Sirach (BAV) 23

23 1 Senhor, meu pai e soberano de minha vida, não me abandoneis ao conselho de meus lábios, e não permitais que eles me façam sucumbir.
2
Quem fará sentir o chicote em meus pensamentos, e em meu coração a doutrina da sabedoria, para eu não ser poupado nos pecados por ignorância, a fim de que esses erros não apareçam?
3
Para que não aumentem as minhas omissões, e não se multipliquem as minhas ignorâncias, e eu não caia diante de meus adversários, e não escarneça de mim o meu inimigo?
4
Senhor, meu pai e Deus de minha vida, não me abandoneis às suas sugestões;
5
não me deis olhos altivos e preservai-me da cobiça!
6
Afastai de mim a intemperança! Que a paixão da volúpia não se apodere de mim e não me entregueis a uma alma sem pejo e sem pudor!

Disciplina da língua

7 Ouvi, filhos, o conhecimento que eu vos dou: aquele que o guardar não perecerá pelos lábios, nem cairá em ações criminosas.
8
O pecador é apanhado pela sua leviandade; o orgulhoso e o maledicente nela encontrarão motivos de queda.
9
Que tua boca não se acostume ao juramento, porque isso leva a muitos pecados.
10
Que o nome de Deus não esteja sempre na tua boca, e que não mistures nas tuas conversas o nome dos santos, porque nisso não estarias isento de culpa.
11
Pois, assim como um escravo submetido continuamente à tortura, dela trará as cicatrizes, assim, todo homem que jura pelo nome de Deus, não poderá totalmente escapar ao pecado.
12
O homem que jura com freqüência será cheio de iniqüidade, e o flagelo não deixará a sua casa;
13
se não cumprir o juramento, sua culpa recairá sobre ele; e, se dissimular, pecará duplamente.
14
Se jurar em vão, isso não o justificará: sua casa será cheia de castigos.
15
Há uma outra palavra que merece a morte, e não deve ser encontrada na herança de Jacó!
16
Tudo isto está longe dos homens piedosos, que não se comprazem em tais crimes.
17
Não acostumes tua boca a uma linguagem grosseira, pois aí sempre haverá pecado.
18
Lembra-te de teu pai e de tua mãe, quando te achares no meio dos poderosos,
19
para não acontecer que Deus se esqueça de ti na presença deles, e que, tornando-te insensato pela tua excessiva familiaridade, tenhas de suportar um insulto, e desejes não ter nascido, e amaldiçoes o dia do teu nascimento.
20
O homem acostumado a dizer palavras injuriosas jamais se corrigirá disso.

Luxúria e adultério

21 Duas espécies de pessoas multiplicam os pecados, e a terceira atrai sobre si a cólera e a perdição.
22
A alma que queima como um fogo ardente não se apagará antes de ter devorado alguma coisa.
23
O homem que abusa de seu próprio corpo, não terá sossego enquanto não acender uma fogueira.
24
Para o fornicador todo o alimento é doce; não se cansará de pecar até à morte.
25
O homem que profana seu leito prejudica-se a si mesmo, e diz: Quem me vê?
26
As trevas me rodeiam, as paredes me escondem; ninguém me olha; a quem temerei? O Altíssimo não se recordará de meus pecados.
27
E ele não compreende que o olhar de Deus tudo vê, que um semelhante temor humano exclui dele o temor a Deus, e que os olhos dos homens o temem.
28
Ele não sabe que os olhos do Senhor são muito mais luminosos que o sol, que examinam por todos os lados o procedimento dos homens, as profundezas do abismo, e investigam o coração humano até em seus mais íntimos esconderijos.
29
Pois, o Senhor Deus conhecia todas as coisas antes de tê-las criado, e as vê todas, depois que as completou.
30
Este tal será castigado nas praças públicas da cidade; será posto em fuga como o potro da égua, e será apanhado onde menos o esperar.
31
Será vexado diante de todos, porque não compreendeu o que é o temor a Deus.
32
Assim também perecerá toda mulher que deixar seu marido, e lhe der como herdeiro um filho adulterino,
33
porque primeiramente ela foi desobediente à lei do Altíssimo, em segundo lugar pecou contra o seu marido, cometendo assim um adultério, dando-se a si filhos de outro homem.
34
Essa mulher será trazida perante a assembléia, e seus filhos serão vigiados.
35
Seus filhos não pegarão raízes; seus ramos não darão frutos.
36
Ela deixará uma memória maldita, e sua desonra jamais se apagará.
37
E todos aqueles que lhe sobreviverem reconhecerão que nada é melhor do que o temor a Deus, e nada mais suave que guardar os seus preceitos.
38
É uma grande glória seguir o Senhor, pois é ele quem dá vida longa.

