formas da virtude da castidade: a
primeira, dos esposos; a segunda, da viuvez; a terceira, da virgindade. Nós não
louvamos uma delas excluindo as outras. Nisso a disciplina da Igreja é rica.
- Os noivos são convidados a
viver a castidade na continência. Nessa provação eles verão uma descoberta
do respeito mútuo, urna aprendizagem da fidelidade e da esperança de se
receberem ambos da parte de Deus. Reservarão para o tempo do casamento as
manifestações de ternura específicas do amor conjugal. Ajudar-se-ão
mutuamente a crescer na castidade.
AS OFENSAS À CASTIDADE
- A luxúria é um desejo
desordenado ou um gozo desregrado do prazer venéreo. O prazer sexual é
moralmente desordenado quando é buscado por si mesmo, isolado das
finalidades de procriação e de união.
- Por masturbação se deve
entender a excitação voluntária dos órgãos genitais, a fim de conseguir um
prazer venéreo. "Na linha de uma tradição constante, tanto o
magistério da Igreja como o senso moral dos fiéis afirmaram sem hesitação
que a masturbação é um ato intrínseca e gravemente desordenado."
Qualquer que seja o motivo, o uso deliberado da faculdade sexual fora das
relações conjugais normais contradiz sua finalidade. Aí o prazer sexual é
buscado fora da "relação sexual exigida pela ordem moral, que
realiza, no contexto de um amor verdadeiro, o sentido integral da doação
mútua e da procriação humana".
Para formar um justo juízo sobre a
responsabilidade moral dos sujeitos e orientar a ação pastoral, dever-se-á
levar em conta a imaturidade afetiva, a força dos hábitos contraídos, o estado
de angústia ou outros fatores psíquicos ou sociais que minoram ou deixam mesmo
extremamente atenuada a culpabilidade moral.
- A fornicação é a união
carnal fora do casamento entre um homem e uma mulher livres. É gravemente
contrária à dignidade das pessoas e da sexualidade humana, naturalmente
ordenada para o bem dos esposos, bem como para a geração e a educação dos
filhos. Além disso, é um escândalo grave quando há corrupção de jovens.
- A pornografia consiste em
retirar os atos sexuais, reais ou simulados, da intimidade dos parceiros
para exibi-los a terceiros de maneira deliberada. Ela ofende a castidade
porque desnatura o ato conjugal, doação íntima dos esposos entre si.
Atenta gravemente contra a dignidade daqueles que a praticam (atores,
comerciantes, público), porque cada um se torna para o outro objeto de um
prazer rudimentar e de um proveito ilícito, Mergulha uns e outros na
ilusão de um mundo artificial. E uma falta grave. As autoridades civis
devem impedir a produção e a distribuição de materiais pornográficos.
- A prostituição vai contra a
dignidade da pessoa que se prostitui, reduzida, assim, ao prazer venéreo
que dela se obtém. Aquele que paga peca gravemente contra si mesmo; viola
a castidade à qual se comprometeu em seu Batismo e mancha seu corpo,
templo do Espírito Santo. A prostituição é um flagelo social. Envolve
comumente mulheres, mas homens, crianças ou adolescentes (nestes dois
últimos casos, ao pecado soma-se um escândalo). Se é sempre gravemente
pecaminoso entregar-se à prostituição, a miséria, a chantagem e a pressão
social podem atenuar a imputabilidade da falta.
- O estupro designa a
penetração à força, com violência, na intimidade sexual de uma pessoa.
Fere a justiça e a caridade. O estupro lesa profundamente o direito de
cada um ao respeito, à liberdade, à integridade física e moral. Provoca um
dano grave que pode marcar a vítima por toda a vida. E sempre um ato
intrinsecamente mau. Mais grave ainda é o estupro cometido pelos pais (cf.
incesto) ou educadores contra as criança que lhes são confiadas.
CASTIDADE E HOMOSSEXUALIDADE
- A homossexualidade designa
as relações entre homens e mulheres que sentem atração sexual, exclusiva
ou predominante, por pessoas do mesmo sexo. A homossexualidade se reveste
de formas muito variáveis ao longo dos séculos e das culturas. Sua gênese
psíquica continua amplamente inexplicada. Apoiando-se na Sagrada
Escritura, que os apresenta como depravações graves, a tradição sempre
declarou que "os atos de homossexualidade são intrinsecamente
desordenados". São contrários à lei natural. Fecham o ato sexual ao
dom da vida. Não procedem de uma complementaridade afetiva e sexual
verdadeira. Em caso algum podem ser aprovados.
- Um número não
negligenciável de homens e de mulheres apresenta tendências homossexuais
profundamente enraizadas. Esta inclinação objetivamente desordenada
constitui, para a maioria, uma provação. Devem ser acolhidos com respeito,
compaixão e delicadeza. Evitar-se-á para com eles todo sinal de
discriminação injusta. Estas pessoas são chamadas a realizar a vontade de
Deus em sua vida e, se forem cristãs, a unir ao sacrifício da cruz do
Senhor as dificuldades que podem encontrar por causa de sua condição.
- As pessoas homossexuais são
chamadas à castidade. Pelas virtudes de autodomínio, educadoras da
liberdade interior, às vezes pelo apoio de uma amizade desinteressada,
pela oração e pela graça sacramental, podem e devem se aproximar, gradual
e resolutamente, da perfeição cristã.
III. O amor entre os esposos
- A sexualidade está ordenada
para o amor conjugal entre o homem e a mulher. No casamento, a intimidade corporal
dos esposos se torna um sinal e um penhor de comunhão espiritual. Entre os
batizados, os vínculos do matrimônio são santificados pelo sacramento.
- "A sexualidade,
mediante a qual o homem e a mulher se doam um ao outro com os atos
próprios e exclusivos dos esposos, não é em absoluto algo puramente
biológico, mas diz respeito ao núcleo íntimo da pessoa humana como tal.
Ela só se realiza de maneira verdadeiramente humana se for parte integral
do amor com o qual homem e mulher se empenham totalmente um para com o
outro até a morte"
Tobias levantou-se do leito e disse a Sara:
"Levanta-te, minha irmã, oremos e peçamos a nosso Senhor que tenha
compaixão de nós e nos salve". Ela se levantou e começaram a orar e a
pedir para obterem a salvação. Ele começou dizendo: "Bendito sejas tu,
Deus de nossos pais... Tu criaste Adão e para ele criaste Eva, sua mulher, para
ser seu sustentáculo e amparo, e para que de ambos derivasse a raça humana. Tu
mesmo disseste: 'Não é bom que o homem fique só; façamo-lhe uma auxiliar
semelhante a ele. E agora não é por desejo impuro que tomo esta minha irmã, mas
com reta intenção. Digna4e ter piedade de mim e dela e conduzir-nos juntos a
uma idade avançada". E disseram em coro: "Amém, amém". E se
deitaram para passar a noite (Tb 8,4-9).
- "Os atos com os quais
os cônjuges se unem íntima e castamente são honestos e dignos. Quando
realizados de maneira verdadeiramente humana, significam e favorecem a
mútua doação pela qual os esposos se enriquecem com o coração alegre e
agradecido." A sexualidade é fonte de alegria e de prazer:
O próprio Criador... estabeleceu que nesta função
(i.é, de geração) os esposos sentissem prazer e satisfação do corpo e do
espírito. Portanto, os esposos não fazem nada de mal em procurar este prazer e
em gozá-lo. Eles aceitam o que o Criador lhes destinou. Contudo, os esposos
devem saber manter-se nos limites de uma moderação justa.
- Pela união dos esposos
realiza-se o duplo fim do matrimônio: o bem dos cônjuges e a transmissão
da vida. Esses dois significados ou valores do casamento não podem ser
separados sem alterar a vida espiritual do casal e sem comprometer os bens
matrimoniais e o futuro da família.
Assim, o amor conjugal entre o homem e a mulher
atende à dupla exigência da fidelidade e da fecundidade.
A FIDELIDADE CONJUGAL
- O casal de cônjuges forma
"uma íntima comunhão de vida e de amor que o Criador fundou e dotou
com suas leis. Ela é instaurada pelo pacto conjugal, ou seja, o
consentimento pessoal irrevogável". Os dois se doam definitiva e
totalmente um ao outro. Não são mais dois, mas formam doravante uma só
carne. A aliança contraída livremente pelos esposos lhes impõe a obrigação
de a manter una e indissolúvel. "O que Deus uniu, o homem não
separe" (Mc 10,9).
- A fidelidade exprime a
constância em manter a palavra dada. Deus é fiel. O sacramento do
Matrimônio faz o homem e a mulher entrarem na fidelidade de Cristo à sua
Igreja. Pela castidade conjugal, eles testemunham este mistério perante o
mundo.
S. João Crisóstomo sugere aos homens
recém-casados que falem assim à sua esposa: "Tomei-te em meus braços,
amo-te, prefiro-te à minha própria vida. Porque a vida presente não é nada, e o
meu sonho mais ardente é passá-la contigo, de maneira que estejamos certos de
não sermos separados na vida futura que nos está reservada... Ponho teu amor
acima de tudo, e nada me seria mais penoso que não ter os mesmos pensamentos
que tu tens".
A FECUNDIDADE DO MATRIMÔNIO
- A fecundidade é um dom,
enfim do Matrimônio, porque o amor conjugal tende naturalmente a ser
fecundo. O filho não vem de fora acrescentar-se ao amor mútuo dos esposos;
surge no próprio âmago dessa doação mútua, da qual é fruto e realização. A
Igreja, que "está do lado da vida", ensina que "qualquer
ato matrimonial deve permanecer aberto à transmissão da vida".
"Esta doutrina, muitas vezes exposta pelo Magistério, está fundada na
conexão inseparável, que Deus quis e que o homem não pode alterar por sua
iniciativa, entre os dois significados do ato conjugal: o significado
unitivo e o significado procriador."
- Chamados a dar vida, os
esposos participam do poder criador e da paternidade de Deus. "Os
cônjuges sabem que, no oficio de transmitir a vida e de serem educadores o
qual deve ser considerado como missão própria deles -, são cooperadores do
amor de Deus criador e como que seus intérpretes. Por isso desempenharão
seu múnus com responsabilidade cristã e humana."
- Um aspecto particular desta
responsabilidade diz respeito à regulação da procriação. Por razões
justas, os esposos podem querer espaçar os nascimentos de seus filhos.
Cabe-lhes verificar que seu desejo não provém do egoísmo, mas está de
acordo com a justa generosidade de uma paternidade responsável. Além
disso, regularão seu comportamento segundo os critérios objetivos da
moral.
A moralidade da maneira de agir, quando se trata
de harmonizar o amor conjugal com a transmissão responsável da vida, não
depende apenas da intenção sincera e da reta apreciação dos motivos, mas deve
ser determinada segundo critérios objetivos tirados da natureza da pessoa e de seus
atos, critérios esses que respeitam o sentido integral da doação mútua e da
procriação humana no contexto do verdadeiro amor. Tudo isso é impossível se a
virtude da castidade conjugal não for cultivada com sinceridade.
- "Salvaguardando estes
dois aspectos essenciais, unitivo e procriador, o ato conjugal conserva
integralmente o sentido de amor mútuo e verdadeiro e sua ordenação para a
altíssima vocação do homem para a paternidade."
