A Verdadeira Estabilidade Matrimonial e Familiar
Diác. Álvaro Mejía Londoño E.P.
Arautos do Evangelho
Deus que é Amor e criou o homem por amor,
chamou-o também a amar criando o homem e a mulher; e chamou-os no matrimônio a
uma íntima comunhão de vida e amor, de maneira a já não serem dois, mas uma só
carne.1 O homem se completa na união com o outro sexo. É assim que
ele é impelido ao matrimônio, a uma ligação caracterizada pela unicidade e para
sempre, um amor exclusivo e definitivo, “ícone do relacionamento de Deus com
Seu povo e vice-versa; o modo de Deus amar torna-se a medida do amor humano”.2
Ao abençoá-los disse-lhes: “Crescei e
multiplicai-vos”.3 Portanto, uma forma de vida em que se realiza
aquela comunhão de pessoas que implica o exercício da faculdade procriativa,
conforme afirmam diversas passagens da escritura: “[…] serão uma só carne”.4
São assim chamados a colaborar com Deus na geração e educação de novas vidas.
Fundado e estruturado com leis próprias —
dadas pelo próprio Criador — e ordenado pela natureza à comunhão e ao bem dos
cônjuges, à procriação e à educação dos filhos, o Divino Mestre ensina que,
segundo desígnio original divino, a união matrimonial é indissolúvel pois, “o
que Deus uniu, não o separe o homem” (Mc 10, 9). Ele quis, com uma santa
pedagogia, ressaltar a Aliança de Deus com o povo de Israel, pré-figura da
Aliança nova do Filho de Deus — Jesus Cristo — com Sua esposa, a Igreja Santa.
Dessa forma, o matrimônio cristão é também sinal eficaz da aliança entre Cristo
e a Igreja.
O matrimônio não é, pois, uma união
qualquer entre pessoas humanas. Foi instituído pelo Criador que o dotou de uma
natureza própria, propriedades essenciais e finalidades.5 Essa união
entre o homem e a mulher foi elevada por Cristo à dignidade de Sacramento.
O sacramento do matrimônio constitui os
cônjuges num estado público de vida da Igreja e, por isso, se faz uma
celebração pública na qual o ministro é um testemunho. Pela sua própria
natureza, o matrimônio rato e consumado entre batizados nunca pode ser
dissolvido, devido à unidade exclusiva do amor conjugal. Mesmo que não possa
ser possível uma convivência normal e que, por isso, recorram à separação, os
cônjuges não são livres para contrair uma nova união, a não ser que o matrimônio
seja expressamente declarado nulo pela Igreja. Recorda-nos São Marcos no seu
Evangelho as palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo: “Quem se divorciar da sua
mulher e casar com outra, comete adultério contra a primeira. E se a mulher se
divorciar do seu marido e casar com outro, comete adultério”.6
Conforme alocução de Bento XVI ao
Tribunal da Rota Romana:
Os contraentes devem se comprometer de modo definitivo,
precisamente porque o matrimônio é tal no desígnio da criação e da redenção. E
a juridicidade essencial do matrimônio reside exatamente nesse vínculo, que
para o homem e a mulher representa uma exigência de justiça e de amor ao qual,
para o seu bem e para o bem de todos, eles não se podem subtrair sem
contradizer aquilo que o próprio Deus realizou neles.7
A família é um bem necessário e
imprescindível para toda a sociedade, núcleo e realidade natural, fundamento da
própria sociedade, e tem o direito de ser protegida e reconhecida pela
sociedade e pelo Estado. Ela tem uma dimensão social única, pela sua natureza,
posto que a procriação situa-se como princípio “genético” da sociedade, como
lugar primário de transmissão e cultivo de valores e, conseqüentemente, como
princípio da cultura e garantia da própria sobrevivência da sociedade. Podemos
dizer com toda a segurança que o matrimônio tem as suas próprias leis, não
dependendo do arbítrio das pessoas ou da sociedade. Não é um fenômeno meramente
cultural e dependente do “sentir” subjetivo da época atual, mas tem como
fundamento o próprio Deus.
É preciso ter presente que a estabilidade
do matrimônio e da família não está exclusivamente confiada à intenção e à boa
vontade dos implicados; ele tem um caráter institucional, adquire caráter
público, inclusive após o reconhecimento jurídico por parte do Estado. Está em
causa a própria dignidade do(s) gerado(s) ser o fruto de uniões íntimas
permanentes, provir de pais unidos, estabilidade essa que deve ser do interesse
de todos, sobretudo velando por estes que são os mais débeis: os filhos.