Elogio da sabedoria

24 1 A sabedoria faz o seu próprio elogio, honra-se em Deus, gloria-se no meio do seu povo.
2
Ela abre a boca na assembléia do Altíssimo, gloria-se diante dos exércitos do Senhor,


3 é exaltada no meio do seu povo, e admirada na assembléia santa.
4
Entre a multidão dos eleitos, recebe louvores, e bênçãos entre os abençoados de Deus.


5 Ela diz: Saí da boca do Altíssimo; nasci antes de toda criatura.
6
Eu fiz levantar no céu uma luz indefectível, e cobri toda a terra como que de uma nuvem.
7
Habitei nos lugares mais altos: meu trono está numa coluna de nuvens.


8 Sozinha percorri a abóbada celeste, e penetrei nas profundezas dos abismos. Andei sobre as ondas do mar,
9
e percorri toda a terra. Imperei sobre todos os povos
10
e sobre todas as nações.
11
Tive sob os meus pés, com meu poder, os corações de todos os homens, grandes e pequenos. Entre todas as coisas procurei um lugar de repouso, e habitarei na moradia do Senhor.


12 Então a voz do Criador do universo deu-me suas ordens, e aquele que me criou repousou sob minha tenda.
13
E disse-me: Habita em Jacó, possui tua herança em Israel, estende tuas raízes entre os eleitos.


14 Desde o início, antes de todos os séculos, ele me criou, e não deixarei de existir até o fim dos séculos; e exerci as minhas funções diante dele na casa santa.
15
Assim fui firmada em Sião; repousei na cidade santa, e em Jerusalém está a sede do meu poder.
16
Lancei raízes no meio de um povo glorioso, cuja herança está na partilha de meu Deus; e fixei minha morada na assembléia dos santos.


17 Elevei-me como o cedro do Líbano, como o cipreste do monte Sião;
18
cresci como a palmeira de Cades, como as roseiras de Jericó.
19
Elevei-me como uma formosa oliveira nos campos, como um plátano no caminho à beira das águas.
20
Exalo um perfume de canela e de bálsamo odorífero, um perfume como de mirra escolhida;
21
como o estoraque, o gálbano, o ônix e a mirra, como a gota de incenso que cai por si própria, perfumei minha morada. Meu perfume é como o de um bálsamo sem mistura.
22
Estendi meus galhos como um terebinto, meus ramos são de honra e de graça.


23 Cresci como a vinha de frutos de agradável odor, e minhas flores são frutos de glória e abundância.


24 Sou a mãe do puro amor, do temor (de Deus), da ciência e da santa esperança,
25
em mim se acha toda a graça do caminho e da verdade, em mim toda a esperança da vida e da virtude.


26 Vinde a mim todos os que me desejais com ardor, e enchei-vos de meus frutos;
27
pois meu espírito é mais doce do que o mel, e minha posse mais suave que o favo de mel.
28
A memória de meu nome durará por toda a série dos séculos.
29
Aqueles que me comem terão ainda fome, e aqueles que me bebem terão ainda sede.
30
Aquele que me ouve não será humilhado, e os que agem por mim não pecarão.