- A continência periódica, os
métodos de regulação da natalidade baseados na auto-observação e no
recurso aos períodos infecundos estão de acordo com os critérios objetivos
da moralidade. Estes métodos respeitam o corpo dos esposos, animam a
ternura entre eles e favorecem a educação de uma liberdade autêntica. Em
compensação, é intrinsecamente má "toda ação que, ou em previsão do
ato conjugal, ou durante a sua realização, ou também durante o
desenvolvimento de suas conseqüências naturais, se proponha, como fim ou
como meio, tornar impossível a procriação"
"À linguagem nativa que exprime a recíproca
doação total dos cônjuges a contracepção impõe uma linguagem objetivamente
contraditória, a do não se doar ao outro. Deriva daqui não somente a recusa
positiva de abertura à vida, mas também uma falsificação da verdade interior do
amor conjugal, chamado a doar-se na totalidade pessoal." Esta diferença
antropológica e moral entre a contracepção e o recurso aos ritmos periódicos
"envolve duas concepções da pessoa e da sexualidade humana irredutíveis
entre si".
- "Estejam todos certos
de que a vida dos homens e a missão de transmiti-la não se confinam ao
tempo presente nem se podem medir ou entender por esse tempo apenas, mas
estão sempre relacionadas com a destinação eterna dos homens."
- O Estado é responsável pelo
bem-estar dos cidadãos. Por isso, é legítimo que ele intervenha para
orientar a demografia da população. Pode fazer isso mediante uma
informação objetiva e respeitosa, mas nunca por via autoritária e por
coação. O Estado não pode legitimamente substituir a iniciativa dos
esposos, primeiros responsáveis pela procriação e educação de seus filhos.
O Estado não está autorizado a intervir neste campo, com meios contrários
à lei moral.
O DOM DO FILHO
- A Sagrada Escritura e a
prática tradicional da Igreja vêem nas famílias numerosas um sinal da
bênção divina e da generosidade dos pais.
- É grande o sofrimento de
casais que descobrem que são estéreis. "Que me darás?", pergunta
Abrão a Deus. "Continuo sem filho..." (Gn 15,2). "Faze-me
ter filhos também, ou eu morro", disse Raquel a seu marido Jacó (Gn
30,1).
- As pesquisas que visam
diminuir a esterilidade humana devem ser estimuladas, sob a condição de
serem postas "a serviço da pessoa humana, de seus direitos
inalienáveis, de seu bem verdadeiro e integral, de acordo com o projeto e
a vontade de Deus"
- As técnicas que provocam
uma dissociação do parentesco, pela intervenção de uma pessoa estranha ao
casal (doação de esperma ou de óvulo, empréstimo de útero), são gravemente
desonestas. Estas técnicas (inseminação e fecundação artificiais heterólogas)
lesam o direito da criança de nascer de um pai e uma mãe conhecidos dela e
ligados entre si pelo casamento. Elas traem "o direito exclusivo de
se tornar pai e mãe somente um por meio do outro"
- Praticadas entre o casal,
estas técnicas (inseminação e fecundação artificiais homólogas) são talvez
menos claras a um juízo imediato, mas continuam moralmente inaceitáveis.
Dissociam o ato sexual do ato procriador. O ato fundante da existência dos
filhos já não é um ato pelo qual duas pessoas se doam uma à outra, mas um
ato que remete a vida e a identidade do embrião para o poder dos médicos e
biólogos, e instaura um domínio da técnica sobre a origem e a destinação
da pessoa humana. Tal relação de dominação é por si contrária à dignidade
e à igualdade que devem ser comuns aos pais e aos filhos". "A
procriação é moralmente privada de sua perfeição própria quando não é
querida como o fruto do ato conjugal, isto é, do gesto específico da união
dos esposos... Somente o respeito ao vínculo que existe entre os significados
do ato conjugal e o respeito pela unidade do ser humano permite uma
procriação de acordo com a dignidade da pessoa."
- O filho não é algo devido,
mas um dom. O "dom mais excelente do matrimônio" e uma pessoa
humana. O filho não pode ser considerado corno objeto de propriedade, a
que conduziria o reconhecimento de um pretenso "direito ao
filho". Nesse campo, somente o filho possui verdadeiros direitos: o
"de ser o fruto do ato específico do amor conjugal de seus pais, e
também o direito de ser respeitado como pessoa desde o momento de sua
concepção".
- O Evangelho mostra que a
esterilidade física não é um mal absoluto. Os esposos que, depois de terem
esgotado os recursos legítimos da medicina, sofrerem de infantilidade
unir-se-ão à Cruz do Senhor, fonte de toda fecundidade espiritual. Podem
mostrar sua generosidade adotando crianças desamparadas ou prestando
relevantes serviços em favor do próximo.
IV. As ofensas á dignidade do matrimônio
- O adultério. Esta palavra
designa a infidelidade conjugal. Quando dois parceiros, dos quais ao menos
um é casado, estabelecem entre si uma relação sexual, mesmo efêmera,
cometem adultério. Cristo condena o adultério mesmo de simples desejo. O
sexto mandamento e o Novo Testamento proscrevem absolutamente o adultério.
Os profetas denunciam sua gravidade. Vêem no adultério a figura do pecado
de idolatria.
- O adultério é uma
injustiça. Quem o comete falta com seus compromissos. Fere o sinal da
Aliança que é o vínculo matrimonial, lesa o direito do outro cônjuge e
prejudica a instituição do casamento, violando o contrato que o
fundamenta. Compromete o bem da geração humana e dos filhos, que têm
necessidade da união estável dos pais.
O DIVÓRCIO
- O Senhor Jesus insistiu na
intenção original do Criador, que queria um casamento indissolúvel.
Ab-roga as tolerâncias que se tinham introduzido na Lei antiga.
Entre batizados, o matrimonio ratificado e
consumado não pode ser dissolvido por nenhum poder humano nem por nenhuma
causa, exceto a morte".
- A separação dos esposos com
a manutenção do vínculo matrimonial pode ser legítima em certos casos
previstos pelo Direito canônico (cf. CIC, cân. 1151-1155).
Se o divórcio civil for a única maneira possível
de garantir certos direitos legítimos, o cuidado dos filhos ou a defesa do
patrimônio, pode ser tolerado sem constituir uma falta moral.
- O divórcio é uma ofensa
grave à lei natural. Pretende romper o contrato livremente consentido
pelos esposos de viver um com o outro até a morte. O divórcio lesa a
Aliança de salvação da qual o matrimônio sacramental é o sinal. O fato de
contrair nova união, mesmo que reconhecida pela lei civil, aumenta a
gravidade da ruptura; o cônjuge recasado passa a encontrar-se em situação
de adultério público e permanente:
Se o marido, depois de se separar de sua mulher,
se aproximar de outra mulher, se torna adúltero, porque faz essa mulher cometer
adultério; e a mulher que habita com ele é adúltera, porque atraiu a si o
marido de outra.
- O caráter imoral do
divórcio deriva também da desordem que introduz na célula familiar e na
sociedade. Esta desordem acarreta graves danos: para o cônjuge que fica
abandonado; para os filhos, traumatizados pela separação dos pais, e
muitas vezes disputados entre eles (cada um dos cônjuges querendo os
filhos para si); e seu efeito de contágio, que faz dele urna verdadeira
praga social.
- Pode acontecer que um dos
cônjuges seja a vítima inocente do divórcio decidido pela lei civil; neste
caso, ele não viola o preceito moral. Existe uma diferença considerável
entre o cônjuge que se esforçou sinceramente por ser fiel ao sacramento do
Matrimônio e se vê injustamente abandonado e aquele que, por uma falta
grave de sua parte, destrói um casamento canonicamente válido.
OUTRAS OFENSAS Á DIGNIDADE DO CASAMENTO
- É compreensível o drama de
quem, desejoso de se converter ao Evangelho, se vê obrigado a repudiar uma
ou várias mulheres com as quais viveu anos de vida conjugal. Contudo, a
poligamia não se coaduna com a lei moral. "Opõe-se radicalmente à
comunhão conjugal, pois nega diretamente o plano de Deus tal como nos foi
revelado nas origens, porque contrária à igual dignidade pessoal entre o
homem e a mulher, que no matrimônio se doam com um amor total e por isso
mesmo único e exclusivo." O cristão que foi polígamo está gravemente
obrigado por justiça a honrar as obrigações contraídas para com as suas
antigas mulheres, bem como para com os filhos.
- O incesto designa relações
íntimas entre parentes ou pessoas afins, em grau que proíba entre eles o
casamento. S. Paulo estigmatiza esta falta particularmente grave: "É
geral ouvir-se falar de mau comportamento entre vós... um dentre vós vive
com a mulher de seu pai... E preciso que, em nome Senhor Jesus...
entreguemos tal homem a Satanás para a perda de sua carne..." (1 Cor
5,1.3-5). O incesto corrompe as relações familiares e indica como que uma
regressão à animalidade.
- Podemos ligar ao incesto os
abusos sexuais perpetrados por adultos contra crianças ou adolescentes
confiados à sua guarda. A falta é acrescida, então, de um dano escandaloso
causado à integridade física e moral dos jovens, que ficarão marcados por
toda a vida, e de uma violação da responsabilidade educativa.
- Existe união livre quando o
homem e a mulher se recusam a dar uma forma jurídica e pública a uma
ligação que implica intimidade sexual.
A expressão é enganosa: com efeito, que
significado pode ter uma união na qual as pessoas não se comprometem mutuamente
e revelam, assim, uma falta de confiança na outra, em si mesma ou no futuro?
A expressão abrange situações diferentes:
concubinato, recusa do casamento enquanto tal, incapacidade de assumir
compromissos a longo prazo. Todas essas situações ofendem a dignidade do
matrimônio, destroem a própria idéia da família, enfraquecem o sentido da
fidelidade. São contrárias à lei moral. O ato sexual deve ocorrer
exclusivamente no casamento; fora dele, é sempre um pecado grave e exclui da
comunhão sacramental.
- Muitos reclamam hoje uma
espécie de "direito à experiência" quando há intenção de se
casar. Qualquer que seja a firmeza do propósito dos que se envolvem em
relações sexuais prematuras, "estas não permitem garantir em sua
sinceridade e fidelidade a relação interpessoal de um homem e uma mulher
e, principalmente, protegê-los contra as fantasias e os caprichos". A
união carnal não é moralmente legítima, a não ser quando se instaura uma
comunidade de vida definitiva entre o homem e a mulher. O amor humano não
tolera a "experiência". Ele exige urna doação total e definitiva
das pessoas entre si.
RESUMINDO
- "O amor é a vocação
fundamental e originária do ser humano."
- Ao criar o ser humano,
homem e mulher, Deus dá a dignidade pessoal de uma maneira igual a ambos.
Cada um, homem e mulher, deve chegar a reconhecer e aceitar sua identidade
sexual.
- Cristo é o modelo da
castidade. Todo batizado é chamado a levar uma vida casta, cada um segundo
seu estado de vida próprio.
- A castidade significa a
integração da sexualidade na pessoa. Inclui a aprendizagem do domínio
pessoal.
