Sirach (BAV) 32


32 1 Fizeram-te rei (do festim)? Não te envaideças com isso. Sê no meio dos outros como qualquer um deles.
2
Ocupa-te com eles e em seguida senta-te. Não tomes lugar à mesa, senão após cumpridos os teus deveres,
3
assim te regozijarás por causa deles. Receberás a coroa como um gracioso adorno, e ganharás a consideração dos convivas.
4
Tu, mais idoso, fala, pois convém
5
que sejas o primeiro a falar, com séria competência. Mas não perturbes a música,
6
nem te alongues em discursos, onde não há quem os ouça. Não te engrandeças sem propósito por causa de tua sabedoria.
7
Como uma pedra de rubi engastada no ouro, assim é a música no meio de uma refeição regada a vinho.
8
Como um sinete de esmeraldas engastadas em ouro, assim é um grupo de músicos no meio de uma alegre e moderada libação.
9
Ouve em silêncio, e tua modéstia provocará a benevolência.
10
Jovem, fala muito pouco de teus assuntos privados.
11
Se fores duas vezes interrogado, que tua resposta seja concisa.
12
Em muitas coisas, porta-te como se as ignorasses; ouve em silêncio e pergunta.
13
No meio dos poderosos, não tomes muitas liberdades; não fales muito onde houver anciãos:
14
vê-se o relâmpago antes de se ouvir o estalido, a graça precede o rubor da modéstia. Pelo teu recato serás benquisto.
15
Uma vez chegada a hora de se levantar, não te demores; sê o primeiro a correr para casa, onde te regozijarás com os divertimentos.
16
Faze o que te aprouver, porém sem pecado e sem orgulho.
17
E em tudo isso glorifica o Senhor que te criou, e que te cumula de todos os seus bens.

A Lei, pedra de toque entre o sábio e o insensato

18 Aquele que teme o Senhor aceitará sua doutrina, aqueles que vigiam para procurá-lo serão por ele abençoados.
19
Aquele que busca a lei, por ela será cumulado. Aquele, porém, que procede com falsidade, nela achará ocasião de pecado.
20
Aqueles que temem o Senhor terão um juízo reto, e farão brilhar como uma tocha a sua justiça.
21
O pecador foge da censura, e encontra precedentes segundo o seu desejo.
22
O homem prudente não perde ocasião alguma para instruir-se, e o estranho ou o orgulhoso não tem nenhum temor;
23
mesmo quando age sozinho e sem conselheiro, ele será castigado pelos seus próprios desígnios.
24
Meu filho, nada faças sem conselho, e não te arrependerás depois de teres agido.
25
Não te embrenhes num caminho de perdição e não tropeçarás nas pedras. Não te metas num caminho escabroso, para não pores diante de ti uma pedra de tropeço.
26
Previne-te contra teus filhos, sê prudente em presença de teus familiares.
27
Em tudo o que fizeres, age com segurança, pois isso é guardar os mandamentos.
28
Aquele que crê em Deus atende ao que ele manda. Aquele que põe sua confiança nele, não será atingido.


33 1 Aquele que teme o Senhor não será surpreendido por nenhuma desgraça. Mas Deus o protegerá na provação, e o livrará de todo o mal.
2
O sábio não odeia nem os mandamentos nem os preceitos. Ele não se despedaçará como uma nave na tempestade.
3
O homem sensato crê na lei de Deus, e a lei lhe é fiel.
4
Aquele que esclarece uma pergunta, prepara a resposta; depois de assim ter orado, ele será atendido. Ele concentra as suas idéias e depois responde.
5
O coração do insensato é como as rodas de um carro, e o seu pensamento é semelhante a um eixo que gira.
6
O amigo zombador é como o garanhão, que relincha debaixo de qualquer um que o monta.

Sábias diposições de Deus

7 Por que um dia prevalece sobre outro dia, uma luz sobre outra luz, um ano sobre outro ano, (provindo todos) do mesmo sol?
8
Foi a ciência do Senhor que os diferenciou, quando criou o sol que atende às suas leis;
9
ele distinguiu os tempos e os dias de festa, nos quais os homens celebram pontualmente as solenidades.
10
Entre eles há alguns que Deus elevou e consagrou; a outros pôs no número dos dias comuns. Foi assim que Deus tirou todos os homens do solo e da terra de que foi formado Adão.
11
Em sua grande sabedoria, o Senhor os distinguiu, e diversificou os seus caminhos.
12
Entre eles, alguns foram abençoados e exaltados, outros foram santificados, e ele os tomou para si. Entre eles, alguns foram amaldiçoados e humilhados, os quais ele expulsou de seu lugar de exílio.
13
Como o barro está nas mãos do oleiro, que o molda e o dispõe,
14
dando-lhe todas as formas que deseja, assim é o homem na mão de quem o criou, e que lhe retribuirá segundo o seu juízo.
15
Diante do mal está o bem; diante da morte, a vida, assim também diante do justo está o pecador. Considera assim todas as obras do Altíssimo; estão sempre duas a duas, opostas uma à outra.

