LITURGIA DA PALAVRA: Mc 4, 1-20; Sl 109; Hb 10, 11-18

MEMÓRIA DE SANTO TOMÁS DE AQUINO

(Presbítero e Doutor da Igreja – Prefácio dos Pastores)

 

Que Pastores para a Igreja no mundo atual?”

 

Depois de nos termos dedicado, ao longo de todo este dia, ao estudo de temas de grande complexidade e relevância, como a “Identidade e Missão do Presbítero no mundo atual”, que foi o tema da primeira conferência, no período da manhã, e “A formação integral do Presbítero”, tema de que nos ocupamos na parte da tarde, somo convidados, nesta celebração Eucarística, a nos deixar conduzir pela graça. O encontro de atualização do clero pertencente a esta Província Eclesiástica deste ano de 2015 tem como objetivo principal responder à pergunta sobre o perfil de pastores de que a Igreja necessita, para evangelizar o mundo atual. É na escuta orante da Palavra que encontraremos resposta para esta pergunta.

Celebramos hoje a memória de Santo Tomás de Aquino, cuja vida e obra, ao menos parcialmente, todos conhecemos. A vida deste santo nos ajuda a refletir sobre o mundo que se transforma, que apresenta novos questionamentos, desafiando a ação evangelizadora da Igreja. Santo Tomás, como sabemos, foi presbítero e um dos mais importante filósofos e teólogos da história da Igreja, mas foi sobretudo um homem de oração. Penso que seja correto dizer que o seu ideal era transmitir aos outros o que ele havia contemplado, isto é, as intuições que eram resultantes da profundidade da sua oração, do seu relacionamento de intimidade com Deus.

De que pastores a Igreja necessita no mundo atual? A vida de Santo Tomás nos ajuda a buscar respostas para esta pergunta. Ele viveu em tempos que foram também muito difíceis. Um dos desafios principais era a difusão, nas universidades e centros de estudo, do pensamento de Aristóteles, um pensador considerado pagão e por isto uma ameaça para a doutrina cristã. Muitos julgavam que a melhor solução seria proibir o estudo de Aristóteles,  impedir a propagação de suas idéias. Santo Tomás, ao contrário, se orientou em outra direção. Percebeu que não havia outra solução senão dialogar com o mundo, conservando a verdade doutrinal, mas tendo por base o novo referencial teórico, advindo da filosofia aristotélica.

De que pastores a Igreja necessita, no mundo atual? 1) A vida de Santo Tomas nos ensina que ao Pastor é essencial a atitude contemplativa. Deve ser um homem de oração, contínua e profunda. Na linguagem atual, somos orientados a zelar pela dimensão espiritual da formação, tanto na fase inicial, no Seminário, quanto na formação permanente. 2) Santo Tomás era movido, ainda, pelo desejo de dialogar com o mundo, de evangelizar aquela realidade, com os seus desafios específicos. Esta é outra característica que não pode faltar ao Pastor: o inquietante desejo de anunciar a Palavra. Apreendemos aqui o dinamismo que deve ter a ação pastoral. Deverá impulsionar o pastor a buscar métodos e linguagens novos e eficazes para anunciar o mesmo evangelho a um mundo que sempre se transforma. No processo formativo inicial e permanente, pensemos no cuidado e na atenção que deve receber a dimensão pastoral. 3) Outra virtude de que se valeu Santo Tomás foi a coragem,  para se colocar diante de desafios de grandes proporções. O evangelizador, onde quer que esteja, deverá igualmente se valer de seus recursos humanos, dos valores naturais. São muitos os desafios que amedrontam, enquanto são muitos os pastores que não se mostram psicologicamente preparados para anunciar o evangelho, nas circunstâncias atuais.  Ao apresentar a formação humana como fundamento de toda a formação sacerdotal, a Igreja afirma, muito sabiamente, que “sem uma oportuna formação humana, toda a formação sacerdotal ficaria priva do seu necessário fundamento” (PDV 43).  4) Santo Tomás é reconhecido, legitimamente, por ser um homem de especiais qualidades intelectuais. Era possuidor de uma inteligência profunda, dinâmica e equilibrada, totalmente orientada para o serviço do Evangelho. A Igreja, no mundo de hoje, precisa de Pastores cuidadosamente preparados quanto à intelecção e à comunicação da fé. Do ponto de vista reflexivo, vivemos uma era de grande confusão e incerteza.  A formação intelectual, voltada para a inteligência da fé, tem o desafio de atender a esta necessidade.