- Entre os pecados gravemente
contrários à castidade é preciso citar a masturbação, a fornicação, a
pornografia e as práticas homossexuais.
- A aliança que os esposos
contraíram livremente implica um amor fiel. Impõe-lhes a obrigação de
guardar seu casamento indissolúvel.
- A fecundidade é um bem, um
dom, um fim do casamento. Dando a vida, os esposos participam da
paternidade de Deus.
- A regulação da natalidade
representa um dos aspectos da paternidade e da maternidade responsáveis. A
legitimidade das intenções dos esposos não justifica o recurso a meios
moralmente inadmissíveis (por exemplo, a esterilização direta ou a
contracepção).
- O adultério e o divórcio, a
poligamia e a união livre são ofensas graves à dignidade do casamento.
ARTIGO 7
O SÉTIMO
MANDAMENTO
Não roubarás (Ex 20,15; Cf Dt 5,19).
Não roubarás (Mt 19,18).
- O sétimo mandamento proíbe
tomar ou reter injustamente os bens do próximo ou lesá-lo, de qualquer
modo, nos mesmos bens. Prescreve a justiça e a caridade na gestão dos bens
terrestres e dos frutos do trabalho dos homens. Exige, em vista do bem
comum, o respeito à destinação universal dos bens e ao direito de
propriedade privada. A vida cristã procura ordenar para Deus e para a
caridade fraterna os bens deste mundo.
I. A destinação universal e a propriedade
privada dos bens
- No começo, Deus confiou a
terra e seus recursos à administração comum da humanidade, para que
cuidasse dela, a dominasse por seu trabalho e dela desfrutasse. Os bens da
criação são destinados a todo o gênero humano. A terra está, contudo,
repartida entre os homens para garantir a segurança de sua vida, exposta à
penúria e ameaçada pela violência. A apropriação dos bens é legítima para
garantir a liberdade e a dignidade das pessoas, para ajudar cada um a
prover suas necessidades fundamentais e as daqueles de quem está
encarregado. Deve também permitir que se manifeste uma solidariedade
natural entre os homens.
- O direito à propriedade
privada, adquirida ou recebida de modo justo, não abole a doação original
da terra ao conjunto da humanidade. A destinação universal dos bens
continua primordial, mesmo se a promoção do bem comum exige o respeito
pela propriedade privada, pelo respectivo direito e exercício.
- "Usando aqueles bens,
o homem que possui legitimamente as coisas materiais não as deve ter só
como próprias dele, mas também como comuns, no sentido de que elas possam
ser úteis não somente a ele, mas também aos outros." A propriedade de
um bem faz de seu detentor um administrador da Providência, para fazê-los
frutificar e para repartir os benefícios dessa administração a outros, a
seus parentes, em primeiro lugar.
- Os bens de produção
materiais ou imateriais -, como terras ou fábricas, competências ou
profissões, requerem os cuidados de quem os Possui para que sua
fecundidade aproveite ao maior número possível. Os detentores dos bens de
uso e de consumo devem usá-los com moderação, reservando a melhor parte ao
hóspede, ao doente e ao pobre.
- A autoridade política tem o
direito e o dever de regulamentar, em função do bem comum, o exercício
legítimo do direito de propriedade.
II. O respeito às pessoas e aos seus bens
- Em matéria econômica, o
respeito à dignidade humana exige a prática da virtude da temperança, para
moderar o apego aos bens deste mundo; da virtude da justiça, para
preservar o direitos do próximo e lhe dar o que lhe é devido; e da
solidariedade, segundo a regra áurea e segundo a liberalidade do Senhor,
que "se fez pobre, embora fosse rico, para nos enriquecer com sua
pobreza".
O RESPEITO AOS BENS DO OUTRO
- O sétimo mandamento proíbe
o roubo, isto é, a usurpação do bem de outro contra a vontade razoável do
proprietário. Não há roubo se o consentimento pode ser presumido ou se
recusa é contrária à razão e à destinação universal dos bem. É o caso da
necessidade urgente e evidente. em que o único meio de acudir às
necessidades imediatas e essenciais (ali mento, abrigo, roupa...) é dispor
e usar dos bens do outro.
- Toda maneira de tomar e de
reter injustamente o bem do outro, mesmo que não contrarie as disposições
da lei civil, é contrária ao sétimo mandamento. Assim, também, reter
deliberadamente os bens emprestados ou objetos perdidos, defraudar no
comércio, pagar salários injustos, elevar os preços especulando sobre a
ignorância ou a miséria alheia.
São ainda moralmente ilícitos a especulação, pela
qual se faz variar artificialmente a avaliação dos bens, visando levar vantagem
em detrimento do outro; a corrupção, pela qual se "compra" o
julgamento daqueles que devem tomar decisões de acordo com o direito; a
apropriação e uso privados dos bens sociais de uma empresa; os trabalhos
malfeitos; a fraude fiscal; a falsificação de cheques e de faturas; os gastos
excessivos; o desperdício. Infligir voluntariamente um prejuízo aos
proprietários privados ou públicos é contrário à lei moral e exige reparação.
- As promessas devem ser
mantidas, e os contratos, rigorosamente observados, na medida em que o
compromisso assumido for moralmente justo. Uma parte notável da vida
econômica e social depende do valor dos contratos entre pessoas físicas ou
morais. E o caso dos contratos comerciais de venda ou compra, os contratos
de locação ou de trabalho. Todo contrato deve ser feito e executado de
boa-fé.
- Os contratos estão sujeitos
à justiça comutativa, que regula as trocas entre as pessoas e entre as
instituições no pleno respeito aos seus direitos. A justiça comutativa
obriga estritamente; exige a salvaguarda dos direitos de propriedade, o
pagamento das dívidas e o cumprimento das obrigações livremente
contraídas. Sem a justiça comutativa, nenhuma outra forma de justiça é
possível.
Distingue-se a justiça comutativa da justiça
legal, que se refere àquilo que o cidadão deve eqüitativamente à comunidade, e
da justiça distributiva, que regula o que a comunidade deve aos cidadãos
proporcionalmente às suas contribuições e às suas necessidades.
- Em virtude da justiça
comutativa, a reparação da injustiça cometida exige a restituição do bem
furtado a seu proprietário:
Jesus abençoa Zaqueu por causa de seu
compromisso: "Se defraudei a alguém, restituo-lhe o quádruplo" (Lc
19,8). Aqueles que, de maneira direta ou indireta, se apossaram de um bem alheio
têm obrigação de o restituir ou de devolver o equivalente em natureza ou em
espécie, se a coisa desapareceu, bem como os frutos e lucros que seu
proprietário legitimamente teria auferido. São igualmente obrigados a
restituir, proporcionalmente à sua responsabilidade e ao benefício auferido,
todos os que participaram de alguma maneira do roubo, ou tiraram proveito dele
com conhecimento de causa, como, por exemplo, Os mandantes, os que ajudaram ou
encobriram o roubo.
- Os jogos de azar (jogos de
cartas etc.) ou as apostas em si não são contrários à justiça. Tomam-se
moralmente inaceitáveis quando privam a pessoa daquilo que lhe é
necessário para suprir suas necessidades e as dos outros. A paixão pelo
jogo corre o risco de se transformar em uma dependência grave. Apostar
injustamente ou trapacear nos jogos constitui matéria grave, a menos que o
dano infligido seja tão pequeno aquele que o sofre não possa razoavelmente
considerá-lo significativo.
- O sétimo mandamento proíbe
os atos ou empreendimentos que, por qualquer razão que seja, egoísta ou
ideológica, mercantil ou totalitária, levam a escravizar seres humanos, a
desconhecer sua dignidade pessoal, a comprá-los, a vendê-los e a trocá-los
como mercadorias. É um pecado contra a dignidade das pessoas e contra seus
direitos fundamentais reduzi-las, pela violência, a um valor de uso ou a
uma fonte lucro. S. Paulo ordenava a um patrão cristão que tratasse seu
escravo cristão "não mais corno escravo, mas como um irmão..., como
um homem, no Senhor" (Fm 16).
O RESPEITO PELA INTEGRIDADE DA CRIAÇÃO
- O sétimo mandamento manda
respeitar a integridade da criação. Os animais, como as plantas e os seres
inanimados, estão naturalmente destinados ao bem comum da humanidade
passada, presente e futura. O uso dos recursos minerais. vegetais e
animais do universo não pode ser separado do respeito pelas exigências
morais. O domínio dado pelo Criador ao homem sobre os seres inanimados e
os seres vivos não é absoluto; é medido por meio da preocupação pela
qualidade de vida do próximo, inclusive das gerações futuras; exige um
respeito religioso pela integridade da criação.
- Os animais são criaturas de
Deus, que os envolve com sua solicitude providencial. Por sua simples
existência, eles o bendizem e lhe dão glória. Também os homens lhes devem
carinho. Lembremos com que delicadeza os santos, como S. Francisco de
Assis ou S. Filipe de Neri, tratavam os animais.
- Deus confiou os animais à
administração daquele que criou à sua imagem. E, portanto, legitimo
servir-se dos animais para a alimentação e a confecção das vestes. Podem
ser domesticados, para ajudar o homem em seus trabalhos e lazeres. Os
experimentos médicos e científicos em animais são práticas moralmente
admissíveis, se permanecerem dentro dos limites razoáveis e contribuírem
para curar ou salvar vidas humanas.
- É contrário à dignidade
humana, fazer os animais sofrerem inutilmente e desperdiçar suas vidas. E
igualmente indigno gastar com eles o que deveria prioritariamente aliviar
a miséria dos homens. Pode-se amar os animais, porém não se deve orientar
para eles o afeto devido exclusivamente às pessoas.
III. A doutrina social da Igreja
- "A revelação cristã
leva a uma compreensão mais profunda das leis da vida social." A
Igreja recebe do Evangelho a revelação plena da verdade do homem. Quando
ela cumpre sua missão de anunciar o Evangelho, testemunha ao homem, em
nome de Cristo, sua dignidade própria e sua vocação à comunhão de pessoas,
ensina-lhe as exigências da justiça e da paz, de acordo com a sabedoria
divina.
- A Igreja emite um juízo
moral, em matéria econômica e social, "quando o exigem os direitos
fundamentais da pessoa ou a salvação das almas". Na ordem da
moralidade, tem uma missão distinta da missão das autoridades políticas. A
Igreja se preocupa com aspectos temporais do bem comum em razão de sua
ordenação ao Sumo Bem, nosso fim último. Procura inspirar as atitudes
justas na relação com os bens terrenos e nas relações socioeconômicas.
- A doutrina social da Igreja
se desenvolveu no século XIX, por ocasião do encontro do Evangelho com a
sociedade industrial moderna, suas novas estruturas para a produção de
bens de consumo, sua nova concepção da sociedade, do Estado e da
autoridade, suas novas formas de trabalho e de propriedade. o
desenvolvimento da doutrina da Igreja, em matéria econômica e social,
atesta valor o permanente do ensinamento da Igreja e, ao mesmo tempo, o
sentido verdadeiro de sua Tradição sempre viva e ativa.