31 Aqueles que me tornam conhecida terão a vida eterna.

A sabedoria e a lei

32 Tudo isso é o livro da vida, a aliança do Altíssimo, e o conhecimento da verdade.
33
Moisés deu-nos a lei com os preceitos da justiça, a herança da casa de Jacó e as promessas feitas a Israel.
34
(Deus) prometeu a seu servo Davi que faria sair dele um rei muito poderoso, o qual se sentaria eternamente num trono de glória.
35
(A lei) faz transbordar a sabedoria como o Fison, e como o Tigre na época dos frutos novos;
36
ela espalha a inteligência como o Eufrates, e uma inundação como a do Jordão no tempo da colheita.
37
É ela quem derrama a ciência como o Nilo, soltando as águas como o Geon no tempo da vindima.
38
Foi ele quem primeiro a conheceu perfeitamente, essa sabedoria impenetrável às almas fracas.
39
O seu pensamento é mais vasto do que o mar, e seu conselho, mais profundo do que o grande abismo.
40
Eu, a sabedoria, fiz correr os rios.
41
Sou como o curso da água imensa de um rio, como o canal de uma ribeira, e como um aqueduto saindo do paraíso.
42
Eu disse: Regarei as plantas do meu jardim, darei de beber aos frutos de meu prado;
43
e eis que meu curso de água tornou-se abundante, e meu rio tornou-se um mar.
44
Pois a luz da ciência que eu derramo sobre todos é como a luz da manhã, e de longe eu a torno conhecida.
45
Penetrarei em todas as profundezas da terra, visitarei todos aqueles que dormem, e alumiarei todos os que confiam no Senhor.
46
Continuarei a espalhar a minha doutrina como uma profecia, e deixá-la-ei aos que buscam a sabedoria, e não abandonarei seus descendentes até o século santo.
47
Considerai que não trabalhei só para mim, mas para todos aqueles que buscam a verdade.

Coisa desejáveis e coisas detestáveis

25 1 Meu espírito se compraz em três coisas que têm a aprovação de Deus e dos homens:
2
a união entre os irmãos, o amor entre os parentes, e um marido que vive bem com sua mulher.
3
Mas há três espécies de gente que minha alma detesta, e cuja vida me é insuportável:
4
um pobre orgulhoso, um rico mentiroso e um ancião louco e insensato.

Maturidade da velhice

5 Como acharás na velhice aquilo que não tiveres acumulado na juventude?
6
Quão belo é para a velhice o saber julgar, e para os anciãos o saber aconselhar!
7
Quão bela é a sabedoria nas pessoas de idade avançada, e a inteligência com a prudência nas pessoas honradas!
8
A experiência consumada é a coroa dos anciãos; o temor de Deus é a sua glória.

As dez bem-aventuranças

9 Nove coisas se apresentam ao meu espírito, as quais considero felizes, e uma décima que anunciarei aos homens:
10
um homem que encontra a sua alegria em seus filhos; um homem que vive o bastante para ver a ruína de seus inimigos;
11
aquele - feliz dele! - que vive com uma mulher sensata, e que não pecou pela língua, nem teve de servir a pessoas indignas dele.
12
Feliz aquele que encontrou um amigo verdadeiro, e que fala da justiça a um ouvido atento.
13
Como é grande aquele que encontrou sabedoria e ciência! Mas nada é tão grande como aquele que teme ao Senhor:
14
o temor a Deus coloca-o acima de tudo.
15
Feliz o homem que recebeu o dom do temor a Deus.
16
O temor a Deus é o começo de seu amor, e a ele é preciso acrescentar um princípio de fé.

Malícia da mulher

17 A tristeza do coração é uma chaga universal, e a maldade feminina é uma malícia consumada.
18
Toda chaga, não, porém, a chaga do coração;
19
toda malícia, não, porém, a malícia da mulher;
20
toda vingança, não, porém, a que nos causam nossos adversários;
21
toda vingança, não, porém, a de nossos inimigos.
22
Não há veneno pior que o das serpentes;
23
não há cólera que vença a da mulher. É melhor viver com um leão e um dragão, que morar com uma mulher maldosa.
24
A malícia de uma mulher transtorna-lhe as feições, obscurece-lhe o olhar como o de um urso, e dá-lhe uma tez com a aparência de saco.
25
Entre seus parentes, queixa-se o seu marido, e, ouvindo-os, suspira amargamente.
26
Toda malícia é leve, comparada com a malícia de uma mulher; que a sorte dos pecadores caia sobre ela!
27
Como uma ladeira arenosa aos pés de um ancião, assim é a mulher tagarela para um marido pacato.
28
Não contemples a beleza de uma mulher, não cobices uma mulher pela sua beleza.
29
Grandes são a cólera de uma mulher, sua audácia, sua desordem.
30
Se a mulher tiver o mando, ela se erguerá contra o marido.
31
Coração abatido, semblante triste e chaga de coração: eis (o que faz) uma mulher maldosa.
32
Mãos lânguidas, joelhos que se dobram: eis (o que faz) uma mulher que não traz felicidade ao seu marido.
33
Foi pela mulher que começou o pecado, e é por causa dela que todos morremos.
34
Não dês à tua água a mais ligeira abertura, nem à mulher maldosa a liberdade de sair a público.
35
Se ela não andar sob a direção de tuas mãos, ela te cobrirá de vergonha na presença de teus inimigos.
36
Separa-te do seu corpo, a fim de que não abuse sempre de ti.