Com o matrimônio se assumem publicamente, mediante o pacto de
amor conjugal, todas as responsabilidades do vínculo estabelecido. Dessa
assunção pública de responsabilidades resulta um bem não só para os próprios
cônjuges e filhos no seu crescimento afetivo e formativo, como também para os
outros membros da família. Dessa forma, a família que tem por base o matrimônio
é um bem fundamental e precioso para a sociedade inteira, cujos entrelaces mais
firmes estão sob os valores que se manifestam nas relações familiares que
encontram sua garantia no matrimônio estável. O bem gerado pelo matrimônio é
básico para a própria Igreja, que reconhece na família a “Igreja doméstica” (Lumen
gentium n.11, Decr. Apostolicam auctositatem, n.11). Tudo isso se vê
comprometido com o abandono da instituição matrimonial implícito nas uniões de
fato.8
Uma pretendida equiparação entre família
e uniões de fato vai contra a verdade das coisas, anulando diferenças
substanciais e introduzindo “modelos” de família que de nenhum modo podem se comparar
entre si, e que acabam por desacreditar injustamente a família tipo, que a
história da humanidade de todos os tempos viu desde sempre, não como uma
relação genérica, mas como uma realidade que tem a sua origem no matrimônio, ou
seja, no pacto estipulado entre pessoas de sexo diverso, realizado a partir de
uma eleição que se pretende recíproca e livre, e que compreende, pelo menos
como projeto, uma relação procriadora.
Santo Agostinho e São Tomás nos ensinam
que a lei positiva humana tem força quando é justa e não contradiz a lei
natural. Doutra forma já não seria lei, senão corrupção da lei… É certo que há
distinção entre lei moral e lei civil; distinção, porém, que não é separação e
muito menos contradição, não podendo o poder civil, sob a égide de uma certa e
questionável tolerância, registrar certas situações e colocar-lhes um selo de
legalidade, como continua a acontecer um pouco por todo o lado.
Toda a sociedade está baseada na noção
sólida de que a família é uma comum união de amor e de vida entre um homem e
uma mulher, provavelmente geradora de vida. O amor humano entre sexos distintos
que cria um vínculo de unidade estável e aberta à vida constitui uma verdade e
um valor antropológico. A negação e ausência dessa fundamental e elementar
verdade levaria à destruição do tecido social. Logo, dar às uniões do mesmo
sexo um status de semelhança com as uniões propriamente matrimoniais
constitui um atropelo e um desconhecimento do que é o bem comum e a verdade do
homem, do que é e comporta o verdadeiro matrimônio, exigência interna do amor
conjugal que faz do casal heterossexual partícipe da ação criadora de Deus.
Não existe nenhum fundamento para assimilar ou estabelecer
analogias, nem mesmo as remotas, diante das uniões homossexuais e o desígnio de
Deus sobre o matrimônio e a família. O matrimônio é santo, enquanto as relações
homossexuais contrastam com a lei moral natural. Na realidade, as relações
homossexuais não permitem o dom da vida pelo ato sexual. Não são frutos de uma
verdadeira complementação afetiva e sexual. Não podem receber aprovação em caso
algum.9
Nessas uniões, encontramos uma
impossibilidade objetiva de fazer frutificar o matrimônio mediante a
transmissão da vida, que é realmente o projeto do próprio Deus, na própria estrutura
do ser humano. Há uma ausência radical de caráter sexual, tanto no plano
físico-biológico como no psicológico, que apenas se dá na relação homem-mulher.
Há uma série de razões que se opõem a
essas uniões:
a) De ordem racional — As leis devem
ser conformes o direito natural; o Estado não pode legalizá-las sem faltar ao
dever de promover e tutelar uma instituição essencial para o bem comum, como é
o matrimônio. Estaria obscurecendo a percepção de alguns valores fundamentais
frente ao corpo social. O costume tem força de lei e, portanto, qual será o
efeito desses “reconhecimentos” para as novas gerações?
b) De ordem biológica e antropológica
— Há uma ausência completa, impossível de complementaridade sexual; não se
promove a ajuda mútua dos sexos, como no verdadeiro matrimônio, e não há a
possibilidade de transmissão de vida. Com a eventual adoção infantil, a
ausência da bipolaridade sexual cria obstáculos ao desenvolvimento normal das
crianças.
c) De ordem social — A
sociedade deve a sua sobrevivência à família estabelecida sobre o verdadeiro
matrimônio. O reconhecimento dessas uniões leva a uma redefinição do conceito
de matrimônio, pois perderia a referência essencial aos fatores associados à
heterosexualidade, especialmente à procriação e à educação.
d) De ordem jurídica — O
matrimônio tem a grande missão de garantir a ordem da procriação e como tal é
de interesse público; por isso é brindado com um reconhecimento institucional.
Isso até pela sobrevivência da própria sociedade.
Termino as considerações feitas com este
texto de São Josemaría Escrivá, que tanta importância deu à família:
É verdadeiramente infinita a ternura de Nosso Senhor. Reparemos
com que delicadeza trata os Seus filhos. Fez do matrimônio um vínculo santo,
imagem da união de Cristo com a Sua Igreja (cf. Ef 5, 32), um grande Sacramento
em que se alicerça a família cristã, que há de ser, com a graça de Deus, um
ambiente de paz e de concórdia, escola de santidade. Os pais são cooperadores
de Deus. Daí procede o amável dever de veneração que cabe aos filhos. Com razão
se pode chamar o quarto mandamento de dulcíssimo preceito do Decálogo. […]
Quando se vive o matrimônio como Deus quer, santamente, o lar torna-se um
recanto de paz, luminoso e alegre.10