- O ensinamento social da
Igreja abrange um corpo de doutrina na que se articula à medida que a
Igreja interpreta os acontecimentos ao longo da história, à luz do
conjunto da palavra revelada por Jesus Cristo, com a assistência do
Espírito Santo. Este ensinamento se torna mais aceitável aos homens de boa
vontade quanto mais profundamente inspira a conduta dos fiéis.
- A doutrina social da Igreja
propõe princípios de reflexão apresenta critérios de juízo, orienta para a
ação.
Todo sistema segundo o qual as relações sociais
seriam inteiramente determinadas pelos fatores econômicos é contrário à
natureza da pessoa humana e de seus atos.
- Uma teoria que faz do lucro
a regra exclusiva e o fim último da atividade econômica é moralmente
inaceitável. O apetite desordenado pelo dinheiro não deixa de produzir
seus efeitos perversos. Ele é uma das causas dos numerosos conflitos que
perturbam a ordem social.
Um sistema que "sacrifica os direitos
fundamentais das pessoas e dos grupos à organização coletiva da produção"
é contrário à dignidade do homem. Toda prática que reduz as pessoas a não serem
mais que meros meios que têm em vista o lucro escraviza o homem, conduz a
idolatria do dinheiro e contribui para difundir o ateísmo. "Não podeis
servir ao mesmo tempo a Deus e ao dinheiro" (Mt 6,24; Lc 16,13).
- A Igreja tem rejeitado as
ideologias totalitárias e atéias associadas, nos tempos modernos, ao
"comunismo" ou ao "socialismo". Além disso, na prática
do "capitalismo", ela recusou o individualismo e o primado
absoluto da lei do mercado sobre o trabalho humano. A regulamentação da
economia exclusivamente por meio planejamento centralizado perverte na
base os vínculos sociais; sua regulamentação unicamente pela lei do
mercado vai contra a justiça social, "pois há muitas necessidades
humanas que não podem atendidas pelo mercado". É preciso preconizar
uma regulamentação racional do mercado e das iniciativas econômicas, de
acordo com uma justa hierarquia de valores e em vista do bem comum.
IV. A atividade econômica e a justiça
social
- O desenvolvimento das
atividades econômicas e o crescimento da produção estão destinados a
servir às necessidades dos seres humanos. A vida econômica não visa
somente multiplicar os bens produzidos e aumentar o lucro ou o poder;
antes de tudo, ela está ordenada ao serviço das pessoas, do homem em sua
totalidade e de toda a comunidade humana. Conduzida segundo seus métodos
próprios, a atividade econômica deve ser exercida dentro dos limites da
ordem moral, segundo a justiça social, a fim de corresponder ao plano de
Deus acerca do homem.
- O trabalho humano procede
imediatamente das pessoas criadas à imagem de Deus e chamadas a prolongar,
ajudando-se mutuamente, a obra da criação, dominando a terra. O trabalho
é, pois, um dever: "Quem não quer trabalhar também não há de
comer" (2Ts 3,10). O trabalho honra os dons do Criador e os talentos
recebidos. Também pode ser redentor. Suportando a pena do trabalho unido a
Jesus, o artesão de Nazaré e o crucificado do Calvário, o homem colabora
de certa maneira com o Filho de Deus em sua obra redentora. Mostra-se
discípulo de Cristo carregando a cruz, cada dia, na atividade que é
chamado a realizar. O trabalho pode ser um meio de santificação e uma
animação das realidades terrestres no Espírito de Cristo.
- No trabalho, a pessoa
exerce e realiza uma parte das capacidades inscritas em sua natureza. O
valor primordial do trabalho está ligado ao próprio homem, que é seu autor
e destinatário. O trabalho é para o homem, e não o homem para o trabalho.
Cada um deve poder tirar do trabalho os meios
para sustentar-se, a si e aos seus, bem como para prestar serviço à comunidade
humana.
- Cada um tem o direito de
iniciativa econômica, cada um usará legitimamente de seus talentos para
contribuir para uma abundância que seja de proveito para todos e para
colher os justos frutos de seus esforços. Cuidará de seguir as prescrições
emanadas das autoridades legitimas, tendo em vista o bem comum.
- A vida econômica abrange
interesses diversos, muitas vezes opostos entre si. Assim se explica o
surgimento dos conflitos que a caracterizam. Deve haver empenho no sentido
de minimiza estes últimos pela negociação que respeite os direitos e os
deveres de cada parceiro social: os responsáveis pelas empresas, os
representantes dos assalariados, por exemplo, as organizações sindicais e,
eventualmente, os poderes públicos.
- A responsabilidade do
Estado. "A atividade econômica, sobretudo a da economia de mercado,
não pode desenvolver-se num vazio institucional, jurídico e político. Ela
supõe que sejam asseguradas as garantias das liberdades individuais e da
propriedade, sem esquecer uma moeda estável e serviços públicos eficazes.
O dever essencial do Estado, no entanto, é assegurar essas garantias, para
que aqueles que trabalham possam gozar do fruto de seu trabalho e,
portanto, sentir-se estimulados a realizá-lo com eficácia e honestidade...
O Estado tem o dever de vigiar e conduzir a aplicação dos direitos humanos
no setor econômico; nessa esfera, porém, a primeira responsabilidade não
cabe ao Estado, mas às instituições e aos diversos grupos e associações
que compõem a sociedade."
- Os responsáveis pelas
empresas têm, perante a sociedade a responsabilidade econômica e ecológica
por suas operações. Têm o dever de considerar o bem das pessoas e não
apenas aumento dos lucros. Entretanto, estes são necessários, pois
permitem realizar os investimentos que garantem o futuro das empresas,
garantindo o emprego.
- O acesso ao trabalho e à
profissão deve estar aberto a todos, sem discriminação injusta: homens e
mulheres, normais e excepcionais ou deficientes, autóctones e migrantes.
Em função das circunstâncias, também a sociedade deve ajudar os cidadãos a
conseguir um trabalho e um emprego.
- O salário justo é o fruto
legítimo do trabalho. Recusá-lo ou retê-lo pode constituir uma grave
injustiça. Para se avaliar a remuneração eqüitativa, e preciso levar em
conta ao mesmo tempo as necessidades e as contribuições de cada um.
"Levando-se em consideração as funções e a produtividade, a situação
da empresa e o bem comum, a remuneração do trabalho deve garantir ao homem
e a seus familiares os recursos necessários a uma vida digna no plano
material, social, cultural e espiritual." O acordo das partes não é
suficiente para justificar moralmente o montante do salário.
- A greve é moralmente
legítima quando se apresenta como um recurso inevitável, e mesmo
necessário, em vista de um benefício proporcionado. Torna-se moralmente
inaceitável quando é acompanhada de violências ou ainda quando se lhe
atribuem objetivos não diretamente ligados às condições de trabalho ou
contrários ao bem comum.
- E injusto não pagar aos
organismos de seguridade social as cotas estipuladas pelas autoridades
legítimas.
A privação do trabalho por causa do desemprego é
quase sempre, para quem a sofre, um atentado à dignidade e uma ameaça ao
equilíbrio da vida. Além do prejuízo pessoal para o desempregado, corre também
inúmeros riscos o seu 1ar.
V. Justiça e solidariedade entre as nações
- No plano internacional, a
desigualdade dos recursos e dos meios econômicos é tão grande que provoca
entre as nações um verdadeiro "fosso". De um lado, estão os que
detêm e desenvolvem os meios de crescimento e, de outro, os que acumulam
as dívidas.
- Diversas causas, de
natureza religiosa, política, econômica e financeira, conferem hoje a
questão social uma dimensão mundial". A solidariedade é necessária
entre as nações cujas políticas já são interdependentes. E ainda mais
indispensável quando se toma preciso deter "os mecanismos
perversos" que impedem o desenvolvimento dos países menos avançados.
Urge substituir os sistemas financeiros abusivos e mesmo usurários, as
relações comerciais iníquas entre as nações e a corrida armamentista por
um esforço comum no sentido de mobilizar os recursos e objetivos de
desenvolvimento moral, cultural e econômico, "redefinindo as
prioridades e as escalas de valores".
- As nações ricas têm uma
responsabilidade moral grave para com aquelas que não podem garantir
sozinhas os próprios meios de seu desenvolvimento ou foram impedidas de
fazê-lo por trágicos acontecimentos históricos. E um dever de
solidariedade e caridade; é igualmente uma obrigação de justiça, se o
bem-estar das nações ricas provém de recursos naturais não foram
eqüitativamente pagos.
- A ajuda direta representa
uma resposta apropriada a necessidades imediatas, extraordinárias,
causadas por catástrofes naturais, epidemias etc., mas não basta para reparar
os graves prejuízos que resultam de situações de miséria nem para prover
permanentemente às necessidades. É necessário também reformar as
instituições econômicas e financeiras internacionais, para que elas
promovam melhor as relações eqüitativas com os países menos desenvolvidos.
E preciso apoiar o esforço dos países pobres trabalhando para seu
desenvolvimento e libertação. Esta doutrina deve ser aplicada de maneira
muito especial no âmbito do trabalho agrícola. Os camponeses, sobretudo
dos países menos desenvolvidos, constituem a massa preponderante dos
pobres.
- Aumentar o senso de Deus e
o conhecimento de si mesmo é a base de todo desenvolvimento completo da
sociedade humana. Este desenvolvimento completo multiplica os bens
materiais e os põe a serviço da pessoa e de sua liberdade. Diminui a
miséria e a exploração econômicas. Faz crescer o respeito pelas;
identidades culturais e a abertura para a transcendência.
- Não cabe aos pastores da
Igreja intervir diretamente na construção política e na organização da
vida social. Essa tarefa faz parte da vocação dos fiéis leigos, que agem
por própria iniciativa com seus concidadãos. A ação social pode implicar
uma pluralidade de caminhos concretos. Terá sempre em vista o bem comum e
se conformará com a mensagem evangélica e com a doutrina da Igreja. Cabe
aos fiéis leigos "animar as realidades temporais com um zelo cristão
e comportar-se como artesãos da paz e da justiça".
VI. O amor aos pobres
- Deus abençoa aqueles que
ajudam os pobres e reprova aqueles que se afastam deles: "Dá ao que
te pede e não voltes as costas ao que te pede emprestado" (Mt 5,42).
"De graça recebestes, de graça dai" (Mt 10,8). Jesus Cristo
reconhecerá seus eleitos pelo que tiverem feito pelos pobres. Temos o
sinal da presença de Cristo quando "os pobres são evangelizados"
(Mt 11,53)
- "O amor da Igreja
pelos pobres... faz parte de sua tradição constante." Inspira-se no
Evangelho das bem-aventuranças, na pobreza de Jesus e em sua atenção aos
pobres. O amor aos pobres é também um dos motivos do dever de trabalhar,
"para se ter o que partilhar com quem tiver necessidade. Não se
estende apenas à pobreza material, mas também às numerosas formas de
pobreza cultural e religiosa.
- O amor aos pobres é
incompatível com o amor imoderado das riquezas ou o uso egoísta delas:
Pois bem, agora vós, ricos, chorai e gemei por
causa das desgraças que estão para vos sobrevir. Vossa riqueza apodreceu e
vossas vestes estão carcomidas pelas traças. Vosso ouro e vossa prata estão
enferrujados, e sua ferrugem testemunhará contra vós e devorará vossas carnes.