Objetivo do autor

16 E eu fui o último que despertei, e fiz como o que junta os grãos depois da vindima.
17
Eu também esperei na bênção de Deus, e enchi a tina como o vindimador.
18
Olhai que não trabalhei só para mim, mas para todos os que buscam a doutrina.
19
Ouvi-me, ó poderosos e todos os povos! E vós, chefes da assembléia, escutai-me!

Distribuição dos bens próprios

20 Ao teu filho, à tua mulher, ao teu irmão, ao teu amigo, não concedas autoridade sobre ti durante tua vida. Não dês teus bens a outrem, para não te arrependeres e teres de tornar a pedi-los.
21
Enquanto viveres e respirares, que ninguém te faça mudar a esse respeito,
22
porque é melhor que os teus filhos te peçam, do que estares tu olhando para as mãos de teus filhos.
23
Em tudo o que fizeres conserva a tua autoridade;
24
não manches o teu bom nome. (Somente) no fim de tua vida, no momento da morte, distribuirás a tua herança.

Comportamento com os escravos

25 Para o jumento o feno, a vara e a carga. Para o escravo o pão, o castigo e o trabalho.
26
O escravo só trabalha quando corrigido, e só aspira ao repouso; afrouxa-lhe a mão, e ele buscará a liberdade.
27
O jugo e a correia fazem dobrar o mais rígido pescoço; o trabalho contínuo torna o escravo dócil.
28
Para o escravo malévolo a tortura e as peias; manda-o para o trabalho para que ele não fique ocioso,
29
pois a ociosidade ensina muita malícia.
30
Ocupa-o no trabalho, pois é o que lhe convém. Se ele não obedecer, submete-o com grilhões, mas não cometas excessos, seja com quem for, e não faças coisa alguma importante sem ter refletido.
31
Se tiveres um escravo fiel, que ele te seja tão estimado como tu mesmo. Trata-o como irmão, porque foi pelo preço de teu sangue que o obtiveste.
32
Se o maltratares injustamente, ele fugirá;
33
se ele for embora, não saberás a quem perguntar, nem onde deverás procurá-lo.

Vaidade dos sonhos

34 1 O insensato (vive) de esperanças quiméricas; os imprudentes edificam sobre os sonhos.
2
Como aquele que procura agarrar uma sombra ou perseguir o vento, assim é o que se prende a visões enganadoras.
3
Isto segundo aquilo, eis o que se vê nos sonhos: é como a imagem de um homem diante dele próprio.
4
Que coisa pura poderá vir do impuro? Que verdade pode vir da mentira?
5
A adivinhação do erro, os augúrios mentirosos e os sonhos dos maus, tudo isso não passa de vaidade.
6
O teu coração, como o de uma mulher que está de parto, sofrerá imaginações. A menos que o Altíssimo te envie uma visão, não detenhas nelas teu pensamento,
7
pois os sonhos fizeram errar muita gente, que pecou porque neles punham sua esperança;
8
a palavra da lei se cumpre integralmente, e a sabedoria tornar-se-á evidente na boca do homem fiel.

A experiência

9 Que sabe aquele que não foi experimentado? O homem de grande experiência tem inúmeras idéias; aquele que muito aprendeu fala com sabedoria.
10
Aquele que não tem experiência pouca coisa sabe, mas o que passou por muitas dificuldades desenvolve a prudência.
11
Que sabe aquele que não foi tentado? O que foi enganado abundará em sagacidade.
12
Vi muitas coisas em minhas viagens, muitos costumes diferentes.
13
Algumas vezes encontrei-me em perigo de morte, mas fui libertado pela graça de Deus.

Proteção de Deus àqueles que o temem

14 O espírito daqueles que temem a Deus será procurado, será abençoado quando Deus olhar para eles.
15
Com efeito, sua esperança está posta naquele que os salva, e os olhos de Deus estão voltados para aqueles que o amam.
16
Aquele que teme ao Senhor não tremerá; de nada terá medo, pois o próprio Senhor é sua esperança.
17
Feliz a alma do que teme ao Senhor.
18
Para quem olha ela, e quem é a sua força?
19
Os olhos do Senhor estão voltados para aqueles que o temem; ele é um poderoso protetor, um sólido apoio, um abrigo contra o calor, uma tela contra o ardor do meio-dia,
20
um sustentáculo contra os choques, um amparo contra a queda. Ele eleva a alma, ilumina os olhos; dá saúde, vida e bênção.