Virtudes e maldades da mulher

26 1 Feliz o homem que tem uma boa mulher, pois, se duplicará o número de seus anos.
2
A mulher forte faz a alegria de seu marido, e derramará paz nos anos de sua vida.
3
É um bom quinhão uma mulher bondosa; no quinhão daqueles que temem a Deus, ela será dada a um homem pelas suas boas ações.
4
Rico ou pobre, (o seu marido) tem o coração satisfeito, e seu rosto reflete alegria em todo o tempo.


5 Meu coração teme três coisas, e uma quarta faz empalidecer de pavor o meu semblante:
6
a denúncia de uma cidade, o motim de um povo,
7
a calúnia, coisas estas mais temíveis que a morte;
8
mas uma mulher ciumenta é uma dor de coração e um luto.
9
A língua de uma mulher ciumenta é um chicote que atinge todos os homens.
10
Uma mulher maldosa é como jugo de bois desajustado; quem a possui é como aquele que pega um escorpião.
11
A mulher que se dá à bebida é motivo de grande cólera; sua ofensa e sua infâmia não ficarão ocultas.
12
O mau procedimento de uma mulher revela-se na imprudência de seu olhar e no pestanejar das pálpebras.
13
Vigia cuidadosamente a jovem que não se retrai dos homens, para que não se perca, achando ocasião.
14
Desconfia de toda ousadia de seus olhos, e não te admires se ela te desprezar.
15
Como um viajante sedento abre a boca diante da fonte e bebe toda a água que encontra, assim senta-se ela em qualquer cama até desfalecer, e qualquer flecha abre sua aljava.


16 A graça de uma mulher cuidadosa rejubila seu marido,
17
e seu bom comportamento revigora os ossos.
18
É um dom de Deus uma mulher sensata e silenciosa, e nada se compara a uma mulher bem-educada.
19
A mulher santa e honesta é uma graça inestimável;
20
não há peso para pesar o valor de uma alma casta.
21
Assim como o sol que se levanta nas alturas de Deus, assim é a beleza de uma mulher honrada, ornamento de sua casa.


22 Como a lâmpada que brilha no candelabro sagrado, assim é a beleza do rosto na idade madura.
23
Como colunas de ouro sobre alicerces de prata, são as pernas formosas sobre calcanhares firmes.
24
Como fundamentos eternos sobre pedra firme, assim são os preceitos divinos no coração de uma mulher santa.

Três coisas irritantes

25 Duas coisas entristecem o meu coração, e uma terceira me irrita:
26
um homem de guerra que perece na indigência, um homem sábio que é desprezado,
27
e aquele que passa da justiça ao pecado; a este último, Deus reserva a espada.

Perigos do comércio

28 Duas coisas me parecem difíceis e perigosas: dificilmente evitará erros o que negocia, e o taberneiro não escapará ao pecado da língua.


27 1 A pobreza fez cair vários deles no pecado. Quem procura enriquecer, afasta os olhos (de Deus).
2
Como se enterra um pau entre as junturas das pedras, assim penetra o pecado entre a venda e a compra.
3
O pecado será esmagado com o pecador.
4
Se não te aferrares firmemente no temor ao Senhor, tua casa em breve será destruída.

Como provar os homens

5 Quando se sacode a joeira, só ficam refugos; assim a perplexidade permanece no pensamento do homem.
6
A fornalha experimenta as jarras do oleiro; a prova do infortúnio, os homens justos.
7
O cuidado aplicado a uma árvore mostra-se no fruto; assim a palavra manifesta o que vai no coração do homem.
8
Não louves um homem antes que ele tenha falado, pois é assim que se experimentam os humanos.

Busca da justiça

9 Se procurares a justiça, hás de consegui-la, e dela te revestirás como de um manto de festa. Habitarás com ela, ela te protegerá para sempre; e, no dia do juízo, nela encontrarás apoio.
10
As aves chegam-se aos seus semelhantes; assim a verdade volta àqueles que a põem em prática.
11
O leão está sempre à espreita de uma presa; assim o pecado, para aqueles que praticam a iniqüidade.