Entesourastes como que um fogo nos tempos do fim! Lembrai-vos de que o salário,
do qual privastes os trabalhadores que ceifaram vossos campos, clama, e os
gritos dos ceifeiros chegaram aos ouvidos do Senhor dos exércitos. Viveste
faustosamente na terra e vos regalastes; vós vos saciastes no dia matança.
Condenastes o justo e o pusestes à morte: ele não resiste (Tg 5,1-6).
- São João Crisóstomo lembra
essa verdade em termos vigorosos: "Não deixar os pobres participar
dos próprios bens é roubá-los e tirar-lhes a vida. Nós não detemos nossos
bens, mas os deles." "É preciso satisfazer acima de tudo as
exigências da justiça, para que não ofereçamos como dom da caridade aquilo
que já é devido por justiça."
Quando damos aos pobres as coisas indispensáveis,
não praticamos com eles grande generosidade pessoal, mas lhes devolvemos o que
é deles. Cumprimos um dever de justiça e não tanto um ato de caridade.
- As obras de misericórdia
são as ações caritativas pelas quais socorremos o próximo em suas
necessidades corporais e espirituais. Instruir, aconselhar, consolar,
confortar são obras de misericórdia espiritual, como também perdoar e
suportar com paciência. As obras de misericórdia corporal consistem
sobretudo em dar de comer a quem tem fome, dar de beber a quem tem sede,
dar moradia aos desabrigados, vestir os maltrapilhos, visitar os doentes e
prisioneiros, sepultar os mortos. Dentre esses gestos de misericórdia, a
esmola dada aos pobres é um dos principais testemunhos da caridade fraterna.
E também uma prática de justiça que agrada a Deus.
Quem tiver duas túnicas, reparta-as com aquele
que não tem, quem tiver o que comer, faça o mesmo (Lc 3,11). Dai o que tendes
em esmola, e tudo ficará puro para vós (Lc 11,41). Se um irmão ou uma irmã não
tiverem o que vestir e lhes faltar o necessário para a subsistência de cada
dia, e alguém dentre vós lhes disser "Ide paz, aquecei-vos e saciai-vos, e
não lhes der o necessário para manutenção, que proveito haverá nisso? (Tg 2,
15-16).
- "Sob suas múltiplas
formas - extrema privação material, opressão injusta, enfermidades físicas
e psíquicas e, por fim, a morte -, a miséria humana é o sinal manifesto da
condição natural da fraqueza em que o homem se encontra após o primeiro
pecado e da necessidade de uma salvação. É por isso que ela atrai a
compaixão de Cristo Salvador, que quis assumi-la sobre si,
identificando-se com os 'mais pequeninos entre seus irmãos'. É também por
isso que todos aqueles que ela atinge são objeto de um amor preferencial
por parte da Igreja, que, desde as suas origens, apesar das falhas de
muitos de seus membros, não deixou nunca de trabalhar por aliviá-los,
defendê-los e libertá-los. Ela o faz por meio de inúmeras obras de
beneficência, que continuam a ser, sempre e por toda parte,
indispensáveis."
- Já no Antigo Testamento,
todas as medidas jurídicas (ano de perdão, proibição de empréstimo a juros
e da manutenção de penhora, obrigação do dízimo, pagamento cotidiano ao
trabalhador diarista, direito de rebusca nas vinhas e respiga nos campos)
são uma resposta à exortação do Deuteronômio:
"Nunca deixará de haver pobres na terra; é
por isso que eu te ordeno: abre a mão em favor de teu irmão que é humilhado e
pobre em tua terra" (Dt 15,11). Jesus faz suas essas palavras:
"Sempre tereis pobres convosco; mas a mim
nem sempre tereis" (Jo 12,8). Dessa forma, ele não deixa caducar a
veemência dos oráculos antigos contra aqueles que "compram o fraco com
prata e o indigente por um par de sandálias..." (Am 8,6), mas Ele nos convida
a reconhecer sua presença nos pobres, que são seus irmãos:
No dia em que sua mãe a repreendeu por manter em
casa pobres e doentes, Santa Rosa de Lima lhe replicou: "Quando servimos
aos pobres e doentes, servimos a Jesus. Não nos devemos cansar de ajudar o
próximo, porque neles é a Jesus que servimos".
RESUMINDO
- "Não roubarás"
(Dt 5,19). "Nem os ladrões, nem os avarentos... nem os rapinadores
herdarão o Reino de Deus" (1 Cor 6,10).
- O sétimo mandamento
prescreve a prática da justiça e da caridade na administração dos bens
terrenos e dos frutos do trabalho dos homens.
- Os bens da criação são
destinados a todo o gênero humanos. O direito à propriedade privada não
abole a destinação universal dos bens.
- O sétimo mandamento
proíbe o roubo. O roubo é a usurpação de um bem de outrem contra a vontade
razoável do proprietário;
- Toda forma de
apropriação e uso injusto dos bens de outrem é contrária ao sétimo
mandamento. A injustiça cometida exige reparação. A justiça comutativa
exige a restituição do bem roubado.
- A lei moral proíbe os
atos que, visando a fins mercantis ou totalitários, conduzem à servidão
dos seres humanos, à sua compra, venda e troca como mercadorias.
- O domínio concedido pelo
Criador sobre os recursos minerais, vegetais e animais do universo não
pode ser separado do respeito às obrigações morais, inclusive para com as
gerações futuras.
- Os animais são confiados
à administração do homem, que lhes deve benevolência. Podem servir para a
justa satisfação das necessidades do homem.
- A Igreja emite um juízo
em matéria econômica e social quando os direitos fundamentais da pessoa ou
a salvação das almas exigem. Preocupa-se com o bem comum temporal dos
homens em razão de sua ordenação ao Sumo Bem, nosso fim último.
- O próprio homem é o
autor, o centro e o fim de toda a vida econômica e social. O ponto
decisivo da questão social é que os bens criados por Deus para todos de
fato cheguem a todos conforme a justiça e com a ajuda da caridade.
- O valor primordial do
trabalho depende do próprio homem, que é seu autor e destinatário. Por
meio de seu trabalho, o homem participa da obra da criação. Unido a
Cristo, o trabalho pode ser redentor.
- O verdadeiro
desenvolvimento abrange o homem inteiro. O que importa é fazer crescer a
capacidade de cada pessoa de responder à sua vocação, portanto, ao
chamamento de Deus.
- A esmola dada aos pobres
é um testemunho de caridade fraterna; é também uma prática de justiça que
agrada a Deus.
- Na multidão de seres
humanos sem pão, sem teto, sem terra, como não reconhecer Lázaro, mendigo
faminto da parábo1a? Como não ouvir Jesus, que diz: "Foi a mim que o
deixastes de fazer" (Mt 25,45)?
ARTIGO 8
O OITAVO
MANDAMENTO
Não apresentarás um falso testemunho contra teu
próximo (Ex 20,16).
Ouvistes também o que foi dito aos antigos: Não
perjurarás, mas cumprirás os teus juramentos para com o Senhor (Mt 5,33).
- O oitavo mandamento proíbe
falsear a verdade nas relações com os outros. Essa prescrição moral
decorre da vocação do povo santo a ser testemunha do; seu Deus, que é e
quer a verdade. As ofensas à verdade exprimem, por palavras ou atos, uma
recusa de abraçar a retidão moral: são infidelidades fundamentais a Deus
e, neste sentido, minam as bases da Aliança.
I. Viver na verdade
- O Antigo Testamento atesta:
Deus é fonte de toda verdade. Sua Palavra é verdade. Sua lei é verdade.
"Sua fidelidade continua de geração em geração" (Sl 119,90). Uma
vez que Deus é "veraz" (Rm 3,4), os membros de seu Povo são
chamados a viver na verdade.
- Em Jesus Cristo, a verdade
de Deus se manifestou plenamente. "Cheio de graça e verdade, Ele é a
"luz do mundo" (Jo 8,12), é a Verdade.".. para que aquele
que crê em mim não permaneça nas trevas." O discípulo de Jesus
"permanece em sua palavra" para conhecer "a verdade que
liberta" (Jo 8,32) e santifica. Seguir a Jesus é viver do "Espírito
da verdade" que o Pai envia em seu nome e conduz "à verdade
plena" (Jo 16,13). Jesus ensina a seus discípulos o amor
incondicional da verdade: "Seja o vosso 'sim', sim, e o vosso 'não',
não" (Mt 5,37).
- O homem tende naturalmente
para a verdade. É obrigado a honrá-la e testemunhá-la: "É postulado
da própria dignidade que os homens todos, por serem pessoas... se sintam
por natureza impelidos e moralmente obrigados a procurar a verdade,
sobretudo a que concerne à religião. São obrigados também a aderir à verdade
conhecida e a ordenar toda a vida segundo as exigências da verdade"
- A verdade como retidão do
agir e da palavra humana tem o nome de veracidade, sinceridade ou
franqueza. A verdade ou a veracidade é a virtude que consiste em
mostrar-se verdadeiro no agir e no falar, guardando-se da duplicidade, da
simulação e da hipocrisia.
- "Os homens não
poderiam viver juntos se não tivessem confiança recíproca, quer dizer, se
não manifestassem a verdade uns aos outros." A virtude da verdade
devolve ao outro o que lhe é devido. A veracidade observa um justo meio
entre aquilo que deve ser expresso e o segredo que deve ser guardado;
implica a honestidade e a discrição. Por justiça, "um homem deve
honestamente a outro a manifestação da verdade".
- O discípulo de Cristo
aceita "viver na verdade", isto é, na simplicidade de uma vida
conforme o exemplo do Senhor permanecendo em sua verdade. "Se
dissermos que estamos em comunhão com Ele e andamos nas trevas, mentimos e
não praticamos a verdade" (1 Jo 1,6).
II. "Dar testemunho da verdade"
- Diante de Pilatos, Cristo
proclama que "veio ao mundo para dar testemunho da verdade" O
cristão não "se envergonha de dar testemunho do Senhor" (2 Tm
1,8). Nas situações que requerem a declaração da fé, o cristão deve
professá-la sem equívoco, a exemplo de S. Paulo diante de seus juizes. Ele
deve manter "uma consciência irrepreensível, constantemente, diante
de Deus e diante dos homens" (At 24,16).
- O dever dos cristãos de
tomar parte na vida da Igreja leva-os a agir como testemunhas do Evangelho
e das obrigações dele decorrentes. Esse testemunho é transmissão da fé em
palavras e atos. O testemunho é um ato de justiça que estabelece ou dá a
conhecer a verdade:
Todos os cristãos, onde quer que vivam, pelo
exemplo da vida e pelo testemunho da palavra, devem manifestar o novo homem que
pelo Batismo vestiram e a virtude do Espírito Santo que os revigorou pela
confirmação.
- O martírio é o supremo
testemunho prestado à verdade da fé; designa um testemunho que vai até a
morte. O mártir dá testemunho de Cristo, morto e ressuscitado, ao qual
está unido pela caridade. Dá testemunho da verdade da fé e da doutrina
cristã. Enfrenta a morte num ato de fortaleza. "Deixai-me ser comida
das feras. E por elas que me será concedido chegar até Deus."