Os sacrifícios

21 A oferenda daquele que sacrifica um bem, mal adquirido, é maculada. E os insultos dos injustos não são aceitos por Deus.
22
O Senhor (só se dá) àqueles que o aguardam no caminho da verdade e da justiça.
23
O Altíssimo não aprova as dádivas dos injustos, nem olha para as ofertas dos maus; a multidão dos seus sacrifícios não lhes conseguirá o perdão de seus pecados.
24
Aquele que oferece um sacrifício arrancado do dinheiro dos pobres, é como o que degola o filho aos olhos do pai.
25
O pão dos indigentes é a vida dos pobres; aquele que lho tira é um homicida.
26
Quem tira de um homem o pão de seu trabalho, é como o assassino do seu próximo.
27
O que derrama o sangue e o que usa de fraude no pagamento de um operário são irmãos:
28
um constrói, o outro destrói. O que lhes resta senão a fadiga?
29
Um ora, o outro maldiz; de qual ouvirá Deus a voz?
30
Se aquele que se lava após ter tocado num morto, torna a tocá-lo, de que lhe serve ter-se lavado?
31
Assim se porta o homem que jejua por causa de seus pecados, e torna a cometê-los: de que lhe serve ter-se humilhado? Quem ouvirá a sua prece?


35 1 Aquele que observa a lei faz numerosas oferendas.
2
É um sacrifício salutar guardar os preceitos, e apartar-se de todo pecado.
3
Afastar-se da injustiça é oferecer um sacrifício de propiciação, que consegue o perdão dos pecados.
4
Aquele que oferece a flor da farinha dá graças, e o que usa de misericórdia oferece um sacrifício.
5
Abster-se do mal é coisa agradável ao Senhor; o fugir da injustiça alcança o perdão dos pecados.
6
Não te apresentarás diante do Senhor com as mãos vazias,
7
pois todos (esses ritos) se fazem para obedecer aos preceitos divinos.
8
A oblação do justo enriquece o altar; é um suave odor na presença do Senhor.
9
O sacrifício do justo é aceito (por Deus). O Senhor não se esquecerá dele.
10
Dá glória a Deus de bom coração e nada suprimas das primícias (do produto) de tuas mãos.
11
Faze todas as tuas oferendas com um rosto alegre, consagra os dízimos com alegria.
12
Dá ao Altíssimo conforme te foi dado por ele, dá de bom coração de acordo com o que tuas mãos ganharam,
13
pois o Senhor retribui a dádiva, e recompensar-te-á tudo sete vezes mais.
14
Não lhe ofereças dádivas perversas, pois ele não as aceitará.


15 Nada esperes de um sacrifício injusto, porque o Senhor é teu juiz, e ele não faz distinção de pessoas.


16 O Senhor não faz acepção de pessoa em detrimento do pobre, e ouve a oração do ofendido.
17
Não despreza a oração do órfão, nem os gemidos da viúva.


18 As lágrimas da viúva não correm pela sua face, e seu grito não atinge aquele que as faz derramar?
19
Pois da sua face sobem até o céu; o Senhor que a ouve, não se compraz em vê-la chorar.

Eficácia da oração

20 Aquele que adora a Deus na alegria será bem recebido, e sua oração se elevará até as nuvens.
21
A oração do humilde penetra as nuvens; ele não se consolará, enquanto ela não chegar (a Deus), e não se afastará, enquanto o Altíssimo não puser nela os olhos.
22
O Senhor não concederá prazo: ele julgará os justos e fará justiça. O fortíssimo não terá paciência com (os opressores), mas esmagar-lhes-á os rins.


23 Vingar-se-á das nações, até suprimir a multidão dos soberbos, e quebrar os cetros dos iníquos;
24
até que ele dê aos homens segundo as suas obras, segundo a conduta de Adão, e segundo a sua presunção;
25
até que faça justiça ao seu povo, e dê alegria aos justos por um efeito de sua misericórdia.
26
A misericórdia divina no tempo da tribulação é bela; é como a nuvem que esparge a chuva na época da seca.

Oração pelo povo oprimido

36 1 Tende piedade de nós, ó Deus de todas as coisas, olhai para nós, e fazei-nos ver a luz de vossa misericórdia!
2
Espargi o vosso terror sobre as nações que não vos procuram, para que saibam que não há outro Deus senão vós, e publiquem as vossas maravilhas!