O Evangelho, há pouco proclamado, nos apresenta a parábola do semeador. Trata-se da primeira parábola do capítulo 4 do Evangelho de Marcos, que é um dos textos mais antigos do Novo Testamento, sendo, cronologicamente, o primeiro dos evangelhos. Esta parábola nos permite visualizar, de modo muito claro, a Jesus em seu trabalho cotidiano de anúncio da “boa-nova”.

Na introdução, a parábola nos mostra a grande proximidade que se estabelece entre Jesus e as pessoas. Jesus procura a multidão. Oferece a oportunidade para que as pessoas se encontrem com Ele. E “uma multidão muito grande”se reúne para ouvir, atentamente, os ensinamentos de Jesus. São muito sugestivos os detalhes apresentados pelo evangelista. Por exemplo, o texto diz que Jesus sentou-se. Ele não tinha pressa. O seu tempo e a sua atenção eram totalmente dedicados ao encontro e ao diálogo com aquelas pessoas, que acorriam para ouvir suas palavras.

O versículo seguinte sublinha, sobretudo, o método utilizado por Jesus. Certamente Jesus buscava a forma mais eficaz de comunicação com aquelas pessoas, levando em consideração as características específicas do tempo e da cultura. Por isto, ensinava-lhes muitas coisas em parábolas. Ensinava muitas coisas, mas utilizando um método atrativo, e eficiente. Fazia-se próximo, oferecia o tempo de que as pessoas necessitavam, com uma linguagem que lhes era acessível à inteligência e lhes tocava o coração.

Na parábola, o semeador saiu a semear. É o trabalho de que muitos dos ouvintes se ocupavam no dia a dia. É uma metáfora para o trabalho de que se ocupava Jesus, e de que nos ocupamos também nós, bispos e presbíteros. Uma riqueza desta parábola, ao meu ver, está em seu realismo. O semeador lançava as sementes certamente movido pela esperança em ter uma boa colheita. Mas a parábola relata, muito claramente, que nem sempre o trabalho do semeador alcança o êxito esperado. O “pastor para a Igreja no mundo atual” deve estar igualmente consciente e preparado para as dificuldades inerentes à ação pastoral.

As sementes lançadas alcançam uma diferente sorte. Uma parte cai “à beira do caminho”; uma parte cai “em terreno pedregoso”;  uma parte caiu “entre os espinhos”, que as sufocam, enquanto uma “outra parte caiu em terra boa e deu fruto”.  

Estas palavras de Jesus são, naturalmente, muito atuais. Jesus quer nos fazer conscientes de que nem toda semente lançada irá cair em terra boa e produzir fruto. As iniciativas Pastorais, propostas sempre com entusiasmo e esperança, nem sempre têm o resultado que imediatamente se espera. Esta passagem do Evangelho deverá produzir em nós o efeito de nos renovar o dinamismo pastoral. Haverá dificuldades e desafios mas, por fim, pela ação do Espírito Santo, uma parte da semente irá cair em terra boa, e dará fruto abundante. Assim tem acontecido, na vida da Igreja e na história de cada um de nós, que recebemos a missão de anunciar o evangelho no mundo atual.

Agradeço a esta Província Eclesiástica a oportunidade de participar das atividades deste encontro de atualização para o Clero. Agradeço, especialmente, a oportunidade de celebrar com vocês esta Eucaristia, em que conjuntamente apresentamos a Deus o desejo de viver, com fidelidade renovada, a nossa missão como evangelizadores, no mundo atual.