Conversão dos tolos

12 O homem santo permanece na sabedoria, estável como o sol; mas o insensato é inconstante como a lua.
13
Na companhia dos tolos, guarda tuas palavras para outra ocasião. Sê de preferência assíduo junto às pessoas ponderadas.
14
A conversação dos pecadores é odiosa; eles se alegram nas delícias do pecado.
15
Uma linguagem cheia de blasfêmias é horripilante, e sua grosseria fará com que não queiramos ouvi-la.
16
Uma disputa entre orgulhosos faz correr sangue; suas injúrias fazem sofrer os ouvidos.

A discrição, salvaguarda da amizade

17 Quem revela o segredo de um amigo perde a sua confiança, e não mais achará amigos que lhe convenham.
18
Ama o teu próximo e sê fiel na amizade com ele;
19
se desvendares seus segredos, em vão correrás atrás dele,
20
pois, como um homem que mata seu amigo, assim é o que destrói a amizade do próximo;
21
como um homem que solta o pássaro que tem na mão, assim abandonaste o teu próximo, e não mais o encontrarás.
22
Não o persigas, já está longe; escapou-se como uma gazela da armadilha. Porque a sua alma foi ferida,
23
e não mais poderás curar (sua ferida). Depois de uma injúria pode haver reconciliação;
24
desvendar, porém, os segredos de um amigo é um desespero para a alma desventurada.

Hipocrisia

25 Aquele que tem um olhar lisonjeiro trama negros propósitos, e ninguém pode afastá-lo de si.
26
Em tua presença só terá doçura nos lábios, admirará tudo o que disseres; mas em breve mudará sua linguagem e armará laços às tuas palavras.
27
Abomino muitas coisas, porém nada tanto quanto ele; o Senhor também o detesta.

Justiça imanente

28 Quem lança uma pedra no ar, a vê recair sobre sua cabeça; a ofensa feita por traição atingirá também o traidor.
29
Quem cava uma fossa cairá nela; quem põe uma pedra no caminho do próximo nela tropeçará; quem arma uma cilada a outrem nela será apanhado.
30
O desígnio criminoso volta-se contra o seu autor, que não saberá de onde lhe vem o mal.
31
A zombaria e a ofensa são próprias dos orgulhosos; a vingança os espreita como um leão.
32
Aqueles que escarnecem do pecado dos justos serão apanhados no laço, e a dor os consumirá ainda vivos.


33 Cólera e furor são ambos execráveis; o homem pecador os alimenta em si mesmo.

A vingança

28 1 Aquele que quer vingar sofrerá a vingança do Senhor, que guardará cuidadosamente os seus pecados.
2
Perdoa ao teu próximo o mal que te fez, e teus pecados serão perdoados quando o pedires.
3
Um homem guarda rancor contra outro homem, e pede a Deus a sua cura!
4
Não tem misericórdia para com o seu semelhante, e roga o perdão dos seus pecados!
5
Ele, que é apenas carne, guarda rancor, e pede a Deus que lhe seja propício! Quem, então, lhe conseguirá o perdão de seus pecados?
6
Lembra-te do teu fim, e põe termo às tuas inimizades,
7
pois a decadência e a morte são uma ameaça (para aqueles que transgridem) os mandamentos.
8
Lembra-te do temor a Deus, e não fiques irado contra o próximo.
9
Lembra-te da aliança com o Altíssimo, e passa por cima do erro que o teu próximo cometeu inadvertidamente.

Desavenças

10 Evita a desavença e diminuirás os pecados.
11
O homem irascível provoca as querelas; o pecador espalha a inquietação entre seus amigos, e semeia a inimizade no meio de pessoas que vivem em paz.
12
O fogo queima na proporção da lenha que há na floresta; a ira do homem inflama-se na medida de seu poder, e desenvolve-se em proporção de sua riqueza.
13
Uma querela precipitada acende o fogo; a presteza na disputa derrama sangue; e a língua que presta (falso) testemunho causa a morte.
14
Sopra sobre uma centelha e ela se abrasará; cospe sobre ela e ela se apagará: ambos saem de tua boca.