3 Estendei vossa mão contra os povos estranhos, para que vejam o vosso poder.
4
Como diante dos seus olhos mostrastes vossa santidade em nós, assim também, à nossa vista, sereis glorificado neles,


5 para que reconheçam, como também nós reconhecemos, que não há outro Deus fora de vós, Senhor!
6
Renovai vossos prodígios, fazei milagres inéditos,


7 glorificai vossa mão e vosso braço direito,
8
excitai vosso furor e espargi vossa cólera;
9
desbaratai o inimigo e aniquilai o adversário.
10
Apressai o tempo e lembrai-vos do fim, para que sejam apregoadas vossas maravilhas.
11
Devore o ardor da chama aquele que escapar, e sejam arruinados aqueles que maltratam o vosso povo.
12
Esmagai a cabeça dos chefes dos inimigos que dizem: Só nós existimos!


13 Reuni todas as tribos de Jacó, para que saibam que não há outro Deus senão vós, e publiquem vossas maravilhas! Tomai-as como herança, assim como eram no começo.
14
Tende piedade de vosso povo, que é chamado pelo vosso nome, e de Israel, que tratastes como vosso filho primogênito.
15
Tende piedade da cidade que santificastes, de Jerusalém, cidade do vosso repouso.
16
Enchei Sião com vossas palavras inefáveis, e o vosso povo com a vossa glória.
17
Dai testemunho em favor daqueles que são vossas criaturas desde a origem. Tornai verdadeiros os oráculos que proferiam os antigos profetas em vosso nome.
18
Recompensai aqueles que vos esperam pacientemente, a fim de que vossos profetas sejam achados fiéis. Ouvi as orações de vossos servos.
19
Segundo as bênçãos dadas a vosso povo por Aarão, conduzi-nos pelo caminho da justiça, para que todos os habitantes da terra saibam que vós sois o Deus que contempla os séculos.


20 O estômago recebe toda espécie de alimentos, mas entre os alimentos um é melhor do que o outro.
21
O paladar discerne o gosto da caça; o coração sensato discerne as palavras enganadoras.
22
Um coração perverso é causa de tristeza, mas o homem experiente resistir-lhe-á.
23
A mulher pode esposar toda espécie de homens, mas entre as jovens uma é melhor do que a outra.
24
A beleza da mulher alegra o rosto do esposo: ela se torna mais amável que tudo o que o homem pode desejar.
25
Se a sua língua cura os males, tem também doçura e bondade; o seu esposo não é como os demais homens.
26
Aquele que possui uma mulher virtuosa tem com que tornar-se rico; é uma ajuda que lhe é semelhante, e uma coluna de apoio.
27
Onde não há cerca, os bens estão expostos ao roubo; onde não há mulher, o homem suspira de necessidade.
28
Quem confia naquele que não tem morada, e naquele que passa a noite onde quer que a noite o surpreenda? Ou que vagueia de cidade em cidade como um ladrão sempre prestes a fugir?

Verdadeiros e falsos amigos

37 1 Todo amigo diz: Eu também contraí amizade. Há porém um amigo que só o é de nome. Não é uma dor que dura até a morte
2
ver um amigo e um companheiro mudarem-se em inimigos?
3
Ó presunção criminosa, onde tiveste origem, para cobrir a terra com tua malícia e tua perfídia?
4
O amigo distrai-se com seu amigo nas suas alegrias; no dia da tribulação, tornar-se-á seu adversário.
5
O amigo compartilha da desventura do seu amigo no interesse de seu ventre; ao ver o inimigo, tomará do escudo.
6
Não te esqueças de teu amigo nos teus pensamentos; no meio da riqueza, não percas a sua lembrança.

Prudente escolha de um conselheiro

7 Não te aconselhes com aquele que te arma um laço. Esconde tuas intenções àqueles que te têm inveja.
8
Todo conselheiro dá sua opinião, mas há conselheiros que só têm em vista o próprio interesse.
9
Estejas prevenido quando tratar-se de um conselheiro; informa-te primeiro quais são os seus interesses, pois ele pensa em si mesmo antes de tudo.
10
Teme que ele plante uma estaca no solo e te diga:
11
Estás no bom caminho, enquanto se põe defronte para ver o que te acontecerá.
12
Vai consultar um homem sem religião sobre as coisas santas; um injusto sobre a justiça; uma mulher sobre sua rival; um tímido sobre a guerra; um mercador sobre o negócio; um comprador sobre uma coisa para vender; um invejoso sobre a gratidão;
13
um ímpio sobre a piedade; um homem desonrado sobre a honestidade; um lavrador sobre o seu trabalho;
14
um operário, contratado por um ano, sobre o término de seu contrato; um criado preguiçoso sobre uma grande tarefa! Não confies neles e em nenhum de seus conselhos.
15
Sê, porém, assíduo junto a um santo homem, quando conheceres um que seja fiel ao temor de Deus,
16
cuja alma se irmana à tua, e que compartilhará da tua dor quando titubeares nas trevas.
17
Fortalece em ti um coração prudente, pois nada tem mais valor para ti.
18
A alma de um santo homem descobre às vezes melhor a verdade que sete sentinelas postas em observação numa colina.
19
Mas em todas as coisas ora ao Altíssimo, para que ele dirija teus passos na verdade.
20
Que uma palavra de verdade preceda todos os teus atos, e um conselho firme preceda toda a tua diligência.