- Com o maior cuidado, a
Igreja recolheu as lembranças daqueles que foram até o fim para
testemunhar a fé. São as "Atas dos Mártires" (Acta Martyrum).
Constituem os arquivos da Verdade escritos em letras de sangue:
De nada me servirão os encantos do mundo e dos
remos deste século. Melhor para mim é morrer (para me unir) a Cristo Jesus do
que reinar até as extremidades da terra. É a Ele, que morreu por nós, que eu
procuro; é a Ele, que ressuscitou por nós, que eu quero. Aproxima-se o momento
em que serei gerado... .
Eu vos bendigo por me terdes julgado digno desse
dia e dessa hora, digno de ser contado no número dos vossos mártires...
Guardastes vossa promessa, Deus da fidelidade e da verdade. Por essa graça e
por todas as coisas, eu vos louvo, vos bendigo e vos glorifico pelo eterno e
celeste sumo sacerdote, Jesus Cristo vosso Filho bem-amado. Por Ele, que está
convosco e com o Espírito, vos seja dada glória, agora e por todos os séculos.
Amém.
III. As ofensas à verdade
- Os discípulos de Cristo
"revestiram-se do homem novo, criado segundo Deus, na justiça e
santidade da verdade" (Ef 4,24). "Livres da mentira" (Ef
4,25), devem "rejeitar toda maldade, toda mentira, todas as formas de
hipocrisia, de inveja c maledicência" (l Pd 2,1).
- Falso testemunho e
perjúrio. Quando emitida publicamente, uma afirmação contrária à verdade
assume uma gravidade particular. Diante de um tribunal, torna-se um falso
testemunho. Quando está sob juramento, trata-se de perjúrio. Essas formas
de agir contribuem para condenar um inocente para inocentar um culpado ou
para aumentar a sanção em que incorre o acusado. Elas comprometem
gravemente exercício da justiça e a eqüidade da sentença pronunciada pelos
juizes.
- O respeito à reputação das
pessoas proíbe qualquer atitude e palavra capazes de causar um prejuízo
injusto. Torna-se culpado:
- de juízo temerário aquele que, mesmo
tacitamente, admite como verdadeiro, sem fundamento suficiente, um defeito
moral no próximo.
- de maledicência aquele que, sem razão
objetivamente válida, revela a pessoas que não sabem os defeitos e faltas de
outros.
- de calúnia aquele que, por palavras contrárias
à verdade, prejudica a reputação dos outros e dá ocasião a falsos juízos a
respeito deles.
- Para evitar o juízo
temerário, todos hão de cuidar de interpretar de modo favorável tanto
quanto possível os pensamentos, as palavras e as ações do próximo.
Todo bom cristão deve estar mais inclinado a
desculpar as palavras do próximo do que a condená-las. Se não é possível
desculpá-las, deve-se perguntar-lhe como as entende; e se ele as entende mal,
que seja corrigido com amor; e, se isso não bastar, que se procurem todos os
meios apropriados para que, compreendendo-as corretamente, se salve.
- Maledicência e calúnia
destroem a reputação e a honra do próximo. Ora, a honra é o testemunho
social prestado à dignidade humana. Todos gozam de um direito natural à
honra do próprio nome, à sua reputação e ao seu respeito. Dessa forma, a
maledicência e a calúnia ferem as virtudes da justiça e da caridade.
- Deve-se proscrever qualquer
palavra ou atitude que, por bajulação, adulação ou complacência, encoraje
e confirme o outro na malícia de seus atos e na perversidade de sua
conduta. A adulação é uma falta grave quando cúmplice de vícios ou de
pecados graves. O desejo de prestar serviço ou a amizade não justificam
uma duplicidade da linguagem. A adulação é um pecado venial quando deseja
somente ser agradável, evitar um mal, remediar uma necessidade, obter
vantagens legítimas.
- A jactância ou fanfarronice
constitui uma falta contra a verdade. O mesmo vale para a ironia, que visa
depreciar alguém caricaturando, de modo malévolo, um ou outro aspecto de
seu comportamento.
- "A mentira consiste em
dizer o que é falso com a intenção de enganar." O Senhor denuncia na
mentira uma obra diabólica: "Vós sois do diabo, vosso pai, . . nele
não há verdade: quando ele mente, fala do que lhe é próprio, porque é
mentiroso e pai da mentira" (Jo 8,44).
- A mentira é a ofensa mais
direta à verdade. Mentir é falar ou agir contra a verdade para induzir em
erro. Ferindo a relação do homem com a verdade e com o próximo, a mentira
ofende a relação fundante do homem e de sua palavra com o Senhor.
- A gravidade da mentira se
mede segundo a natureza da verdade que ela deforma, de acordo com as
circunstâncias, as intenções daquele que a comete, os prejuízos sofridos
por aqueles que são suas vítimas. Embora a mentira, em si, não constitua
senão um pecado venial, torna-se mortal quando fere gravemente as virtudes
da justiça e da caridade.
- A mentira é condenável em
sua natureza. E uma profanação da palavra que tem por finalidade comunicar
a outros a verdade conhecida. O propósito deliberado de induzir o próximo
em por palavras contrárias à verdade constitui uma falta à justiça e à
caridade. A culpabilidade é maior quando a intenção de enganar acarreta o
risco de conseqüências funestas para aqueles são desviados da verdade.
- A mentira (por ser uma
violação da virtude da veracidade) é uma verdadeira violência feita ao
outro porque o fere em sua capacidade de conhecer, que é a condição de
todo juízo e de decisão. Contém em germe a divisão dos espíritos e todos
os males que ela suscita. A mentira é funesta para toda a sociedade; mina
a confiança entre os homens e rompe o tecido das relações sociais.
- Toda falta cometida contra
a justiça e a verdade impõe o dever de reparação, mesmo que seu autor
tenha sido perdoado. Quando se toma impossível reparar um erro
publicamente, deve-se fazê-lo em segredo; se aquele que sofreu o prejuízo
não pode ser diretamente indenizado, deve-se dar-lhe satisfação
moralmente, em nome da caridade. Esse dever de reparação se refere também
às faltas cometidas contra a reputação de outrem. Essa reparação, moral e
às vezes material, será avaliada na proporção do dano causado e obriga em
consciência.
IV. O respeito à verdade
- O direito à comunicação da
verdade não é incondicional. Cada um deve conformar sua vida com o
preceito evangélico do amor fraterno. Este requer, nas situações
concretas, que se avalie se é conveniente ou não revelar a verdade àquele
que a pede.
- A caridade e o respeito à
verdade devem ditar a resposta a todo pedido de informação ou de
comunicação. O bem e a segurança do outro, o respeito à vida privada, o
bem comum são razões suficientes para se calar aquilo que não deve ser
conhecido ou para se usar uma linguagem discreta. O dever de evitar o
escândalo impõe muitas vezes uma estrita discrição. Ninguém é obrigado a
revelar a verdade a quem não tem o direito de conhecê-1a.
- O sigilo do sacramento da
Reconciliação é sagrado e não pode ser traído sob nenhum pretexto. "O
sigilo sacramental é inviolável; por isso, não é lícito ao confessor
revelar o penitente, com palavras, ou de qualquer outro modo, por nenhuma
causa."
- Os segredos profissionais
por exemplo, de políticos, militares, médicos, juristas ou as confidências
feitas sob sigilo devem ser guardados, salvo casos excepcionais em que a
retenção do segredo causasse àquele que os confia, àquele que os recebe ou
a um terceiro prejuízos muito graves e somente evitáveis pela divulgação
da verdade. Ainda que não tenham sido confiadas sob sigilo, as informações
privadas prejudiciais a outros não podem ser divulgadas sem uma razão
grave e proporcionada.
- Cada um deve manter a justa
reserva acerca da vida privada das pessoas. Os responsáveis pela
comunicação devem manter uma justa proporção entre as exigências do bem
comum e o respeito dos direitos particulares. A ingerência da informação
na vida privada de pessoas comprometidas numa atividade política ou
pública é condenável na medida em que ela viola sua intimidade e
liberdade.
V. O uso dos meios de comunicação social
- Na sociedade moderna, os
meios de comunicação social exercem um papel primordial na informação, na
promoção cultural e na formação. O papel cresce em razão dos avanços
técnicos, com a amplitude e a diversidade das notícias transmitidas, com a
influência exercida sobre a opinião pública.
- A informação dos meios de
comunicação social está a serviço do bem comum. A sociedade tem direito a
uma informação fundada sobre a verdade, a liberdade, a justiça e a
solidariedade:
O correto exercício desse direito exige que a
comunicação seja, quanto ao objeto, sempre verídica e completa, dentro do
respeito às exigências da justiça e da caridade; que ela seja, quanto ao modo,
honesta e conveniente, quer dizer, que na aquisição e difusão das notícias
observe absolutamente as leis morais, os direitos e a dignidade do homem.
- "É indispensável que
todos os membros da sociedade cumpram também neste particular os deveres
de justiça e verdade. Hão de empregar os meios de comunicação social a fim
de cooperar para a formação e a difusão da reta opinião pública." A
solidariedade aparece como conseqüência de uma comunicação verdadeira e
justa e da livre circulação das idéias que favoreçam o conhecimento e o
respeito aos outros.
- Os meios de comunicação
social (especialmente a mídia) podem gerar certa passividade entre os
usuários, tornando-os consumidores pouco criteriosos a respeito das
mensagens e dos espetáculos, Os usuários hão de se impor moderação e
disciplina quanto à mídia. Hão de formar em si uma consciência esclarecida
e correta, para resistir mais facilmente às influências menos honestas.
- Os responsáveis pela
imprensa, exatamente por sua profissão têm o dever, na difusão da
informação, de servir à verdade e não ofender a caridade. Hão de se
esforçar por respeitar, com igual cuidado, a natureza dos fatos e os
limites do juízo crítico a respeito dai pessoas. Devem evitar ceder à
difamação.
- "Cabem às autoridades
civis deveres especiais em razão do bem comum. Os poderes públicos devem
defender e proteger a verdadeira e justa liberdade de informação."
Publicando leis e cuidando de sua aplicação, os poderes públicos cuidarão
para que o mau uso dos meios de comunicação não "cause graves
prejuízos aos costumes públicos aos progressos da sociedade".
Estabelecerão sanções contra a violação dos direitos de cada pessoa à
reputação e ao segredo da vida privada. Darão no momento oportuno e
honestamente as informações que dizem respeito ao bem comum e respondem às
inquietações fundadas da população. Nada pode justificar o recurso a
falsas informações para se manipular a opinião pública pelos meios de
comunicação. Essas intervenções não ferirão a liberdade dos indivíduos e
dos grupos.
- A moral denuncia o flagelo
dos estados totalitários que falsificam sistematicamente a verdade,
exercem mediante os meios de comunicação uma dominação política da
opinião, "manipulam" os acusados e as testemunhas de processos
públicos e imaginam assegurar sua tirania sufocando e reprimindo tudo o
que consideram "delitos de opinião".