Crimes da língua

15 Maldito o delator e o homem que diz branco e preto, pois semeiam a discórdia entre muita gente que vive em paz.
16
A língua de um terceiro abalou muitos deles, e os afugentou de uma nação a outra.
17
Ela destruiu as cidades fortes dos ricos, e arrasou as casas dos poderosos.
18
Desbaratou os exércitos dos povos, e dispersou nações valentes.
19
A língua de um terceiro fez repudiar mulheres de escol, e privou-as do fruto de seu labor.
20
Aquele que o ouve não terá paz, não terá amigo em quem tenha confiança.
21
A chicotada produz um ferimento, porém uma língua má quebra os ossos.
22
Muitos homens morreram pelo fio da espada, mas não tantos quanto os que pereceram por sua própria língua.
23
Feliz aquele que está ao abrigo da língua perversa, que não passou pela cólera dela, que não atraiu sobre si o seu jugo, e que não foi atado pelas suas correntes,
24
pois o jugo dela é um jugo de ferro, e suas correntes, correntes de bronze.
25
A morte que ela dá é morte desastrada, e a moradia dos mortos é-lhe preferível.
26
Ela durará, mas não sempre; ela dominará o proceder dos injustos, e os justos não serão devorados pelas suas chamas.
27
Aqueles que abandonam Deus lhe serão entregues: ela os consumirá sem se apagar; lançar-se-á sobre eles como um leão; e os estraçalhará como um leopardo.
28
Protege teus ouvidos com uma sebe de espinhos; não dês ouvidos à língua maldosa, e põe em tua boca uma porta com ferrolhos.
29
Derrete teu ouro e tua prata; faze uma balança para (pesar) as tuas palavras, e para a tua boca, um freio bem ajustado.
30
Tem cuidado para não pecar pela língua, para não caíres na presença dos inimigos que te espreitam, e para que não venha o teu pecado a ser incurável e mortal.

Empréstimos

29 1 Aquele que tem compaixão empresta com juros ao seu próximo; aquele que tem a mão generosa guarda os mandamentos.
2
Empresta a teu próximo quando ele estiver necessitado, e de teu lado, paga-lhe o que lhe deves, no tempo marcado.
3
Cumpre tua palavra e procede lealmente com ele, e acharás em toda ocasião o que te é necessário.
4
Muitos consideraram como um achado o que pediam emprestado, e causaram desgosto àqueles que os ajudaram.
5
Até que se tenha recebido, beija-se a mão de quem empresta; com voz humilde fazem-se promessas;
6
mas, chegando o tempo de restituir, pedem-se prazos; só se têm palavras pesarosas e queixas; e toma-se como pretexto (a dificuldade) da época.
7
Se o que pede emprestado pode restituir, nega-se a princípio. Restitui em seguida só a metade da quantia, e a considera como um lucro.
8
Se não tem meios para pagar, priva o que emprestou do seu dinheiro, e dele se faz gratuitamente um inimigo.
9
Ele o paga com ofensas e maldições, e paga com o mal o bem que recebeu.
10
Muitos não emprestam, não por maldade, mas por medo de serem injustamente iludidos.

Compaixão com os pobres

11 Todavia, sê indulgente para com o miserável, e não o faças esmorecer depois da esmola.
12
Por causa do mandamento, socorre o pobre; e não o deixes ir com as mãos vazias na sua indigência.
13
Perde o teu dinheiro em favor de teu irmão e de teu amigo; não o escondas debaixo de uma pedra para ficar perdido.
14
Gasta o teu tesouro segundo o preceito do Altíssimo, e isso te aproveitará mais do que o ouro.
15
Encerra a esmola no coração do pobre, e ela rogará por ti a fim de te preservar de todo o mal.
16
, 17, 18 Para combater o teu inimigo, ela será uma arma mais poderosa do que o escudo e a lança de um homem valente.

A fiança

19 O homem de bem responsabiliza-se pelo próximo; o homem sem pejo abandona-o a si próprio.
20
Não esqueças o benefício daquele que se responsabiliza por ti, pois ele arriscou a vida para te amparar.
21
O pecador e o impudico fogem de seu fiador;
22
o pecador atribui a si mesmo o benefício de quem por ele se responsabiliza, e com coração ingrato abandona o seu libertador.
23
Um homem se responsabiliza pelo seu próximo, e este, perdendo a vergonha, o abandonará.
24
Um mau penhor perdeu muitas pessoas que prosperavam, e as agitou como as ondas do mar;
25
por uma reviravolta das coisas, ele exilou muitos poderosos, que se tornaram peregrinos em terra estrangeira.
26
O pecador que transgride o mandamento do Senhor, comprometer-se-á a responder inoportunamente por outro; e aquele que tentar muitos empreendimentos não escapará do processo.
27
Ajuda o próximo conforme as tuas posses, e acautela-te para que não caias tu também.