Verdadeira e falsa sabedoria

21 Uma palavra má transtorna o coração; dela vêm quatro coisas: o bem e o mal, a vida e a morte; sobre estas quem domina de contínuo é a língua. Há homem hábil que ensina a muita gente, mas que é inútil para si mesmo.
22
Outro é esclarecido e instrui a muitos, e é agradável a si próprio.
23
Aquele que afeta sabedoria nas palavras é odioso; ficará desprovido de tudo.
24
Não recebeu o favor do Senhor, pois é desprovido de toda a sabedoria.
25
Há um sábio que é sábio para si mesmo, e os frutos de sua sabedoria são verdadeiramente louváveis.
26
O sábio ensina o seu povo, e os frutos de sua sabedoria são duradouros.
27
O homem sábio será cumulado de bênçãos. Aqueles que o virem o louvarão.
28
A vida do homem conta poucos dias, mas os dias de Israel são inúmeros.
29
O sábio herdará a honra no meio do povo, e o seu nome viverá eternamente.
30
Meu filho, experimenta tua alma durante tua vida; se o poder lhe for nefasto, não lho dês,
31
pois nem tudo é vantajoso para todos, e todos não se comprazem nas mesmas coisas.
32
Nunca sejas guloso em banquete algum; não te lances sobre tudo o que se serve,
33
pois o excesso no alimento é causa de doença, e a intemperança leva à cólica.
34
Muitos morreram por causa de sua intemperança, o homem sóbrio, porém, prolonga sua vida.

Médicos e medicinas

38 1 Honra o médico por causa da necessidade, pois foi o Altíssimo quem o criou.
2
(Toda a medicina provém de Deus), e ele recebe presentes do rei:
3
a ciência do médico o eleva em honra; ele é admirado na presença dos grandes.
4
O Senhor fez a terra produzir os medicamentos: o homem sensato não os despreza.
5
Uma espécie de madeira não adoçou o amargor da água? Essa virtude chegou ao conhecimento dos homens.
6
O Altíssimo deu-lhes a ciência da medicina para ser honrado em suas maravilhas;
7
e dela se serve para acalmar as dores e curá-las; o farmacêutico faz misturas agradáveis, compõe ungüentos úteis à saúde, e seu trabalho não terminará,
8
até que a paz divina se estenda sobre a face da terra.
9
Meu filho, se estiveres doente não te descuides de ti, mas ora ao Senhor, que te curará.
10
Afasta-te do pecado, reergue as mãos e purifica teu coração de todo o pecado.
11
Oferece um incenso suave e uma lembrança de flor de farinha; faze a oblação de uma vítima gorda.
12
Em seguida dá lugar ao médico, pois ele foi criado por Deus; que ele não te deixe, pois sua arte te é necessária.
13
Virá um tempo em que cairás nas mãos deles.
14
E eles mesmos rogarão ao Senhor que mande por meio deles o alívio e a saúde (ao doente) segundo a finalidade de sua vida.
15
Aquele que peca na presença daquele que o fez, cairá nas mãos do médico.

Moderação no luto

16 Meu filho, derrama lágrimas sobre um morto, e chora como um homem que sofreu cruelmente. Sepulta o seu corpo segundo o costume, e não descuides de sua sepultura.
17
Chora-o amargamente durante um dia, por causa da opinião pública, e depois consola-te de tua tristeza;
18
toma luto segundo o merecimento da pessoa, um dia ou dois, para evitar as más palavras.
19
Pois a tristeza apressa a morte, tira o vigor, e o desgosto do coração faz inclinar a cabeça.
20
A tristeza permanece quando (o corpo) é levado; e a vida do pobre é o espelho de seu coração.
21
Não entregues teu coração à tristeza, mas afasta-a e lembra-te do teu fim.
22
Não te esqueças dele, porque não há retorno; de nada lhe servirás e só causarás dano a ti mesmo.
23
Lembra-te da sentença que me foi dada: a tua será igual; ontem para mim, hoje para ti.
24
Na paz em que o morto entrou, deixa repousar a sua memória, e conforta-o no momento em que exalar o último suspiro.