VI. Verdade, beleza e arte sacra
- A prática do bem é
acompanhada de um prazer espiritual gratuito e da beleza moral. Da mesma
forma, a verdade implica a alegria e o esplendor da beleza espiritual. A
verdade é bela em si mesma. A verdade da palavra, expressão racional do
conhecimento da realidade criada e incriada, é necessária ao homem dotado
de inteligência, mas a verdade também pode encontrar outras formas de
expressão humana, complementares, sobretudo quando se trata de evocar o
que ela contém de indizível, as profundezas do coração humano, as
elevações da alma, o mistério de Deus. Antes de se revelar ao homem em
palavras de verdade, Deus se lhe revela pela linguagem universal da
criação, obra de sua Palavra, de sua Sabedoria: a ordem e a harmonia do
cosmo que tanto a criança como o cientista descobrem , "a grandeza e
a beleza das criaturas levam, por analogia, à contemplação de seu
Autor" (Sb 13,5), "pois foi a própria fonte da beleza que as
criou" (Sb 13,3).
A Sabedoria é um eflúvio do poder de Deus,
emanação puríssima da glória do Todo-Poderoso; por isso nada de impuro pode
nela insinuar-se. É reflexo da luz eterna, espelho nítido da atividade de Deus
e imagem de sua bondade (Sb 7,25-26). A sabedoria é mais bela que o sol, supera
todas as constelações. Comparada à luz do dia, sai ganhando, pois a luz cede
lugar à noite, ao passo que, sobre a Sabedoria o mal não prevalece (Sb
7,29-30). Enamorei-me de sua formosura (Sb 8,2).
- "Criado à imagem de
Deus", o homem exprime também a verdade de sua relação com o Deus
Criador pela beleza de suas obras artísticas. A arte de fato é uma forma
de expressão própria mente humana; acima da procura das necessidades
vitais, com a todas as criaturas vivas, ela é uma superabundância gratuita
da riqueza interior do ser humano. Nascendo de um talento dado pelo
Criador e do esforço do próprio homem, a arte é um forma de sabedoria
prática, que une conhecimento e perícia para dar forma à verdade de uma
realidade na linguagem acessível à vista e ao ouvido. A arte inclui certa
semelhança cor a atividade de Deus na criação, na medida em que se inspira
na verdade e no amor das criaturas. Como qualquer outra até atividade
humana, a arte não tem um fim absoluto em si mesma mas é ordenada e
enobrecida pelo fim último do homem.
- A arte sacra é verdadeira e
bela quando corresponde, por sua forma, à sua vocação própria: evocar e
glorificar, na fé e na adoração, o Mistério transcendente de Deus, beleza
excelsa invisível de verdade e amor, revelada em Cristo, "resplendor
de sua glória, expressão de seu Ser" (Hb 1,3), em quem "habita
corporalmente toda a plenitude da divindade" (Cl 2,9), beleza
espiritual refletida na Santíssima Virgem Maria, Mãe de Deus, nos anjos
santos. A arte sacra verdadeira leva o homem à adoração, à oração e ao
amor de Deus Criador e Salvador, Santo e Santificador.
- Por isso devem os bispos,
por si ou por delegação, cuidar de promover a arte sacra, antiga e nova,
sob todas as formas, e afastar, com o me mo zelo religioso, da liturgia e
dos edifícios do culto, tudo o que não harmoniza com a verdade da fé e a
autêntica beleza da arte sacra.
RESUMINDO
- "Não levantarás
falso testemunho contra teu próximo" (Ex 20,16 Os discípulos de
Cristo "revestiram-se do homem novo, criado segundo Deus na justiça e
santidade da verdade" (Ef 4,24).
- A verdade ou veracidade
é a virtude que consiste em mostrar-se verdadeiro no agir e no falar,
fugindo da duplicidade, dê simulação e da hipocrisia.
- O cristão não deve
"se envergonhar de dar testemunho de Nosso Senhor" (2Tm 1,8) em
atos e palavras. O martírio é o supremo testemunho prestado à verdade da
fé.
- O respeito à reputação e
à honra das pessoas proíbe toda atitude ou palavra de maledicência ou
calúnia.
- A mentira consiste em
dizer o que é falso com a intenção de enganar o próximo.
- Toda falta cometida
contra a verdade exige reparação.
- A regra de ouro ajuda a
discernir, nas situações concretas, se convém ou não revelar a verdade
àquele que a pede.
- "O sigilo
sacramental é inviolável. " Os segredos profissionais devem ser
guardados. As confidências prejudiciais a outros não devem ser divulgadas.
- A sociedade tem direito
a uma informação fundada na verdade, na liberdade e na justiça. É
conveniente que se imponham moderação e disciplina no uso dos meios de
comunicação social.
- As artes, mas sobretudo a
arte sacra, têm em vista, "por natureza, exprimir de alguma forma nas
obras humanas a beleza infinita de Deus e procuram aumentar seu louvor e
sua glória na medida em que não tiverem outro propósito senão o de
contribuir poderosamente para encaminhar os corações humanos a Deus."
ARTIGO 9
O NONO
MANDAMENTO
Não cobiçarás a casa de teu próximo, não
desejarás sua mulher, nem seu servo, nem sua serva, nem seu boi, nem seu
jumento, nem coisa alguma que pertença a teu próximo (Ex 20,17). Todo aquele
que olha para uma mulher com desejo libidinoso já cometeu adultério com ela em
seu coração (Mt 5,28).
- São João distingue três
espécies de cobiça ou concupiscência: a concupiscência da carne, a
concupiscência dos olhos e a soberba da vida. Conforme a tradição
catequética católica, o nono mandamento proíbe a concupiscência carnal; o
décimo proíbe a concupiscência dos bens alheios.
- No sentido etimológico, a
"concupiscência" pode designar qualquer forma veemente de desejo
humano. A teologia cristã lhe deu o sentido particular de moção do apetite
sensível que se opõe aos ditames da razão humana. O Apóstolo Paulo a
identifica com a revolta que a carne provoca contra o
"espírito". Provém da desobediência do primeiro pecado.
Transtorna as faculdades morais do homem e, sem se pecado em si mesma,
inclina-o a cometê-lo.
- Já no homem, tratando-se de
um ser composto, espírito corpo, existe certa tensão, desenrola-se certa
luta de tendência entre o "espírito" e a carne . Mas essa luta,
de fato, pertence à herança do pecado, é uma conseqüência dele e, ao mesmo
tempo, uma confirmação, e faz parte da experiência do combate espiritual:
Para o Apóstolo, não se trata de discriminar e
condenar o corpo que, juntamente com a alma espiritual, constitui a natureza c
homem e sua subjetividade pessoal. Ele quis tratar sobretudo das obras, ou
melhor, das disposições estáveis virtudes vícios moralmente boas ou más, que
são fruto da submissão (no primeiro caso) ou, pelo contrário, de resistência
(no segui do caso) à ação salvífica do Espírito Santo. Por isso o Apóstolo
escreve: "Se, portanto, vivemos pelo espírito, caminhemos também segundo o
espírito" (Gl 5,25).
I. A purificação do coração
- O coração é a sede da
personalidade moral: "É do coração que procedem más intenções,
assassínios, adultérios, prostituições, roubos, falsos testemunhos e
difamações" (Mt 15,19). A luta contra a concupiscência da carne passa
pela purificação do coração e a prática da temperança:
Conserva-te na simplicidade, na inocência, e
serás como a criancinhas, que ignoram o mal destruidor da vida dos homens.
- A sexta bem-aventurança
proclama: "Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a
Deus" (Mt 5,8). A expressão "puros de coração" designa
aqueles que entregaram o coração e a inteligência às exigências da
santidade de Deus, principalmente em três campos: a caridade, a castidade
ou a retidão sexual, o amor à verdade e à ortodoxia da fé. Existe um laço
de união entre a pureza do coração, do corpo e da fé:
Os fiéis devem crer nos artigos do símbolo,
"para que, crendo, obedeçam a Deus; obedecendo, vivam corretamente;
vivendo corretamente, purifiquem seu coração; e, purificando o coração,
compreendam o que crêem".
- Aos "puros de coração
esta prometido ver a Deus face a face e ser semelhantes a Ele. A pureza de
coração é a condição prévia da visão. Desde já nos concede ver segundo
Deus, receber o outro como um "próximo"; permite-nos perceber o
corpo humano, o nosso e o do próximo, como um templo do Espírito Santo,
uma manifestação da beleza divina.
II. A luta pela pureza
- O Batismo confere àquele
que o recebe a graça da purificação de todos os pecados. Mas o batizado
deve continuar a lutar contra a concupiscência da carne e as cobiças
desordenadas. Com a graça de Deus, alcançará a pureza de coração:
- pela virtude e pelo dom da castidade, pois a
castidade permite amar com um coração reto e indiviso;
- pela pureza de intenção, que consiste em ter em
vista o fim verdadeiro do homem; com uma atitude simples, o batizado procura
encontrar e realizar a vontade de Deus em todas as coisas;
- pela pureza do olhar, exterior e interior; pela
disciplina dos sentimentos e da imaginação; pela recusa de toda complacência
nos pensamentos impuros que tendem a desviar do caminho dos mandamentos
divinos: "A desperta a paixão dos insensatos" (Sb 15,5);
- pela oração:
Eu julgava que a continência dependia de minhas
próprias forças... forças que eu não conhecia em mim. E eu era tão insensato
que não sabia que ninguém pode ser continente, se vos lho concedeis. E sem
dúvida mo teríeis concedido, se com gemidos interiores vos ferisse os ouvidos
e, com firme fé, pusesse em vós minha preocupação.
- A pureza exige o pudor.
Este é uma parte integrante da esperança. O pudor preserva a intimidade da
pessoa. Consiste na recusa de mostrar aquilo que deve ficar escondido.
Está ordenado castidade, exprimindo sua delicadeza. Orienta os olhares e
os gestos em conformidade com a dignidade das pessoas e de sua união.
- O pudor protege o mistério
das pessoas e de seu amor. Convida à paciência e à moderação na relação
amorosa; pede que sejam cumpridas as condições da doação e do compromisso
definitivo do homem e da mulher entre si. O pudor é modéstia. Inspira o
modo de vestir. Mantém o silêncio ou certa reserva quando se entrevê o
risco de uma curiosidade malsã. Torna-se discrição.
- Existe um pudor dos
sentimentos, como existe o do corpo. O pudor, por exemplo, protesta contra
a exploração do corpo humano em função de uma curiosidade doentia (como em
certo tipo de publicidade), ou contra a solicitação de certos meios de
comunicação ir longe demais na revelação de confidências íntimas. O pudor
inspira um modo de viver que permite resistir às solicitações da moda e à
pressão das ideologias dominantes.
- As formas revestidas pelo
pudor variam de uma cultura a outra. Em toda parte, porém, ele permanece
como o pressentimento de uma dignidade espiritual própria do homem. O
pudor nasce pelo despertar da consciência do sujeito. Ensinar o pudor a
crianças e adolescentes é despertá-los para o respeito à pessoa humana.
- A pureza cristã requer uma
purificação do clima social. Exige dos meios de comunicação social uma
informação que não ofenda o respeito e a modéstia. A pureza do coração
liberta a pessoa do erotismo tão difuso e afasta-a dos espetáculos que
favorecem o "voyeurismo" e a ilusão.