Sobriedade e discrição

28 O principal para a vida do homem é a água, o pão, o vestuário e uma casa para ocultar a sua nudez.
29
Mais vale o que um pobre come sob um vigamento, do que um magnífico banquete em casa alheia para quem não tem domicílio.
30
Contenta-te com o pouco ou muito que tiveres e evitarás a censura de seres um estranho.
31
É uma vida miserável a daquele que vai de casa em casa; em toda parte onde se hospedar, não estará confiante, e não ousará abrir a boca.
32
Recebe-se com hospitalidade, dá-se de comer e de beber a ingratos; e, depois disso, ouvem-se palavras desagradáveis:
33
Vamos, intruso, prepara a mesa, e o que tens, dá-o de comer aos outros;
34
retira-te, por causa da homenagem que devo prestar aos meus amigos. Preciso de minha casa para nela receber meu irmão.
35
Eis coisas penosas para um homem sensato: ouvir censuras pela hospitalidade e pelo empréstimo que se fez.

Educação dos filhos

30 1 Aquele que ama seu filho, castiga-o com freqüência, para que se alegre com isso mais tarde, e não tenha de bater à porta dos vizinhos.
2
Aquele que dá ensinamentos a seu filho será louvado por causa dele, e nele mesmo se gloriará entre seus amigos.
3
Aquele que educa o filho torna o seu inimigo invejoso, e entre seus amigos será honrado por causa dele.
4
O pai morre, e é como se não morresse, pois deixa depois de si um seu semelhante.
5
Durante sua vida viu seu filho e nele se alegrou; quando morrer, não ficará aflito; não terá de que se envergonhar perante seus adversários,
6
pois deixou em sua casa um defensor contra os inimigos, alguém que manifestará gratidão aos seus amigos.
7
Aquele que estraga seus filhos com mimos terá que lhes pensar as feridas; a cada palavra suas entranhas se comoverão.
8
Um cavalo indômito torna-se intratável; a criança entregue a si mesma torna-se temerária.
9
Adula o teu filho e ele te causará medo; brinca com ele e ele te causará desgosto.
10
Não te ponhas a rir com ele, para que não venhas a sofrer com isso, e não acabes rangendo os dentes.
11
Não lhe dês toda a liberdade na juventude, não feches os olhos às suas extravagâncias:
12
obriga-o a curvar a cabeça enquanto jovem, castiga-o com varas enquanto ainda é menino, para que não suceda endurecer-se e não queira mais acreditar em ti, e venha a ser um sofrimento para a tua alma.
13
Educa o teu filho, esforça-te (por instruí-lo), para que te não desonre com sua vida vergonhosa.

Saúde

14 Mais vale um pobre sadio e vigoroso, que um rico enfraquecido e atacado de doenças.
15
A saúde da alma na santidade e na justiça vale mais que o ouro e a prata. Um corpo robusto vale mais que imensas riquezas.
16
Não há maior riqueza que a saúde do corpo; não há prazer que se iguale à alegria do coração.
17
Mais vale a morte que uma vida na aflição; e o repouso eterno que um definhamento sem fim.
18
Bens escondidos em uma boca fechada são como preparativos de um festim colocados sobre um túmulo.
19
De que serve ao ídolo a oferenda que lhe fazem? Não pode nem comê-la nem lhe respirar o aroma.
20
Assim é aquele que o Senhor repele, e que carrega o castigo de seu pecado;
21
seus olhos vislumbram (o alimento) e ele suspira, assim como suspira o eunuco ao abraçar uma virgem.

Cultivar a alegría

22 Não entregues tua alma à tristeza, não atormentes a ti mesmo em teus pensamentos.
23
A alegria do coração é a vida do homem, e um inesgotável tesouro de santidade. A alegria do homem torna mais longa a sua vida.
24
Tem compaixão de tua alma, torna-te agradável a Deus, e sê firme; concentra teu coração na santidade, e afasta a tristeza para longe de ti,
25
pois a tristeza matou a muitos, e não há nela utilidade alguma.
26
A inveja e a ira abreviam os dias, e a inquietação acarreta a velhice antes do tempo.
27
Um coração bondoso e nobre banqueteia-se continuamente, pois seus banquetes são preparados com solicitude.