Paralelo entre o artífice e o escriba

25 A sabedoria do escriba lhe vem no tempo do lazer. Aquele que pouco se agita adquirirá sabedoria.
26
Que sabedoria poderia ter o homem que conduz a charrua, que faz ponto de honra aguilhoar os bois, que participa de seu labor, e só sabe falar das crias dos touros?
27
Ele põe todo o seu coração em traçar sulcos, e o seu cuidado é engordar novilhas.
28
Igualmente acontece com todo carpinteiro, todo arquiteto, que passa no trabalho os dias e as noites. Assim sucede àquele que grava as marcas dos sinetes, variando as figuras por um trabalho assíduo; que aplica todo o seu coração na imitação da pintura, e põe todo o cuidado no acabamento de seu trabalho.
29
Assim acontece com o ferreiro sentado perto da bigorna, examinando o ferro que vai moldar; o vapor do fogo queima as suas carnes, e ele resiste ao ardor da fornalha.
30
O barulho do martelo lhe fere o ouvido de golpes repetidos; seus olhos estão fixos no modelo do objeto.
31
Ele aplica o seu coração em aperfeiçoar a sua obra, e põe um cuidado vigilante em torná-la bela e perfeita.
32
O mesmo sucede com o oleiro que, entregue à sua tarefa, gira a roda com os pés, sempre cuidadoso pela sua obra; e todo o seu trabalho (visa a produzir) uma quantidade (determinada).
33
Com o seu braço dá forma ao barro, torna-o maleável com os pés,
34
aplica o seu coração em aperfeiçoar o verniz, e limpa o forno com muita diligência.
35
Todos esses artistas esperam (tudo) de suas mãos; cada um deles é sábio em sua profissão.
36
Sem eles nenhuma cidade seria construída,
37
nem habitada, nem freqüentada; mas eles mesmos não terão parte na assembléia,
38
não se sentarão nas cadeiras dos juízes, não entenderão as disposições judiciárias, não apregoarão nem a instrução nem o direito, nem serão encontrados a estudar as máximas.
39
Entretanto, sustentam as coisas deste mundo. Sua oração se refere aos trabalhos de sua arte; a eles aplicam sua alma, e estudam juntos a lei do Altíssimo.


39 1 O sábio procura cuidadosamente a sabedoria de todos os antigos, e aplica-se ao estudo dos profetas.


2 Guarda no coração as narrativas dos homens célebres, e penetra ao mesmo tempo nos mistérios das máximas.
3
Penetra nos segredos dos provérbios, e vive com o sentido oculto das parábolas.
4
Exerce o seu cargo no meio dos poderosos, e comparece perante aqueles que governam.


5 Viaja pela terra de povos estrangeiros, para reconhecer o que há do bem e do mal entre os homens.
6
Desde o alvorecer aplica o coração à vigília para se unir ao Senhor que o criou, e ora na presença do Altíssimo.
7
Abre sua boca para orar, e pede perdão de seus pecados,


8 pois se for da vontade do Senhor que é grande, ele o cumulará do espírito de inteligência.


9 Então ele espargirá como uma chuva palavras de sabedoria, e louvará o Senhor em sua oração.
10
O Senhor orientará seus conselhos e seus ensinamentos, e ele meditará nos mistérios (divinos).
11
Ensinará ele próprio o conhecimento de sua doutrina. Porá sua glória na lei da aliança do Senhor.
12
Muitos homens louvarão sua sabedoria: jamais cairá ela no esquecimento.
13
A sua memória não desaparecerá; seu nome será repetido de geração em geração.
14
As nações proclamarão sua sabedoria, a assembléia apregoará seu louvor.