- O que se costuma chamar
permissividade dos costumes se apoia numa concepção errônea da liberdade
humana; para se edificar, esta última tem necessidade de se deixar educar
previamente pela lei moral. Convém exigir dos responsáveis pela educação
que dêem à juventude um ensino respeitoso da verdade, das qualidades do
coração e da dignidade moral e espiritual do homem.
- "A Boa Nova de Cristo
restaura constantemente a vida e a cultura do homem decaído, combate e
remove os erros e os males decorrentes da sempre ameaçadora sedução do
pecado. Purifica e eleva incessantemente os costumes dos povos. Com as
riquezas do alto ela fecunda, como que por dentro, as qualidades do
espírito e os dotes de cada povo e de cada idade; fortifica-os, aperfeiçoa-os
e restaura-os em Cristo."
RESUMINDO
- "Todo aquele que
olha para uma mulher com desejo libidinoso já cometeu adultério com ela em
seu coração" (Mt 5,28).
- O nono mandamento
adverte contra a cobiça ou concupiscência carnal.
- A luta contra a cobiça
carnal passa pela purificação do coração e pela prática da temperança.
- A pureza do coração nos
permitirá ver a Deus e nos permite desde já ver todas as coisas segundo
Deus.
- A purificação do coração
exige a oração, a prática da castidade, a pureza da intenção e do olhar.
- A pureza do coração
exige o pudor, que é paciência, modéstia e discrição. O pudor preserva a
intimidade da pessoa.
ARTIGO 10
O DÉCIMO
MANDAMENTO
Não cobiçarás... coisa alguma que pertença a teu
próximo (Ex 20,17).
Tu não desejarás para ti a casa de teu próximo,
nem seu campo, nem seu escravo, nem sua escrava, nem seu boi, nem seu jumento,
qualquer coisa que pertença a teu próximo (Dt 5,21).
Onde está o teu tesouro, aí estará também teu
coração (Mt 6,21).
- O décimo mandamento
desdobra e completa o nono, que se refere à concupiscência da carne.
Proíbe a cobiça dos bens dos outros, raiz do roubo, da rapina e da fraude,
que o sétimo mandamento proíbe. A "concupiscência dos olhos" (1
Jo 2,16) leva à violência e à injustiça, proibidas pelo quinto preceito. A
cupidez tem sua origem, como a fornicação, na idolatria proibida nas três
primeiras prescrições da 1ei. O décimo mandamento se refere à intenção do
intenção do coração e resume, junto com o nono, todos os preceitos da Lei.
I. A desordem das concupiscências
- O apetite sensível nos faz
desejar as coisas agradáveis que não temos. Por exemplo, desejar comer
quando temos fome, ou aquecer-nos quando estamos com frio. Esses desejos
são bons em si mesmos, mas muitas vezes não respeitam a medida da razão e
nos levam a cobiçar injustamente o que não nos cabe e pertence, ou é
devido a outra pessoa.
- O décimo mandamento proíbe
a avidez e o desejo de uma apropriação desmedida dos bens terrenos; proíbe
a cupidez desmedida nascida da paixão imoderada das riquezas e de seu
poder. Proíbe ainda o desejo de cometer uma injustiça pela qual se
prejudicaria o próximo em seus bens temporais:
Quando a Lei nos diz: "Não cobiçarás",
ordena-nos, em outros termos, que afastemos nossos desejos de tudo aquilo que
não nos pertence. Pois a sede dos bens do próximo é imensa, infinita e nunca
saciada, como está escrito: "Quem ama o dinheiro nunca se de
dinheiro" (Ecl 5,9).
- Não é violar este
mandamento desejar obter coisas que pertencem ao próximo, contanto que
seja por meios justos. A catequese tradicional indica com realismo
"aqueles que mais devem lutar contra suas concupiscências criminosas
e, portanto, que e preciso "exortar o mais possível à observância
deste preceito":
São os .. comerciantes que desejam a carestia ou
os preços excessivos das mercadorias, que vêem com pesar que não são os únicos
a comprar e a vender, o que lhes permitiria vender mais caro e comprar ao preço
mínimo; os que desejam que seus semelhantes fiquem na miséria, para tirarem
lucro, quer vendendo para eles, quer comprando deles... Os médicos que desejam
que haja doentes, os legistas que desejam causas e processos importantes e
numerosos....
- O décimo mandamento exige
banir a inveja do coração humano. Quando o profeta Natã quis estimular o
arrependimento do rei Davi, contou-lhe a história do pobre que possuía uma
única ovelha, tratada como sua própria filha, e do rico que, apesar da
multidão de seus rebanhos, invejava o primeiro e acabou roubando-lhe a
ovelha. A inveja pode levar às piores ações. E pela inveja do demônio que
a morte entrou no mundo:
Nós nos combatemos mutuamente, e é a inveja que
nos arma uns contra os outros... Se todos procuram por todos os meios abalar o
Corpo onde acabaremos? Nós estamos enfraquecendo o Corpo de Cristo...
Declaramo-nos membros de um mesmo organismo e nos devoramos como feras.
- A inveja é um vício
capital. Designa a tristeza sentida diante do bem do outro e do desejo
imoderado de sua apropriação, mesmo indevida. Quando deseja um grave mal
ao próximo, é um pecado mortal:
Sto. Agostinho via na inveja "o pecado
diabólico por excelência". "Da inveja nascem o ódio, a maledicência,
a calúnia, a alegria causada pela desgraça do próximo e o desprazer causado por
sua prosperidade."
- A inveja representa uma das
formas de tristeza e, portanto, uma recusa da caridade; o batizado lutará
contra ela mediante a benevolência. A inveja provém muitas vezes do
orgulho o batizado se exercitará no caminho da humildade:
Quereríeis ver Deus glorificado por vós?
Pois bem, alegrai-vos com os progressos de vosso
irmão e imediatamente Deus será glorificado por vós. Deus será louvado dirão,
porque seu servo soube vencer a inveja, colocando alegria nos méritos dos
outros.
II. Os desejos do espírito
- A economia da lei e da
graça desvia o coração dos homens ambição e da inveja e o inicia no desejo
do Sumo Bem; instrui-o nos desejos do Espírito Santo, que sacia o coração
do homem.
O Deus das promessas desde sempre advertiu o
homem contra a sedução daquilo que, desde as origens, aparece como "bom ao
apetite, agradável aos olhos, desejável para adquirir ciência" (cf. Gn
3,6).
- A Lei confiada a Israel
jamais bastou para justificar aqueles que lhe eram sujeitos; antes,
tomou-se mesmo o instrumento da "cobiça". A inadequação entre o
querer e o fazer indica o conflito entre a lei de Deus, que é a "lei
da razão", e outra lei, "que me acorrenta à lei do pecado que
existe em meus membros" (Rm 7,23).
- "Agora, porém,
independentemente da Lei, se manifestou a justiça de Deus, testemunhada
pela lei e pelos profetas, justiça de Deus que opera pela fé em Jesus
Cristo em favor de todos os crêem" (Rm 3,21-22). Por isso os fiéis de
Cristo "crucificaram a carne com suas paixões e concupiscências"
(Gl 5,24); eles conduzidos pelo Espírito e seguem os desejos do Espírito.
III. A pobreza de oração
- Jesus ordena a seus
discípulos que O prefiram a tudo e dos e lhes propõe que "renunciem a
todos os bens" por causa dele e do Evangelho. Pouco antes de sua
paixão, deu-lhes como exemplo a pobre viúva de Jerusalém que, de sua
indigência, deu tudo o que possuía para viver. O preceito do
desprendimento das riquezas é obrigatório para se entrar no Reino dos
céus.
- Todos os fiéis de Cristo
"devem dirigir retamente seus afetos para que, por causa do uso das
coisas mundanas, por causa do apego às riquezas contra o espírito da
pobreza evangélica, não sejam impedidos de tender à perfeição da
caridade".
- "Bem-aventurados os
pobres em espírito" (Mt 5,3). As bem-aventuranças revelam uma ordem
de felicidade e de graça, de beleza e de paz. Jesus celebra a alegria dos
pobres, a quem já pertence o Reino:
O Verbo chama "pobreza em espírito" â
humildade voluntária de um espírito humano e sua renúncia; o Apóstolo nos dá
como exemplo a pobreza de Deus quando diz: "Ele se fez pobre por nós"
(2 Cor 8,9).
- O Senhor se queixa dos
ricos porque encontram na profusão dos bens o seu consolo (Lc 6,24).
"O orgulhoso procura o poder terreno, ao passo que o pobre em
espírito busca o Reino dos Céus." O abandono nas mãos da Providência
do Pai do Céu liberta da preocupação do amanhã. A confiança em Deus
predispõe para a bem-aventurança dos pobres. Eles verão a Deus.
IV. "Quero ver a Deus"
- O desejo da felicidade
verdadeira liberta o homem do apego imoderado aos bens deste mundo,
(felicidade) que se realizará na visão e na bem-aventurança de Deus.
"A promessa de ver a Deus ultrapassa todas as bem-aventuranças. Na
Escritura, ver é possuir. Aquele que Vê a Deus obteve todos os bens que
podemos imaginar.
- Ao povo santo de Deus resta
lutar, com a graça do Alto, para alcançar os bens que Deus promete. Para
possuir e contemplar a Deus, os fiéis de Cristo mortificam sua
concupiscência e superam, com a graça de Deus, as seduções do gozo e do
poder.
- Por esse caminho da
perfeição, o Espírito e a Esposa chamam aquele que os ouve à comunhão perfeita
com Deus.
Aí
haverá a verdadeira glória; ninguém será louvado então por engano ou bajulação;
as verdadeiras honras não serão recusadas àqueles que as merecem, nem
concedidas aos indignos; aliás, nenhum indigno terá tal pretensão, pois só quem
é digno será admitido. Aí reinará a verdadeira paz, onde ninguém será sujeito à
oposição nem de si mesmo nem dos outros. Da virtude, o próprio Deus será a
recompensa, Ele que deu a virtude e se prometeu a si mesmo como a recompensa
(para ela) melhor e maior que possa existir: "Eu serei o seu Deus e eles
serão o meu povo" (Lv 26,12)... É também o sentido das palavras do
Apóstolo: "Para que Deus seja tudo em todos" (1 Cor 15,12). Ele mesmo
será o fim de nossos desejos, aquele que contemplaremos sem fim, amaremos sem
sociedade, louvaremos sem cansaço. E esse dom, essa afeição, essa
ocupação serão certamente como a vida eterna, comuns a todos.
RESUMINDO
- "Onde está teu tesouro, aí estará teu
coração" (Mt 6,21).
- O décimo mandamento proíbe a ambição
desregrada, nascida paixão imoderada das riquezas e de seu poder.
- A inveja é a tristeza sentida diante do
bem de outrem e o desejo imoderado de dele se apropriar. E um vício
capital.
- O batizado combate a inveja pela
benevolência, pela humildade e pelo abandono nas mãos da Providência
divina.
- Os fiéis de Cristo "crucificaram a
carne com suas paixões concupiscências" (Gl 5,24); são conduzidos
pelo Espírito e seguem os desejos dele.
- O desapego das riquezas é necessário para
entrar no Reino dos Céus. "Bem-aventurados os pobres de
coração."
- Eis o verdadeiro desejo do homem:
"Quero ver a Deus A sede de Deus é saciada pela água da Vida Eterna.