Infelicidade do avarent

31 1 As vigílias para enriquecer ressecam a carne, as preocupações que elas trazem tiram o sono.
2
A inquietação pelo porvir perturba o sentido. Uma doença grave torna a alma moderada.
3
O rico trabalha para juntar riquezas; quando se entrega ao repouso, goza o fruto de seus haveres.
4
O pobre trabalha por não possuir com que viver, e, ao término da vida, tudo lhe falta.
5
Aquele que ama o ouro não estará isento de pecado; aquele que busca a corrupção será por ela cumulado.
6
O ouro abateu a muitos, e seus encantos os perderam.
7
O ouro é um obstáculo para aqueles que se lhe oferecem em sacrifício; infelizes daqueles que o buscam com ardor: ele fará perecer todos os insensatos.
8
Bem-aventurado o rico que foi achado sem mácula, que não correu atrás do ouro, que não colocou sua esperança no dinheiro e nos tesouros!
9
Quem é esse homem para que o felicitemos? Ele fez prodígios durante sua vida.
10
Àquele que foi tentado pelo ouro e foi encontrado perfeito, está reservada uma glória eterna: ele podia transgredir a lei e não a violou; ele podia fazer o mal e não o fez.
11
Por isso seus bens serão fortalecidos no Senhor, e toda a assembléia dos santos louvará suas esmolas.

Refeições e banquetes

12 Se estiveres sentado a uma mesa bem abastecida, não comeces abrindo a boca.
13
Não digas: Que abundância de iguarias há sobre ela!
14
Lembra-te de que um olhar maldoso é coisa funesta.
15
Que coisa há pior que o olho? É por isso que há de se desfazer em lágrimas.
16
Quando ele olhar, não sejas o primeiro a estender a mão, para que não cores, envergonhado pela tua cobiça.
17
Não comas demasiadamente num banquete.
18
Julga os desejos de teu próximo segundo os teus.
19
Serve-te como um homem sóbrio do que te é apresentado, para que não te tornes odioso, comendo muito.
20
Acaba de comer em primeiro lugar, por decoro, e evita todo excesso, para que não desgostes a ninguém.
21
Se tiveres tomado assento em meio de uma sociedade numerosa, não sejas o primeiro a estender a mão para o prato, nem sejas o primeiro a pedir de beber.
22
Não é um pouco de vinho suficiente para um homem bem-educado? Assim não terás sono pesado, e não sentirás dor.
23
A insônia, o mal-estar e as cólicas são o tributo do intemperante.
24
Para um homem sóbrio, um sono salutar; ele dorme até de manhã e sente-se bem.
25
Se tiveres sido obrigado a comer demais, levanta-te e vomita; isso te aliviará, e não te exporás à doença.
26
Ouve-me, meu filho, não me desprezes: reconhecerás no fim a veracidade de minhas palavras.
27
Em todas as tuas ações, sê diligente, e nenhuma doença te acometerá.
28
Muitos lábios abençoarão aquele que dá refeições com liberalidade; o testemunho prestado à honestidade dele é verídico.
29
Toda a cidade resmunga contra aquele que dá de comer com mesquinhez e o testemunho prestado à avareza dele é exato.
30
Não incites a beber aquele que ama o vinho, pois o vinho perdeu a muitos.
31
O fogo põe à prova a dureza do ferro: assim o vinho, bebido em excesso, revela o coração dos orgulhosos.
32
O vinho bebido sobriamente é como uma vida para os homens. Se o beberes moderadamente, serás sóbrio.
33
Que é a vida do homem a quem falta o vinho?
34
Que coisa tira a vida? A morte.
35
No princípio o vinho foi criado para a alegria não para a embriaguez.
36
O vinho, bebido moderadamente, é a alegria da alma e do coração.
37
A sobriedade no beber é a saúde da alma e do corpo.
38
O excesso na bebida causa irritação, cólera e numerosas catástrofes.
39
O vinho, bebido em demasia, é a aflição da alma.
40
A embriaguez inspira a ousadia e faz pecar o insensato; abafa as forças e causa feridas.
41
Não repreendas o próximo durante uma refeição regada a vinho; não o trates com desprezo enquanto ele se entrega à alegria.
42
Não lhe faças censuras, não o atormentes, reclamando o que te é devido.


Sirach (BAV) 23