Exortação às boas obras

15 Enquanto viver, terá maior nome que mil outros, e, quando repousar, será feliz.
16
Refletirei ainda para contá-lo, pois estou cheio de um entusiasmo
17
que diz: Ouvi-me, rebentos divinos, desabrochai como uma roseira plantada à beira das águas;
18
como o Líbano, espargi suave aroma,
19
dai flores como o lírio, exalai perfume e estendei graciosa folhagem. Cantai cânticos e bendizei o Senhor nas suas obras.
20
Dai ao seu nome magníficos elogios, glorificai-o com a voz de vossos lábios, com os cânticos de vossos lábios e a música das harpas. Direis assim à guisa de louvor:
21
Todas as obras do Senhor são excelentes;
22
à sua voz conteve-se a água amontoada, a uma palavra de sua boca as águas ajuntaram-se como em reservatórios.
23
À sua ordem, fez-se calmaria, e a salvação que ele dá não será mesquinha.
24
São-lhe apresentadas as ações de todos os viventes, nada é oculto aos seus olhos.
25
Seu olhar abrange de um século a outro: nada é maravilhoso para ele.
26
Não se deve dizer: O que é isso, o que é aquilo? Pois todas as coisas serão examinadas a seu tempo.
27
A bênção dele é como um rio que transborda;
28
como o dilúvio inundou a terra inteira, assim a sua cólera será a sorte dos povos que não o procuram.
29
Assim como ele transformou as águas em aridez e ressecou a terra, e o seu comportamento é determinado pelo deles, assim, em sua ira, seu comportamento é motivo de queda para os pecadores.
30
Assim como os bens, desde o princípio, foram criados para os bons, assim os bens e os males o foram para os maus.
31
As coisas mais necessárias à vida do homem são: a água, o fogo, o ferro, o sal, o leite, o pão da flor de farinha, o mel, a uva, o azeite e o vestuário:
32
todas essas coisas são bens para os fiéis, mas tornam-se males para os ímpios e os pecadores.
33
Há espíritos que foram criados para a vingança: aumentaram seus tormentos pelo seu furor.
34
No tempo do extermínio manifestarão sua força, e apaziguarão a fúria daquele que os criou.
35
Fogo, granizo, fome e morte, tudo isso foi criado para a vingança,
36
como também os dentes dos animais, os escorpiões, as serpentes, e a espada vingadora destinada ao extermínio dos ímpios.
37
Todas essas coisas se regozijam com as ordens do Senhor, e mantêm-se prontas sobre a terra para servir oportunamente, e, chegando o tempo, não omitirão uma só de suas palavras.
38
Por isso, desde o princípio estou firme em minhas idéias; refleti e as escrevi.
39
Todas as obras do Senhor são boas; ele põe cada coisa em prática quando chega o tempo.
40
Não há razão para dizer: Isto é pior do que aquilo, porque todas as coisas serão achadas boas a seu tempo.
41
E agora, de todo o coração e com a boca, cantai e bendizei o nome do Senhor!

A sombra da morte sobre a criação

40 1 Uma grande inquietação foi imposta a todos os homens, e um pesado jugo acabrunha os filhos de Adão, desde o dia em que saem do seio materno, até o dia em que são sepultados no seio da mãe comum:
2
seus pensamentos, os temores de seu coração, a apreensão do que esperam, e o dia em que tudo acaba,
3
desde o que se senta num trono magnífico, até o que se deita sobre a terra e a cinza;
4
desde o que veste púrpura e ostenta coroa, até aquele que só se cobre de pano. Furor, ciúme, inquietação, agitação, temor da morte, cólera persistente e querelas.
5
E na hora de repousar no leito, o sono da noite perturba-lhe as idéias.
6
Ele repousa um pouco, tão pouco que é como se não repousasse; e no mesmo sono, como uma sentinela durante o dia,
7
é perturbado pelas visões de seu espírito, como um homem que foge do combate. No momento em que (se julga) em lugar seguro, ele se levanta e admira-se do seu vão temor.
8
Assim acontece a toda criatura, desde os homens até os animais. Mas para os pecadores é sete vezes mais.
9
Além do mais, a morte, o sangue, as querelas, a espada, as opressões, a fome, a ruína e os flagelos
10
foram todos criados para os maus, e foi por causa deles que veio o dilúvio.
11
Tudo o que vem da terra voltará à terra, como todas as águas regressam ao mar.

A sorte do ímpio

12 Todo presente e todo bem mal adquirido perecerão; a boa fé, porém, subsistirá eternamente.
13
As riquezas dos injustos secarão como uma torrente; elas assemelham-se a uma trovoada que estala na chuva.
14
O homem se regozija quando abre a mão, mas no fim os prevaricadores serão aniquilados.
15
A posteridade dos ímpios não multiplicará os ramos; as raízes impuras agitam-se no alto de um rochedo.
16
A vegetação que cresce à beira das águas, ao longo de um rio, será arrancada antes de todas as ervas dos campos.
17
A beneficência é como um paraíso abençoado, e a misericórdia permanecerá eternamente.

De bem a melhor

18 Doce é a vida do operário que se basta a si próprio; vivendo assim, encontrarás um tesouro.
19
Os filhos e a fundação de uma cidade dão firmeza a um nome, mas é mais estimada que um e outro uma mulher sem mácula.
20
O vinho e a música alegram o coração: sobre um e outro, porém, prevalece o amor da sabedoria.
21
A flauta e a harpa emitem um som harmonioso; a língua suave, porém, supera uma e outra.
22
A graça e a beleza são atraentes para o olhar; mais do que uma e outra é a vegetação dos campos.
23
Um amigo ajuda a seu amigo no momento oportuno. Mais do que um e outro, uma mulher ajuda seu marido.
24
Os irmãos são um socorro no tempo da tribulação. Mais do que eles, porém, a misericórdia liberta.
25
O ouro e a prata são bases sólidas. Um bom conselho, porém, supera um e outra.
26
As riquezas e as energias elevam o coração; o temor do Senhor, porém, sobrepuja umas e outras.
27
Nada falta àquele que tem o temor ao Senhor; e com ele não há necessidade de outro auxílio.
28
O temor ao Senhor é-lhe como um paraíso abençoado; ele está revestido de uma glória que supera toda glória.

Autonomia do sábio

29 Meu filho, não leves nunca uma vida de mendigo, pois mais vale morrer que mendigar.
30
Quando um homem olha para a mesa de outro, sua vida não é realmente vida, na obsessão do alimento, porque se nutre dos víveres de outrem;
31
mas o homem moderado e educado se acautela contra isso.
32
Na boca do insensato, a coisa mendigada é doce; mas nas suas entranhas arderá um fogo.

O pensamento da morte

41 1 Ó morte, como tua lembrança é amarga para o homem que vive em paz no meio de seus bens,
2
para o homem tranqüilo e afortunado em tudo, e que ainda se encontra em condição de saborear o alimento!
3
Ó morte, tua sentença é suave para o indigente, cujas forças se esgotam,
4
para quem está no declínio da idade, carregado de cuidados, para quem não tem mais confiança e perde a paciência.
5
Não temas a sentença da morte; lembra-te dos que te precederam, e de todos os que virão depois de ti: é a sentença pronunciada pelo Senhor sobre todo ser vivo.
6
Que te sobrevirá por vontade do Altíssimo? Dez anos, cem anos, mil anos...
7
Na habitação dos mortos não se tomam em consideração os anos de vida.

Castigo dos pecadores

8 Os filhos dos pecadores tornam-se objeto de abominação, assim como os que freqüentam as casas dos ímpios.
9
A herança dos filhos dos pecadores perecerá. O opróbrio prende-se à sua posteridade.
10
Os filhos de um homem ímpio queixam-se de seu pai porque é por sua culpa que estão envergonhados.
11
Desgraçados de vós, homens ímpios, que abandonastes a lei do Senhor, o Altíssimo!
12
Se nasceis, é na maldição, e quando morrerdes, tereis a maldição como herança.
13
Tudo o que vem da terra voltará à terra. Assim os ímpios passam da maldição à ruína.
14
Os homens se entristecem com (a perda) de seu corpo; porém, até o nome dos ímpios será aniquilado.
15
Cuida em procurar para ti uma boa reputação, pois esse bem ser-te-á mais estável que mil tesouros grandes e preciosos.
16
A vida honesta só tem um número de dias; a boa fama, porém, permanece para sempre.

Verdadeira e falsa vergonha

17 Meus filhos, guardai em paz meu ensinamento: pois uma sabedoria oculta e um tesouro invisível, para que servem essas duas coisas?
18
Mais vale um homem que dissimula a sua ignorância, que um homem que oculta a sua sabedoria.
19
Tende, pois, vergonha do que vou dizer,
20
porque não é bom ter vergonha de tudo, e nem todas as coisas agradam, na verdade, a todos.
21
Envergonhai-vos da fornicação, diante de vosso pai e de vossa mãe; e da mentira, diante do que governa e do poderoso;
22
de um delito, diante do príncipe e do juiz; da iniqüidade, diante da assembléia e do povo;
23
da injustiça, diante de teu companheiro e de teu amigo;
24
de cometeres um roubo no lugar onde moras, por causa da verdade de Deus e de sua aliança. Envergonha-te de pôr os cotovelos sobre a mesa, de usar de fraude no dar e no receber,
25
de não responder àqueles que te saúdam, de lançar os olhos para uma prostituta,
26
de desviar os olhos de teu próximo, de tirar o que a ele pertence, sem devolver-lho.
27
Não olhes para a mulher de outrem; não tenhas intimidades com tua criada, e não te ponhas junto do seu leito.
28
Envergonha-te diante de teus amigos de dizer palavras ofensivas; não censures o que deste.


Sirach (BAV) 32